JANEIRO 2014 ANÁLISE GLOBAL DE LAUSANNE II
SUMÁRIO EXECUTIVO
O TRÁFICO DE SERES HUMANOSE A RESPOSTA DA IGREJA
Abraham (Abbey) George
O tráfico de seres humanos é um crime que ocorre em todo o mundo e afeta praticamente todos os países. Entre 2007 e 2010, foram detectadas vítimas de 136 nacionalidades diferentes em 118 países. Essa prática terrível é um processo pelo qual indivíduos são recrutados em suas comunidades e explorados por traficantes, que se utilizam de enganos e/ou alguma forma de coerção para atrair e controlar tais pessoas. É o conflito entre força e vulnerabilidade – a exploração do fraco pelo forte. Isso tem que ser algo que grita em alta voz nos corações e mentes de nós, cristãos.
As Escrituras contêm muitas ordens claras para se “fazer justiça” (Miqueias 6:8) e para “tratar os outros com justiça, socorrer os que são explorados, defender os direitos dos órfãos e proteger as viúvas” (Isaías 1:17). Essas não são referências acidentais, mas constituem o ponto central da Bíblia. O reino de que Jesus falou não era um estado futuro de ser nem um lugar distante, mas algo que estava acontecendo nesta Terra, aqui e agora.
A igreja é o veículo de Deus para profetizar shalom
sobre a devastação e a opressão existentes no mundo. Sem uma interação ativa com a devastação que nos rodeia, nossa proclamação se resume a uma mera sombra do evangelho glorioso que somos comissionados a compartilhar.
Portanto, a igreja precisa ser a voz profética da transformação, manter a esperança viva e estar engajada na obra. Historicamente, ela tem estado na linha de frente em assuntos relacionados a educação, ação em hospitais e orfanatos,
alimentação dos famintos e abolição da escravidão em algumas partes do mundo. Infelizmente, na maioria das vezes, a igreja tem deixado de lado de maneira clara o tráfico de seres humanos, que afeta praticamente todos os países.
A igreja pode encorajar os jovens a assumir carreiras que ajudam a proteger e cuidar daqueles que sofrem abusos. Ela também pode pressionar os governos local, federal e internacional, bem como influenciar os empresários da região onde está localizada. Internamente, a igreja pode ensinar os fundamentos bíblicos sobre justiça e mostrar a visão que Deus tem em relação a mulheres e crianças. Ela pode ainda encorajar os membros a se comprometer com as vítimas como se elas fossem de sua própria família, oferecendo tempo, habilidades e recursos a organizações como a Missão Justiça Internacional, e interceder em favor daqueles que são explorados por traficantes.
A igreja precisa crer que pode, verdadeiramente, ser agente de transformação neste mundo arruinado e ferido. Se fizer isso, ela se tornará parte inequívoca do processo de geração do shalom de Deus neste mundo.
O ENGAJAMENTO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO: UMA TAREFA MISSIOLÓGICA GLOBAL
Lars Dahle
Onde quer que vivamos no mundo atual, as tecnologias de informação e comunicação influenciam cada vez mais nossas vidas, bem como nosso testemunho e ministérios cristãos. A grande variedade de mensagens locais e globais veiculadas pelos meios de comunicação fornece um contexto
JANEIRO 2014 ANÁLISE GLOBAL DE LAUSANNE III complexo para a tarefa de defender a verdade de
Cristo no século 21. Os assuntos missionais relacionados ao engajamento dos meios de comunicação são, portanto, de real significância para a igreja global.
Os meios de comunicação contemporâneos apresentam cinco características centrais: digitalização, democratização, fragmentação, globalização e pluralização. Elas ilustram a urgente necessidade de se engajar mais efetivamente nos meios de comunicação em toda a sua diversidade. Eles são o principal veículo por meio do qual notícias, ideias e histórias se espalham. Portanto, se nós somos testemunhas de Cristo e de todos os seus ensinos em cada nação, em cada esfera da sociedade e no domínio das ideias (Compromisso da Cidade do Cabo), não podemos negligenciar os meios de comunicação.
O Compromisso enfatiza três grandes áreas de preocupação: consciência dos meios de comunicação (a necessidade de os discípulos serem mais conscienciosos quando deparam com mensagens dos meios de comunicação), presença dos meios de comunicação (a necessidade de entrar nos meios de comunicação atuais com profissionalismo e integridade cristã) e ministérios nos meios de comunicação (a necessidade de usar todo tipo de tecnologia dos meios de comunicação para comunicar o evangelho no contexto de uma visão de mundo bíblica holística).
Teologicamente, devemos encarar o chamado para ser um profissional dos meios de comunicação como parte do mandato cultural de Deus e de sua missão para o mundo. Do ponto de vista missiológico, devemos encarar o engajamento dos meios de comunicação como parte essencial do chamado de toda a igreja para levar todo o evangelho para todo o mundo. Em termos apologéticos, devemos encarar o engajamento dos meios de comunicação como uma dimensão do nosso testemunho de Jesus Cristo.
A consciência dos meios de comunicação, a
presença dos meios de comunicação e os ministérios nos meios de comunicação constituem uma abordagem estratégica para o engajamento desses meios.
Capacitar pessoas, famílias, jovens ministros e igrejas para se comprometerem com as mensagens dos meios de comunicação é uma dimensão da missão frequentemente esquecida. Essa capacitação inclui pesquisa, recursos e treinamento prático em análise global e em mensagens dos meios de comunicação, procurando mostrar a credibilidade e a relevância de uma visão de mundo bíblica holística, em contraste com outras visões alternativas.
Há uma grande variedade de papéis legítimos e estratégicos, para cristãos talentosos, a ser desempenhados no mundo dos meios de comunicação, como, por exemplo, no jornalismo, no trabalho com documentários, na área da criatividade e no entretenimento. Por meio da presença desses cristãos nos meios de comunicação, a credibilidade e plausibilidade do evangelho e da visão de mundo bíblica holística podem merecer a atenção tanto daqueles que buscam algo, como de céticos e cristãos.
O uso efetivo de todos os tipos de tecnologia de mídia, formato e gênero é importante para evangelizar, discipular e educar na fé. Especialistas em ministérios que utilizam meios de comunicação ainda desempenham um papel estratégico, mas as novas tecnologias de mídia têm transformado organizações missionárias, ministérios com jovens e igrejas locais em pontos de difusão de mídia. Isso cria uma necessidade crescente de parcerias evangelísticas em todas as áreas da mídia. Nós precisamos também explorar as maneiras como as mídias sociais criam possibilidades cada vez maiores de um ministério de mídia para cada crente.
Portanto, há muitas razões para os líderes cristãos integrarem globalmente o engajamento dos meios de comunicação em suas estratégias de missão.
JANEIRO 2014 ANÁLISE GLOBAL DE LAUSANNE IV
MISSÃO ENTRE GRUPOS INDÍGENAS DO BRASIL: LIÇÕES, DESAFIOS E OPORTUNIDADES
Ronaldo Lidório
Este artigo analisa tendências e desafios na missão entre os grupos indígenas no Brasil. Entender a realidade desses grupos é crucial para qualquer reflexão ou ação. Há 228 grupos indígenas reconhecidos no Brasil, ainda que o número real possa chegar a 340. Do total da população indígena, 52% vivem em vilas tradicionais, enquanto 48% estão em áreas urbanizadas ou em processo de urbanização. Existem 181 línguas indígenas.
Há uma igreja evangélica para cada um dos 150 grupos étnicos. Entretanto, 99 dessas igrejas não contam com lideranças indígenas. Missionários evangélicos estão presentes em 182 comunidades, representando mais de 30 agências missionárias e aproximadamente 100 denominações diferentes. Alguma coisa nova está acontecendo na igreja indígena no Brasil. Deus tem levantado líderes indígenas chaves para trazer pessoas que manifestam o desejo de buscar o Senhor. As igrejas indígenas estão crescendo rapidamente e se espalhando por áreas e grupos totalmente novos. Entretanto, o número de líderes indígenas maduros é pequeno, e são poucas as iniciativas que focam o treinamento de liderança. É necessário investir na capacitação desses líderes para fortalecer a igreja existente, alcançar os que ainda precisam ser alcançados e evitar sincretismos. Existe, ainda, a necessidade de melhor integração entre tradução da Bíblia, plantação de igrejas e treinamento de líderes.
Há 121 grupos étnicos que ainda estão mal evangelizados ou totalmente não evangelizados. Serão necessárias centenas de novos missionários para encarar o desafio de compartilhar o evangelho, plantar igrejas e se comprometer com suas necessidades sociais. Muitos desses missionários podem vir da igreja indígena.
Entretanto, eles precisam receber treinamento em transculturalidade, já que muitos deles podem experimentar as mesmas barreiras que os não índios, ao viver e se comunicar com outros grupos. Está na hora de fazer parceria com a igreja indígena no Brasil e trabalhar com ela para alcançar os que precisam ser alcançados, traduzir a Bíblia para todas as línguas e treinar novos líderes. A AMTB (Associação de Agências Missionárias Transculturais do Brasil) e a CONPLEI (Conselho Nacional de Pastores e Líderes Evangélicos Indígenas) estão trabalhando arduamente nessa direção. Fazer parcerias com essas organizações em projetos de colaboração com a igreja indígena no Brasil seria um passo estratégico.
Há lições tanto para a igreja global como para o movimento missionário, especialmente no que diz respeito à necessidade de melhor entendimento e unidade para enfrentar os desafios atuais. Para alcançar os que precisam ser alcançados, precisamos saber mais do que “quantos”, “quem” e “onde”. Entender a identidade, o contexto sociocultural e a situação das igrejas indígenas é vital. Há também a necessidade urgente de promover melhor unidade estratégica e espiritual entre os diferentes atores do movimento missionário mundial. Sem entendimento, acabaremos focando em soluções inadequadas. Sem unidade, não seremos fortes o suficiente para enfrentar os desafios.
A HORA DA ETNODOXOLOGIA CHEGOU: COMO O ENGAJAMENTO DE ARTISTAS LOCAIS PODE EXPANDIR O REINO DE DEUS
Brian Schrag with Robin Harris
A etnodoxologia é um conceito teológico e antropológico que orienta todas as culturas a adorar a Deus utilizando suas próprias expressões artísticas. O termo vem de duas palavras gregas bíblicas: ethne, que significa povo, e doxa, que significa glória, louvor. A comunicação artística
JANEIRO 2014 ANÁLISE GLOBAL DE LAUSANNE V local é poderosa para a expansão do reino de Deus,
principalmente porque ela é geralmente criada e reconhecida localmente. Não há necessidade de traduzir materiais estrangeiros, e por isso os artistas da comunidade podem contribuir para essa expansão.
O processo básico para fazer etnodoxologia envolve conhecimento da comunidade e de sua arte, identificando de que modo gêneros artísticos específicos podem ir ao encontro dos alvos comunitários do reino – estimulando a criatividade, encorajando os membros da comunidade a melhorar novas criações e integrando e celebrando novos trabalhos e planos para a continuidade dessa criatividade.
A etnodoxologia aumenta a eficiência dos esforços de plantação de igrejas, desenvolvendo expressões de adoração multiculturais saudáveis, discipulado e formação espiritual, evangelismo e missões de curto período e ajudando pessoas a responder à injustiça e a traumas.
Se a etnodoxologia se tornar a abordagem principal no crescimento de missões e da adoração, artistas de minorias e sua arte estarão bem integrados à vida das igrejas de suas comunidades, e a igreja se tornará um motor para a revitalização dessas artes e de suas comunidades, em vez de contribuir para a sua morte. Além disso, o compartilhamento de recursos artísticos na igreja moverá ambos da cultura das minorias para a cultura da maioria e vice-versa, e mais formas artísticas serão representadas ao redor do trono de Deus (Apocalipse 7:9-12) e em sua cidade (Apocalipse 21:22-27).
Há um número crescente de recursos para ajudar a integrar a etnodoxologia às igrejas e organizações. Uma sugestão é filiar-se ao ICE (International Council of Ethnodoxologists), considerado o centro da rede de praticantes da etnodoxologia. Por meio do ICE, pode-se ter acesso ao conhecimento que ele produz e também contribuir para aumentar esse conhecimento. É possível, ainda, encorajar artes potenciais a se tornar certificadas pela organização. Há, além disso, seminários, cursos, consultas e livros disponíveis sobre o assunto. As pessoas se comunicam em quase 7.000 línguas no mundo, não apenas por palavras faladas, mas também por meio de manifestações artísticas, como música, teatro e dança, entre outras. Essas comunidades mantêm um relacionamento imperfeito ou não existente com Deus e lutam contra violência, doenças, conflitos sociais, raiva, promiscuidade sexual, ansiedade e medo – do mesmo modo que nossas próprias sociedades. Deus concedeu a cada cultura dons artísticos únicos, para falar da verdade e promover cura, esperança e gozo em resposta a esses problemas. Entretanto, muitos desses dons estão dormentes, mal utilizados ou mortos. Se pudermos ajudar nossos irmãos e irmãs – e a nós mesmos – a reviver essas tradições artísticas, todas as culturas finalmente usarão todos os seus dons para adorar, obedecer a Deus e desfrutar dele de todo coração, mente, alma e força. Isso não acontecerá completamente nesta Terra, mas podemos nos juntar a Deus e trabalhar para a futura terra.
