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As Ordens Militares do Hospital e do Templo no Entre-Cávado-e-Minho nas inquirições de Duzentos

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(1)

MESTRADO EM ESTUDOS MEDIEVAIS

As Ordens Militares do

Hospital e do Templo no

Entre-Cávado-e-Minho

nas inquirições de

Duzentos

Ricardo José Barbosa da

Silva

M

(2)

Ricardo José Barbosa da Silva

As Ordens Militares do Hospital e do Templo no

Entre-Cávado-e-Minho nas inquirições de Duzentos

Dissertação realizada no âmbito do Mestrado em Estudos Medievais, orientada pela Professora Doutora Paula Maria de Carvalho Pinto Costa

e coorientada pelo Professor Doutor José Augusto de Sottomayor-Pizarro

Faculdade de Letras da Universidade do Porto

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As Ordens Militares do Hospital e do Templo no

Entre-Cávado-e-Minho nas inquirições de Duzentos

Ricardo José Barbosa da Silva

Dissertação realizada no âmbito do Mestrado em Estudos Medievais, orientada pela Professora Doutora Paula Maria de Carvalho Pinto Costa

e coorientada pelo Professor Doutor José Augusto de Sottomayor-Pizarro

Membros do Júri

Professora Doutora Maria Cristina Almeida e Cunha Alegre Faculdade de Letras - Universidade do Porto

Professor Doutor João Paulo Martins Ferreira Doutor pela Faculdade de Letras - Universidade do Porto

Professor Doutor José Augusto de Sottomayor-Pizarro Faculdade de Letras - Universidade do Porto

(4)

Em memória dos meus avós, em especial, de Maria da Cunha Neiva A todos aqueles que amam a sua terra

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SUMÁRIO Sumário ... 5 Agradecimentos ... 6 Resumo ... 7 Abstract ... 7 Índice de Mapas ... 8 Índice de Tabelas ... 9 Abreviaturas ... 10 Introdução ... 11

Capítulo I – As Ordens do Hospital e do Templo nas inquirições régias de 1220, 1258 e 1288, no Entre-Cávado-e-Lima ... 15

1 – Inquirições de 1220 ... 15

2 – Inquirições de 1258 ... 34

3 – Inquirições de 1288 ... 40

Capítulo II – As Ordens do Hospital e do Templo nas inquirições régias de 1258 e 1288, no Entre-Lima-e-Minho ... 44

1 – Inquirições de 1258 ... 44

2 – Inquirições de 1288 ... 53

Capítulo III – Outras considerações ... 62

1 – As Ordens do Hospital e do Templo e a sociedade local ... 62

2 – Em torno das comendas do Hospital e do Templo, a norte do Cávado ... 74

2.1 – A comenda de Aboim ... 76

2.2 – A comenda de Santa Marta (S. Mamede de Arcozelo) ... 79

2.3 – A comenda de Távora ... 83

2.4 – A comenda de Rio Frio ... 85

3 – A Ordem do Hospital e a atração do meio urbano ... 87

Conclusões ... 93

Fontes e Bibliografia ... 95

(6)

AGRADECIMENTOS

Esta dissertação não é fruto somente de um esforço individual da minha parte, mas também de todos aqueles que, direta ou indiretamente me apoiaram e incentivaram ao longo desta “aventura”.

Muitas foram as horas gastas, as linhas escritas e depois refeitas ou apagadas, os quebra-cabeças que foram resolvidos e as “crises” ultrapassadas. Mais do que as dificuldades inerentes a qualquer investigação deste género, fui-me dando conta das minhas próprias limitações e dificuldades, diria até alguns defeitos, de que, no dia-a-dia, nem sempre me dou conta.

Assim sendo, esta aventura, como lhe chamo, foi mais um processo de aprendizagem do que de aperfeiçoamento ou aplicação de conhecimentos, já que, aprendi muito com as fontes, os autores, comigo mesmo, e claro está, com os outros. Daí ter optado por escrever na primeira pessoa do plural, não só por modéstia, mas porque sozinho nada poderia ter feito.

Assim sendo, desde logo quero dedicar um profundo agradecimento à Sra.ª Prof.ª Dr.ª Paula Pinto Costa e ao Sr. Prof. Dr. José Augusto de Sottomayor-Pizarro, meus orientadores. Pelas palavras de apoio quando o ânimo entorpecia, pela jovialidade e prontidão com que ouviram as minhas dúvidas e questões, pelas sugestões e pelas dicas, pelas chamadas de atenção quando o entusiasmo a rédeas soltas me desviava de um objetivo concreto, e por muito mais, eu lhes agradeço.

De igual modo agradeço aos meus pais, pela paciência e compreensão, e em especial, à minha irmã, que, se um dia quiser empreender uma aventura semelhante, oxalá eu lhe possa dispender tanto tempo, nomeadamente, ao telemóvel.

Quero também deixar umas palavras de apreço àqueles que tanto me apoiaram, por vezes, sem disso terem noção: ao Micael; à “Silvi”; ao Eládio e ao pessoal do Veracruz; à Dona “Gina”, Sr. Fernando e funcionários; à Dona Marina; ao Dr. Miguel Nogueira, ao pessoal da biblioteca da FLUP, bem como às senhoras da Secretaria. A todos lhes fico grato.

Também às Senhoras da Universidade do Saber, com quem aprendi e partilhei conhecimento, e a muitas outras pessoas que nesta hora não me vêem ao pensamento.

(7)

RESUMO

As referências às Ordens do Hospital e do Templo nas inquirições do século XIII, isto é, 1220, 1258 e 1288, permitem-nos saber um pouco mais acerca da sua presença e influência na região compreendida entre os rios Cávado e Minho. Os dados, apesar das suas lacunas e dificuldades de interpretação como um todo, são contudo, essenciais para compreender a interrelação destas instituições com a sociedade local e a região. Assim, o maior destaque vai para a Ordem do Hospital, aqui voltada sobretudo para a assistência e com bens ao longo das principais vias de comunicação. O Templo, embora não tão omnipresentes, detém focos concentrados de riqueza patrimonial e influência.

Palavras-chave: Ordem do Hospital; Ordem do Templo; Entre-Cávado-e-Lima e

Entre-Lima-e-Minho (Noroeste de Portugal); Século XIII; Inquirições régias.

ABSTRACT

The references to the Knights Hospitaller and the Templars in the royal inquiries of the 13th century (1220, 1258 and 1288), allow us to know more about it’s presence and influence in the area between the rivers “Cávado” and “Lima”. The data, inspite of the difficulties to get a big picture of the situation and some gaps, are essential to understand the interrelationship of these two Institutions with the local society and the region. Thus, the highlight goes to the Hospitallers, with many properties spread along the communication ways and focused on the assistance to pilgrims. The Templars, although not so omnipresent, have their goods and influence more concetrated.

Keywords: Knights Hospitaller; Templars; Cávado-e-Lima and

Entre-Lima-e-Minho (North-west region of Portugal); 13th Century; Royal Inquiries.

(8)

ÍNDICE DE MAPAS

Mapa 1

 1220: Entre-Cávado-e-Lima – Distribuição dos bens do Hospital . …….17-20, 23

Mapa 2

 1220: Entre-Cávado-e-Lima – Distribuição das rendas recebidas pelo Hospital ... .26

Mapa 3

 1220: Entre-Cávado-e-Lima – Distribuição dos bens do Templo ………...32

Mapa 4

 1258 e 1288: Entre-Lima-e-Minho – Referências, por freguesia, ao Hospital....60

Mapa 5

 1258 e 1288: Julgado de Valdevez – Referências, por freguesia, ao Hospital ... 60

Mapa 6

(9)

ÍNDICE DAS TABELAS

Tabela 1

 1220: Entre-Cávado-e-Lima – Distribuição dos bens do Templo ... 30-31

Tabela 2

 1258: Entre-Lima-e-Minho – Propriedades detidas pelo Hospital ... 45-47

Tabela 3

 1258: Abusos perpetrados pelo Hospital ou sob sua alçada, a norte do Lima.... ... 48-49

Tabela 4

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ABREVIATURAS Cf. – Confrontar c.º – Concelho Doc./doc. – Documento D. – Dom D.ª – Dona Ed./ed. – Edição fr. - Freguesia Vd. – Vide n.º – número p. – página pp. – páginas Vol. - Volume Vols. – Volumes

(11)

INTRODUÇÃO

“Independientemente de los orígenes amalfitanos de la fundación hospitalaria de

Jerusalén a mediados del siglo XI, y de su ulterior evolución hasta la toma de la Ciudad Santa por los cruzados en 1099, podemos considerar que fue la bula papal de Pascual II de 15 de febrero de 1113 el acta auténticamente fundacional de la orden de San Juan de Jerusalén.”1 Eis como Carlos de Ayala Martínez resume, numa só frase, a alargada e

multifacetada “etapa embrionária” da Ordem que, vulgarmente, designamos de Hospital. Em Portugal, citando Paula Pinto Costa: “A historiografia aponta a mais antiga

referência conhecida da presença de membros da Ordem de S. João de Jerusalém... para o ano de 1132...”, embora se desconheça “...o momento exacto em que esta... se fixou no

extremo ocidental da Península Ibérica.”2 Apesar de tudo isto, num documento à guarda do

Arquivo Distrital do Porto, existem indícios, que podem indicar a presença do Hospital, em solo português, já no ano de 1122, senão mesmo, no de 11123.

Servindo-nos das palavras da mesma autora: “Do ponto de vista documental há indícios

de que os Templários podem ter chegado ao norte do que viria a ser Portugal antes de 1128...”, antes mesmo, portanto, de verem a sua Ordem “legitimada no plano internacional no concílio de Troyes (1129)”4.

Com estes excertos, em jeito de preâmbulo, evidencia-se que o objeto de estudo desta dissertação de Mestrado reside nas Ordens Militares do Hospital e do Templo.

Estas, tendo nascido no seguimento da primeira cruzada, atingiram o seu auge nos dois séculos seguintes. Enquanto o Templo foi suprimido no dealbar de Trezentos, sendo o seu legado patrimonial herdado pela subsequente Ordem de Cristo, o Hospital perseverou ao longo dos séculos, mantendo, grosso modo, o perfil granjeado desde as suas origens, pelo menos, em Portugal.

Tomando por limite o curso dos rios Cávado, na parte meridional, e Minho, na parte setentrional, bem como a fronteira com a Galiza, temos delineado o espaço geográfico sobre

      

1 AYALA MARTÍNEZ, Carlos de – “Orígenes e Implantación de la Orden de San Juan de Jerusalén en la

Península Ibérica (Siglo XII)”, La Orden Militar de San Juan en la Península Ibérica durante la Edad Media.

Actas del Congreso Internacional celebrado en Alcázar de San Juan (Ciudad Real), p. 25.

2 COSTA, Paula Pinto – “A Ordem do Hospital em Portugal no primeiro século da nacionalidade”, Actas do 2.º

Congresso histórico de Guimarães, vol. 5, p. 99.

3 COSTA, Paula Pinto – “A Ordem do Hospital em Portugal no primeiro século da nacionalidade”, Actas do 2.º

Congresso histórico de Guimarães, vol. 5, pp. 100 e 101.

4 COSTA, Paula Pinto – “Templários no condado portucalense antes do reconhecimento formal da ordem: O

caso de Braga no início do séc. XII”, Revista da Faculdade de Letras. Ciências e Técnicas do Património, vol. 12, p. 232.

(12)

o qual incide a presente dissertação. Esta área, dividida, durante quase toda a Idade Média, entre duas circunscrições diocesanas diferentes, a de Braga, a sul, e a de Tui, a norte, tinha no curso do rio Lima o limite entre ambas.

Esta razão, desde sempre prendeu a nossa atenção, em função dessa realidade que, nomeadamente a norte do Lima, é deveras curiosa. Aqui, devia-se obediência, no campo eclesiástico a uma diocese galega, enquanto na esfera civil, se devia fidelidade ao rei de Portugal. Infelizmente, a historiografia não tem votado tanto interesse a este caso excecional quanto merece, mercê da limitação das fontes existentes, e do desaparecimento ou desconhecimento de fontes provenientes da principal instituição do seu seio: a Sé de Tui5, e ainda, de vários mosteiros da região. Para a parte compreendida entre o Cávado e o Lima, pertencente à arquidiocese de Braga, a documentação é mais abundante, e, por conseguinte, os trabalhos historiográficos nela baseados e referentes à dita área, também são mais frequentes e prolixos em informação. Do mesmo modo, o facto de nos encontrarmos relacionados, por laços de carinho e pertença, com a região enunciada, pesou, efetivamente, aquando da escolha do tema para esta dissertação.

Quanto à cronologia, cingimo-nos, em especial, à centúria de Duzentos, abordando, por necessidade e pertinência, períodos anteriores e posteriores. Assim, a nossa fonte documental, por excelência, é constituída pelas inquirições régias do século XIII, isto é, as de 1220, 1258 e 1288, o que não causa surpresa. Às duas primeiras, publicadas no volume I das

      

5 Em finais do século XIV, com a autonomia da parte portuguesa da sua diocese, isto é, de quase metade do seu

território, é natural que muitos documentos inerentes ao sul do Minho, perdessem o seu valor e interesse para a mitra tudense.

Recentemente, foi apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto, uma dissertação de Doutoramento, na qual esta região, compreendida entre os rios Lima e Minho, foi abordada, chamando a atenção para diversos aspetos relacionados com a parte portuguesa da diocese de Tui. Apesar de tudo, a dita dissertação incide, preferencialmente sobre a nobreza deste recanto do Alto-Minho, indissociavelmente ligada a determinadas linhagens do outro lado da fronteira. Em termos cronológicos, o autor foca-se, sensivelmente, entre as datas de 915 e 1381. Ver FERREIRA, João Paulo Martins – A Nobreza Galego-Portuguesa da Diocese

de Tui (915-1381), Tese de Doutoramento em História (Medieval), orientada pelo Sr. Prof. Dr. José Augusto de

Sottomayor-Pizarro, apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2016.

Convém também relembrar que existem diversos estudos que incidem sobre esta região, quer de autores portugueses, quer galegos. A título de exemplo, do lado português, tomemos o estudo de José Marques intitulado “O Censual do Cabido de Tui para o Arcediagado da Terra da Vinha (1321)”, Relações entre Portugal

e Castela nos finais da Idade Média (pp. 65-104), ou o de Amélia Aguiar Andrade denominado “A Estratégia

Afonsina na Fronteira Noroeste”, Actas do 2.º Congresso Histórico de Guimarães, Vol. 2 (pp. 81-93). Do lado de lá da fronteira, podemos apontar a obra O antigo bispado de Tui en Portugal de Ernesto Iglesias Almeida, o estudo de Paz Romero Portilla designado “Un Observatorio privilegiado de las relaciones entre Castilla y Portugal: Tuy en la Edad Media”, Estudos em Homenagem ao Professor Doutor José Marques, vol. 4; e até, abraçando os dois lados da raia minhota a tese de Dirceu Marchini Neto: A Ordem do Hospital no Noroeste da

Península Ibérica: Doações e Privilégios (Séculos XII-XV). Muitos outros poderiam ser aduzidos, e ainda assim,

no entanto, cremos que esta região tem muito mais para oferecer, o que, se por um lado nos pesa, por outro, constitui um incentivo.

(13)

Inquisitiones da obra Portugaliae Monumenta Historica, aliam-se as últimas, publicadas

recentemente, pelo Senhor Professor Doutor José Augusto de Sottomayor-Pizarro6.

A partir da compilação e recolha de todas as referências, inerentes ao Hospital e ao Templo, nas freguesias incluídas dentro dos limites que expusemos, procurámos, na medida do possível, acompanhar a evolução da influência e património de ambas as instituições.

Desta feita, as inquirições de 1220 serão as primeiras a ser analisadas, permitindo-nos gizar um esboço da implantação do Templo e do Hospital, entre os rios Cávado e Lima7, ou seja, sensivelmente cem anos após a chegada das mesmas instituições a Portugal. O nosso estudo começa, assim, in media res.

Deste modo, no capítulo I, debruçamo-nos sobre o Entre-Cávado-e-Lima. Com efeito, com base nos dados recolhidos, procedemos ao seu estudo, e, através da compração entre as diferentes inquirições, tentamos perceber o que estas nos deixam entrever acerca da presença do Hospital e do Templo entre os ditos rios.

No capítulo II, a área em foco é o Entre-Lima-e-Minho. O objetivo, bem como a metodologia utilizada também são semelhantes, embora não possuamos dados das inquirições de D. Afonso II a norte do Lima. Assim, neste capítulo o nosso estudo começará pelas inquirições de D. Afonso III.

O capítulo III, denominado “Outras considerações”, pretende, com base em informações colhidas nas inquirições e noutras fontes documentais como o Liber Fidei8, o

Livro dos herdamentos de Leça e doações do mosteiro de Leça9 ou as Memórias Paroquiais

de 1758, entre outros, tecer alguns comentários acerca do relacionamento das Ordens enunciadas com a sociedade local. De igual modo, procura-se focar, também, o papel mais

      

6 Portvgaliae Monvmenta Historica. Inqvisitiones : Inquirições Gerais de D. Dinis de 1288. Sentenças de 1290

e execuções de 1291. Edição de José Augusto Sottomayor-Pizarro. Nova série. Lisboa: Academia das Ciências

de Lisboa, 2012. Daqui em diante utilizaremos a seguinte forma abreviada: Portvgaliae Monvmenta Historica.

Inqvisitiones – Inquirições Gerais de D. Dinis de 1288...

7 TRINDADE, M.ª José Lagos – “A Propriedade das Ordens Militares nas Inquirições Gerais de 1220”, Anuario

de estudios medievales, n.º 11, pp. 81-93. Aqui, a mesma fonte documental, foi já utilizada, na senda de

contabilizar a propriedade, nomeadamente das Ordens Militares, contabilizando o número de casais, fazendo a sua distribuição por divisão administritiva, ou “terras”. Entre essas instituições, evidentemente, encontram-se o Hospital e o Templo. Todavia, no nosso estudo, esta componente, além de termos de lhe fazer menção, será direcionada, não neste sentido, senão no de perceber como o património das Ordens indicadas se encontrava implementado ao nível das paróquias. A partir, daqui eleboraremos diversos raciocínios.

Para complementar esta perspetiva e a temática subsequente veja-se também GONÇALVES, Iria (coord.) – “O entre Cávado e Minho, cenário de expansão senhorial no século XIII”, Separata de Revista da Faculdade de

Letras de Lisboa, IV Série, n.º 2, pp. 399-440.

8 Liber Fidei Sanctae Bracarensis Ecclesiae, edição crítica de Avelino de Jesus da Costa, 3 volumes, Braga,

Junta Distrital, 1965-1990. No decorrer do texto servir-nos-emos da forma abreviada Liber Fidei.

9 Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Livro dos herdamentos e doações do mosteiro de Leça, Coleção Costa

Basto, n.º 4. De agora em diante, quando nos referirmos a esta fonte, fá-lo-emos da seguinte maneira: Livro dos

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expressivo que algumas comendas do Alto-Minho parecem ter tido, e, em última instância, procura-se delinear a tendência que, nomeadamente o Hospital, foi evidenciando, na busca/predileção por património de cariz mais urbano.

Por fim, resta-nos referir que, nesta dissertação, em prol de uma melhor compreensão dos dados, seguiremos sempre, a divisão administrativa por freguesias anterior às reformas de 2013.

(15)

CAPÍTULO I

As Ordens do Hospital e do Templo nas inquirições régias de 1220, 1258 e 1288 no Entre-Cávado-e-Lima

1 – Inquirições de 1220

Quando mandou proceder às inquirições de 1220, D. Afonso II pretendia reforçar a sua autoridade, nomeadamente no Entre-Douro-e-Minho e, em especial no seio da vastíssima e poderosíssima arquidiocese bracarense, cujo prelado era um adversário de peso à sua mundividência política10. A área que agora nos propomos estudar, visto que integrava a dita circunscrição episcopal foi portanto englobada nesse projecto régio11.

A Ordem de S. João de Jerusalém, que nos primórdios se dedicava essencialmente a práticas assistenciais, terá encontrado no Noroeste português “terreno” propício à sua implantação e desenvolvimento. De facto, as características desta região a nível social, demográfico, fundiário, entre outros aspetos, aliadas à passagem constante de pereginos a caminho de Compostela devem ser tidos em conta para se perceber o sucesso desta instituição a norte do Douro12.

      

10 VILAR, Hermínia Vasconcelos – D. Afonso II. Um rei sem tempo, pp. 186-188.

11 Não esqueçamos que a própria Ordem do Hospital se viu envolvida, de motu propriu ou não, no conflito que

opôs este monarca às suas irmãs. Uma delas, D. Mafalda, havia doado à Ordem o mosteiro de Bouças, feito que D. Afonso II revogou e que alimentou o dito desentendimento. (A título de exemplo veja-se COSTA, Avelino Jesus; MARQUES, M.ª Alegria F. – Bulário Português. Inocêncio III (1198-1216), doc. 182, pp. 330-331.) Esta doação deixou, ainda que indiretamente, o Rei em clima de tensão com o Hospital. Mais tarde, quando se efetuaram os inquéritos régios que estamos a analisar, é natural que a Coroa, querendo saber com detalhe o património de diversas instituições religiosas, olhasse também com interesse para aquele à guarda desta Ordem. Afinal de contas, as inquirições e o conflito com as Infantas tem de ser visto como o resultado de todo um projeto e conceção políticos, logo profundamente indissociáveis.

12 “O grande número de comendas... é reflexo de uma grande dispersão patrimonial e das exigências de

gestão... A cronologia precoce de instalação dos freires de S. João no Condado Portucalense (provavelmente na 2ª década do século XII) pode ter favorecido o pulverizar das doações em seu benefício, num espaço nortenho, como o Entre-Douro-e-Minho, que registava uma elevada ocupação do solo, pelo que a propriedade se encontrava bastante fraccionada. A presença neste espaço das principais casas de prestígio do reino português constituiu outro factor que favoreceu a orientação setentrional do património hospitalário, pelo menos numa fase inicial.” Cf. COSTA, Paula Pinto – “As comendas: enquadramentos e aspectos

metodológicos”, Militarium Ordinum Analecta, n.º 11, p. 14 ou então COSTA, Paula Pinto – “A Ordem de S. João em Portugal: traços da sua evolução medieval”, La Orden Militar de San Juan en la Península Ibérica

durante la Edad Média. Actas del Congreso Internacional celebrado en Alcázar de San Juan (Ciudad Real), p.

227: “O Norte de Portugal... [é das] áreas de maior implantação patrimonial da Ordem, não faltando razões

que [o] justificam... as quais, sumariamente, se podem identificar com a recuada cronologia da instalação dos freires... e com a proveniência social dos Cavaleiros de S. João, profundamente relacionada com os estratos nobilitados... [que] estavam fixados no Entre Douro e Minho”. Da mesma autora, podemos ainda citar as

seguintes palavras, em língua inglesa: “When it first arrived in the County of “Portucale”, the Order was settled

to the north of the river Douro and, therefore, away from the military conflicts of the “Reconquista”. Its main responsability was to plan, assist and support pilgrimage to Santiago de Compostela, a situation similar to that in Galicia where the Order did not carry out any kind of defensive frontier-related activities”. COSTA, Paula

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No que à nossa análise diz respeito, são muitas as freguesias onde vêm expressas referências aos hospitalários, ascendendo a um total de 104, distribuídas por todas as terras que então enquadravam o território entre o Cávado e o Lima.

Se bem que as referências que coletámos constem, quase exclusivamente, na série Bens

das Ordens das inquirições de 1220, encontrámos também um número reduzido de menções

na parte designada de Foros e Dádivas13.

De todas as freguesias onde é assinalada a presença do Hospital, podemos identificar três grupos. O primeiro constituído por aquelas onde apenas se referem bens patrimoniais, um outro respeitante a rendas pagas à Ordem e, um último, onde estão expressas as duas componentes.

Tendo em vista a uma melhor compreensão e aproveitamento dos dados, abordaremos, num primeiro momento, as referências a bens de raiz e só depois as rendas registadas.

Assim sendo, na área considerada, os hospitalários senhoreiam entre 19214 e 196 casais inteiros15; diversas partes de casais, em alguns casos contabilizados juntamente com casais inteiros16 e que, reunidas as partes podem ascender a cerca de oito casais17; sete quintãs18,

       

Pinto – “The Role of the Order of St. John in Pilgrimage and Politics: The Case of the North of Portugal”,

Pilgrims and Politics. Rediscovering the power of the pilgrimage, pp. 73-74.

As próprias inquirições, neste caso as de 1288, permitem-nos assinalar a presença desta instituição, já por meados do século XII em Antas e Marinhas, ambas no actual c.º de Esposende, junto à foz dos rios Neiva e Cávado, remetendo-nos para o “tempo do Mestre don Reymondo” (Cf. Portvgaliae Monvmenta Historica.

Inqvisitiones – Inquirições Gerais de D. Dinis de 1288..., pp. 334 e 335), alusão possível às duas visitas que este

realizou à Península Ibérica em 1140 e 1156. Cf. AYALA MARTÍNEZ, Carlos de – “Orígenes e implantación de la Orden de San Juan de Jerusalén en la Península Ibérica (siglo XII)”, La Orden Militar de San Juan en la

Península Ibérica durante la Edad Média. Actas del Congreso Internacional celebrado en Alcázar de San Juan (Ciudad Real), p. 33. Este Mestre, não deve ser outro, senão o que, também em 1140, recebeu de D. Afonso

Henriques carta de couto e privilégios, confirmada, e note-se o pormenor curioso das datas, em 1157. Cf. COSTA, Paula Pinto – “A Ordem do Hospital em Portugal no primeiro século da nacionalidade”, Actas do 2.º

Congresso histórico de Guimarães, vol. 5, p. 102. Do mesmo modo, no Liber Fidei, já em 1145 vem referido

um comendador para Aboim, o que, sugere claramente uma soma de bens e/ou rendas sob controlo da Ordem, dispersa, como já notou Paula Pinto Costa, mas também consideravelmente avultada. Cf. COSTA, Paula Pinto – “A Ordem de S. João em Portugal: traços da sua evolução medieval”. La Orden Militar de San Juan en la

Península Ibérica durante la Edad Média. Actas del Congreso Internacional celebrado en Alcázar de San Juan (Ciudad Real), p. 227. Tenhamos também em atenção os muitos privilégios que recaíam sobre aqueles que

doavam bens à Ordem, constituindo, pois, um incentivo mais a este tipo de ação. Veja-se, por exemplo o “Privilégio à Ordem do Hospital sobre aqueles que escolherem sepultura e deixarem bens a casas da Ordem.”. Ver COSTA, Avelino Jesus da; MARQUES, M.ª Alegria F. – Bulário Português. Inocêncio III (1198-1216), doc. n.º 72, p. 149.

13 Caso de Aboim, Forjães, Godinhaços, Mar, Marinhas, Penascais, Pico – S. Cristóvão (neste caso para o

Templo), Quintiães, Sandiães, Seara e Vila Boa. Em alguns destes casos, na série Bens das Ordens nem sequer vem mencionado qualquer bem referente ao Hospital, apesar de vir referido aqui, nos Foros e Dádivas. Isto sucede em Quintiães e Vila Boa, ambas em Barcelos nos nossos dias.

14 Aqui incluimos os casais da freguesia de Queijada (18) que não vêm atribuídos a ninguém mas que as

inquirições seguintes nos remetem ao Hospital, visto ser um couto seu.

15 Dúvidas em relação a Castelo de Neiva, Creixomil, Forjães e Tamel (Sta. Leocádia). Cf. Portugaliae

Monumenta Historica, Inquisitiones, pp. 227 e 228, ver também as notas de rodapé respectivas.

16 Por exemplo, em Anais, com 1 casal e um quarto (¼): “j. casale et quartam.” Ver Portugaliae Monumenta

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mais duas fracções19; uma herdade20; um número indefinido de searas21; uma vinha e campos indeterminados22; três vessadas23; uma “casam cum sua chausa”24 e três leiras25.

Além destes bens, ficamos ainda a saber que o Hospital detém o padroado das igrejas de Aboim da Nóbrega26, da Boalhosa27, parte do padroado de Seara (dividida com o mosteiro de Carvoeiro)28 e duas ermidas, uma em Vitorino de Piães29 e a outra em Vila Frescaínha (S. Martinho), onde recebe, 1 moio, não sabemos de quê, de renda30.

Esta questão da propriedade, à excepção de um ou outro bem de menor escala, encontra-se já tratada num estudo de Maria José Lagos Trindade, se bem que numa perspetiva primordial de demonstrar o número total de propriedades (especificamente, os casais) adstritos às Ordens Militares por circunscrição administrativa ou “Terra”31.

Assim sendo, e para tirar outro tipo de ilações dos mesmos dados, ainda que, de algum modo atualizados, pretendemos fazer uma aproximação diferente, através da representação dos bens e rendas por freguesia, o que nos permite tecer os comentários que se seguirão.

Deste modo, e começando pelos bens patrimoniais, atentemos no seguinte mapa:

Mapa 1

1220: Entre-Cávado-e-Lima – Distribuição dos bens do Hospital

       

17 Referem-se 8 meios casais: Aborim, Amares, Anha, Arcozelo (c.º de Vila Verde), Boalhosa, Geraz (Sta.

Leocádia), Goães e Penascais; 4 quartos de casal: Anais, Caldelas, Darque, Geraz (Sta. Maria); 2 terços de casal: Oriz – S. Miguel e Passó ou Paçô (c.º de Vila Verde); 2 sextos de casal: Quintiães e Vila Franca; um quinhão indefinido em Barbudo; em Asias, partes de casais que podem perfazer, de três quartas partes a 1 casal na íntegra, e em Covas, c.º de Vila Verde, dois casais menos a quarta parte.

18 Arcozelo (c.º de Barcelos) – 1, Gandra (c.º de Esposende) – 4, Gondiães (c.º de Vila Verde) – 1, Ponte (c.º de

Vila Verde) – 1.

19 Barbudo (neste caso, a antiga paróquia de Parada de Barbudo, incluída na primeira, c.º de Vila Verde) – meia

quintã, menos a oitava parte, e tamém, em Santa Maria de Rebordões, c.º de Ponte de Lima, um sexto de uma quintã (1/6) .

20 Em S. Mamede da Seara (c.º de Ponte de Lima): “Hospitale habet unam hereditate, de que dant ei unum

morabitinum...” Portugaliae Monumenta Historica, Inquisitiones, p. 131, 2.ª coluna (o sublinhado é nosso).

21 Aboim da Nóbrega, Arcozelo (Barcelos) e na Seara. 22 Cervães.

23 2 em Pico e 1 em Oleiros (Vila Verde).

24 Vila Franca: Portugaliae Monumenta Historica, Inquisitiones, p. 229. 25 Atães, Caldelas e Portela, cada uma delas com uma unidade.

26 Portugaliae Monumenta Historica, Inquisitiones, p. 236. 27 Portugaliae Monumenta Historica, Inquisitiones, p. 227. 28 Portugaliae Monumenta Historica, Inquisitiones, p. 241.

29 “Et Hospitale habet ibi unam heremitam ubi habitent iij. homines.” Ver Portugaliae Monumenta Historica,

Inquisitiones, p. 240.

30 Vila Frescaínha (S. Martinho): “Hospitale j. modium de renda de una heremita”. Portugaliae Monumenta

Historica, Inquisitiones, p. 227.

31 TRINDADE, M.ª José Lagos – “A Propriedade das Ordens Militares nas Inquirições Gerais de 1220”,

(18)

Antes de mais, são percetíveis, desde logo, as áreas de maior densidade patrimonial, mas também a existência de uma espécie de “corredores” que, seguramente coincidem com vias de comunicação. No caso do Hospital, esta circunstância faz todo o sentido, no âmbito da vertente assistencial assegurada pelos freires. De resto, era este o seu pilar fundamental nesta região, tão longe que estava já da fronteira com o Islão desde há mais de um século.

Logo no extremo norte do mapa apresentado, contra o curso do rio Lima identifica-se claramente um desses “corredores”, a que chamaremos “Corredor do Lima”, indo praticamente, desde a foz deste rio até perto da fronteira galega32.

Numa quase constante cadência de conjuntos de um ou dois casais, ressaltam à vista alguns pontos onde a propriedade se adensa. Estes pontos, de forma intencional ou não, refletem por vezes a proximidade de um meio de transpor o rio, como se pode adivinhar no vão assinalado a vermelho com a letra A (ver detalhe do mapa, na página seguinte). Este, corresponde ao grupo de freguesias, composto por Vitorino das Donas e Moreira de Geraz do Lima. Como vemos, este ponto A está rodeado por diversos bens pertencentes aos hospitalários: em Deão, Deocriste, Geraz (Sta. Maria e Sta. Leocádia), Facha e a Seara.

      

32 Começando na foz do Lima (Darque e logo abaixo Anha) até para lá do ponto C, terminando no couto de

Entre-ambos-os-Rios, já nas imediações de Britelo, onde se adensa a influência do mosteiro de cisterciense de Ermelo. Britelo fica aliás, fronteira a Ermelo.

(19)

Mapa 1 – Detalhe: “Corredor do Lima”

Voltando às freguesias a que corresponde a letra A, lembremos que, à época, existia a paróquia de Santa Maria do Barco, dentro do couto de Vitorino (do mosteiro homónimo feminino, daí a designação “das Donas”), freguesia que acabou por absorvê-la33. Próximo, em Moreira de Geraz, existe também o topónimo Passagem, neste caso, provavelmente relacionado com o fronteiro cenóbio de S. Salvador da Torre34.

Subindo o Lima, entre a Seara e a vila de Ponte, aquela onde se erguia o único modo “permanente” para atravessar o dito rio, isto é, a ponte que lhe deu o nome, insinua-se um outro vão, que corresponde aos coutos da Correlhã (da Sé de Compostela) e de Domez (hoje Feitosa, da Sé de Braga), assinalados com a letra B. A partir da vila de Ponte, até ao ponto C, apenas verificamos um intervalo no “corredor”, devido à existência do couto do mosteiro de Bravães35.

Chegados ao ponto C, deparamos com a localidade de Ponte da Barca, então inexistente como centro urbano e como freguesia, mas onde existia uma barca de passagem. Citando Amândio Jorge Morais Barros: “Temos notícia da barca de passagem numa data tão antiga

como 1050, no cruzamento com o Lima da estrada dos peregrinos que, de Braga

      

33 Apesar de tudo existe ainda o topónimo Barco e Senhora do Barco em Vitorino das Donas. Ver BAPTISTA,

António José – Toponímia de Ponte de Lima. I.Levantamento Toponímico, p. 292.

34 Disponível em http://www.codigo-postal.pt/4905-280/ (Visto a 11/06/16): Este lugar deu origem ao nome da

rua aqui presente. O dito topónimo deve prender-se, aliás, com a posterior criação do Julgado de Geraz, já evidente em 1258.

35 Este englobava também alguma parte da freguesia de Lavradas, onde se davam ao Hospital “ij. quartarios de

pane de renda”. Cf. Portugaliae Monumenta Historica, Inquisitiones, p. 226. Ver Anexos. Também nada se

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demandavam a Santiago ou que, da Ribeira Lima, levavam o caminho de Ourense, por Lindoso.”36

Tendo em consideração o que é afirmado no excerto citado, prossigamos a caminho de Lindoso, passando pelo couto do mosteiro de Vila Nova de Muía, que se inclui no vão assinalado pela letra C. A própria carta de couto deste cenóbio (agostinho, como Bravães e Crasto, todos na terra da Nóbrega), datada de 1141 já estipulava a condição de “receberem os

hóspedes e peregrinos”37, própria aliás dos preceitos de tantas instituições monásticas.

Antes de chegar a Lindoso, vemos que os bens de S. João de Jerusalém têm o seu último grande núcleo ao longo do Lima, na freguesia de Vila Chã (S. Tiago), e principalmente, na última, Entre-ambos-os-Rios, onde detinha “vij. casalia in suo cauto”38.

Mapa 1 – Detalhe: “Corredor do Neiva”

Ora, paralelo a este último, vemos um outro “corredor” que apelidaremos de “Corredor do Neiva”, visto acompanhar o curso do rio homónimo desde a foz à nascente (ver detalhe do mapa na página anterior).

Tomando a foz, onde em ambos os lados assomam propriedades hospitalárias, deixamos de ver, logo depois, num largo trecho ao longo da margem norte do Neiva, qualquer sinal da presença destes freires. Esta constatação, feita a partir dos dados colhidos

      

36 BARROS, Amândio Jorge Morais – Os forais de Ponte da Barca, p. 35.

37 BARROS, Amândio Jorge Morais – Os forais de Ponte da Barca, p. 35. Nesta página o autor aponta também

um “hospitale de Barca”, já existente em 1220.

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nas inquirições que analisámos, e que pode não corresponder totalmente à realidade, prende-se, a nosso ver, com a localização dos mosteiros de S. Romão do Neiva39 e de Carvoeiro40 (instituições “concorrentes”), com os seus respetivos coutos41, a que se junta ainda o couto de Capareiros, da Sé de Braga e hoje conhecido por Barroselas (ponto D). Porém, na margem esquerda, o fluxo de bens continua, pronunciando-se nas freguesias de Forjães, Cossourado e Sandiães42.

Ora, não querendo forjar nenhuma ilação que não podemos provar, é na verdade curioso, que nestas três localidades existam hoje topónimos referentes à transposição do Neiva. Referimo-nos ao lugar de Ponte, em Forjães43; à ponte das Tábuas, em Cossourado44; bem como ao topónimo Ponte de Anhel, e estrutura respetiva, em Sandiães45. Desta ponte de Anhel, seguindo o vale do Neiva rumo à nascente, podemos observar o pontilhado quase ininterrupto de bens de S. João de Jerusalém, destacando-se os casos das freguesias de Goães (em 1220, Goães e Santo Tirso da Portela) e de Godinhaços, onde nasce o rio em questão. Recordemos pois, que Goães está nas imediações de um desses acidentes geográficos denominados “portelas”, verdadeiras passagens naturais de um vale a outro, facto consignado

      

39 Para ter uma pequena ideia acerca da base patrimonial deste mosteiro na mesma data e na terra de Neiva, que

abarca o curso final do dito rio, veja-se TRINDADE, Maria José Lagos – “A Propriedade das Ordens Militares nas Inquirições Gerais de 1220”, Anuario de estudios medievales, n.º 11, pp. 89 (Terra de Neiva) e 90 (Terras de Ponte e Sto. Estêvão de Riba de Lima).

40 De menor escala, veja-se TRINDADE, M.ª José Lagos – “A Propriedade das Ordens Militares nas Inquirições

Gerais de 1220”, Anuario de estudios medievales, n.º 11, p. 90 (Terras de Aguiar de Lima e Sto. Estêvão de Riba de Lima), para ter noção, por alto, do património deste mosteiro.

41 De S. Romão do Neiva fazia parte a freguesia homónima e parte de Alvarães. De Carvoeiro, além da

homónima, pertencia Durrães (já na margem esquerda ou margem sul) e, provavelmente Portela Suzã.

42 Todas elas assinaladas com um triângulo, sendo que Forjães é o primeiro deles, junto à foz, seguindo-se a

ordem enunciada para os restantes.

43 Disponível em http://www.codigo-postal.pt/esposende/rua-da-ponte/ (Visto a 06/06/16). O nome do lugar deu

origem à nomenclatura da rua atual.

44 Sobre esta: “A ponte das Taboas, que hé de pedra, no sitio onde esta freguezia de Cossourado lemita com a

de Santa Lucrecia de Aguiar, em estrada que vem de Ponte [de Lima, a norte] para Barcellos...” Ver CAPELA,

José Viriato – As Freguesias dos Distrito de Braga nas Memórias Paroquiais de 1758, Registo da freguesia de Cossourado, p. 107. Interessante que refere também uma ponte em Fragoso, onde a Ordem detinha bens e recebia rendas nas imediações. Fragoso é vizinha de Forjães. Seriam estas rendas legados pios ou “esmolas” doadas para a construção de soluções para a travessia dos rios?

45 Veja-se, por exemplo, BAPTISTA, António José – Toponímia de Ponte de Lima. I. Levantamento

Toponímico, p. 266. Na mesma obra e freguesia referem-se ainda, a título de curiosidade, os “suspeitos”

topónimos (alguns microtopónimos) de Barca (campo da); Barquinho (Campo do); Carreira, inerente ao caminho/estrada que a dita ponte servia; Couto; e, já na página seguinte, Proença e Rossilhão (repare-se que na Beira Interior, em terras das Ordens surgem nomes que ainda hoje nos fazem lembrar França, como Nisa « Nice; Proença-a-Nova « Provence; Vila Velha de Ródão « Ródano (o rio), etc. Antes de terminar registe-se a capela de Santa Ana, cerca da dita Ponte de Anhel e em cuja festividade, se guardavam os juízos da Ordem do Hospital. Ver COSTA, Paula Pinto – “A Ordem Militar do Hospital em Portugal: dos Finais da Idade Média à Modernidade”, Militarium Ordinum Analecta, p. 86 (Julho, 26). Veja-se ainda o seguinte trecho: “... a ponte de

Anhel... na freguezia de S. Mamede de Sandiães, no sitio que parte para a [freguesia] de Alheira em estradas publicas que vão para Braga.” Cf. CAPELA, José Viriato – As Freguesias do Distrito de Braga nas Memórias Paroquiais de 1758, Registo da freguesia de Cossourado, p. 107.

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hoje na nomenclatura da sua vizinha Portela das Cabras e na extinta freguesia de Santo Tirso de Portela46.

Lembremos também a vizinhança de Anais, e, por conseguinte, do castelo de Penela, onde o Templo detém parte de uma albergaria, como veremos. E logo ali, na vizinha paróquia de S. João de Queijada, que é couto da Ordem, identificamos praticamente o início de um “caminho secundário” que, desde aí, em direção ao Lima, acompanhando a reta final do vale do Trovela, parece bifurcar-se em dois.

Quanto a Godinhaços, onde o Neiva principia o seu percurso, não se deve descurar a sua proximidade à Portela do Vade (passagem natural entre o vale do Homem e o vale do Vade, afluente do Lima), nem ao facto de, do outro lado da cumeada do monte se encontrar o couto da Boalhosa, pertença do Hospital e onde nasce o mesmo Trovela.

Indo ao extremo sul do Mapa 1, alvo destes comentários, atingimos o Cávado. Na sua foz, tem início um outro corredor (“Corredor do Cávado”) que, praticamente ininterrupto até às terras coutadas do mosteiro de Bouro (ver mapa na página seguinte, letra H), apenas se detém, por breve espaço, nos coutos monásticos de Palme e Banho, em Perelhal (que era reguengo47 – letra E) e pouco depois da vila de Barcelos48 (letra F).

Ao longo deste rio, além das propriedades junto à foz, onde em Gemeses encontramos o topónimo Barca do Lago49, vestígio duma barca de passagem que efetivamente existiu50, sobressaem aquelas que se concentram nos arredores de Barcelos, integradas num grupo de freguesias51, com Arcozelo à cabeça.

      

46 Como se percebe, a passagem aqui efectua-se entre o vale do Neiva para o vale do Homem/Cávado. Porém,

para norte, pouco falta para encontrarmos o vale do Lima, nomeadamente através de pequenos vales onde rios pouco caudalosos correm para ele, como o rio Trovela. Ver “Corredor do Lima” e “Corredor do Neiva” (detalhes do Mapa 1) nas pp. 19 e 20, bem como o texto que sucede a esta nota.

47 Portugaliae Monumenta Historica, Inquisitiones, p. 230 (Bens das Ordens: onde figura apenas uma seara

pertencente a uma instituição eclesiástica, a saber, a igreja paroquial) e p. 309 (1258): onde se diz: “... dominus

Rex est patronus et senor dest ecclesia, et ha elRey in este couto xxj. Casal et tercia...”

48 Tenha-se em atenção a presença do mosteiro de Manhente com seu couto e do couto de Azevedo, por

exemplo.

49 Disponível em http://www.codigo-postal.pt/esposende/barca-do-lago/ (Visto a 29/05/2016). Veja-se também

PINHO LEAL – Portugal Antigo e Moderno..., 1.º fascículo (A – BUS), p. 265: “Está nesta freguezia a Barca

do Lago, onde antigamente se passava de graça, por um legado feito á camara com esta condição.”

50 Nas inquirições de 1288, em Gandra (c.º de Esposende), embora não se mencione a barca, é citado um

indivíduo de nome Miguel de Lago, morando com seu filho numa quintã, que pagava “censorya” ao Hospital. Ver Portvgaliae Monvmenta Historica. Inqvisitiones – Inquirições Gerais de D. Dinis de 1288..., p. 702.

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Mapa 1 – Detalhe: “Corredor do Cávado/Homem”

Esta realidade deve ter a ver com o papel que esta vila detinha no âmbito da peregrinação a Compostela, o que explicará também a existência, em Abade de Neiva, de um hospital, embora não se consiga saber a que instituição estaria entregue52.

Nesta última freguesia, apesar de tudo, vemos o Hospital com bens e rendas, assim como o Templo, o que não deixa de ser deveras interessante53.

É certo que, neste caso a ponte medieval de Barcelos, ainda não existia, pois só terá sido construída nos inícios do século XIV (entre 1325 e 1328 sensivelmente54), mas parece legítima a possibilidade de existir uma barca nas proximidades55. Daqui, parte claramente um caminho (onde se disseminam bens do Hospital) em direção a Cossourado, e um outro,

      

52 De facto, nesta freguesia “houve um hospital, até agora [1989] desconhecido. Destinava-se essencialmente a

pobres e foi erigido por ordem de Mestre Martinho, que ocupou altos cargos na Corte de D. Dinis e veio a ser bispo da Guarda.” MARQUES, José – “A assistência no Norte de Portugal nos finais da Idade Média”, Revista da Faculdade de Letras. História, 1989, p. 51. Este devia estar sob a “alçada da jurisdição eclesiástica” do

arcebispo bracarense (p. 53). Atendo-nos a esta informação, existiria aí uma estrutura assistencial já no século XIII, talvez apoiada logisticamente pelas Ordens Militares que aí detinham também bens avultados? (Veja-se nota seguinte)

53 Portugaliae Monumenta Historica, Inquisitiones, p. 227: “Templum viiij. casalia, j. quintana. Hospitale ij.

casalia, et iiij. morabitinos, iiij. spatulas, viij. capones de renda.”

54 Disponível em

http://www.patrimoniocultural.pt/pt/patrimonio/patrimonio-imovel/pesquisa-do-patrimonio/classificado-ou-em-vias-de-classificacao/geral/view/70518 – secção “Descrições: Nota Histórico-Artística”. (Visto a 15/05/16).

55 De facto, existe uma referência a um açude, local passagem a vau no verão, no lugar de Mereces (hoje em

Barcelinhos, mesmo em frente a Barcelos, pertencendo ao seu concelho), não se especificando para que época se reporta essa informação. Ver PINHO LEAL – Portugal Antigo e Moderno..., 1.º fascículo (A – BUS), p. 330, 1.ª coluna.

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embora menos nítido, tendo Sandiães como destino próximo, sendo que, tanto numa como noutra, como já referimos, havia que atravessar o Neiva.

Continuando rio acima, entramos na Terra de Prado, onde, já nos limites da mesma encontrávamos, na altura, a paróquia de S. Tiago de Francelos, mais tarde deslocada e apelidada de vila de Prado, como hoje a conhecemos. Aí, detinham os hospitalários grande número de casais. Hoje vemos uma ponte imponente que, apesar de ser do século XVII, deverá ter substituído uma anterior56, ou pelo menos, algum outro modo de travessia mais rudimentar. Não se olvide que, do outro lado, já no termo de Braga se erguia (e ergue) o mosteiro de Tibães, também ele, devido ao seu cariz monástico, comprometido com obras de assistência57.

Curiosamente, de Francelos (Prado), que devido à sua importância aparece com um comendador pelo menos em 121658, parte um outro eixo, neste caso perpendicular ao sentido horizontal oeste-este que temos vindo a percorrer pelos vales do Lima, Neiva e Cávado. Assim, tomando o curso final do rio Homem, infletimos para norte, onde se vai formando uma zona que, no mapa apresentado parece um autêntico “formigueiro” de referências a bens do Hospital naquele que é hoje o concelho de Vila Verde. Deste emaranhado de freguesias assinaladas, parecem surgir indícios de vias de passagem em direção a Goães (a tal Portela, hoje das Cabras); rumo à Boalhosa e pelo rio Homem acima. Todavia, é entrando nas Terras da Nóbrega (isto, num sentido sul-norte) que, em Aboim da Nóbrega, ali ao lado da ainda hoje afamada Portela de Vade e nas cercanias do castelo da Nóbrega59, vemos culminar essa malha de propriedades, ali tão concentrada. De facto, nesta freguesia apura-se o número mais elevado de casais de toda a região (23), na mão dos freires de S. João de Jerusalém, além da posse da igreja paroquial e determinadas searas60.

      

56 Disponível em

http://www.patrimoniocultural.pt/pt/patrimonio/patrimonio-imovel/pesquisa-do-patrimonio/classificado-ou-em-vias-de-classificacao/geral/view/70616/ – secção “Descrições: Nota Histórico-Artística”. (Visto a 15/09/16).

57 A este título, e quiçá correlacionado, vemos por exemplo em 1258, em Carreço (c.º de Viana do Castelo, a

norte do Lima), o Hospital e este mosteiro a terem propriedade em comum. Ver capítulo II, nota 145.

58 Liber Fidei, doc. 898, p. 343. Neste documento surge o comendador de “Fenal”, topónimo que como

veremos, se relacionará com o conjunto de bens hospitalários nos limites desta paróquia, hoje conhecida, grosso

modo, por vila de Prado. A esse conjunto de bens se dará o nome de couto de Feal, isto é, “Fenal”.

59 Monte de Ventoselo, em Sampriz, conhecido também por (Sra. do) Livramento.

60 Portugaliae Monumenta Historica, Inquisitiones, p. 236: “...ista ecclesia habet senarias et xxiij. Casalia, et

est de Hospitali.” Esta freguesia, era já sede de comenda, aliás aquela que terá perdurado por mais tempo, fruto

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De Aboim, embrenhados já no vale estreito do Vade, seguindo para norte chegava-se, sensivelmente, à atual vila barquense, onde existia a barca que deu nome à ponte que a substituiu61.

Antes de darmos por concluída a análise dos dados contidos no nosso mapa, e donde já extraímos diversos raciocínios, não podemos omitir um outro pequeno “corredor”, também ele num sentido sul-norte, que atravessa algumas freguesias que hoje formam o concelho de Amares. Identificamos, portanto junto ao Cávado alguma propriedade, que curiosamente está próxima da Ponte do Porto. Esta, apesar de medieval, não estaria já de pé62, porém é certo que ali existiria um modo de transpor as àguas, nem que fosse a vau, daí o topónimo Porto, pré-existente63. Enveredando para norte, e entre os coutos dos poderosos mosteiros de Rendufe64 (a ocidente – letra G) e de Bouro (a leste – letra H), chegamos ao rio Homem, onde vemos, uma base patrimonial considerável de ambos os lados do rio. Escusado será dizer que também aqui se verifica uma passagem, conhecida por ponte de Caldelas e que, naquela maré, se ainda não existia, mais tarde surgiria ali, levando a que do outro lado do rio, a freguesia então denominada de “Sancto Vincentio de Coucieiro”65 viesse a ser conhecida em nossos dias por S. Vicente de Ponte66.

      

61 Uma vez aqui, como se verá, entramos no vale do Vez, por onde passava um importante caminho em direcção

a Monção, logo na fronteira do Minho, numa clara alternativa à estrada romana que ligava Ponte de Lima a Valença/Tui. Ainda hoje esta via, embora um pouco ultrapassada e preterida pelos condutores devido às curvas sinuosas, é, apesar disso, muito frequentada.

62 Disponível em

http://www.patrimoniocultural.pt/pt/patrimonio/patrimonio-imovel/pesquisa-do-patrimonio/classificado-ou-em-vias-de-classificacao/geral/view/69829 – secção “Descrições: Nota Histórico-Artística”. (Visto a 12/09/16).

63 Portugaliae Monumenta Historica, Inquisitiones, p. 19: “Sancti Michaelis de Portu” era ermida e o prelado

que a rege tem o mesmo nome daquele que tutela a paróquia de Amares, sua vizinha, logo será o mesmo. Esta ponte pertence, no entanto, a Proselo e servia uma via que se ligava ainda a Braga, mas sobretudo às terras de Lanhoso, e daqui a Guimarães.

64 Note-se que, a freguesia de Barreiros, então “Trianaa”, estava englobada no couto deste mosteiro, o que não

impossibilitou que o Hospital aí detivesse um casal. Portugaliae Monumenta Historica, Inquisitiones, p. 221. Este facto, poderá estar ligado á existência de barcas de passagem, o que, pode constituir, talvez, um exemplo de como as Ordens cooperavam com outras insituições eclesiásticas na assistência a peregrinos e viandantes. Não muito longe, na freguesia de Bico, também incluída no couto mencionado, redige o seu pároco, em 1758 o seguinte: “... tem [o rio Homem] a ponte chamada de Caldellas... nesta freguezia no barco da Malheira e no

barco de Rendufe em a freguezia de Rendufe.” CAPELA, José Viriato – As freguesias do Distrito de Braga nas Memórias Paroquiais de 1758, p. 36.

65 Portugaliae Monumenta Historica, Inquisitiones, p. 20, entre outras.

66 Nesta freguesia, possuía o Hospital: “iij. casalia et j. quintanam”. Cf. Portugaliae Monumenta Historica,

Inquisitiones, p. 222. Ao que parece, outra designação conhecida é, a de “Ponte de Rodas”, facto deveras

curioso, já que Rodas nos traz à memória, a ilha que, durante algum tempo, foi sede do Hospital: Rodes. Contudo, esta nomenclatura, apesar de tentadora, pode não estar, de todo, relacionada com o exposto, mas sim com os carros e carroças que nela podiam transitar. Disponível em

http://www.patrimoniocultural.pt/pt/patrimonio/patrimonio-imovel/pesquisa-do-patrimonio/classificado-ou-em-vias-de-classificacao/geral/view/70653/ – secção “Descrições: Nota Histórico-Artística”. (Visto a 19/09/16). Veja-se também este excerto, referente a Amares: “Por este concelho passa a estrada da Geira... Parece que

esta villa teve principio entre umas tabernas que havia entre a Porte do Porto e a de Caldelas.” Ver PINHO

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Todos estes bens, que no conjunto eram muitos, rendiam seguramente copiosas colheitas, géneros e tributos. Porém, existem várias freguesias em que deparamos simplesmente com rendas, desconhecendo a que título eram pagas. Seriam resquícios de esmolas iniciais, convertidas com o tempo em rendas fixas a solver aos freires?67 Ou talvez se reportem, a nosso ver, pouco provavelmente, a bens detidos pela Ordem e omitidos pelos inquiridos. Deixando-nos de especulações, debrucemo-nos sobre os dados que temos e vejamos o que podemos dizer acerca deles e da sua distribuição.

Sob diversas formas se revestiam estas rendas, embora possamos agrupá-las, por comodidade, da seguinte maneira: Dinheiro, Géneros e Produtos manufacturados.

Mapa 2

1220: Entre-Cávado-e-Lima – Distribuição das rendas recebidas pelo Hospital

Uma vez mais, parece que a representação gráfica das rendas, se correlaciona com a anterior, onde constam os bens patrimoniais do Hospital, consolidando a relação da Ordem,

      

67 Algumas prestações tomaram este caminho. As dádivas, por exemplo, passaram ”de um oferecimento

voluntário a contribuição obrigatória paga à Igreja, ao rei ou seus representantes...” Cf. COSTA, Avelino

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não só com a assistência a peregrinos, mas com a rede viária da área, que dava suporte aos mesmos, bem como a outro e qualquer transeunte.

Em termos pecuniários, recebiam os freires pouco mais de 33 morabitinos, 8 dinheiros e alguma mealha. Deste montante, o destaque vai para a freguesia de Marinhas (então Cepães), onde eram arrecadados 16 morabitinos de “censoria”68, isto é a bem dizer, metade de todo o dinheiro auferido. Se repararmos bem, as freguesias onde se paga em dinheiro localizam-se perto de vias de comunicação, lugares onde o fluxo de moeda seria mais abundante. Caso curioso é o da quantia paga em S. Martinho de Crasto, dentro do couto portanto, do mosteiro do mesmo nome. Teria o Hospital algum bem dentro do couto deste mosteiro, recebendo por ele a dita renda? Ou existiria uma espécie de acordo entre ambas as instituições que desconhecemos? Em última análise, e não é descabido de todo, visto que foi um membro da linhagem dos da Nóbrega quem fundou o dito mosteiro e que a mesma linhagem patrocinou e soube entender-se muito bem com o Hospital, teriam estes fidalgos “obrigado” o mosteiro de que eram padroeiros a pagar uma renda ao Hospital? Muitas hipóteses podem ser aventadas, e lembremos antes de prosseguir que, Crasto como o Hospital, atendia à regra de Santo Agostinho e por diversas vezes tentou isentar-se da tutela da mitra bracarense69, talvez até apoiados pela Ordem.

Quanto a géneros, eram recebidos quer em animais, quer em determinadas medidas de pão, e em menor número, vinho70.

      

68 CAPELA, José Viriato – As Freguesias do Distrito de Viana do Castelo nas Memórias Paroquiais de 1758,

ver Censo, p. 560: “... pensão em dinheiro, ou em espécie, que reserva para si o senhor do prédio quando o

aliena. Toma-se também pelo contrato em que alguém compra um prédio por certa soma, obrigando-se a dar ao vendedor uma pensão anual consistente em dinheiro ou em frutos.” Se esta for a aceção de “censuria” de que

se fala nas inquirições, então, podemos estar perante bens que a Ordem alienou, ou, ainda mais interessante, propriedades que a Ordem vendeu, reservando para si determinada renda. Pelas inquirições de 1288 sabemos que estas rendas em dinheiro remontavam já ao reinado de D. Afonso Henriques, como veremos adiante. Muitas outras possibilidades poderíamos invocar, como prestação a troco de algum tipo de proteção, talvez até, alguma renda sobre alguma atividade em particular (apanha de sargaço, pesca ou extração de sal, por exemplo?), porém, de momento não possuímos outros dados que nos permitam obter uma resposta satisfatória a esta questão.

69 Vários são os documentos onde se aborda esta questão. Ver COSTA, Avelino Jesus da; MARQUES, M.ª

Alegria F. – Bulário Português. Inocêncio III (1198-1216), docs. n.º 2, 64 e 80, culminando no acordo contido no doc. n.º 84, pp. 3-5, 106-107, 156 e 159-160, respetivamente. No entanto, esta situação era deveras usual como se pode corroborar pelo conteúdo do documento n.º 103, com respeito aos mosteiros de Rates e Vimieiro, p. 218.

70 Veja-se MARQUES, José – “O Censual do Cabido de Tui para o Arcediagado da Terra da Vinha – 1321”,

Relações entre Portugal e Castela nos finais da Idade Média, p. 75. Aqui, o autor mencionado estabelece,

hierarquicamente, as equivalências de vários termos, para líquidos e para sólidos, de acordo com a “medida de Ponte”. Apesar de existirem outras, como as medidas de Braga ou de Barcelos, remetemos para a sistematização aí apresentada, para se ter uma ideia geral das proporções de muitas das rendas que, em anexo, virão contempladas por extenso.

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Os animais eram pagos apenas em Abade de Neiva (quatro capões e quatro espádoas), Lijó (um capão e dez ovos), Sampriz (um capão e um cabrito) e Francelos/Prado (vinte “pissotas”, ou seja, peixe).

Até agora, não sabemos por que razão só aqui se efectuava o pagamento em animais. Não obstante, pensamos que estes pagamentos poderão estar relacionados com a permanência mais demorada de determinado número de freires nas proximidades, os quais certamente consumiriam as ditas peças de carne e peixe71. Na verdade, consideremos que todas estas freguesias se situam nas imediações de sedes de comendas hospitalárias, o que, de certo modo vem acalentar a hipótese delineada72.

O género mais abundante, devido ao facto de ser menos perecível e mais fácil de armazenar, além de ser fundamental na alimentação medieval e do seu caráter quase sagrado, é sem dúvida o pão73, devendo esta palavra referir-se ao cereal panificável e não a um tipo de pão já cozido. Quanto ao tipo de cereal, o silêncio da fonte documental em análise é quase absoluto, à exceção dum alqueire de trigo pago em Sampriz74, onde se pagava também um sesteiro de pão, o que levanta a hipótese de este último ser constituído por mais que um cereal. Simbolicamente relacionadas, podemos acrescentar ainda as rendas em vinho, referidas apenas em quatro paróquias75.

Quanto aos produtos manufaturados, referimo-nos expressamente ao bragal, “pano de

linho grosso”76, pago um pouco por toda a região, por exemplo ao Rei, e também ao Hospital.

Seria interessante compreender melhor os motivos inerentes ao pagamento destas rendas e a sua natureza. Ou seja, se resultavam de algum tipo de foro ou se fruto da

      

71 Mesmo que assim não fosse, estes produtos podiam ser vendidos, ou então trocados por outros de interesse.

Alguns poderiam até ser armazenados por algum tempo, nomeadamente no caso das espádoas, através da salga ou fumagem.

72 Tanto Abade como Lijó estão próximas de Arcozelo onde se situaria a comenda de Santa Marta; Sampriz

pega com a freguesia e comenda de Aboim da Nóbrega e em Francelos ficava a sede da comenda de Feal. Sobre esta última não sabemos muito, mas por um documento do Liber Fidei vemos que, em 1216 existia um comendador aqui e também em Santa Marta, e no caso de Aboim, já pelo menos desde 1145. Veja-se o capítulo III, ponto 2, nesta dissertação.

73 São 14 as freguesias onde se paga pão.

74 Apesar de tudo, em 1288, na freguesia de Freixo (c.º de Ponte de Lima), faz-se referência a dois homens que

se “defendiam”, através do pagamento ao Hospital de “hûa teyga de milho”, cada um, presumimos. Ora, tendo em conta que Freixo é, precisamente, uma das freguesias onde se pagam rendas em pão (ver Anexos), temos aqui um indício que nos pode remeter para o tipo de cereal pago aí já em 1220. Cf. Portvgaliae Monvmenta

Historica. Inqvisitiones – Inquirições Gerais de D. Dinis de 1288..., p. 699.

75 Sampriz (Ponte da Barca), Sande (Vila Verde), Oliveira (Barcelos) e Parada de Gatim (Vila Verde). A estas

duas últimas, que são vizinhas, juntemos a vinha referida em Cervães como propriedade da Ordem.

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exploração de alguma propriedade77, se eram uma esmola ou um donativo regular, se eram um tributo devido por algum favor, promessa ou disposição testamentária, entre outras razões válidas neste contexto. De facto, tirando o caso de Marinhas, onde sabemos que se pagavam dezasseis morabitinos de “censuria”, nada mais sabemos acerca destas rendas, o que nos leva a pensar que em alguns casos as rendas se reportam a bens detidos pela Ordem. Ainda dentro deste desconhecimento em relação às rendas, não deixa de ser interessante mencionar o pagamento das mesmas em determinados coutos, nomeadamente de outras instituições eclesiásticas. É o caso de Crasto (couto do mosteiro do mesmo nome), Cabaços (couto de Braga), Lavradas (couto de Bravães) e Aldreu (S. Tiago de Palme, couto de Palme), ou ainda, das “entradas” a receber no couto de Cossourado78. Nestes casos específicos é de questionar se terá havido algum tipo de acordo entre o Hospital e as ditas instituições, recebendo a Ordem uma determinada renda como ressarcimento de um bem que aí detém/deteve, e que, para não gerar conflitos, aceitou o dito tributo. Ou será que estas instituições, imbuídas de espírito cruzadístico e caritativo, pretenderam também favorecer a ação hospitalária?

Saber de que modo estas realidades se criaram e que consequências geravam seria de sumo interesse, embora as testemunhas não o comuniquem, e muitas sejam as motivações e circunstâncias que podemos imaginar.

Além destas rendas, são ainda enunciadas algumas situações abusivas, manifestadas nomeadamente, através da sonegação de foros por parte de herdadores sujeitos à Ordem (como por exemplo, os herdadores da Boalhosa que lavravam monte reguengo em Duas Igrejas) e a fuga a determinados tributos, em especial voz e coima devidos ao rei, sob o patrocínio/amparo dos freires (como acontecia em Marinhas, Seara e Vila Boa), entre outras79.

Eis o panorama geral tornado possível pelas informações compiladas a partir das inquirições de D. Afonso II, onde devemos realçar a localização dos bens e rendas detidos pela organização que vimos estudando, nomeadamente junto a vias de comunicação, numa malha densa, rareando junto das áreas mais montanhosas (serras Amarela e do Gerês), bem

      

77 Em Abade de Neiva, por exemplo, a Ordem detem 2 casais e recebe 4 morabitino, 4 espádoas e 8 capões.

Renderá cada casal anualmente metade deste montante, ou não terão estas rendas nada que ver com a dita propriedade?

78 SANTA ROSA DE VITERBO, Fr. Joaquim de – Elucidário..., vd. Entradas, vol. II, p. 220: “...pensões que se

pagavam de alguns casais, em cujas rendas entravam outros senhorios”.

79 Refiram-se também os casos de Godinhaços e Quintiães. Vejam-se as referências completas nos Anexos a

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como de alguns espaços controlados por outros institutos religiosos, onde as referências ao Hospital não são registadas80.

*

No que à Ordem do Templo diz respeito, deparamos com dados contidos exclusivamente na série Bens das Ordens, onde simplesmente figuram bens patrimoniais, num conjunto menos variado que o anteriormente referido, porém mais fácil de apresentar sob a forma de tabela.

Observemos, então, como se repartem pelas freguesias de Entre-Cávado-e-Lima:

Tabela 1

1220: Entre-Cávado-e-Lima – Distribuição dos bens do Templo

FREGUESIA ATUAL TERRA EM 1220 C.º ATUAL N.º DE CASAIS OUTROS BENS

Abade de Neiva Neiva Barcelos 9 1 quintã Alheira Neiva Barcelos 1 - Alvito, S. Pedro Neiva Barcelos 1 -

Anais Penela Ponte de Lima 4 Duas partes da Albergaria e suas

searas Atães Bouro Vila Verde 1 - Atiães Prado Vila Verde 5 e ¼ - Azões Penela Vila Verde 8 ¾ de quintã e

searas Beiral do Lima Penela Ponte de Lima 3 - Carreiras, S.Tiago Bouro Vila Verde 1 - Cervães Prado Vila Verde 1/3 - Dossãos Bouro Vila Verde 1 - Duas Igrejas Penela Vila Verde 4 - Gandra Neiva Esposende 1 - Grandra Penela Ponte de Lima 1 - Gemeses Neiva Esposende 2 - Marinhas Neiva Esposende 3 e ¼ -

      

80 Eis algumas dessas instituições, detentoras, por vezes, de coutos de dimensão considerável: mosteiro de S.

Romão do Neiva; couto de Capareiros (hoje, Barroselas); mosteiro de Carvoeiro; couto de Junqueira (hoje Mazarefes, do mosteiro galego de S. Paio de Antealtares); mosteiros de Banho (Vila Cova, c.º de Barcelos) e Palme; reguengo de Perelhal; mosteiro de Manhente e couto de Azevedo (Lama, c.º de Barcelos), mosteiro de Vitorino das Donas; coutos da Correlhã e de Domez (hoje Feitosa, c.º de Ponte de Lima); o couto da vila de Ponte de Lima; os coutos de Moure, Lage e Freiriz; mosteiro de Serdedelo; couto de Gondufe, e muitos outros. Veja-se, por exemplo, ANDRADE, Maria Filomena – “Entre Braga e Tui: uma fronteira diocesana de Duzentos (o testemunho das inquirições)”, Revista da Faculdade de Letras. História, série II, vol. XV, Tomo I, pp. 77-98.

Referências

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