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"OS SOFREDORES DA RUA"
Estudo de caso da cooperativa de catadores de papel e papello da V~rzea do Glicério, S~o Paulo
Banca examinadora Pro; . Orientador _ Pro-t.
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;?~-Fundação Getulôo Vargas •• Escola de Administração ~" '. ~ de Empresas de SAo Paulo -; ~ Biblioteca j-." ." .. " "i'"
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- ---~-. -
,-Aos meus pais
FUNDAC~O GET~LIO VARGAS
ESCOLA DE ADMINISTRAC~O DE S~O PAULO
JOIO LUIZ PASSADOR
"OS SOFREDORES DA RUA"
Estudo de caso da cooperativa de catadores de papel e
papelio da Virzea do Glic~rio, Sio Paulo.
Disserta~io apresentada ao
da EAESP/FGV,
~reade Concentra~io:
Administra-~io e Planejamento Urbano, como
requisito para obten~io de titulo
de mestre em Administra~io.
Orientador: Prof. Ruben Cesar Keinert
S~O PAULO 1.993
---PASSADOR, ·.JoãoLuiz. D"ií "iíofredore"ií da rue . Eet ada de cs sa
da cooperativa de c s
t
saare-s de pal-'el ~' papelão da (,/a'rzea do Glicério, Sito Paulo. São Paulo, EAESP/FG'J, 1.993.177 p. (Disserta~ão de Mestrado apresentada ao Curso de
Pós-Graduação da EAESP/FGV, ~rea dE Concentração:
Administl-ação e F'lanejamento UI-bano) ..
Re"iíwlIo: TI-ata da conceituação do mendigo segundo a ót ica
dos proc e ssos de exc 1usão soc ia 1, na,;,.;+o rma s qUE:·
impossibilitam os indivíduos mo rad or es de l-ua, ao pleno
exercício dos direitos de cidadania. Apresenta um quadro
atual do pel-fil da pOPLllação de rua da Cidade de sã/j
Paulo e os modos de sobrevivincia por ela adotados.
Analisa a experiincia da Cooperativa dos Catadores
Autônomos de Papel, Apal-as e Matel-iais Reapl-oveitáveis
Ltda. - COOPAMARE, como movimento de reinserção social de
mendigos catadores. Avalia as políticas p~blicas
bra sí Le í.r as na ár e a social e as possíveis a lter natí va s
para a problemática das populaç5es de rua.
Palavra"ií-Chaw~"ií: Mendigos - População de Rua - Br asi I
-Cidadania - Políticas P~blicas - Cooperativa - etc ...
ÍNDICE
1 - Apr~s~ntaçlo ~ agrad~cim~ntos 1 2 - 1'I~todologia · ··· 3 3 - Conc~ituaçlo do m~ndigo ···7 3.1 - Pobrezae
estratificação ·8 3.2 - Ol"d~m mora1 13 3.3 - Direitos civis ·.··· .16 3.3.1 - Aspectos jurídicos 16 3.3.2 - Tr ab a l ho ··· .19 3.4 - Dir~itos políticos 22 3.4 - Dir~itos sociais ··· ..254 - P~r'il do hom~m d~ rua ·..··· 30
4.1 - Int roducão 30
4.2 - Distribuiç:ão espacial ··· .34 4.2.1 - Tamanho dos grupos ··· .37
4.2.2 - Composi,lo dos grupos 41
4.3 - P~l"' i1 44
4.3.1 - Dados quantitativos ···.44
r
4.4 - Modo de vida na rua ··· .54
4.4.1 - MOl-adia , 55
4.4.2 - Tr ab a l ho 56
4.4.3 - Alimentaç:ão 65
4.4.4 - Higiene e saúde 68
4.4.5 - Valores e sociabilidade 75
5 - A experiência dos catadores de papel e papelão 83
5.1 - A Organizaç:ão de Auxílio Fraterno 83
5.2 - A Cooeer atí va ··· .94
6 - Políticas públicas ··· .110
6.1 - Avaliaç:ão de políticas sociais 110
6.2 - As Casas de Convivência ·.· .117
7 - Conc 1usão 120
8 - Anexos ·.. ··· 124
9 - Bibli091-afia ··· .173
1 - APRESENTACÃO E AGRADECIMENTOS
brisas, guardadores de carros, catadores de sucata ou simplesmente pedintes formam um segmento crescente de indivíduos, pe,-sonagens da vida ur-bana do país. Apesal- de representarem o teatro cotidiano da mis~ria brasileira, s~o ainda um grande mist~rio por desvendar e um problema social sem solu~~o aparente.
Este trabalho se prop5e a tentar entender o fen8meno l luz das m~ltiplas raz5es que levam o indivíduo ao estado de
mendicância. no contexto dos sistemas social, político e
econ8mico que geram processos de estratifica~~o, exclus~o e marginalidade.
Desta forma, busca construir um quadro tedrico de referlncia, organizando as virias categoriza~5es existentes. tendo por objetivo compreender, de forma gen~rica por~m exaustiva, os diversos modos de ver e pensal- o .endigo dentro do campo do conhecimento científico.
Tomando por objeto o fen8meno da mendicância na Cidade de S~o Paulo e, mais especificamente, a experilncia da COOPAMARE - Cooperativa dos Catadores Aut8nomos de Papel, Ltda. , reconhecido movimento social de recupera~~o de homens de rua, o estudo pl-op5e-seI num segundo moment o, a uma re rlexão sobn~ as
possibilidades de reinser~~o social e resgate da cidadania
destes indivíduos fl-ente às políticas püblicas locais na ~rea social e, subsidiariamente, sobre o papel do Estado nas políticas macroecon8micas de ordem institucional.
A part ir dest a ana1ise, con T\-ontando-se as P\-~ticas
atuais de assistência social institucionalizadas a experiência da COOPAMARE, ser~ apresentado um quadro de possíveis alternativas para a reformula~ão destas políticas.
Os agradecimentos vão, em primeiro lugar, à Escola de Administra~ão de Empresas de São Paulo da Funda~ão Getdlio Vargas pela ampla liberdade de escolha e pesquisa do tema. Em especial, ao meu orientador, professor Ruben Cesar Keinert pelo cr~dito em mim depositado e aos demais professores da casa que ofereceram contribui~5es relevantes ao longo da confec~ão deste trabalho.
Merecem minha imensa gratidão a Organiza~ão de Auxílio Fraterno OAF, na pessoa das i\-mãs Lvete e Regina, os membros cooperados da COOPAMARE e os t~cnicos da Secretaria Municipal de Bem-Estar Social de São Paulo, sem os quais a motiva~ão e o incentivo para o trabalho seriam diversos.
Agrade~o l CAPES - Centro de Aperfei~oamento de Pessoal de Nível Superior pelo financiamento deste programa de mestl-ado.
Por fim, meus sinceros agradecimentos a todos os meus colegas dos CUl-SOS de Pós-G\-adua'~ãoda EAESP, na qual existe tamb~m, ainda que info\-malmente, uma ccceeratí va de mútuo
auxílio na supera~ão conjunta das dificuldades surgidas durante a confec~ão de nossas respectivas monografias. .-,
2 - METODOLOGIA
Esta disserta,io enquadra-se na categoria metodológica
de an~lis€ teórico-pr~tica, mais especificamente, um estudo
de caso com an á lí ae intel-pl-etativa de dados con cretos em
confronto com bibliografia definida.
A
revisio bibliogr~fica foi feita com base em trabalhoscientíficos pertinentes ao tema, publicados principalmente a
partir da d~cada de 70 Publica~5es avulsas, paper mimeos,
arquivos pdblicos tamb~m fazem parte do
material da revisio.
Quanto ao ti-aba1ho de a da
metodologia encontrou uma s~rie de limita,5es.
EII p rí meí ro lugar, houve a dificuldade op e rac í ona l de
ol-ganizada de vida, oc or r end o r e+e r en t e s à
defini~io de compromisso e disposi,io pessoal para diilogos.
Em segundo tusar . houve sempl-e uma c 1al-a sensa~io de
que, em fun,io dos riscos constantes no confronto com
pessoas desconhecidas, e tallb~m pelo medo de repl-essio e
remocão que fazem part e do seu cot id iano, as in fOI-ma,5es
prestadas pela p op u laç ão de rua e mesmo pelos catadores
cooperados eram muitas vezes in~orretas ou pouco fidedignas,
havendo uma tendincia a apresentar discursos prontos frente
~ identifica~io que fazem do interlocutor.
...,
r
;
..
Não só a omissão de dados ou o discurso justificador de
uma de te r m í nad a situaç:ão r ep r-e s en tavam, num P\- imei l-O
momento, dificuldades para a pesquisa, mas tamb~m a questão
do processo de comunicaç:ão, ou mercado lingUístico1, isto ~,
O uso de vocabul~rio diferenciado ou mesmo formas, ~s vezes
ininteligíveis, de articular palavras tornavam extremamente
difícil a coleta de
informaç:5es-Os ob s t ác u l o s slll-gidos do ponto de vista pessoal do
pesquisador# em funç:ão do impacto que representou o contato
com a realidade estudada, anvar aaveIment e,
sentimentos de confusão e reaç:5es de grande
ansiedade, e fOl-am decisivos paI-a a de Pí n íc ão de método e
técnica da pesquisa de campo_
O contato mais fl-eqUente com poucos indivíduos, já
melhor est!-utLIl-ados, como os rnt esran+e s mais ant igos da
COOPAHARE, e a r e a I a z ac ão de ent revi st as pnévias junt o à s
irlllãs da OAF fo\-am capazes d~ minimizal- as expectat ivas e
ansiedades de ambos os lados, atitudes mais
n~cept ivas quanto ~ possibi I idade de se conve r-sa r sob r e o
i. I~ão se pode sonhal- com uma SItuação de entrevista "Plt'ra",
livre de todos os efeitos da dominação de classe. Os membros
das c l a ss e s mais pop u l ar es ao sei-em entl-,;::·vi·:;tadostendem,
consciente ou inconscientemente, na sitlta~ão da presenç:a do
en tr e v istado r , a 'se1e c iona1- o que '::>1:: 1 hes par e c e a o e 'lua
1-ma ís à iITlCt.g€·1T1 que eles fazem da c u l tur a dominante, de modo
que i mu ít o difícil c on s e s u í r com que ~:;implesmentt:~falem
aquilo qUE.' 'realmente pensam. A ün íc a man eir a de c on tr ol a r a
1-eI ac ão é f;,.?:€·-·la va1-ia1- seg un d o a ':;ituac :Kc. tie "mer c ad o" em
lugar' de p'(ivilegial- uma un í c a +or ma criando c on d í c ões de
um discurso mais autêntico possível, Para melhor compreensão
'v eI" C ap . i 0 •. O !TIe1-c a doI i n 9 Uíst i c o " 1n BOURD I EU, F'ie1-r e .
aa€'stl5es de socio loeis . I:;:io de Janei-ro, narco Z":l-O, 1.983. 208 P(~9S.
histdrico da cooperativa, seu sistema de opera,io e o papel
de cada um nesse p roc es ao , Esta foi a metodologia adotada
tomando-a como mais adequada em rela,io ao inicialmente
pretendido m~todo do discurso livrei.
Desta as rea 1izadas
utilizando-se um roteiro muito flexível de recomposi~io
histdrica da trajetdria individual de cada cooperado, e
pr inc ipa 1ment e, da formaçio do grupo e organiza,io da
cooperativa, tentaram minimizar a imprecisio e maximizar os
detalhes das in~orma~5es narradas.
Ao longo de todo o trab a lho , utilizou-se amplamente a
transcri,io de entrevistas, tidas aqui como forma mais
adequada de objeto de estudo com pouca
documenta~io, que depende de relatos pessoais para
amplia,ão de informa,io sistematizada. Na composi,io de
alguns t óp í cos da mon091-afia, fOI-am utilizadas entrev í st as
t écní.ca simi l ar .
[lOS depoimentos, fOI-am e xtra f do s os trec ho s que são
mais representativos para o trabalho quanto ~ recomposi,io
histórica e ~ reconquista simultinea e paulatina das
possibilidades de social exercício de
cidadania.
E. Té cnic a ut í Lizac a pcu"a d ím ínu í r Ci. ans í ed ad e do
e n t r' e '.•si st <.•.d o d i a ntE ti a .."'"'rUd íc
i~:
o .. d o Ent1- E Vi st a d o1- € doemprEendimentü (monografia de mestradü). Descriçio do m~todo
em ;;:01:11;: I;JUE:::~, AI-ak c i j'1ar't in 5 . Dpti.'r a'r.i o, oo ersiri a . Es
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ad of.;'xplor;~tdr.io sobre ape rs risdo ia du st ris I ds {ir~=If1de S~(O
t.c."'•••salo , São F'aula, Símbolo} 1.9/~8. -.
r
o
trabalho se divide basicamente em quatro partes: (1)0conceito de mendigo, que tenta delimitar o espa~o científico
do conceito fi-ente à l ate ratur a existente; (2)0 pel-fil do
homem de rua na cidade de Sio Paulo com base nos trabalhos
existentes de levantamento, principalmente os da Prefeitura
do Município (3)a experiincia da COOPAMARE - Cooperativa
de Catadore s Autônomos de Papel, e Matel-iais
Reaproveitáveis; (4)a análise das atuais políticas públicas
na área social e suas possíveis mudan~as, principalmente ao
nível do poder local.
r
3 - CONCEITUACIO DO MENDIGO
O exame do fenômeno da mendicância na
literatura pertinente, que as concep~5es se formaram atrav~s
de uma s~l-ie de categol-ias que comp5e um esp ac o de o r
o
emessencialmente ét íca . É neste espaç:o que sUI-gem, ao mesmo
tempo, a ideologia, como formaç:io de legítimo/nio-Iegítimo,
e a c on ce rt uac ão var í ad a do mendigo no campo econômico,
jurídico, político e socio-cultural.
Neste sentido busca-se comc reende r o fenômeno ~egundo
de sua estigmatiza~io, da ideologia
institucionalizada, e que coincidem, sobremaneira, com a
consciincia comum.
Adota-se como estrutura de an~lise as diversas ~reas de
de conhecimento especializado mendigos,
enquanto de inclusio/exclusio na
Pobl-e:za/rique:za e na ordem de dareí tos da c idadan ia. Sio
elementos da cidadania o civil ( d í r e í to à
individual>, o político (direito a participa~io no sistema)
e o social (direito a um mínimo de bem-estar econômico).9
Atl-avés deste corte ho r í.aon taL, preten d e+ se c r aari . um
quadro amplo de entendimento ~as teorias que abordam o
fenômeno dos mendigos urbanos.
3. MARSHALL, T. H ..
de Janeiro, Zahar. 1,967. pags .. pags 63 e 63.
r.
r
3.1 - POBREZA E ESTRATIFICACZO
A pobreza pode ser entendida como um conceito relativo, isto ~, ela só existe em contraposi,io à riqueza.
Se os bens provenientes da natureza e do trabalho nio são sufie ient es pal-a sat is+aae r as necessidades vi t ai s de todos, cada sociedade se organiza de forma particular, segundo o seu meio natural, os produtos e processos disponíveis e o seu estilo de vida, quanto às fOI-mas de produç:ão e consumo dest es bens
det er eí na , segundo o pl"OCeSSO social, o "minimum" pal-a a sobrevivência e assim, dentro do grupo social, quem consome o mínimo, quem consome acima, e quem não tem acesso ao padl"ão básico.
"Nio ~ apenas pela quant idade br ut a de bens pr odu z í.doe
OU de en er s ias consumidas P01" uma pop u l acão que podemos c ar ac t er izal- u.a soe iedade como pobr-e ou 1-ica. Só exi st e a
pobreza em rela,ão
à
riqueza. istoi,
só existe carência de aI imentos, morad ia, saúde, quando part e da popuI acão tem pouco ou nenhum acesso aos bens que a sociedade efetivamente pr c du z c ?"tambim nio pode seI" tratada como uma classificaç:ão comparativa entre ~ociedades diferentes, tendo POl- l-efel-ência padl-ões de consumo das moder na s sociedades 4. COSTA, 1'1::u-j.a C'ristina Cast a l bo . Sociologia. Il1.tl"o.duli--itoà
cii/n 1'::i,':I. da :::iCK i ed s de . P <:\9. i:~i4. S:-3.0 Pau 1o, l"i()del- na, i. 99i? . 248 pag·:;.
í ndu st rí aí s , do p r a me iro Inundo. Existem países que, ap esar
de contarem com recursos limitados, adotam formas mais
igualitál-ias de d í at rí buí cão dos bens sociais e não podem
ser consideradas pobres.
situam como a oitava economia do mundo ocidental, e seus
a nd í cador es sociais de nível aTl-o-asiát íco""
Portanto, i estigmatizante a defesa de que sempre
existiu pobreza no mundo em funç:ão do mau aproveitamento de
recursos naturais e humanos ou uso de tecnologias impróprias
por parte de soci.dades atrasadas, ou que em países, como o
Bl-asiI, onde se encont ram boI sões de pob reaa abso luta, o
fen8meno ocorre em funç:ão do baixo padrão de desenvolvimento
econ8mico em relaç:ão a outras naç:ões.
Não se poderia considerar as sociedades indígenas
brasí Leí r as como "pob re s", pois a d í str rbuí cão do produto
social se dá de forma igualitária entre os membros do grupo.
Isso nos l-ellete ainda ao fat o de que a pobl-eza, como
acima entendida, muito embora se faç:a presente em todas as
ipocas e nas mais divel-sas sociedades, jamais alcanc ou a
proporç:ão em que se apresenta na atual sociedade industrial,
onde tão vasta quant idade e qual idade de bens prod uzado-s
convive com tão desigual distri~uiç:ão.
5. ~JAGUAI;:IBE} Hé 1 io .i..~ outr os . Br~"l si 1 2. Íf}f!}~l. p~r~"l um i70VO
pacto social. pag 21. Rio de Janeiro, Paz 8 Terra, 1.986.
Este é o gl"ande earad oxo das atuais sociedades
democrát icas. Tendo como fundament o o valOI" de igualdade,
que se tenta pl"atical" sob a égide do Estado de Dí ref to
(direitos iguais pa ra todos), no caso econômico e social
apl"eSenta-se como uma P I"eocLtPac ão de r educ ão de
desigua 1dades. Par a além da vont ad e de r e duz í 1- de fat o a
desigualdade, está se reconhecendo, até mesmo
reproduzindo, as diferenças.6
Este r ec onb ec iment o da in iqüidade c on+t r aa a
contrad ição do dese nvo1v í men t o das soc íedade s cap ital ist as
que segue a lógica da c onc en t rac ão de j-iquezas e pj-oduz o
contraste entre, de um lado, o ac~mulo de bens produzidos, e
do out l-O, a inacessibilidade ao consumo para grandes
contingentes populacionais.
~ importante ressaltar que o processo de exclusão não
se dá somente pela via econômica. As escalas de
estratificação passam também por um complexo sistema de
diferenciação de classes sociais. Além do critério econômico
os sistemas de classe se baseiam em dimensões políticas e
sociais que se traduzem pela autoridade e poder político e
militar, pela posse e controle da propriedade, pelas
I-elaç:ões de pal-entesco, pelo status étnico, pela j-eligião,
enfim, por um conjunto de características que se articulam,
se combinam com pesos difeientes segundo o que uma
6. DRAIBE, Sonia & HEI-IRIQUE, Wilnes. "Wê:lf~~r~' S.rat<'.;''', crise e ge::;{//CJ o'a c r is e : U(I1bs Lsurc o de Liters
c
ur s i n ie rn s ci on s l .In Revista Brasileira de Ciências Sociais, n.o 6, Vol. 3,
F1a9':5. 53 a :78.
10
r
deter mí nad a soc iedade julga malS ou menos impOl-tant e paI-a,
sua posi~~o relativa no gradiente social.7
Apesar de ser o interior da ordem social o lugar
genuíno de e xc luaão pelos "gl-UPOS de status", e, na o rdem
política ser a ol-ganizao;;:~opal-tidál-ia o signo de exc lus.âo
via usos do podel-8 nos atuais sistemas sociais pal-ece
havel- um imperat í vo da ol-dem econômica na determ í.n ac ão de
classes, principal fonte das outras formas de diferencia,~o
e que, POI- conseguinte, os de
estratifica,~o e marginaliza~~o social.
Dentre algumas propostas teóricas acerca da existincia
da pluridimensionalidade hierárquica da estrutura social
(conjunto de hierarquias paralelas, onde os indivíduos podem
ocupar posi~ões em níveis de
hiel-al-quiza~ão, simultaneamente), a que pal-ece se r a mais'
consistente delas é a hiel-al-quia en tre estratos , onde se
observa a separao;;:~ode camadas em corte vertical. Assim, na
base desta estrutura social estratificada encontra-se o
extrato mais marginalizado e que dentro dele haveria a
pluridimensionalidade da primeira hipótese.
a s í t u ac âo de "mal-ginaIidade
serrer a Iizada" ou "muI t imarg ina 1idade" .
7. BERELSON, Bernard
&
STEINER, Gar~ A., [,'o,wport s mento /-;,ulI'f~"!na. São Paulo, B'«:\silil~nsE', i.97i. pag':;;..Ü, WEBEi\, 11ax. [,'l~~~':h"', "etstus", p~"!rtido, In Estrutu ra de
classes E' extratificao;;:ão social, Biblioteca de Ci~ncias
Sociais. pags, 61 a 83. Rio de Janeiro, Zahar, 1,976, 170
r
Isto
i,
quando as bases de aquisi~io e distribuiçio debens s ão instáveis e escassas pal-a o gl-UPO, a sí tuac ão de
classe, que tem significa~io predominante nos aspectos
econBmicos, gera uma situa~io de marginaliza~io ampla.
"A si t uac ão de exc 1usão soc ia 1 não É a1e at ór ia. Quando
indivíduos ou grupos s ão excluídos de um benefício social
tendem t ambim a se r de cu tr os , ou sej a, o pl-ocesso de
mal-ginal izaçio tende a ser cumul at ivo. üc or r e quando o n ão
acesso a recursos de uma esfera da sociedade leva tambim ao
n~o acesso a muitos outros: as exclus5es sociais
adicionam-se. "9
No limite estio os substr at os mais baixos da classe
mais baixa. Den tr o das camadas da pop u laç ão l-ejeitadas, que
conscientemente ou nio da sua situaçio de exclusio, na qual
efetivamente não pa rt ic ipam dos benefícios básicos da
sociedade Lu-bano social, existem pl-át icas de d í Per en c íacão
entre seus membros.
o
favelado e o encorti~ado, discriminam os mendigos del-ua. A moradia, ainda que pl-ecária, tem um significado
soc ial mais comp let o, re+e re+ae ao local onde o ind ivíduo
pode sel- en c ontrado''", e aquele "que n ão possui um endereço
residencial corre o risco muito provável de ser preso e/ou
de nio conseguir emprego,
.. 1.
Latina. pago 31.
C~"I.pit.~li":5tT1Q Ii!' iIT~"I.,'-gin211id~=l.dena ~tTlé,'-ica
Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1.975. 188
9.
KOWARICK.
L~cio.pags.
10.
BERLINCK,
Manoel Tosta& HOGAN,
p ap u 1~=l.ç~ro e "cu 1t u r a ds pob re z s " na iU21/Cgil121lid~=l.dé' s oc is I ou r e I sc ãe s de
Daniel. ,4d21pt21ç~=rQd21
ci ds de de S.~~oPaú hJ:
In
Cidade,r
Assim, a pobreza deve ser entendida como fenômeno
intra-social de di st1-ibu t iva ,
múltiplas de estratLf ícacão e exclusão, pl-oduzindo camadas
marginalizadas impedidas de ter acesso a quaisquer bens
s oc ía ís , um fenômeno que r ec rud esce c ontemc or ane amente , e
que um imenso contingente de mendigos ur b ano s ,
p r í.n c i.p alme nte nas economias onde as
desigual d ade s , como p raxi s soc ia I, são h ist01-icament e mais
pl-ofundas.
3.2 - A ORDEM MORAL
As tendincias na caracterizaç:ão de fundo moral do
mendigo, fundamentam-se principalmente nas ideologias de
cunho religioso e estruturam-se basicamente em torno de um
mesmo núcleo: a responsabilidade do individuo. Uma primeira
corrente acusa e incrimina o mendigo ou vadio, como tamb~m
aquele que o ajuda. A posiç:ão de defesa, a t r í.buí sua
condiç:ão a "fol-ç:as impessoais", isentando-o de qualquer
responsabilidade individual.
1-4a tendincia acusat ór ia destaca-se a ar sumen tac ão
calvinista e luterana. Para tais doutrinas, 1-iqueza e
pobl-eza e stão Iigadas ao mér it o ind ividua 1. "A 1-iqu eza é o
produto de uma superioridade ~essoal e signo da binç:ão
U50S e ab u'50S,
167,
Sio Paulo, BrasiliensE, 1978, pags 115 a
r
divina. O pobre, ao contr~rio, ~ danado nos tempos presentes
e fut u ro ."U
"Mas o mais impol-tante é que o trab a lho constitui,
antes de mais nada, a própria finalidade da vida. A
expressão paulina quem não trabalha não deve comer
incondicionalmente v~lida para todos. A falta de vontade de
traba Ihal- ~ um sin tama da ausência do est ado de gl-aça."Ui
o
estado de mendicância ~ visto como o justo castigo au.a vida de vício e pl-eguiça, onde at é mesmo o deficiente
Tísico é visto como astuto e malicioso. Além disso,
representa um perigo para a ordem social.
Se "a preguiça é a mãe de todos os vícios, os mendigos
e vadios são parasitas ameaçando as ordens social e moral,
natural e divina. e constituem uma massa sempre suscetível
de ser manipulada pelos grupos radicais prontos a subverter
a or dem dominante. "12
Recriminado é tamb~m aquele que ajuda, na medida que é
um encorajador da miséria e da mendicância. H~ pobres porque
a assistência existe, portanto bastaria suprimir o auxílio
assistencial para resolver-se o problema da pobreza.l~
11. STOFFELS, Mal-ie-Ghislét.ine. Os mend ie o e da cide de de SãQ F'ai.ilo. pag.32. Rio de .Jan eí ro , F'az 02 Ter ra , i.'777. 295
pags ..
12. WEBER, Max. ~
e
ts
c s Pl"otestant6' ~' o e se sr it:o do capit~":J.l.i;:iimo. São Paulo, F'ionein:\, 1.967. 223 pag·:;.13. I)EXILIAF:D, Alexandl"e. In t r oduc t ion ~"l la socio Loeie da vagabonda!;,'€. pago 188. F'al" í s , 11al"CE'1 RivH~I"E', 1.956.
224-pags.
14. Este a1"9LUTIe n t o fo i u til i z a do c o ntr a a va lid a de das ..F'oo
1-Laws " no s écu 1o X'JI I E; dos si st emas ptib 1 icos de Pl"ev:i.d€-ncia
social no siculo
XIX,
alegando que a assistincia aodesempregado é uma das causas do desemprego. MARSHAL, T. H ..
Cidadan.i~~... , pag. 71
'1
A tendência de defesa do mendigo é de 01- í s em judaico-,
cristã, e define-o como produto da estrutura social global.
Se tudo pertence a Deus e, embora a terra seja explorada por
c e rto s indivíduos, os r í.c c s têm a ob r ís ac ão de ampar ar' os
menos +avo r e c idos: "Quem dá aos pobres empl-est a a Deus"
(Salomão). Ajudal- o pobl-e, da r esmola, equivale a uma
l-emissão dos pecados: "Assim como a água apaga o fogo, a
esmola apaga o pecado" (São Cipl-iano) .15
Todavia, o princípio da caridade apresentava uma certa
posiç:ão ambígua na católica. Sempl-e houve
r ec onh ec imento do mel-it o da cal- idade quant o à mend icânc ia
"vo l unt ár a a? , ou seja, o caso dos mendigos que pedem paI-a
fins de mera sobrevivência. Mas ouve sempre recriminação à
mend icânc ia "pr ofi ssiona 1", com car at er simulador, ut i 1izada
paI-a ens an a r ou tr em . Entr etanto a posição pl-eferencial ao
longo da hí st ór aa da igreja catól ica foi de defesa do
mendigo, realçando seu caráter não-perigoso, em oposição ao
e stigma de "r e+r atár io ao tr ab a 1ho út a l " e "c r iminoso. Nest e
caso, havia o car at er funcional de ev ítar os at rí.but o s que
seriam suscetíveis de seI-em aplicados ao bUI-9UÊ'S cristão,
ocioso enganadol- . A mendicância enfim, deve
sel-reconhecida como prática livre da repressão e do mecanismo
ideológico da limpeza.u
t5. IJE:XI L U-IF.:D, ,;. In
t
I"o di.iCt
iOf1. . .. Pa9 .i97 .10. Aparatos de repressão e ocultação do fen8meno.
STOFFELS, M ..
05 mendigos .... pag. 33.15
1 .J
3.3 - DIREITOS CIVIS
Trata-se basicamente dos direitos conquistados a partir
do s~culo XVIII, seguindo a ordena~ão histórica definida por
T. H. Os civis se
fundamentalmente na constitui~ão dos ordenamentos jurídicos
E a cr san í aacão dos trí.buna í s , E nos direitos re lat ívo s à
liberdade do trabalho, em contratos vilidos.
3.3.1 - ASPECTOS JURiDICOS
As teorias jurídicas encaram mendicincia e vadiagem
como de l itos que devem se r punidos. O conjunto de medidas
legislativas fundamentam-se na concep~ão de responsabilidade
do vagabundo, que equivale, na realidade, a um preconceito
em rela~io ao indivíduo pobre, visto como ocioso, perigoso
para a ordem social. "Detu rca+s e assim o vínculo entre
mis~ria e violincia, presumindo-se que a primeira conduz a
segunda em vista da necessidade de sobrevivincia, encarando
a mis~ria como perigo ou amea~a à ordem, ou meio termo entre
indigincia e protesto, e afastando-se desta maneira da
realidade que aproxima uma da outra."17
O atributo de periculosid~de, atrav~s desta rela~io
mendigo-delinquincia, ~ superestimativo como det€~minant€ da
personalidade criminosa.
1'1 •• 4·:: .
r
Não há dúvidas de que a ausênc ia de domic í1í o e/ou a
dificuldade típica de garantir a sobreviv~ncia,
todavia o delito é
normalmente de pouca gravidade, e tem um certo caráter
utilitário frente ~s necessidades vitais do mendigo.
é subme t ido à sancão legal no Brasí 1, o indivíduo que
pede esmola por ociosidade e cupidez, considerado o mendigo
pl"ofissiona I, con fOi-me a rtigo 60 da Lei de Cont r aven c õe s
Penais, e aquele que exerce atividades ilícitas - exceto a
mendicância - e carece de domicílio certo, que é considerado
vadio, c on+o rme ar ta s o 59 da mesma lei. O vagabundo pode,
enr retant o , não sei" nec es sar iament e vadio, segundo a
tendência filosófica que tem o primeiro como ser que
r enunc iou ao bem-est ar mat e r ia1 e está à procura da
verdadeira ess~ncia das coisas do mundo, enquanto o vadio é
imoral, irresponsável, ocioso, inútil e parasita_19
Todavia, pal-a o sistema judicial, o mendigo de r ua é
essencialmente pel-i90S0, efetivo ou potencial. Há uma
tendência à e~tigmatizaç:ão pelo fato de ser pobre, de viver
num ambiente desajustado e utilizar-se de expedientes que o
tornam inevitavelmente um criminoso, normalmente com elevado
potencial de reincidência.
"Nas cidades, as áreas faveladas sofl-em
incidência de comportamento tran sv íado de muitas maneil-as:
18. Não obstante a delinquincia dos mendigos ser
circunscrita a características e significaç5es peculiares,
como se verá no capitulo 4 .
. 1'7'. STOFFE-:l_S, lí .. Os mendigos pag.38. r: ..,.
r
delinqüência juvenil, p rost atuí c ãc , doenças mentais gl-aves,
alcoolismo e tr~fico de drogas, defeitos físicos e mentais,
crí ee s de violência. Encontramo s assim uma espiral social
bem conhec ida em ação i em cons.e cuêrrc ia, as areas se tornam
mais pobres e atraem cada vez mais tal comportamento. Assim
muito difícil essa
portant o, r o t u Lad o como c r iminoso,
provavelmente uma pessoa que arrombar~ outras casaSi a
polícia. ao prender infratores conhecidos para investigaç:ão,
após
u.
cr ime have r sido comet ido, ope ra com base nessapremissa. Além disso considera-se que ele provavelmente
ato des viante expõe uma pessoa à p,-obabilidade de que ela
seja encarada como desviante ou indesej~vel em outros
a sp ectos. "111
o
mendigo em confronto com os órgãos judici~rios é umindefeso. Desconhece o funcionamento dos aparatos da lei e
sua or san ização, em +unc ão das
culturais, sociais e econ8micas impostas pela sua condiç:ão.
Est~ distante dos direitos que a lei formalmente lhe
20. BERELSON, B 7 STEINER, G. A. CailTPortamê:'nf:o i",uilTaI1O.
pago 36.
2 i. BECK ER, Howar d S.. Uma teoria da a~'Xo co] et:iva . pag
80. Rio dE Janeiro, Zahar, 1977. 225 pags.
;~
gal-ante, não possuindo Ln strumen tos para utilizá-la em seu
favor ou para dela se defender.
Os dí r e í.t o s civis são postos como da
igualdade, e o acesso à presta~ão jurisdicional deveria ser
acessível a todos. Mas a sof'ista cac ão do ol-denamento
intencional como pl-ivilégio de classe, c ría um proc e s so de
exclusão de camadas mal-ginais da popula~ão, que estimulam
sistemas pal-alelos e tácitos de c ontro le social, +o ra da
esfera institucionalizada."
Impossibi 1itado de a adequada
jUI-isdicional, ineficiente monopólio do Estado frente à
maiol-ia das lides sociais, o mendigo, estigmatizado como
indivíduo essencialmente c r iminoso, é o cidadão mais
distante na escala social a pretender exercer seus direitos
civis, reconhecendo o Estado apenas como o
violento, no coturno, nos cassetetes e nos maus tratos nas
rondas de recolhimento e nas delegacias de polícia.
3.3.2 - TRABALHO
O mendigo remete também, dentro do sistema capitalista,
à ideologia do trabalho. Na concep~ão do sistema como ordem
o ind ivíduo que n'ão cume re uma pl-ática de
---
econômica,22, Estima-se que menos de 20% da popula~ãc brasileira tem
acesso amplo e adequado à prestaçio jurisdicional do Estado,
:3ANTOS, Boaventul-a S" NOt~~5 50b!",",' ~~ hi5tdria
,/urúfico--socis I de Pa:'?;:'5,;!"-flad.~, F',-ape'l-mí.meo , Faculdade de D í reí to da
trabalho assalariado, produtivo e legítimo, apresenta-se
como res íduo sócio-econômico, e um reb e loe -face ao código
mOI-aI da classe dominante que r ei fIca o trab a lho . É um
desviante ~s normas do sistema.
institucionais, via sistema penal, a imprensa, a literatura
e o judici~rio, baseadas numa idéia abstrata e universal de
justi~a que introduz a oposi~ão entre o justo e o injusto, o
mOI-aI e o imoral, o honesto e o desonesto. Isto t erí a
PO\-plebe não pro leta r Lz ad a constituída de ociosos, mendigos,
da sociedade aos olhos dos primeiros.-u
Todavia a Iõs ica do sist ema cap ita 1ist a de Pl-odu~ão
pl-essupõe a exist ênc ia de um e xc eden te de popu 1ac ão que
compõe o exército industrial de reserva. Só ~ue o fenômeno
da superpopula~ão relativa causa efeitos. Nem toda popula~lo
excedente tem, na fase atual do capitalismo,
principalmente nas economias a de
exército industrial de reserva.
da popula~lo excedente t o r n am+ae
'afuncionais' ou 'disfuncionais' para o processo produtivo.
I~em toda constitui ne ces sa r iament e um
23. ZALUAR, Alba.
mor s dor es da f.'i:'r.i fer.ia po de r o-sos , pag. 133.
e a ,:(ue F'!?tI ::;am da pade r e dos
S~o Paulo, Brasiliense, 1.985.
r
relação funcional deste excedente com o sistema no seu
conjunto ...a4
Os individuos excluidos do mercado d~ trabalho, vitimas
dos ciclos econ8micos e das formas de acumulação do capital,
formam um contingente de marg1nalizados do sistema, sobre o
qual não tim nenhum poder de decisão.
"A +o rma de acumulação c cr-p o rí Píca+ae , pois, atravé s de
uma lógica rest rí t íva em que a captação do excedente ao
mesmo tempo que concent ra e b ene+ íc ia uns poucos, apóia-se
na exclusão de par ce laa pcn de ráveí s : são os assa lar í ado s e
vastos contingentes populacionais que não conseguem se
Por tanto , o va lor ético do trab a lho , que estigmatiza o
não trabalho como marginalidade do sistema de produção, não
incorpora o sentido da contradição do próprio sistema.
A a 1t a rotat ividade de mão de ob ra na c il-anda dos
baixos s a l ãr Lo s , estimulada P01- uma legislação trab a lh ísta
que privilegia os interesses do capital, e a dificuldade de
se forjar trabalhadores com melhor capacitação técnica fazem
com que as relaç5es no mercado de trabalho sejam perversas
(baixa estabilidade, ausincia de registros formais como
de recolhimento de cont 1-ibuições
previdenciárias, condiç5es insa 1ubres pel-igosas no
amb ient e de trab a 1ho , \-emunel-ação insign i ficant e, etc .)
24. KOVARICK, L. 25. KOVARICK. L.
[;.::<.f.'i ta 11"5mo I:i;' marg.illa Lideae .
Caf..'.it-al.i:'5fT'!o e fl1al··g.iI1,;!I.id,~de.
Pago 110.
F'ag. í7i.
Por tanto , a origem das populações mal-ginais passa
POI-um pl-ocesso c onc r eto de exclusão do d í r e í to do tr ab a l ho ,
Lner en t e ao sistema capitalista de Pl-odução, mas que na
consciincia comum representa quem não quer trabalhar. O
mendigo é indolente, "peso mor to " no pl"OCeSSO de gel-ação e
acumulação de riquezas.
3.3 - DIREITOS POLiTICOS
Delimitados negativamente em re l ac ão ao pl-oletal"iado,
os lumpenpl"oletál-ios sempl-e +oram vistos com desconfiança.
Formam uma camada incapaz de ser po rta d o r a de um pl-ojeto
aut8nomo de transformação social, são anti-revolucionários.
SUbPI-ol etar iado iso I ado numa cat es o r ia re s í dua 1 segl"egada,
os mendigos são totalmente despojados de prática histórica
significativa e, assim, situados numa negatividade
O lumpenpl-olé'tal"iado, no sentido clássico mal"xista, é
vinculado ainda, embora de forma intermitente, ~ lógica do
tr ab a l ho ,
"o Ú1t imo resíduo mora no in -terno do paUpel" ismo i
abstração feita dos vagabundos, dos criminosos, das
prostitutas, dos mendigos, e de todo mundo que se chama de
classes perigosas (lumpen~roletariado no sentido
est 1-i to)" ... "degl"adados, despoj ados, incapazes de t l-aba I halo .
Trata-se de seres condenados a perecer pela imobilidade que
r
sob rev í vem à idade norma 1 de sua c 1asse, as vít imas da
ind~stria cujo n~mero cresce com as m~quinas perigosas, as
f~bricas químicas, etc., os mutilados, os enf'el-mos, as
ví dvas . O paupel-ismo € o asilo de a nva lrdo s do exé rc íto
o PE:'SO morto do i ndli St1-i a1 de
O mendigo não se estrutur a , orsaní za ou levanta como
grupo, é completamente a-revolucion~rio. Embora comporte
elementos violentos, degenerados ou perigosos, eventualmente
aliam-se a grupos às vezes antagBnicos ou vendem-se a
diversos outros grupos de referincia, demonstrando falta de
lógica e c oe rênc í a na ac ão política. Ou ela é estabelecida
justamente pelo car~ter fragmentado dos valores da sua
existência.
Assim as orsan í z ac õe s po 1 ít icas não vêem os lRendigos
como um grupo capaz de constituir objeto de interesse para
os quadros e objetivos de sua atua.;ão, ou ainda, em um outro
sentido, são aqueles que devem ser politicamente anulados.
Num contexto de repressão institucionalizada, qualquer
ar remedo de mobil izaç:ão po I ít ica de mend í sos , é r ep r imido.
Todas as fOI-mas de rep res sâo suscetíveis de ime ed ír lutas
reivindicatórias, sio aplicadas exemplarmente quando se
trata de homens de rua.
"O mendigo, seja simples
'transgressor', ou vítima nio respons~vel de sua condi.;io, €
São
I'ÍARX,
Paulo,
l<ar·1. lJ Capital: critica ds
i'ü·.)\/;,·~. Cu 1t1..1."("<;.1, i. 985 . T . I I I .
~l f..- 011omi a. fofo 11.'tic ~ . pags 545 t:::' s e s s .
,-portador de uma pr~tica contr~ria ~s normas básicas. ~
preciso que este desvio seja controlado totalmente, em todas
as suas man i+e stacões . É n ece ssã r ia pal-a isso conhecer as
manifestaç:ões da mendicincia e demais pr~ticas de~viantes.
Ideologia e teoria do estigma nio se isolam no quadro
institucional, assim como poder e saber podem unir-se para
que um saber corrente permita ao poder manter a unidade do
sistema, apontando, prevenindo e tratando os n~cleos de
divergência. "li,.
Desprovidos de capacidade de ol-ganizaç:ão
política reivindicatória", quando esboçam
qualquer aç:io coletiva, os mendigos estão excluídos da
pal-ticipaç:io dos proc esaoa polítiCOS enquanto e le i t o res ou
como gl-UpO soc ia 1 de int e resse de or san az ac õe s po I ít
ico-interesses pontuais e vol~teis
car~ter disciplinador e subserviente ~ sua clientela de
mendigos, trabalhando pela via institucional na garantia de
determinados de classe, que satisfazem a
E:'stl-atégiade mante r a desol-ganizaç:io poIít ica dos gl-UPOS
mal-ginais.
i"27. STOFTFLS, t·í..
o«
mendisa«, .pag. ii~2.28. G1-an dE: p a1-tE: dos p rÓpr'ios mE' lidi9os in c01- Po ram o t-~5 t í9ma,
frequentemente tomando-se por incapazEs de constituir
organizaç6es de atuaç:~o política, permanecendo isolados e
relativamente fechados diante dessa possibilidade da açio
reivindicatória, como se verá ao longo da pesquisa empírica.
24
r
3.4 - DIREITOS SOCIAIS
Sio direitos sociais aqueles que garantem um mínimo de
bem-estar econ8mico e seguran~a, o direito de participar por
completo na heran,a social E levar a vida dE um ser
civilizado de acordo com os padr5es que prevalecem na
sociedade.
Surgidos basicamente a partir do final do século
XIX,
in íc io do sécu Io XX, os di l-eitos soc iais buscaram c r a a r
mecanismos compensatórios aos desequilíbrios inaceitiveis na
condi,io de vida do proletariado. Foi a base para cria,io do
"WeIfal-e St at e" ou Est ado de Bem-Est ar Soc iaI nas soc iedades
rnod e r n a s .
"O podel- inst ituc iona I orsan izado assim começ:a a se r
empl-egado num e s+or co pal-a modifical- o jogo das TOI-,as do
mer c ado em sentidos, basicamente: subsistência,
segul-anç:ae uma dete rmí nad a gama de servi,os sociais"R9
O mend igo, en tretant oI es ti à mar sem do acesso ampIo
aos servi,os sociais, em fun,io da imprescindibilidade de um
certo grau de inserç:io para dispor de tais servi~os. A falta
dos mecanismos de acesso o coloca +o ra do c í rcu í to dos
servi,os sociais do Estado porque nio disp5e de instrumentos
típicos da vida nas sociedades c~pitalistas urbanas.
"A assimi lac ão de valor es , nOI-mas e conhecimentos
desempenho
---
a
ne r ente s ao de papeis urbano-industriais, 29. MARSHt-iU_) T. H .. Ci.d;il.dani.a, .... Pag. 187.r
oc or re r ía de forma desigual." ... "Devido a padl-ões sociais
diferentes nio teriam (as popula~ões marginais) condi~ões de
os desafios da cidade, baseados em
específicas de sociabilidade, contatos secund~rios e que se
apóiam em c e rtos como o pl-agmat ismo a
c on t r at ua I Lz ac ão ."se
Sem residincia fixa e sem documentos, os servi~os
sociais que restam são aqueles onde prevalece o princípio da
isto ~, a rede de institui~ões oficiais de
recolhimento e tratamento de mendigos.
Assim, o mendigo € visto como
+r
uto dos desajustessócio-econ8micos mas, ao mesmo tempo, i um contribuinte
pródigo para a preserva~io e agravamento da degrada~ão
social.
A atua~io governamental norteia-se entio pela idiia de
saneamento social, com o objetivo de promover a recuperaçio
dos ind ivíduos tran ev íado s . As inst ítu ícões Pune ionam como
dispositivos higienizadores, protegendo a família, a cidade
e o sistema como um todo, dos elementos tran ss ressor es e
nocivos à ordem social.
"A
mendicância cir cun sc rita como d íve r s í d ad ecen su rad a e desvio est igmat izado. Est~ pel-manentemente em
retac ão de possível apl-eensio pela inst rtuí c âo , e vem a
receber a marca completa do est{gma (desafortunado, parasita
pel-igoso, louco) pelo rí to de passagem na a natt tuí c ão que,
30. KOI.,.tARICK, L.. CaF'itaJi-smo t:' ,'71argiilalú.lad~'. F'ag. !:,j0.
31. Responsabilidade coletiva na produçio do fenômeno.
r
com o projeto de devolvê-lo à socí ed ad e como UITI e lemen to
integrado, em conformidade ou d í ve r s íd ad e
aceitive1, coloca-o em situaç:io d€ ruptura e o isola,
conferindo-lhes todos os atributos da identidade inadequada
e condenada. "2a
A
€stigmatizaç:ão passa pela aç:ão da polícia que reco1h€o mendigo de rua e o considera perigoso, efetivo ou
potencial; pelo serviço social como ser desajustado ou
apitico; e para o sistema governamental como elemento
perigoso e desajustado. Cria-se desta forma um espaç:o aberto
A uma psíquica de
"Entre a identidade social ví rtua l (as
demandas Pormu ladas a r e-speí to da pessoa) € a re a 1 (as
categorias e atributos que de fato lhe pertencem), opera-se
um pl-ocesso de distanciamento. 'Desacl-editado'
'desacreditive1' atrav~s do estigma, o indivíduo torna-se ao
mesmo tempo um ser inferiorizado e obrigado a fingir."~
"A1~m da vida pública, delineia-se o espaç:o da
int imidade em que o ind ivíduo se de+r onta com o eu que
reconstroi, ou preserva a integridade, o espaç:o dos contatos
e ambientes em que ~ aceito com seu desvio, seja pelo
pl-ocesso de encobl-imento, seja pelo pr oc e s s o de
normalizaç:io. O eu dividido ent~e esses espaç:os, o núcleo da
intimidade (em que atua a de r ecus e r
ac
ão da32. STOFFELS, M.
as
mendigas ... Pag. 105.33. GDFF 11(·11'-1,Er''Ii119 . .'1~~nic âm:Q-::;J pri -:;d~'-:; ,s' con \'·&.'11 to-s .
Pag.91. Sio Paulo, Perspectiva.1.974. 315 pags.
r
integridade pessoal) e a esfera relacional (em que é
classificado como se r ma rsí na l e pel-igoso), luta entre o
atrí buto de "out s í de r " e a r e con st Ltuí c âo do núcleo da
ident idade. "9"
Desta +or ma c rta+ se um ciclo em torno do e sp ac o r ua+
instituição. De um lado, a Lnst í tuí cão re co lbe aque le qUE
adota a existincia na rua atingido pela doen.;:a mental e, do
out ro , devo lve às r ua s os indivíduos compl-omet idos na sua
estrutura psíquica em fun.;:ão dos 1-itos impostos pela
passagem nas institui.;:5es. Ao voltar para a rua, o indivíduo
apresenta profundas deficiincias afetivas por não lograr
responder à complExidade de papeis e normas sócio-culturais,
como inser.;:ão não padronizada no sistema global.
~ guisa de conclusão, podemos dizer que o mendigo sofre
um processo dE estigmatiza.;:ão e exclusão amplos E que a sua
possível r e í n se r
c
ão social passa somente por umareconstrução da consciincia enquanto cidadão sujeito de
direitos.
E,.bol-a se con Tigun;~ a consc a ênc ia da di Tel-enciação de
eat egol-ia ou "status" d en t1"0 das Pl-ÓPI- ias classes
miser~veis, a qual contribui para formar um estigma de
legit imac;ão da dEsigualdade ao n íve l da visão do sistema
como um todo, pode existir em certas condic;5es, uma retomada
da conse í ênc ia de composição e posição de c 1asse como um
34. LAHJ.G, Rena 1 d Ira v id . D' eu diviai do . E':;i!-ada eotrr e d
loucurs /E' a -:5dn:io'adf.:".
ruo
dl2 Janeiro, Zah ar. 1.763.r
todo específico potencialmente autônomo, entre as
popula~ões de mendigos.
Neste caso, o processo de identifica~io passa PEla
descoberta dE que as diferen~as podem compor as semElhan~as,
ao cescob r i1- que os ind ivíduos fazem pal-te de uma mesma
rea lLd ad e e assim con struí r um p roc e sso de conquista da
cidadania, nas suas instincias fundamentais de legitima~io €
condi~io. Nio se prescinde todavia, de reformula~io das
po 1 ít icas p ub 1icas E a It er nativas inst it uc ionai s que mudem
efetivamente as l-ela~ões entre Estado € aoc í ed ad e civil E
Entre segmentos desta mesma sociedade.
r
4 - PERFIL DO HOMEM DE RUA
4.1 - INTRODUÇÃO
A população de rua, no caso especifico do Brasil, esti
começando a ser desvendada em funç~o de levantamentos
estatísticos ainda pouco abrangentes, porém, efetivos. No I
Seminirio Nacional sobre População de Rua, realizado em São
Paulo, em julho de 1.992, pela SEBES - Secretaria Municipal
de Bem Estar Social de S~o Paulo, com a presença e
participação de diversos drg~os p~blicos de promoção social
possível identificar uma grande semelhança entre os n~meros
das pesquisas estatísticas, preocupadas em levantar o perfil
do homem de l-ua.
Nas diversas pesquisas apresentadas, foram adotadas
metodologias específicas quanto à
delimitação e segmentaç~o do universo pesquisado, quanto aos
locais e fOI-mas de abOl-dagem e coleta de dados e quanto à
composição dos questionirios e entrevistas. Todavia, as
informaçSes sistematizadas, mesmo não atendendo a critérios
metodoldgicos homogineos, coincidiram grosso modo, quanto ao
levantamento da população de rua nos itens sexo, idade, cor,
origem, escolaridade e situação de trabalho.
organizado e consistente foi o realizado pela SEBES de São
apl-esentados pelas ou t ras entidades o t or na rec resentat í.vo.
como um ret rat o genél-ico do fenômeno pop u laç ão de l-ua no pais e, num segundo momento, valioso documento para a comp1-een são mais pl-ecisa, ao nível do 11un ic lPí o , da
orsan ízac âo dos homens de São Paulo, cen a rio
privilegiado deste estudo.
Este levantamento de dados foi rea lLzad o basicamente
nas ruas da cidade e em algumas instituiç:ões de acolhimento e assistincia social da Cidade de são Paulo.
1'-10 pl-imeil-o caso, teve-se POI- objetivo de termí nar o
número de pessoas que dormem nas ruas2S da cidade, mais
especificamente nos pontos de pernoite entendidos como logradouros públicos l-uas, calç:adas, praç:as, te r r en o s
baldios, viadutos e OUtl-OS - que a pop u lac âo ut iIí za pai-a
dormir, ao relento ou improvisando abrigosU,
Foram ident ificados pelos técnicos e estas í ã rí os da
pl-efeitul-a, na primeira quinzena de maio de 1.991, at ravé s das rondas noturnas de assistincia e recolhimento, 329 35, ..Exc lu ídos do r ecen':502::\ln.::,'ot o os b1-as 1.1E.'1.\-os qUE.' IÚ~O mCH'"1.IT1
e!TI 1LI9a1- n efihum não tem i d ent idadE' fiE:'m /TIesmo no anofiJ,mato
d ::.•.s t-~stat íst icas" I]E SF' , E:? . ~):3 , ':;";:~. i\!ãLi have n do daLIos
confiáveis sobre o número de individuos habitantes das ruas, as estimativas variam de 3 a 100 mil pessoas, O mais provável é que hoje representem uma população de ;".pl-oxiRl<:l,daRlente10 mi'1 pessoas, 1:::Stíma t rva .Jorna l (ja Tarde
em 24,09,05: 75 mil; O Globo em 12,08,90: 100 mil,
36. i;!:; Í\1:;;o.,;;:::;es. Un ioas definem "homele·:;.s"não só com o aqw:~l€s
qUE vi '...ern na 'i"U=3. mas també/TI os' que ITlOj-::"RI Em ilabitai;ões que
nao satisfazem minimamente necess1.dades e padrões de habitabilidade. Se somarmos os encortiçados e os favelados,
São Paulo possui hoje uma população aproximada de 4 mIlhões de" horne 1ess? • i:'F\:EFE: I Tur':~l DE SÃO PAUL.O. POPi.d .a'i-·~!fade rua. Ouem é, CCh7;r,::) ·vi~,··e., como ti' vi s t s . :3f.~(JF'::!\ul0 s Huc í te c , J.99E:.
r
pontos de pernoite, com 3.392 pessoas, localizadas
principalmente nas regiões mais próximas do centro da
cidade. A maior concentra~io da população nas regiões
da cidade se deve às de
sobrevivência Lne rentes ao "modus ví ve ndí " da l-ua que sei-ia
analisados em tópicos específicos.
Os espa~os de acolhimento pesquisados foram as Casas de
Convivência, os Abrigos de Inverno e os albergues, num total
de 635 quest ionál-ios, resp e ct ivament e 375, 175 e 103
en trev í stados. Est as organ iza~ões se d iferem pelo tipo e
período de presta~ão do servi~o de acolhimento.
As Casas de Convivência sio geridas por entidades
l-eIig iosas pr Ln c i c a l me n t e católicas, metodistas
eresba te r ianas que mantêm convênios com a p\-efeitu\-a e
dispõem de ser vtcos de hisiene pessoa I, Iavasem de roup as •
a I
a
mentac ão , Laz e r e encaminhamento. Existe a possibi I idadede repouso diurno por~m o pernoite ~ reservado apenas
àqueles já conhecidos ou que desempenham alguma +unc ão no
trabalho interno da Casa. Hoje são sete as Casas de
Convi vênc ia em Puneionament o sendo cinco na r es ião da Sé,
uma na Moóca e uma no Brás.
Os ab r igos de Ln ve r n o têm a ca1-a cte1-íst ica
PI-OVisOI-iedade sazonal. No pe r f od o de arive rno a p\-efeitura
abre a possibilidade do pernoit~ nas Casas de Convivência e
mobiliza vários espa~os edificados
da
~,.-.
r
abrigar a popula,ão nas noites frias, que são basicamente os
centros esportivos municipaisv.
l-los al be r s ues , tanto püblicos como pr ivados, os
servi,os de acolhimento tim maior perenidade no atendimento;
todavia, tim sempl-e o de a,ão emel-gencial,
oferecendo alojamento de curta dura~ão,
s
e ra lmente compermanincia m~xima de uma semana para os a Ibel-gados.
Consideradas institui,Ses de passagem, seu maior exemplo ~ o
Cent I-O de TI-iagE.'m e Encaminhament o CETREN. O Albergue
pesquisado foi o L~gia Jardim, conveniado com a Prefeitura.
Os dados ap resentad os pela SEBES +or am divididos
POI-sel-vi,os de acolhimento, j~ que existe uma cel-ta d í st í nc ão
USU~I-ios tocante, fundamentalmente,
os no
c irc un stânc ia e ao tempo de pel-maninc ia na ru a . POI- outro
lado, nas demais h~ coincidincia,
adotando-se aqui como pe rt inente a apresent acão dos dados
consol idados para -fol-ma,ão de um pano de fundo sufic iente
para a compreensão do fen8meno da cooperativa dos catadores
de papel e papelão.
37 Este p',oj.;::'to f():i. inie iado p·e1a e',€.'f€itll.',a dE'
3~:L"
i:'ali.1oEm 1 990 e r e c eb eu ü nome de "A Casa Acol he a Rua" h10
inverno de 1,992, das 900 vagas criadas, todas foram
ocupadas. In '3€C'rE::,t:;-,,',i:3. i1unicipal do Bem-Esta',- '3ocia1 :3EBE:;, d a r'TE:' fe itUi-a de São F'au 10. h~€'v. ,C'ida.i./a.i"li~~p':~l-a qU6'f11 I:" I" 6"1~:':i:5a . .4 ....~"5i"5'.ist:i;.il1,c'i ...~ soci·.;tI na .r:;ida de de .:3$0 ,,1.;'•••=1.uI o 1,-:/12
i. 'i\S!I;t'" .•;! i. 9'?i] I pag. 23.
a
33
r
;"
4.2 - DISTRIBUICIO ESPACIAL
Quase metade de todos os logradouros identificados
pelas res ron aí s da SEBES de- São Paulo, estão carc un ac rí tos
em uma ar e a bastante re strí ta no município e pr óxí ma s ao
centro. ~ medida que se afasta da região central em dire~ão
aos bairros, a presen~a e distribui~ão dos pontos de
pernoite torna-se rarefeita.
Tabela 1. Númel-o de pessoas e pontos de pel-noite, segundo
regi5es administrativas
---Regi5es Pessoas Pontos Média de pessoas
adm í n í s t r a t í va s n.a X n.<:> X POI- ponto
---Sé 2.647 78,2 198 60,4 13,3 Pinheiros<PI) 137 4,0 53 16,1 2,5 Mooca*<MO) 163 4,8 28 8,5 5,8 Lapa(LA) 158 4,6 14 4,2 11,2 Vila Hal-iana*<VH) 57 1.6 12 3,6 4,7 Ip il-anga* <IP) 58 1,7 8 2,4 7,2 F'enha*(PE) 63 1,9 8 2,4 7,8 Santana*<ST) 109 3,2 8 2,4 13,6
---Total 3.392 100,0 329 100,0 10,3
---* Cobertura parcial das regionais. Fonte: PREFEITURA DE S~O
PAULO. Populaii:ão de Rua. (}uem €, como vive, como € vista. São
Paulo, Hucitec, 1.992. 181 pags.
r
A escolha do Lus ar onde
o
or eu r parece estar ligado àproximidade dos locais de produ,io da sobrevivincia, ou
seja, das oportunidades de trabalho e obtençio de comida. A
escolha tamb~m é determinada pela disponibilidade de espa,os
públicos, de pl-ef'el-incia c ob ertos , que l-epresentem alguma
privacidade e prote,io contra o frio e a chuva, como
viadutos, ma r quises., becos, árvor e s gl-andes, entre outros .
Imdveis privados abandonados como galpões e casar6es tamb~m
são 10gradoul-oS escolhidos pal-a o pel-noite. Os homens de
rua, em geral, improvisam algum tipo de abrigo com caixas de
papelão, folhas de madeira, lonas ou objetos
ainda que precariamente,
espaço protegido.
O centro de Sio Paulo, as grandes avenidas que comp6em
a malha ví árí a 1:.' as pl-oximidades dos centros comel-ciais
perif~ricos, são os pontos preferencialmente escolhidos.
Todavia, em quarenta por cento dos pontos identificados pela
prefeitura, as pessoas dormiam sem qualquer tipo de abrigo.
r
Tab e 1a 2. F'ont os de per no i t e e ruime r o de pessoas, segundo
---Log1-ad ou1-os Pontos Pessoas
n.'" n.O
---Ruas/avenidas 199 60,4 1.569 4G,9 p.,-ac as/I a1-9os 51 15,5 832 24,5 Viadutos 39 11,8 381 11,2 Te r r en o s baldios ..,.J 1,0 46 1,4 Cantei l-OS 3 1,0 36 1,1 Outl-OS 34 10,3 438 12,9
---Total 329 100,0 3.392 100,0
---Fonte: Prefeitura de São Paulo. Idem Tab. 1. 1.992.
r
4.2.1 - TAMANHO DOS GRUPOS
vantagem e uma desvantagem.
l-lumcerto sentido e sta r em gl-UpO significa uma ma ío r
garantia de segurança e proteção m~tua. Entre iguais ~ mais
fici1 se defender da violência diversificada que representa
dormir pelas ruas.
potencial de conflitos internos e algazarras que podem
chamar a atenção da polícia, ou se tornar alvo de den~ncias
por parte da vizinhança.
Dentro desta lcigica pode-se dizer que a população que
pernoita na rua é gregiria, porém os grupos são pequenos. Em
241 dos pontos pesquisados (74%), ob ae rvar am+s e srup o s de
até 10 pessoas, sendo que a maioria destes (172', era
formada por grupos de até 5 pessoas.
Pessoas que absolutamente scis
encontradas em apenas 18,2% dos pontos ( Tabela 3', sendo na
sua ma í orta homens. Isto se deve ao fato de que tanto a
mulher como a c ríanc a do rm índ o isoladamente nas l-uas, à
noite, se tornam alvos ficeis de dominação e sujeição
física, ou de qualquer outra ordem.
...,..,.
Tabela 3. Pontos de pernoite, segundo tamanho dos grupos
---Tamanho dos grupos Pontos
n .<:>
r.
---i pessoa 60 18,2 2 a 5 pessoas 112 34,0 6 a 10 pessoas 69 21,0 11 a 20 pessoas 44 13,4 21 a 30 pessoas 13 4,0 31 a 50 pessoas 14 4,3 l'1aisde 50 pessoas 12 3,6
Sem a n Po r macão 5 1,5
---Total 329 100,0
---Fonte: Prefeitura de São Paulo. Idem Tab. 1. 1.992.
.-.,-.
0.00 __ .0 _ • 1 a 5 pessoas • 6 a 10 pessoas • 11 a 20 pessoas O 21 a 30 pessoas I::. 31 a 40 pessoas C 41I50 pessoas O Mais de 51 pessoas O ÁREAPESQUISADA _ - •• - LIMITE DE MUNIClplDS oI .~
r----.,
• RUAS E AVENIDAS • PRAÇAS E LARGOS .•. VIADUTOS O OUTROSD
AREA PESQUISADA ___ - LlMITEDEMUNIClplOS __ ·f -.~ ...d40---4.2.2 - COMPOSICIO DOS GRUPOS E
TEMPO
DE
PERMANiNCIA
NAS
RUAS
Apesar de a populaçio de rua ser bastante heteroginea
na sua composiçio, misturando-se famílias, homens e mulheres
sós, adolescentes e crí an cas , o gl-UpO mais ree res entata vo
quanto ao sexo, ~ o dos homens. Foram encontrados indivíduos
adu 1tos do sexo mascu I ino em 947. dos pont os de pe rnoí te
(309) , sendo que em 517. deles estavam abr igados
exc Iusivament e homens. As mulhel-es e crran cas apa re cern na
sua maioria compondo grupos mistos.H
Considerando que
em
apenas parte dos pontos, foramcolhidas informações (162), junto a moradores e comerciantes
próximos aos logradouros de pernoite, constatou-sE qUE mais
de 647. deles existem há mais de um ano.
:38, O quo:-:' +amí I iares indica 3. SIe1-a 1m€n t e possibilidadE.' dE.' oc up an do os p()ntos,
forma mais ~~rmanente.
TabEla 4. Pontos dE PErnoitE sEgundo composição dos grupos
---Composição dos grupos Pontos
n.'"
---HomEns Cl-ianç:as '"u1hEl-ES 168 8 51,1 2,4 2 0,6
---Subtotal 178 54,1
---14 15,8 4,3 HomEns E mulhErES HomEns E crianças
HomEns E/OU mulhErES E crian~as
52 75 22,8
---Subtotal 141 42,9
---SEm informação 10 3,0
---Total 329 100,0
Tabela 5. Pontos de pernoite segundo tempo de ocupaçio
---p
Tempo de ocupa~io Pontos
.,. /+
---l'1enosde ':)'"' meses 14 8,6 ,.., a 6 meses 30 18,6 .;) 6 meses a 1 ano 14 8,6 i a .;),.., anos 32 19,8 ,.., a 5 anos 32 19,8 .;) mais de 5 anos 40 24,6
---Total 162 100,0
---~---Fonte: Prefeitura de Sio Paulo. Idem Tab. 1. 1.992
~ significativo, todavia, o n~mero de pontos surgidos
há menos de seis meses (27,2:4) , o que d emon s t r a a
intensifica~io do processo de pauperiza~io que tem levado as
pessoas a se utilizarem da Ü 1tima alte rnat íva de
4.3 - PERFIL
As informa~aes a seguir, que caracterizam de forma mais
come Let a a pop u 1ac ão de l-ua no que se l"E::fel-ea sexo, idade
cor, escolaridade, origem, dentre outras, foram colhidas
atr avé s de' question ar ios ap I icados nos s e r v í c o s
acolhimento (Albergues, abrigos de inverno, e casas de
c on v í vên c í a ) . Apesar de a pesquisa nestes lugares não
uma de elimina~ão do 1-isco de
informa~5es incorretas, a expectativa do atendimento leva os
indivíduos a resp on de rem com maio r sesu ranc a , o que lhes
parece plausível, em se tratando de uma institui~ão. A
receptividade e as atitudes não repressivas do trabalho
cotidiano dos técnicos e estagiários da Prefeitura e a certa
familiaridade adquirida, parecem também ter contribuído para
minimizar a comum falta de corre~~o nas respostas.
4.3.1 -
DADOS QUANTITATIVOS
Sexo
A popula~ão masculina é predominante, correspondendo a
88X dos indivíduos. ~ possível 'que este fato corresponda a
prática do homem migrar só, deixando a fa~ília na cidade de
origem para tentar a sorte nos grandes centros.
Idade
Tabela 6. Popula~io por sexo segundo faixas etárias
---Idade (anos) Mascu 1ino Feminino Total
---o -
19 n.'" 29 6 35 % 5,2 7,9 r.:"',.,J,,.,J!:'" n.'" 47 10 57x
8,4 13,1 9,0 n.'" 67 5 72x
12,0 6,6 11,3 n.'" 1i5 11 126x
20,6 14,5 19,8 n."" 1i2 12 124x
2O,0 15,8 19,6 n. "" 116 18 134x
20.8 2317 21, 1 n. C':> 56 6 62x
10.0 7,9 9,8 n. Q 17 8 25 % 3.0 10,6 3,9 20 - 24 25 - 29 30 - 34 35 - 39 40 - 49 50 - 59 60 € mais---Total n."" 559 76 635
100,O 100,O 100,O
Sio adultos jovens sendo que 59,7X tem Idade entre 20 e 39 anos, ou seja, o período et~rio de maior capacidade de
A maioria ~ composta de brancos com 50,4X do total de indivíduos, pardos 30,7% negros 18,9%. l'Ilão
encontrados indígenas ou orientais.
Tabela 7. Populaçio segundo a cor
---'----n.O
---320 50,4 120 18,9 195 30,7
---Total 635 100,0
---Fonte: Prefeitura de São Paulo. Idem Tab . 1. 1.992.
:::'7'. ;( dís t'rj.bLI.i .;ão '::;'t ár :1a d<:t. S inLi.1 hto''rt:~s './a r j.<:1 e m .::Un ção ijo
serVIço. Nas Casas ae Convivincia são extremamente Jovens,
sendo que várias delas com passagens anterIores pela FEBEM
-j::'undê,..;ão ,:~st::\dLlalelo Br:.-:ITI !:~st::\r' do 1'1el"lo·r. hio':; albers ues , ,:I,
s í t u s c ão é r nversa não s (.: .::r<TI.t21.nClo U f:;;
a maí oria
/TIL!.1ht':jOE:'~:; de
tem mais de qUal°(:o~nta an os ,
rua , ma·:;; i:iE: /TIl( 1 heri:::S com
Esco 1ar idade
incompleto com 66,7X dos entrevistados.
Tabela 8. Populaçio segundo escolaridade
---n.o
---Analfabetos 28 5,0 Semi-analfabetos 40 'T/ , C-••••. 1.0 gl-au incompleto 371 66,7 Lo
s
r au completo 65 11,7 2.0 s r au incompleto 18 3,2 2.0 gl-au completo 24 4,3 Supel-ior 10 1,8---Total 556 100,0
---*
Excluídos 79 casos que nio informaram escolaridadeFonte: Prefeitura de Sio Paulo. Idem Tab. 1. 1.992.
4.3.2 - ORIGEM E TRAJETóRIA
As estatísticas mostraram que os fluxos migratórios do
origem geogrifica das popu1aç5es pobres. Quase 50X das
::r
popula~5es de rua nos grandes centros têm origem endógena ou
nas migra~5es regionais. A mudan~a na tendêncla dos fluxos
mí ç ratór í o s talvez tenha or íaem , não só em uma r e lat í va
c entros como São Paulo, mas também no r ed í rec í on amen to dos
fluxos para as cidades m~dias e pólos industriais no
interior dos Estados mais desenvolvidos.
Tabela 9. Popula~ão segundo região de origem
---Região de orísem n.o
---Sudeste SP/Capital 85 13,4 SP/I nte r i01- 92 14,5 Outr o s Estados 124 19,5 NOl-deste 259 40,8 Sul 44 6,9 No rte 17 '"'Co, <"?I Cen t1-o-Oest e 8 1,3 Est1-an se i1-os Ó 0,9
---Total 635 100,9
Os nascidos na Capital são 13,4:4; no interior do Estado
de São Paulo, 14,5:4; E nos outros estados da Regiio Sudeste
19,5X. Se considerarmos, todavia, os nascidos em São
Paulo/Capital, que possuem menos de 25 anos, o índice de
pl-ocedência será de 25X, o que 'remete à hipótese de que
pai-te dos jovens pesquisados tenham nascido e/ou c rescído
nas ruas da cidade. (Tabela 9.a)
Tabela 9.a. Popula~ão segundo idade e lugar de origem
.
---Idade (anos) Capital OUtl-OS lugal-es Total
---25 e mais n .
.,
23 X 25,0 n.."
62 X 11,4 69 92 100,0 menos de 25 75,0 481 543 88,6 100,0---Total 85 550 635 13,4 86,6 100,0
---Fonte: Pre~eitura de São Paulo. Idem Tab. 1. 1.992,
O ingresso no mundo da rua nio se dá de maneira
ree ent ina.
Existe •• obviamente, aqueles egressos de uma vida em
inst itui~ões que estigma social como