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Apparelho d'Esmarch

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Academic year: 2021

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ÂPPÂRELHO D'ISMCH

DISSERTAÇÃO INAUGURAL

PARA ACTO GRANDE

SEGUIDA DE DEZ PROPOSIÇÕES

APRESENTADA Á

mtêik wmím-ummitk m mwm

E DEFENDIDA

Sob a presidência do E x . " Sur.

MANOEL DE JESUS ANTUNES LEMOS POR J. C. TEIXEIRA DA MOTTA ■ * = » * < POETO TYPOGRAPHIA LUSITANA E u a de D . Fernando 1 8 7 9 .

*$\H FHC

(2)

ESCOLA MEDICO-CmERGÏCA DO PORTO

D I R E C T O R

0 111.™0 e Ex.m0 Snr. Conselheiro, Manoel Maria da Costa Leite

S E C R E T A R I O

O 111.™0 e Ex.ra° Snr. Antonio d'Azevedo Maia

C O R P O C A T H E D R A T I C O

LENTES PROPRIETÁRIOS

OS ILL."" E EX.""" SNRS. 1." Cadeira — Anatomia descriptiva e ge­

r al João Pereira Dias Lebre.

2.' Cadeira— Physiologia _. Dr. José Carlos Lopes Junior.

3." Cadeira —Historia natural dos medi­ , camentos. Materia medica João Xavier de Oliveira Barros.

4.' Cadeira — Pathologia externa e the­

rapeutica externa Antonio Joaquim de Moraes Laldas. 5.' Cadeira — Medicina operatória. . . . Pedro Augusto Dias.

6 / Cadeira —' Partos, moléstias das mu­

lheres de parto e dos recem­nasci­ ■■•_• jo s Dr. Agostinho Antonio do Souto.

7. Cadeira —Pathologia interna.—The­

rapeutica interna e historia medica. Antonio d'Oliveira Monteiro. 8.* Cadeira — Clinica medica Manoel Rodrigues da Silva Pinlo. 9.» Cadeira — Clinica cirúrgica Eduardo Pereira Pimenta.

10.' Cadeira ­ Anatomia pathologica. . . Manoel de J. Antunes Lemos, presidente. H." Cadeira — Medicina legal, hygiene

privada e publica e toxicologia ge­ ■ nl, , . . , Dr. José F. Ayres de Gouveia Osório.

12 ■ Cadeira — Patíioiogia geral lllidio Ayres Pereira do Valle. Pharmacia *e'rx da Fonseca Moura.

LENTES JUBILADOS

í Dr. José Pereira Reis.

Secção medica \ Dr. Francisco Velloso da Cruz. _ ( José de Andrade Gramaxo.

I Antonio Bernardino d'Almeida.

Serrão cirurcica \ Luiz Pereira da Fonseca.

becçao cirúrgica | g ^ , , ^ M a B 0 e, M d a C o s t a L e i l c. LENTES SUBSTITUTOS

( Antonio de Azevedo Maia. Secção medica j Vicente Urhino de Freitas.

( Augusto Henrique d'Almeida Brandão Secção cirúrgica j Vago.

LENTE DEMONSTRADOR

(3)

A Escola não responde polas doutrinas expendidas na disserta-ção e enunciadas nas proposições.

(4)

A

W.

Off-O VOff-OSSOff-O FILHOff-O E AFILHADOff-O

(5)

ÃOS PARENTES

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Off.

(6)

0L ifb&maxbmo JUUetio "òe 'Vievca e lfhi,ûo

cR*ica/ù)o 3'uUwteu)a «Jotae

C o m o prova, d e a m i g o d e d i c a d o

off.

o vosso

(7)

AO MEU PRESIDENTE

O EX.m 0 SNR.

MANOEL DE JESUS ANTUNES LEMOS

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INTRODUCÇAO

O sangue é uma das partes mais importantes da eco-nomia humana, e as hemorrhagias abundantes contam-se entre os accidentes mais graves das operações.

Se um individuo robusto pôde soffrer sem inconve-nientes a perda de uma certa quantidade de sangue, a edade do paciente, a sua fraqueza constitucional, e a debi-lidade produzida por padecimentos anteriores, fazem muitas vezes hesitar o cirurgião, com receio de que a hemorrhagia, inevitável e inhérente a certos methodos operatórios, não venha comprometter a vida ou pelo menos perturbar pro-^ fundamente o trabalho de reparação do traumatismo cirúr-gico.

D'ahi a importância da hémostase preventiva, para cuja realisação fácil e eíHcaz muito teem concorrido os trabalhos dos cirurgiões contemporâneos, entre os quaes occupam incontestavelmente o primeiro logar os do

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pro-— 16 pro-—

fessor.de Kiel, F. Esmarch, cujo methodo hemostatico es-colhemos para assumpto da nossa ultima prova escolar.

Dois grandes grupos se podem formar dos meios de hémostase preventiva. Comprehende-se eífectivamente que a effusão de sangue possa ser prevenida, já directamente no acto da divisão dos tecidos por meio de methodos apro-priados de dierese, já obstando por meios mechanicos a que o sangue chegue ás extremidades dos vasos seccio-nados.

Os methodos de dierese, denominados oblitérantes, creados principalmente com o fim de prevenir a infecção purulenta, fechando as portas á intoxicação, obstam perfei-tamente ao derramamento de sangue ; são hemostaticos em contraposição ao bisturi que é hemorrhagico. Se taes me-thodos conseguissem dominar em todas as operações cirúr-gicas, lançando para o domínio da historia o bisturi, no manejo do qual é impossível exceder a pericia dos antigos cirurgiões, resolvido estava o problema da hémostase pre-ventiva.

Taes exclusivismos não conseguiram porém vingar e o instrumento cortante, arma cirúrgica por excellencia, foi, é e será o mais simples e o mais racional dos meios de dierese. Todos os methodos denominados oblitérantes são simplesmente applicaveis a casos particulares, incapazes de se adaptarem á generalidade das operações. As cauterisa-ções são lentas, dolorosas e sem precisão de effeitos. A gal-vano-caustica é caprichosa, irregular e de diíficil manejo.

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O próprio esmagador linear, o mais precioso d'esta ordem de methodos, é menos delicado, menos preciso e d'um cam-po de acção muito restricto comparado ao bisturi. O ins-trumento cortante continua assim na posse da sua supre-macia, honra que lhe é devida pela extensão immensa das suas applicações, pelo seu fácil manejo, e sobre tudo por que, deixando-nos as partes á vista, domando-se com a ma-xima facilidade e adaptando-se á vontade do operador, é na verdade um instrumento intelligente, vantagem de pri-meira ordem que contrasta com a brutalidade dos outros methodos.

Antes do advento do methodo d'Esmarch, dois metho-dos foram adoptametho-dos na hémostase preventiva: a laquearão e a compressão.

A laqueação preventiva, sobretudo preconisada por Verneuil, consiste em ligar as artérias á medida que ellas se descobrem no decurso da operação ou mesmo antes de a começar. O distincto cirurgião assegurou, em face do resultado de sete amputações, praticadas por este methodo, que a perda de sangue é muitíssimo limitada e que a du-ração da opedu-ração não excede muito sensivelmente a ordi-nária. O methodo de Verneuil não vingou, por ser preciso addicionar a uma operação, outra que é muitas vezes mais delicada e laboriosa. Se nas suas mãos hábeis a perda de sangue foi minima e a operação não muito duradoura, para a generalidade dos cirurgiões o seu methodo é de uma gra-víssima dificuldade, torna a operação longa e irregular e faria com que a hemorrhagia fosse considerável.

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A compressão exercida sobre a artéria-principal do

membro, com o fim de impedir a passagem do sangue, era o methodo universalmente empregado. Distingue-se n'elle a compressão digital e a compressão mechanica. A com-pressão digital, a actualmente mais adoptada, tem a van-tagem de ser pouco dolorosa, e de se graduar facilmente á vontade do operador, constituindo-se realmente n'um meio intelligente de exercer a compressão. Está muito longe porém, de satisfazer a todos os requisitos.

E manifestamente insuffíciente, pois que não obsta ao accesso do sangue arterial que se estabelece pelas vias col-lateraes, e, o que é peior, exagera o derramamento do sangue venoso pela compressão das respectivas veias. Não impedindo assim, como deve, a hemorrhagia, é inconve-niente para o operado ao qual não poupa as forças e para o operador ao qual não deixa limpo o campo da operação. A compressão digital só pôde ser exercida nas arté-rias superficiaes, collocadas sobre um plano resistente, e exige constantemente ajudantes exercitados e com pre-sença de espirito, o que é sobre tudo necessário quando as operações são executadas na raiz do membro, passando a faca rente dos dedos do ajudante. A execução da compres-são é até muitas vezes diíficil, fugindo a artéria a cada passo á pressão, sob a influencia dos movimentos do ope-rado.

Emfim Verneuil considera a compressão digital, como capaz de provocar phelebites inguinaes, quando é exercida na flexura da verilha. E inutil insistir sobre estes argu-mentos para evidenciar quam imperfeita é a compressão digital como methodo hemostatico.

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A compressão mechanica já desde muito tempo estava considerada como inferior á digital por não ter a precisão e a delicadeza d'esta, por não realisar a hémostase com tanta perfeição e finalmente por que os apparelhos desti-nados á sua producção se desarranjam facilmente.

Tal era o estado bem pouco lisongeiro da hemosta-tica, quando appareceu o methodo de que vamos occupar-nos.

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COMPRESSÃO ELÁSTICA—METHODO DESMARCIÎ

DEFINIÇÃO E HISTORIA

É conclusão legitima da analyse dos methodos, prece-dentemente expostos, que a hémostase preventiva por elles realisada é insuficiente e grosseira. A suspensão da cor-rente arterial, circumscripta ao vaso principal do membro, não obsta a que o sangue inunde o campo da operação, nem previna a perda do sangue contido no segmento am-putado. Sendo taes methodos incapazes de satisfazer com-pletamente ao desideratum cirúrgico, sob o duplo ponto de vista do operador e do operado, não podia a cirurgia con-temporânea, graças ás tendências progressivas que a cara-cterisam, permanecer immovel perante taes imperfeições, e porisso procurou substituil-os por meios mais convenien-tes e perfeitos.

Tão deplorável lacuna foi de facto preenchida pelo methodo da compressão elástica, inaugurado em 1873 pelo Dr. Frederico Esmarch.

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O processo do celebre professor de Kiel torna sim-ples e rapidamente exsangue o membro lesado, permittin-do a execução operatória sem perda de sangue. Esta per-feitíssima hémostase realisa-se com a applicação d'uma facha elástica, enrolada ao longo do membro, desde a sua extremidade livre, até além do campo operatório, onde se exerce uma compressão circular por meio d'um tubo de caoutchouc. As espiras elásticas propeliam os humores da periferia para o centro, e o tubo terminal interrompe com-pletamente o curso do sangue nas artérias.

Tal é, summariamente delineado, o methodo ischemico d'Esmarch, que veio exercer uma verdadeira revolução na hemostatica, e concomitantemente em toda a cirurgia.

Como acontece na apresentação de todos os grandes inventos, no intuito de contestar-lhes a maior somma de originalidade, não se tardou a esmiuçar os annaes da scien-cia para ver se elles registravam casos espescien-ciaes em que a hémostase fosse realisada d'um modo semelhante ao me-thodo d'Esmarch.

Após a invenção do torniquete, diversos cirurgiões precediam a sua applicação d'uma compressão exercida, desde a raiz do membro, com uma atadura de panno fortemente apertada; ainda em 1853, um cirurgião inglez, Clover, applicou este processo a uma coxa que tinha de amputar, tendo o cuidado de conservar o membro elevado emquanto fazia a ligadura. Ora é fácil de ver que este me-thodo, utilisado pelo próprio Esmarch em 1855, não podia satisfazer plenamente a todos os requisitos de uma hemos-tatica perfeita.

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n'elle contida, enfraquecendo a irrigação arterial e facilitan-do o desaguamento venoso; e por outro lafacilitan-do a compressão da atadura ischemiava pelo menos as partes superficiaes. Es-tas duas acções tendentes ambas a desengorgitar os teci-dos não podiam de certo ir muito longe, tanto mais que o seu eíFeito era pouco e pouco annullado pela acção das artérias collateraes, cuja circulação não era impedida pelo tcrniquete.

Chassaignac, em 1856, n'uma communicação feita á soàedade de cirurgia, estabeleceu que se obtém perfeita e facilmente a suspensão da circulação arterial pela com-pressão exercida por anneis de caoutchouc sobrepostos, cuja tensão individual exigindo somente um leve esforço produziria pelo seu conjuncto enormes effeitos de pres-são.

Aponta um caso em que, vendo-se a braços com uma hemorrhagia, consecutiva á amputação d'um metatarsiano, nâo lhe sendo possivel encontrar os vasos que davam sangue, e nada obtendo com o perchloreto de ferro, somente con-seguiu a hémostase, comprimindo as artérias tibiaes com tubos de caoutchouc, enrolados.

Foi de certo este o primeiro ensaio da substituição da facha elástica á facha simples de panno; a constricção porém era limitada, não se estendia ao membro todo como no methodo de Esmarch.

A constricção elástica teve desde então diversos se-ctários, entre outros Ad. Richard, que em 1857 utilisava a compressão exercida na raiz do membro por uma facha de caoutchouc.

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mais se radicou o uso das fachas constrictoras elásticas, iniciado pela prática de Grandesso Silvestri.

Esta compressão preventiva era mesmo realisada nas clinicas de Padua com uma certa perfeição, circumdando-se previamente o membro com uma facha fortemente aper-tada.

Esta praxe hemostatica, assim continuada d'um mo-do regular, serviu de base a Vanzetti para defender em 1873 a prioridade de Silvestri na descoberta do methodo da compressão elástica. Certo é porém, que, como fez ob-servar Léon Le Fort, o conhecimento da prática italiana só se fez pela communicação de Vanzetti, que é posterior á publicação da descoberta d'Esmarch; e, dado mesmo que assim não fosse, havia sempre como meio differencia-dor dos methodos de Silvestri e d'Esmarch ausência m primeiro de compressão elástica total.

Devemos emfim assignai ar entre as tentativas, desti-nadas a aperfeiçoar a hémostase preventiva, o processo utilisado por Felix Guyon em 1872. Este processo foi fi-xado, depois de diversos ensaios, no seguinte: exercer a compressão arterial na raiz do membro elevado e com-primir por baixo da linha d'operaçao com um laço circu-lar.

D'esta forma se evitava o engorgitamento do segmen-to amputado e o escoamensegmen-to de sangue, principalmente venoso, durante a operação.

Taes precedentes cirúrgicos no campo da hemostatica preventiva, não murcham a corôa de que tal invento cin-giu a fronte d'Esmarch. E incontestável que dos elementos mechanicos do seu processo, se alguns como o tubo de

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caoutchouc por exemplo, já tinham sido empregados, o es-sencial da sua invenção, a facha elástica, circumdando todo o segmento periférico do membro, não tinha sido ainda uti-lisada; ora é exactamente este o elemento caracterisco da ischemia cirúrgica.

A obra d'Esmarch, attinge porém, as maiores propor-ções, se apreciarmos a sábia combinação das différentes partes do seu processo e sobre tudo a poderosa generali-sação que o distincto cirurgião lhe imprimiu, estendendo-lhe o mais possivel o campo d'applicaçao, estabelecendo as suas indicações e as suas vantagens, e empregando to-dos os esforços para radical-o na sciencia.

A descoberta d'Esmarch, fructo do empenho que desde muitos annos tinha manifestado no aperfeiçoamento da hemostatica, foi pela primeira vez apresentada em 1873 ao congresso dos cirurgiões allemães reunidos em Berlim, e no mesmo anno admiravelmente exposta n'uma lição cli-nica publicada em différentes jornaes de medicina, onde se fazia a apologia prática do seu methodo em face de 87 operações, entre as quaes figuravam amputações, desarti-culações e resecções.

Tão brilhantes resultados induziram os cirurgiões a ensaiar o seu emprego, e o methodo da ischemia artifi-cial vulgarisou-se rapidamente por toda a Europa.

O celebre professor Billroth, um dos primeiros a se-guir tal prática, deu immediatamente conta de 14 opera-ções, executadas com uma perda minima de sangue.

De Vienna d'Austria a compressão elástica passou á França, levada por Demarquay, que obteve os mais favo-ráveis resultados, e fez construir a Gallante, sob as suas

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indicações, um apparelho d'Esmarch que é o geralmente empregado.

A Inglaterra seguiu immediatamente a iniciativa, to-mada pela cirurgia dos outros paizes, e a prática de nu-merosas operações de Mac Cormac, Humphry e Gibb, at-testaram os excellentes resultados da ischemia artificial.

Assim vulgarisada em toda a cirurgia estrangeira, a compressão elástica fez a sua entrada em Portugal, sendo applicada pela primeira vez no hospital de S. José de Lis-boa, em Maio de 1874, e no Porto em 1875, onde foi ini-ciada pelos ex."'°8 professores Almeida e Pimenta.

Estava, pois, introduzida definitivamente na sciencia a ischemia cirúrgica, que viu estender successivamente o seu campo, a principio bastante circumscripto ás mais di-versas e variadas operações, vindo coroar estes trabalhos de generalisação, a utilisação feita em Inglaterra da com-pressão elástica no tratamento dos aneurismas.

No meio porém d'esté concerto de elogios ao methodo d'Esmarch, que em todos os tons e de toda a parte par-tiam, começaram a surgir clamores hostis e a levanta-rem-se questões pró e contra, cuja solução necessita ainda da sancção da experiência.

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MODOS OPERATÓRIOS

O methodo de exsangnificação, realisado pela com-pressão elástica, obtem-se com processos diversos, adapta-dos ás regiões onde tem de ser applicado. Distinguiremos, debaixo do ponto de vista descriptivo: 1.° As operações nos membros para além da sua raiz; 2.° As operações na raiz dos membros; 3.° As operações fora dos membros.

l.° As operações nos membro.s para além da sua raiz. — O clássico e usual apparelho d'Esmarch consta de uma forte facha elástica de caoutchouc, tecido com seda e d'um tubo de caoutchouc, n'uma das extremidades do qual prende uma cadeia cujos elos são destinados a fixar-se so-bre um colchete, preso no outro topo. Chloroformisado o doente e cobertas as soluções de continuidade, se as ha, com um tecido impermiavel, eis, como se utilisa o apparelho. Enrola-se a facha elástica em espiras sobrepostas, exercendo uma tracção mais ou menos enérgica, desde a extremidade do membro até além do campo operatório. N'este ponto circumda-se o membro com o tubo de caout-chouc, sufficientemente estendido e com um numero bas-tante de voltas e prendem-se as duas extremidades com um dos elos da cadeia e o colchete. Em seguida levanta-se a facha elástica, deixando o membro a descoberto. Tal é o processo e o apparelho geralmente empregados.

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-Alguns operadores, como Langenbeck, substituem o tubo por muitas circulares da propria facha elástica, fixas na sua extremidade por um alfinete.

A contensão dos dous topos do tubo de caoutchouc tem sido realisada por différentes formas. No apparelho de Foulis, na parte média do tubo está fixo um annel fendido; depois de ter dado as voltas passam-se por esta fenda os dous topos estendidos do tubo elástico que, uma vez aban-donados, tendem a tomar o seu diâmetro normal, e com-primem-se fortemente um ao outro.

Tem sido também utilisado um tubo curto, pelo qual se passam os dois topos estendidos, que em seguida se fi-xam pelo mesmo mechanismo. Este processo, diz Esmarch, é sobretudo util nos casqs em que se quer reservar a pos-sibilidade de fazer sahir á vontade um pouco de sangue da ferida, quando por exemplo, se trata da laqueação d'uma artéria, porque retirando ou repellindo o annel diminue-se ou augmenta-se a compressão.

Finalmente Nicaise exerce a compressão com uma fa-cha elástica muito forte, ao longo da qual estão différentes anneis nos quaes se prende um gancho, fixo n'uma das ex-tremidades.

Cripps fez uma modificação curiosa á facha d'Es-march; eis como ella é descripta no Correio Medico de 15 de Outubro de 1873:

«Pega-se em um tubo de gomma elástica de vinte e uma pollegadas de comprimento e de pouco mais ou me-nos três oitavos de pollegada de grossura, e atam-se uma á outra as extremidades com um cordel, ficando assim um annel elástico de sete pollegadas de diâmetro. Uma

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espe-— 29 espe-—

cie de garrochinho, cuja parte central é ligeiramente esca-vada, como uma roldana, e que gira sobre o eixo, com-pleta o apparelho.

«Para o applicar ao braço, por exemplo, dão-se com o annel elástico três ou quatro voltas apertadas em redor da mão, incluindo os quatro dedos e o pollegar, tendo o cuidado de fazer as voltas do tubo parallelas e não cru-zando-as umas por cima das outras. Depois na parte que liga a volta superior á inferior do annel e, estendendo-o, introduz-se o garrochinho e anda-se com este em redor do braço e para a parte superior, de modo que a volta, que se desfaz na parte inferior, faz-se na parte superior. Assim se fazem subir as três ou quatro voltas da ligadura pelo ante-braço e braço até á altura que se quer, graduando o seu aperto pelo affastamento em que o garrochinho se con-serva do braço.

«Este meio de fazer recuar o sangue e de o suspen-der nas extremidades tem excellente resultado no ante-braço, braço e perna ; mas na região poplitea, os tendões dos flexores obstam a que a artéria seja efficazmente com-primida.

«É provável que uma almofada possa remediar esta falta do apparelho.

«Para tirar a ligadura introduz-se o garrochinho e anda-se com elle em sentido inverso ou corta-se o cordel que une as duas extremidades do tubo.»

2.° Operações na raiz dos membros.—Nas desarticu-lações e nas resecções da espádua, o tubo, fortissimamente apertado e abraçado á axilla, deve ser fixo por mão vigo-rosa em cima da espinha da omoplata.

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Nas amputações da parte superior da coxa, o tubo elástico é enrolado fortemente por baixo da flexura da ve-rilha uma ou duas vezes; cruzando em seguida as suas extremidades por diante da região inguinal, levam-se á região posterior da bacia, e fazendo-se ahi novo encruza-mento, vêem enganchar-se os dois topos á face anterior do abdomen. Pôde ainda proceder-se d'outra forma, compri-mindo a iliaca externa com uma almofada e applicando em seguida uma facha elástica muito forte, que, vindo da face posterior da coxa, se cruza sobre a almofada, indo em seguida prender-se os seus dois topos á face posterior do abdomen.

Nas desarticulações da coxa e nas resecções da ca-beça do fémur, depois da ischemia realisada pela facha elástica, para impedir o accesso do sangue comprime-se a aorta na região umbilical, depois de previamente esvasia-dos os intestinos.

Esmarch usa n'estes casos de um apparelho, consti-tuído por uma peça dorsal almofadada, terminada lateral-mente por dois ganchos, destinados a fixar fachas elásticas, e por uma peça compressora, uma das extremidades da qual é applicada immediatamente sobre a aorta. Esta ul-tima peça tem duas almofadas, uma inferior em contacto com o ventre, outra superior para que um ajudante a possa conservar em posição, e finalmente uma haste intermedia-ria, largamente aberta no meio para deixar passar as vol-tas da facha elástica que exercem uma compressão enér-gica. Este apparelho pôde ser mais simples e facilmente substituído por uma atadura enrolada sobre um pau, for-mando uma almofada que se colloca por baixo do umbigo,

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-e applicando-a vigorosam-ent-e contra a columna v-ert-ebral por 5 ou 6 voltas circulares d'uma facha elástica larga.

Brandis, no intuito de evitar a compressão circular do ventre, enrola a atadura em torno d'um pau mais com-prido cujas extremidades se abaixam pelas voltas d'uma facha elástica que passam por baixo da meza da operação. 3.° As operações fora dos membros.—Nas operações a realisar no penis e no escroto é utilisada a ischemia ar-tificial, usando-se d'uma facha elástica muito estreita e d'um tubo de caoutchouc delgado que, depois de ter cin-gido com numero de voltas suíficiente a base do penis e do escroto, se faz passar sobre as regiões inguinaes, vindo prender-se os seus dois topos na região posterior da bacia.

Na extracção d'um tumor da parotida, Letievant rea-lisou a ischemia comprimindo os ramos arteriaes caroti-dianos por baixo do maxillar com um cylindro de algodão, enrolando em seguida a facha elástica em torno da face, do craneo e da região parotidiana. Affastando duas circulares, conseguiu ter o campo operatório suíficiente para dissecar minuciosamente o tumor sem hemorrhagia arterial.

Nas operações da mama, Diday propõe o emprego da ischemia, operada com um pequeno apparelho, composto d'um balão achatado de caoutchouc, d'um annel, collocado em volta e por fora, e guarnecido em baixo por um tubo elástico. Uma vez bem sustentado por ligaduras, insufla-se o balão central, anemiando assim a parte que elle cobre; insufla-se em seguida o tubo circular para impedir o ac-cesso do sangue, e tiram-se emfim o balão e as ataduras, ficando o campo operatório livre e ischemiado.

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a applicação de duas bexigas compressivas, destinadas á producção da ischemia.

Emfim nos aneurismas em que a compressão elástica é adoptada como meio coagulante, a facha a partir do sacco é brandamente passada e o tubo de caoutchouc substituído depois por um torniquete.

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APPLICAÇÕES OPERATÓRIAS

Deprehende-se do que deixamos dito, que a facha de Esmarch, susceptível de ser applicada a diversas regiões, tem o seu uso principal nas operações dos membros. É porém immensa a sua área operatória, e multiplicadissimos os serviços que pode prestar a sua acção ischemica. Pri-mitivamente Esmarch tinha-lhe circumscripto o campo ás operações longas dos membros nas quaes prestava a su-prema utilidade de poupar o sangue ao operado e livrava o operador dos inconvenientes da hemorrhagia. Taes eram todas as amputações, resecções e sequestrotomias.

N'estas operações da grande cirurgia, o methodo de exsanguificação d'Esmarch, além da simplificação operató-ria e do beneficio do operado, tem a immensa vantagem de precisar as indicações, tarefa capital que é um dos fins a que a cirurgia moderna tanto mira.

Todos sabem que o espirito do cirurgião vacilla mui-tas vezes entre uma amputação e uma resecção, pelo facto de se não poder conhecer qual o grau da extensão das le-sões ósseas. Ora, a facha d'Esmarch permitte uma explo-ração minuciosa e completa que vai fornecer uma base se-gura e certa ás nossas decisões. Assim Gayet, n'um caso d'osteo-periostite antigo da tibia, acompanhado d'um crescimento notável das dimensões do osso em todos os senti

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_ 34 _

dos, pôde por meio da ischemia cirúrgica, apreciar exacta-mente a profundidade da lesão, o que lhe permittiu appli-car a escavação sub-periossea, que foi seguida de bons re-sultados. No anno passado, também, em a nossa enfermaria de clinica cirúrgica, n'um caso de carie escrofulosa da ti-bia, o ex.mo snr. Eduardo Pereira Pimenta, nosso

distin-cto professor, applicou previamente a compressão elástica para saber se era ainda possível a conservação do membro; a lesão porém não o permittiu, e em vez da resecção, fez-se a amputação que foi coroada de bons resultados.

Dentro em pouco porém rasgaram-se novos horisontes ao methodo ischemico. A extirpação de tumores foi egual-mente feita com o seu auxilio, applicação tanto mais no-tável que permitte a ablação de tumores profundos, im-possíveis de dissecar-se sem uma hémostase perfeita. O methodo d'Esmarch impedindo n'estes casos a amputação é um processo conservador que poupa muitas vezes os membros.

Citarei, por exemplo, um caso clinico de Grayet, em que um tumor, profundamente desenvolvido entre a tibia o o peronéo, indicava a amputação, pela impossibilidade de attingir a sua origem e operar a sua excisão completa. Feita a ischemia, conseguiu-se attingir o seu pedículo im-plantado na membrana interossea e dissecar os seus pro-longamentos que se estendiam por baixo e por entre a bai-nha do extensor do dedo minimo.

Ha certos tumores que trariam uma hemorrhagia abundantíssima e seriam d'uma difficultosa ablação se não fora o methodo d'Esmarch. E o que se nota no caso de Letievant que extirpou muito facilmente, - graças á

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ische-— 35 ische-—

mia, tumores venosos duros, desenvolvidos sobre varizes, cheios de lagos sanguíneos e estendendo-se até ao solear. É nas operações delicadas que a ischemia presta o mais precioso soccorro; é a realisação simples e completa, diz Gayet, d'esté desejo que todo o operador não deixa de formular, in pefto, nos casos espinhosos: «se eu podesse operar no cadaver?»

Casos d'esta ordem são apontados por Brandis, nos quaes se trata da extracção de corpos estranhos da palma da mão e da planta do pé. São de ordinário fragmentos de agulhas quebradas que o cirurgião reconhece muito bem pela palpação, mas uma vez feita a incisão tudo muda. A ferida inunda-se de sangue, a agulha desapparece, e em vão se empregam a esponja, o dedo, a sonda ou a pinça. D'esté penosíssimo trabalho o que ordinariamente se obtém é a inutilidade de esforços e uma suppuração pro-funda, dolorosa e persistente. Com o methodo d'Esmarch a scena muda completamente, porque o corpo estranho bem facilmente se encontra.

Foi d'esta forma que Gayet facilmente extrahiu um fragmento d'agulha que se tinha profundamente enterrado na eminência tenar da mão direita, notando-se que as ten-tativas de extracção previamente feitas tinham sido com-pletamente baldadas.

N'estas circumstancias, diz Esmarch, a ausência do sangue favorece a exploração, simplifica a operação e faci-lita a reunião por primeira intenção.

Casos ainda mais perigosos e difiiceis são os das feri-das arteriaes, especialmente com numerosos coágulos e em cavidades aníractuosas. O cirurgião muitas vezes não

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con-36 —

segue achar os topos da artéria ferida, e as hemorrhagias que se repetem, ou fazem perder a vida ao doente, ou obrigam á amputação. Ora tudo se reduz a uma operação das mais benignas e das mais simples, executando a is-chemia artificial.

Assim Gayet, no caso d'uma ferida da cubital, pro-vocada por uma explosão, foi obrigado a laquear a nume-ral ; mas onze dias depois, repetindo-se a hemorrhagia com intensidade, foi applicada a facha d'Esmarch, apesar da tumefação e dos coágulos, conseguindo-se laquear os topos arteriaes em menos de dez minutos e com os melhores re-sultados.

Diversos casos se apontam em que as feridas vascu-lares foram curadas com o melhor êxito pelo methodo de Esmarch.

A applicação do methodo d'Esmarch na raiz dos membros permitte que com muito mais segurança n'ellas se façam as desarticulações, operações muito perigosas e diíficeis pelas enormes hemorrhagias que provocam; é este de certo um dos benefícios mais notáveis da exsangûifica-ção elástica.

Não é só até á raiz dos membros, como já vimos, que se estende o methodo d'Esmarch. Différentes opera-ções do penis e do escroto como amputaopera-ções, extirpaopera-ções de cancroides e de vegetações do penis, operações de phi-mosis, antoplastia urethral e ablações do testículo, são hoje feitas pela compressão elástica com excellente resultado.

Como já vimos também, na parotida e no seio, tem-se conseguido extirpar tumores pelo mesmo processo.

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tam-— 37 tam-—

bem beneficiadas pela ischemia artificial; tal é a eauteri-sação pelo ferro em braza que feita sobre uma ferida ex-sangue, não tendo liquido a vaporisar, produz eífeitos mais enérgicos e mais profundos do que nas circumstancias or-dinárias.

Foi o que observou Oilier, na desarticulação meta-tarso-phalangica do grande dedo com cauterisação da fe-rida, indicada por uma carie da cabeça do metatarsiano. A acção do cautério actual n'estas circumstancias pôde ser muito bem aproveitada sempre que se cauterisem tecidos na visinhança de vasos importantes ou de articulações que é necessário poupar.

N'esta indicação das principaes operações a que tem sido applicado o methodo d'Esmarch, não poderia esquecer o emprego, apregoado por Talbot nas hemorrhagias incoer-cíveis, principalmente uterinas, com o intuito de substi-tuir a transfusão. A facha d'Esmarch, applicada nos mem-bros toraxicos e pélvicos, recalcaria o sangue para as ca-vidades esplanchnicas, achando-se assim nas condições quantitativas de entreter a vida.

Este methodo seria superior á transfusão, não só pela simplicidade da applicação, como porque utilisa o próprio sangue do doente, mais benéfico para o seu organismo do que um sangue estranho ; infelizmente tal substituição não pôde vingar porque a compressão prolongada traz comsigo dores insupportaveis, sendo bem depressa necessária a ablação da facha elástica, que reduz o doente ás mesmas condições em que primeiramente estava.

Além de inutil porém, o methodo seria até perigoso, pois que se poderiam formar pequenos coágulos nas veias

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varicosas, determinando a formação de embolias, que de-pois de tirada a facha, iriam provocar a morte, projectan-do-se na artéria pulmonar. Foi o que succedeu a uma mu-lher, atacada de hemorrhagias puerperaes abundantes, que falleceu duas horas depois da applicação da facha elástica que lhe tinha procurado um allivio simplesmente momen-tâneo. Na necropsia verificou-se que os ramos da artéria pulmonar estavam embolisados e que nas varicosidades das saphenas existiam coágulos análogos aos encontrados nas divisões da artéria pulmonar.

Esmarch, n'um dos seus trabalhos, admitte, como uma das preciosas indicações do seu methodo, esta con-centração do sangue nas partes centraes, methodo a que dá o nome de autotransfusão ; pensa que nas hemorrhagias ameaçadoras, recalcando temporariamente o sangue das extremidades, se pode reter a vida prestes a escapar-se. E fácil de vêr, como já mostramos, que tal beneficio é sim-plesmente temporário.

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ACÇÃO DO METHODO D'ESMARCH

O methodo d'Esmarch actua essencialmente por ische-mia. A compressão uniforme da facha elástica desengorgita os tecidos do sangue n'elles contido, e o tubo terminal de caoutchouc impede absolutamente o accesso do sangue arte-rial ; o segmento, sujeito á acção da compressão elástica, fica exsangue como o d'um cadaver; é d'esta acção ische-mica que derivam todas as indicações do methodo de Es-march, as quaes se podem reduzir a três, sendo o methodo utilisado como hemostatico, anesthesico e coagulante.

ACÇÃO HEMOSTATICA E SUAS VANTAGENS

A hémostase perfeita, operada pela compressão elás-tica, tem cirurgicamente um proveito duplo, beneficiando simultaneamente o operador e o operado. As vantagens operatórias são immensas e importantes.

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A região a operar, sujeita á ischemia, não deixa es-capar sangue quando se faz applicação dos ferros cirúrgi-cos. L'on opere, a blanc, como diz Henocque, e o operador desembaraçado do sangue, vendo sem obstáculos o cami-nho a seguir, opéra como n'um cadaver, e não necessita de continuamente se interromper, arredando o bisturi para as esponjas extrahirem o sangue que o embaraça.

Com a compressão elástica dispensa-se mesmo o con-curso de diversos ajudantes, indispensáveis antes do seu emprego ; taes são, os que eram necessários para a com-pressão digital e os que com esponjas desembaraçavam do sangue o campo operatório. O modus faciendi fica assim simplificado, abreviado e menos apparatoso.

Esta simplificação no apparato operatório torna a fa-cha d'Esmarch um recurso preciosíssimo para os cirurgiões que se acham muitas vezes desprovidos de ajudantes exer-citados. Taes são os clínicos das aldeias que muitíssimas vezes não teem para ajudantes senão o barbeiro ou outros de igual competência. A bordo dos navios, o facultativo egualmente folgará com o seu uso, pois que o seu pessoal auxiliar se acha de ordinário reduzido a um simples enfer-meiro. Emfim, até no campo da batalha a facha d'Esmarch é utilíssima, sendo muitas vezes o pessoal cirúrgico apou-cado relativamente á abundância das operações a fazer.

Não podemos também deixar de assignalar as vanta-gens que do novo methodo aufere o clinico principiante, porque como diz Dieffenbach, é o sangue diabólico que faz hesitar o pratico novo diante das operações um pouco im-portantes.

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Esmarch, vindo em seguida as suas preciosíssimas indica-ções nos casos especiaes.

Já mencionamos a facilidade com que a facha de Es-march permitte a exploração da extensão das lesões, per-mittindo muitas vezes a substituição das resecções ás am-putações; indicamos igualmente a sua extrema vantagem em todas as operações longas e minuciosas que exigem uma dissecação delicada; vemol-o egualmente operar mi-lagres na extracção dos corpos estranhos, profundamente enterrados nos tecidos, assim como nas laqueações dos to-pos arteriaes.

Sempre que nos falta um bem é que melhor o reco-nhecemos; é exactamente o que se dá com a compressão elástica, cuja ausência se deplora sempre que temos de operar em regiões onde ella não pôde ser applicada.

Apontaremos, como exemplo, a extirpação dos tumo-res da região cervical, anterior e lateral, onde as relações vasculares e nervosas importantíssimas tornam difficil a ablação do producto neoplasico, não deixando o sangue fa-zer uma dissecção minuciosa, e deixando o cirurgião no receio constante de ferir os órgãos importantes da região. Nas operações da face, o operador vê-se geralmente a bra-ços com as mesmas dificuldades e vimos ainda ha pouco, em clinica cirúrgica, uma resecção parcial do maxillar su-perior para a extracção d'um polypo naso-pharyngeo em que a hemorrhagia abundante demorou e difficultou por extremo a operação. Seria fácil apontar outros tantos casos bastante significativos em que a impossibilidade da appli-cação da facha d'Esmarch é uma verdadeira lacuna a la-mentar.

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Ás vantagens para o operador ha a addicionar immen-sas para o operado. Já fizemos sentir, quam importante era para o doente a economisação do seu sangue, pois que a sua debilitação por uma hemorrhagia abundante, póde-lhe causar as mais tristes consequências, após o traumatismo operatório. Ora, a facha d'Esmarch reduzindo ao seu mí-nimo o escoamento do sangue no acto da operação, per-mitte ao doente a conservação das forças necessárias para a reparação da ferida cirúrgica. A ischemia artificial é as-sim o companheiro do chloroformio ; evita a perda de san-gue, como a anesthesia evita a dôr e concorrem assim si-multaneamente para a conservação das preciosas energias do organismo. Aboliram o antigo rifão operatório cito, tuto et jucunde, não se tornando já tão imperiosa a rapidez na execução operatória, exigida em tempo, já pela dôr, já pela perda de sangue. Se a hemorrhagia é sempre um mal para o doente, muito mais perigoso se torna quando o organismo está enfraquecido pela moléstia; na penúria de forças em que, em taes circumstancias, se encontra o enfermo, a me-nor subtracção de sangue põe-no em risco de vida. Ora é incontestável que toda e qualquer operação hemorrhagica estaria contra indicada, se o methodo d'Esmarch não viesse como valioso auxilio, permittindo-nos a execução opera-tória.

D'esta forma se obtém magníficos resultados, e se teem salvo doentes condemnados a uma morte certa, devido isso á intervenção operatória, permittida pela exsangaificação elástica.

Impedindo a perda de sangue e collocando assim o operado nas melhores condições vitaes, a influencia do

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me-— 43 me-—

thodo d'Esmarch deve reflectir-se forçosamente, tanto na mortalidade dos operados como na apparição dos acciden-tes traumáticos.

Esmarch praticou mais de 200 operações pelo seu methodo, na sua clinica de Kiel, entre as quaes figuram como mais interessantes : 14 amputações de coxa, que de-ram somente um caso de morte; 11 amputações de perna egualmente com um único caso fatal ; 2 desarticulações das cabeças femural e humeral, sendo a primeira seguida de morte, e emfim 8 resecções, três do quadril, três do joelho e duas do cotovello, nas quaes houve somente um caso fatal.

Durante o mesmo lapso de tempo, 226 operações, fei-tas pelo methodo d'Esmarch no hospital de Kiel, deram, segundo Duns, 168 curas completas, 7 casos frustrados e 15 mortes.

Em resumo a mortalidade foi de 11,8 por cento, pro-porção muito inferior a outras estatísticas apresentadas, como são a estatística de Lister 26,3 por cento, a de Eri-chsen 26,3 por cento e a de Wolkmann 28,2 por cento.

Este lisonjeiro resultado é devido á menor frequência e menor intensidade das complicações traumáticas. Produ-ctos de dous factores, o organismo e a acção delecteria do meio externo, as febres cirúrgicas serão tanto mais raras e menos mortíferas, quanto mais enérgica for a vitalidade do operado. Ora, a suppressão da perda sanguínea pelo me-thodo d'Esmarch auxilia poderosamente a resistência do organismo aos agentes perturbadores da reparação. A esta causa addiciona ainda Esmarch a ausência do attrito repeti-do das esponjas, assim como a ausência d'uma compressão

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I

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brusca sobre os grossos troncos vasculares, como acontece na compressão digital e no torniquete.

A ischemia artificial presta o seu contingente para a satisfação do grande desideratum da cirurgia moderna, a diminuição dos accidentes traumáticos e particularmente a da pyoemia. Se é certo, porém, que o methodo do cirur-gião de Kiel rareia as complicações cirúrgicas, está longe de as prevenir completamente como era para desejar. As-signalam-se diversos casos de infecção purulenta e nós já tivemos occasião de observar este anno um, n'uma ampu-tação de coxa, exigida por um sarcoma do terço superior da perna.

Provado que esteja que o methodo de Esmarch dimi-nue ou atténua as diversas complicações traumáticas, não terá elle comsigo accidentes que só na sua applicação se possam filiar? E uma questão delicadíssima para a resolu-ção da qual estamos longe de ter dados sufncientes e que n'um dos próximos paragraphos examinaremos.

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ACÇÃO ANESTHESICA

A todos os grandes inventos se pretende de ordinário assignar mais virtudes do que aquellas que elles realmente possuem ; é o que se deu com a facha d'Esmarch. •

Quando foi descoberta a anesthesia, attribuiram-se ao chloroformio propriedades hemostaticas que elle somente em fraquissimo grau possuia, graças á diminuição na veloci-dade circulatória; ora, da mesma forma teem diversos ope-radores aventado que a compressão elástica, produzindo uma anesthesia local, é capaz de substituir a narcose chlo-roformica. Assim Esmarch n'uma das suas communicações ao congresso de Berlim apresenta, como um dos effeitos mais notáveis da ischemia cirúrgica, a producção da anes-thesia nas partes comprehendidas abaixo da ligadura. Esta anesthesia, embora incompleta, combinada com a pulveri-sação do ether poderia ser applicada ás pequenas opera-ções. Cita um caso de Stoks que conseguiu extrahir um cancroide da mão sem que o doente nada tivesse sentido. Este entorpecimento da sensibilidade tem sido objecto de variadíssimas experiências e de diversas opiniões.

Emquanto que Jeversen, instituindo uma série de ex-periências, concluia pela anesthesia, Fischer declara nunca a ter observado, mesmo fazendo persistir a ischemia no homem, durante 30 a 45 minutos.

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É egualmente esta a opinião de Gayet que não espe-ra do methodo d'Esmarch a menor anesthesia local, facto demonstrativo de que os conductores nervosos, embora pri-vados de sangue, continuam a funccionar, ao inverso dos centros nervosos, cuja ischemia arrasta consequências ful-minantes pela sua promptidão e gravidade.

Laborde e Morél pretenderam decidir a questão, á luz das experiências feitas sobre o coelho com a facha elástica; verificaram assim que, nos primeiros três minu-tos, ha uma anesthesia completa, podendo-se pinçar e picar a pata do animal sem o menor indicio de soflrimento.

A sensibilidade torna-se porém bem depressa normal, para ser substituída emfim por uma hyperesthesia consi-derável. Com estas variações de sensibilidade coincidiriam differenças de temperatura, que, diminuida de 4 ou 5o,

durante o período anesthesico, se tornaria em seguida nor-mal, para attingir finalmente um augmento d'um a dous graus, durante a phase hyperesthesia.

De taes experiências concluíram os dous experimen-tadores que a compressão elástica poderia ser utilisada, como anesthesico local, para executar operações rápidas, embora muito dolorosas.

Após a apresentação d'estes resultados á sociedade de biologia, Krishaber contestou immediatamente taes conclu-sões, baseando-se sobre experiências feitas no laboratório de Cl. Bernard. Admitte que a sensibilidade varia, conforme o grau de compressão; a compressão moderada é incapaz de extinguir a sensibilidade, o que somente pode obter-se por uma compressão extremamente enérgica. Esta insen-sibilidade em vez de ser um effeito precoce é pelo

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contra-— 47 contra-—

rio um effeito tardio, sendo a conductibilidade motriz a primeira que desapparece. Emquanto ás applicações clini-cas, Krishaber entende que para obter a insensibilidade é necessário exercer uma compressão de tal ordem que além de perigosa, provocaria uma dor superior á da operação. Pronuncia-se pois contra a utilisação prática no homem da insensibilidade obtida pela compressão elástica.

Seguem-se, por ordem de data, as experiências de Chaunel que foram feitas no homem. Observou que a anes-thesia longe de ser immediata somente se estabelece, pas-sados quinze ou vinte minutos, accentuando-se sobretudo nas extremidades e diminuindo successivamente para a raiz do membro. Esta insensibilidade é superficial e incom-pleta, nunca total nem profunda.

Apresenta dous casos clinicos da extirpação da unha encravada sem determinar dor pela applicação da facha d'Esmarch; n'um d'elles foi possivel sem soffrimento cau-terizar a matriz da unha, durante doze minutos com a pas-ta de Vienna. Conclue das suas observações e experiências que a compressão d'Esmarch, só pôde ser aproveitada como meio anesthesico para as operações superficiaes e rápidas. A memoria de Chaunel teve como relator Lannlongue que deu o seu assentimento á maxima parte das suas con-clusões.

Leon Le Fort fez por esta occasião sentir a sua opi-nião sobre tal questão. Declara ter executado uma resec-ção do cotovello e uma amputaresec-ção da perna sem chloro-formisação e sem que a dor afHigisse os enfermos, permit-tindo-lhes o fallar e beber durante a operação. Estes re-sultados porém não podem conseguir-se, senão com uma

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compressão enérgica, o que está longe de ser conveniente. Praticamente pois, entende que, sempre que se possa dar chloroformio, se não deve recorrer ás virtudes anesthesicas do methodo d'Esmarch.

Mas nos doentes debilitados ou affectados de lesões que façam receiar a syncope, deve substituir-se o chloro-formio pela insensibilidade obtida pela compressão elástica.

No meio d'esta amalgama de experiências e opiniões contradictorias, é difficil dar uma solução definitiva á ques-tão proposta ; no entanto, apresentaremos o parecer que julgamos mais rasoavel.

Praticar uma operação, diz Lannlongue, sem enfraque-cer por uma perda de sangue a saúde do paciente e tornar esta parte fria e insensivel, seria realisar um grande pro-.gresso cirúrgico. São porém muitas vantagens reunidas e

não poderão ser de certo simultaneamente utilisadas. Terá realmente o methodo d'Esmarch uma acção anesthesica?

Quando uma embolia se estabelece n'uma artéria e a circulação fica interrompida, no seu districto de distribui-ção apparece a frialdade e a insensibilidade. Baseando-nos n'este facto, deveremos concluir que uma ischemia perfeita deve trazer comsigo uma insensibilidade completa. Consideramos, portanto, uma compressão enérgica, exercida pela facha elástica, como capaz de exercer uma anesthesia local, quasi que completa. A compressão moderada, essa não teria a menor acção para abolir a sensibilidade.

Mas dever-se-ha exercer uma compressão enérgica com a facha d'Esmarch?

Não. l.° Porque a anesthesia local assim obtida é compensada por uma dor extrema no ponto em que se fixa

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o laço constrictor. 2.° Porque é perigosa, determinando, por paralysias vasculares, hemorrhagias secundarias que constituem um dos principaes defeitos apontados hoje á is-chemia artificial.

Concluímos pois que o methodo d'Esmarch não pode resolver o problema cirúrgico da anesthesia local e que não pode nem deve ser empregado como agente de

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ACÇÃO COAGULANTE

O tratamento das hemorrhagias e o tratamento dos aneurismas são dous capítulos de therapeutica cirúrgica que intimamente se relacionam. Servimo-nos reciproca-mente dos mesmas meios e tal communídade de processos se observa desde o agarico de carvalho até ao perchloreto de ferro, desde a laqueação até á compressão. Esta iden-tidade de methodos thorapeuticos que a historia nos re-vela, tornando solidários os progressos da hemostatica e os da therapeutica dos aneurismas, tem talvez a sua ra-são de ser nos laços Íntimos que prendem estes dous es-tados mórbidos. Na hemorrhagia como no aneurisma, ha sangue desviado do curso normal da circulação; o derra-mamento de sangue é a phase incipiente da maior parte dos aneurismas; o é emfim a hemorrhagia o modo ordi-nário da sua terminação fatal. Todavia, além das suas relações pathogenicas ha ainda as mais intimas relações therapeuticas; effectivamente o que se pretende no trata-mento das hemorrhagias, é a formação d'um coagulo, e não é este também o desideratum no tratamento dos aneu-rismas?

A esta lei, que baseada na pathogenia, na therapeu-tica e na historia, subordina á evolução da hemostatherapeu-tica os progressos da therapeutica dos aneurismas, não podia

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eximir-se o methodo d'Esmarch. Era forçoso que, assim como todos os methodos de hemostatica tinham sido ap-plicados á cura das lezões aneurismaes, a ischemia arti-ficial devia também prestar o seu contingente a este ramo da therapeutica cirúrgica. Foi effectivamente o que se deu e o nosso trabalho seria incompleto, se deixássemos de apreciar esta face da compressão elástica, que não é de certo uma das menos notáveis por que pôde ser enca-rado o methodo de Esmarch.

Do mesmo modo que a ischemia cirúrgica teve no campo da hemostatica methodos que se podem considerar como antecessores, assim no campo da therapeutica dos aneurismas não lhe faltam precedentes históricos.

Podem effectivamente approximar-se do methodo de Esmarch as primeiras tentativas da applieação da com-pressão ao tratamento dos aneurismas ; taes são os metho-dos históricos de Genga e Guattani applicametho-dos nos fins do século 17.° e principio do 18.°.

Genga, para as feridas da artéria humeral na flexura do cotovelo, applicava uma ligadura, desde os dedos até á flexura, onde comprimia a artéria ao nivel da ferida com um volumoso tampão; a partir d'esté ponto a atadura passava por cima de um páu cylindrico, applicado sobre todo o trajecto da artéria humerai. A parte inferior d'esta atadura era destinada a impedir a tumefacção da mão e do antebraço, a parte média exercia sobre a ferida uma compressão directa, e emfim a parte superior ou brachial moderava a velocidade da corrente sanguínea na artéria lesada.

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arte— 52

-riaes dos membros, entrou no campo da.therapeutica dos aneurismas como meio complementar, na operação da abertura do sacco, para diminuir o choque sobre a liga-dura superior; mas d'esté logar modesto e accessorio não tardou a elevar-se ao desempenho do papel capital na cura dos aneurismas.

Foi Guattani quem teve e mérito de introduzir a compressão arterial total, na pratica cirúrgica. N'um caso de aneurisma da poplitea, o cirurgião italiano applicou uma atadura, desde os dedos até á flexura do joelho, a partir da qual passava sobre uma almofada comprida o estreita, estendida ao longo da artéria crural até á virilha. O fim principal do seu methodo compressor era curar o aneurisma, não obliterando a artéria lesada, mas sim re-tardando o curso do sangue no vaso comprimido. Obtido um primeiro successo, Guattani utilisou-se do seu me-thodo em différentes casos, mas, apezar da efficacia dos resultados nunca vistos até então no tratamento dos aneu-rismas, Guattani não conseguiu elevar o seu processo á altura d'uma prática cirúrgica ordinária. A lentidão extrema do tratamento, a obrigação imposta aos doentes de estarem na cama, e as dores excessivas da compressão foram as causas de tal indifferença; mas quem principal-mente tolheu o passo á evolução do methodo de Guattani, foi Hunter que, generalisando e fecundando o methodo de Anel, instituía um methodo operatório poderoso e feliz para o tratamento dos aneurismas.

A compressão indirecta da artéria lesada foi assim esquecida, porém mais tarde foi chamada outra vez á prática cirúrgica, para ser no presente século rehabilitada

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pelos cirurgiões hollandezes e principalmente por Bellin-gham, de que se fez echo em França o illustre Broca. Esta restauração todavia rompia com as tradições do me-thodo primitivo, exercendo-se somente a compressão em um ponto limitado da artéria. Ao methodo d'Esmarch coube, reiterando as tentativas de Guattani, exercer a compressão em toda a extensão do vaso affectado de aneurisma.

O ponto commum que prende os methodos d'Esmarch e de Guattani e que nol-os permittiu enlaçar historica-mente, é precisamente o enfraquecimento circulatório, ob-tido pela compressão em toda a extensão da artéria acima do sacco aneurismal ; afora porém esta analogia profunda, em différentes pontos se dessemelham. A compressão de Guattani actuava directamente sobre o tumor, ao passo que a compressão elástica procura evital-o; na primeira o sangue continua a circular no segmento do membro infra aneurismal, ao passo que na segunda, fica n'esse segmen-to do membro completamente interrompida a circulação. Emfim, a applicação de uma facha elástica e de um tor-niquete, terminam as dessemilhanças dos dous modos ope-ratórios.

Pondo ponto n'estas observações históricas, que mui a propósito vinham, vejamos que papel tem representado o novo methodo d'Esmarch no tratamento dos aneuris-mas.

O primeiro logar, concedido á ischemia artificial n'este ramo da therapeutica, foi puramente accessorio e secundário. Esmarch e Gayet pretenderam fazer reviver o antigo methodo de Antyllo por meio da compressão

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elas-— 54 elas-—

tica. O methodo antigo estava, como se sabe, proscripto completamente do tratamento dos aneurismas, e somente era ainda utilisado para os pequenos aneurismas traumá-ticos da radial ou cubital, e para os arterio-venozos da flexura do cotovelo. Este ostracismo era devido á difi-culdade da operação, na qual constantemente surgiam ac-cidentes imprevistos entre os quaes avultam, a difficuldade de introduzir o estylete no canal da artéria, e a hemor-rhagia proveniente de collateraes abertas no sacco. Estas complicações operatórias eram essencialmente devidas ao sangue derramado; ora, o methodo d'Ësmarch, ischemiando o membro, tornava o methodo da abertura do sacco per-feitamente simples e fácil. Tal era o raciocinio invocado por Esmarch e Gayet, insufficiente porém para rehabilitar o velho tratamento dos aneurismas. Os perigos operatórios immédiates não são os únicos defeitos do methodo antigo; ha inconvenientes consecutivos muito mais graves e esses não os previne a compressão elástica. Após a operação, sobrevem de ordinário, violentas dores, névrites, hemorrha-gias consecutivas, phlegmões diffusos violentos, suppura-ções abundantes e algumas vezes mesmo o esphacelo do membro. Taes complicações proscrevem absolutamente o methodo de Antyllo sem que a ischemia artificial possa annullar tal veredictum.

A um outro methodo operatório veio porém bem de-pressa prestar os seus auxílios o methodo de Esmarch ; quero referir-me á laqueação singularmente simplificada pelo emprego da compressão elástica, como o demonstra-ram frisantemente dous casos, cominunicados, um por Vallerani, e outro por Leisrink. No facto apresentado por

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Vallerani, tratava-se de um aneurisma da poplitea, no qual a compressão digital não tinha dado resultados, em virtude da intolerância do doente e da insufficiencia do pessoal. Estava pois indicada a laqueação que foi prati-cada no vértice do triangulo de Scarpa e consideravel-mente facilitada pela applicação da facha d'Ësmarch, que permittiu achar facilmente atravez de tecidos exsangues, a artéria profundamente occulta em camadas de tecido adiposo.

O caso de Leisrink é muito curioso e notável; no momento em que este cirurgião auscultava um aneurisma diffuso da tibial anterior, o sacco rompeu-se, sob a influen-cia da pressão. Applicou-se immediatamente a facha de Esmarch, e a laqueação pôde ser feita, com a maxima fa-cilidade, apezar da profundidade e da estreiteza do espaço.

Estes dois factos patenteiam quanto a compressão elástica beneficia o methodo da laqueação; e principalmente nos casos extremos, em que o único recurso duvidoso seria a amputação, a ischemia cirúrgica se transforma n'uma verdadeira taboa de salvação.

Até aqui o methodo d'Esmarch desempenha, como se vê, simplesmente um papel accessorio; é um mero auxiliar dos outros processos therapeuticos dos aneurismas. O seu campo de applicação, porém, não podia ficar de tal modo restricto; a ischemia artificial tomou em breve um logar importante e elevado na therapeutica dos aneurismas.

Esta revolução foi operada em Inglaterra por diffé-rentes cirurgiões á frente dos quaes se encontra Walter Reid. Reid, n'um caso de aneurisma popliteo, applicou a facha elástica, desde o pé até á flexura do joelho, passou

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levemente sobre o tumor e terminou a applicação na raiz da coxa, ao fim de uma hora tirou a facha elástica, appli-cando um torniquete sobre a femural, durante doze horas; o tumor cessou de bater ao fim de sessenta minutos e a cura foi completa.

Wagstaffe e Heath obtiveram dous resultados egual-mente favoráveis, operando da mesma forma. A facha de Esmarch mantivera-se durante uma hora e o torniquete sete horas e meia no primeiro caso e cinco no segundo. Em ambas as operaçSes o aneurisma, respectivamente ao fim de duas horas para o primeiro e uma para o segundo, es-tava duro e sem pulsações, diminuindo rapidamente de vo-lume.

Thomas Smith serviu-se do mesmo methodo para um caso idêntico. Applicou a facha elástica até ao joelho, apertando moderadamente, deteve-se um pouco até que o sacco estivesse bem cheio de sangue e em seguida deixan-do o tumor a descuberto continuou até á virilha, onde o tubo elástico foi applicado, para deter completamente a circulação. Meia hora depois tinha de chloroformisar o doente por causa das dores e ao fim de uma hora foi ti-rada a facha elástica, ficando applicado um torniquete so-bre a femural, durante duas horas; o aneurisma tinha-se solidificado e diminuído de volume, as pulsações desappa-receram ao fim de três horas, e o doente sahiu completa-mente curado.

Em seguida vieram três casos mal succedidos, dous de Bradley e outro de Smith, que foram attribuidos a imper-feições do methodo operatório.

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a registrar-se. Tyrell applicou n'um aneurisma popliteo a facha elástica, apertando fortemente desde os dedos até ao tumor, e continuando em seguida até á virilha onde foi collocado o annel elástico. Em virtude de dores vivissimas, ao fim de 50 minutos foi tirada a facha, fazendo-se du-rante duas horas compressão sobre a femural, já com os dedos, j á com o torniquete; o membro conservou-se ele-vado e ao outro dia o tumor estava duro, diminuindo de volume e sem pulsações.

Wrigth obteve egualmente bom resultado em um aneu-risma, situado proximo do annel dos adductores. Tendo tentado inutilmente a compressão mechanica, applicou a facha elástica que manteve durante três horas, deixou em seguida um sacco de chumbo sobre a femural, durante 21 horas, pouco mais ou menos, ao fim das quaes o tumor ap-pareceu sem pulsações nenhumas, que tornaram porém a apparecer, dissipando-se em breve.

Cornisk obteve a cura rápida de um aneurisma da tibial anterior, desenvolvido consecutivamente a um trau-matismo e situado profundamente entre os músculos. Ap-plicou-se a facha d'Esmarch, mas, ao fim de 40 minutos foi necessário, por causa das dores, tirar o tubo constri-ctor, e substituil-o por um torniquete durante três horas, mantendo-se uma compressa sobre a femural durante as quatro horas seguintes. O tumor diminuiu gradualmente e três semanas depois o doente sahia do hospital perfeita-mente curado.

Recentemente tornou-se a registrar outro caso frus-trado; trata-se de um aneurisma da poplitea, sujeito por três vezes successivas ao methodo d'Esmarch, sem se obter

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-o men-or resultad-o. Pel-o c-ontrari-o, -o tum-or augmentava cada vez mais, e ia amollecendo em certos pontos com pul-sações violentas; o único meio, foi fazer a laqueação da femural.

Eis os casos de que tenho conhecimento mais minu-cioso. Como se deprehende da sua exposição, este methodo applicado até agora, quasi exclusivamente, ao aneurisma da poplitea, pôde reduzir-se ao seguinte : a facha é enro-lada desde os artelhos até ao sacco, e ahi ou se passa le-vemente sobre o aneurisma ou se deixa este a descuberto, continuando-se em seguida a applicaçâo até á virilha onde se colloca o tubo constrictor. Mantem-se a facha pouco mais ou menos durante uma hora, podendo recorrer-se á chloroformisação ; passado este lapso de tempo tira-se, comprimindo a femural, ordinariamente por meio d'um tor-niquete até que as pulsações desappareçam.

Como é que tal processo determina a coagulação do sangue no sacco? Largo espaço oceupariamos e excedería-mos o nosso programma se fosseexcedería-mos discutir agora as dif-férentes theorias emittidas para explicar a formação do coagulo aneurismal. Não se tem ainda derramado a luz sufficiente sobre tão importante ponto da physiologia pa-thologica, que nos deixa sem dados precisos que segura-mente appliquemos ao caso presente. As duas theorias mais notáveis a de Richet e Lefort podem em todo o caso dar-nos algumas presumpções sobre o modo porque o methodo d'Esmarch provoca a coagulação aneurismal. A facha elás-tica suspende completamente a circulação e o sangue esta-gnado no sacco é obrigado a coagular-se em massa; ora, este coalho tornar-se-hia estável por uma inflammação

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si va que o prendesse ás paredes do sacco e aos topos ar-teriaes. Eis como a theoria de Richet daria a razão do facto; todavia a de Lefort não deixa de ser applicavel e coadunavel com os factos apresentados. O coagulo molle, uma vez formado, ir-se-hia desfazendo pouco e pouco da sua serosidade e dos seus glóbulos rubros, sob a influencia da corrente arterial enfraquecida, graças á applicação do torniquete, e assim reduzido ao estado do coagulo duro tor-naria a cura solida e persistente.

Seja porém qual for a interpretação physiologica, o que sobretudo nos interessa é o valor clinico. Será o me-thodo d'Esmarch, como se disse, um meio que cure os aneurismas com a precisão de uma experiência de pbisica? A affirmativa de tal proposição seria uma presumpção au-daciosa e injustificável. Todas as descubertas que se teem feito no tratamento dos aneurismas teem sido sempre acom-panhadas de elogios d'esta ordem, para dentro em pouco a clinica lhes estabelecer a fallibilidade.

O methodo do cirurgião de Kiel não escapa a esta lei, tanto mais que já foram registrados diversos maus êxitos. Tem-se procurado desculpal-os attribuindo-os a defei-tos operatórios.

Uns, como Smith, dizem que se não suspendeu com-pletamente a circulação no membro durante o tempo sufi-ciente ; outros, como Gould, affirmam que se comprimiu a artéria de maneira que o coagulo formado no sacco não pôde estender-se á artéria, condição que, segundo elle, se-ria essencial para o bom resultado. Ora, emquanto á pri-meira theoria, é fácil de vêr que, nos casos apontados, o apparelho esteve applicado mais tempo ainda do que

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quelles em que a cura se operou. A segunda theoria é egual-raente insustentável, pois que a embocadura da artéria no sacco fica sempre completamente livre. O que me parece poder-se deduzir com toda a justiça é que o methodo de Esmarch é tão fallivel como os outros meios de tratamento dos aneurismas.

Ultimamente mesmo tem-se levantado os mais vigo-rosos ataques contra o methodo em questão, e creio serem as objecções de tal alcance que em fevereiro d'este anno Esmarch se viu obrigado a abandonar o seu methodo na cura dos aneurismas, substituindo-o pela compressão da ar-téria por meio d'um pequeno cylindro da grossura de um dedo, processo do qual diz ter colhido os melhores resul-tados.

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INCONVENIENTES DO METHODO D'ESMARCH

Toda a medalha tem o seu reverso, e á ischemia ci-rúrgica não faltam desvantagens. Esta questão dos defei-tos do methodo d'Esmarch é actualmente ainda difficil de decidir. Pesar equitativa e imparcialmente as suas vanta-gens e inconvenientes, assignar devidamente o lugar que cabe á ischemia artificial na prática cirúrgica, é tarefa que hoje se não pôde fielmente cumprir e que só o tempo faci-litará.

Os inconvenientes do methodo d'Esmarch podem-se dividir em dois grupos: 1.° Inconvenientes que são inhé-rentes á lesão; 2.° Inconvenientes que são inhéinhé-rentes ao pró-prio methodo.

l.° Inconvenientes inhérentes á lesão.—A natureza da lesão obsta em muitos casos a que a compressão elástica possa ser utilisada.

Já Esmarch, nas suas primeiras communicações, tinha prevenido que se renunciasse á ischemia nas partes infil-tradas de líquidos ichorosos. É effectivamente de receiar em taes casos, que os humores saniosos, impellidos para a torrente sanguinea ou lymphatica, vão provocar a explosão da infecção purulenta. Os próprios coágulos poderiam ser causa de estragos, tornando-se causa de embolias, quando fossem, expulsos das veias obliteradas.

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Verneuil faz egualmente observar que será conve-niente a abstenção nas fracturas complicadas de inflamma-ções vivas, ou de osteo-periostites agudas; n'este caso as veias estão cheias de coágulos moveis em via de suppura-ção ou embebidos de líquidos sépticos. No esmagamento dos membros pelas rodas de carruagem ou por grandes projectís, estaria da mesma forma contra-indicado o me-thodo d'Esmarch.

Propõe o illustre cirurgião de Kiel, para taes casos, que se modifique o seu methodo, de forma a tornai-o ap* plicavel. Supprime a facha elástica, e limita-se a levantar o membro para o exsangaificar o mais possivel, applicando em seguida o tubo de caoutchouc para impedir o accesso do sangue.

2.° Inconvenientes inhérentes á compressão elástica.— Para o final deixamos a questão das desvantagens proprias do methodo d'Esmarch, questão que, como já tivemos oc-casiao de dizer, é d'uma difficuldade extrema. Não possuí-mos ainda os dados essenciaes do problema cuja solução nos permittirá fixar com precisão o logar da ischemia arti-ficial na hémostase preventiva.

Com receio vamos pizar tão escorregadio terreno; no entanto offereceremos os resultados que as nossas poucas forças nos permittiram attingir.

Os inconvenientes até agora apontados, do methodo • d'Esmarch derivam da acção mechanica por elle exercida, já sobre a circulação, já sobre a innervação; como porém estas duas modalidades funccionaes se interlaçam, é muito difficil descriminar dos accidentes, attribuidos á compres-são elástica, quaes os que dependem immediatamente da

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circulação e quaes os que se filiam nas perturbações ner-vosas. Procurando subtrahir-nos a esta difficuldade, ana-lysemos methodicamente os efFeitos que o methodo de Es-march pôde exercer sobre a vascularisação e innervação, com o fim de deduzirmos d'elles os accidentes que a clinica tem indicado.

O methodo d'Esmarch, recalcando o sangue da parte comprimida para a circulação geral, produz no segmento operado, carência de sangue, e nas restantes partes do or-ganismo maior abundância do mesmo liquido. Ha pois dois effeitos inversos sobre a circulação ; uma ischemia local e uma plethora geral. D'estas duas modificações circulatórias se podem deduzir accidentes do methodo d'Esmarch.

A superabundância sanguínea é principalmente accu-sada, quando se subtraia á circulação geral uma parte con-siderável, um membro por exemplo.

Poderá imputar-se a esta plethora algum inconve-niente? É pelo menos a opinião de um cirurgião italiano, Grandesso Silvestri, que d'esté facto faz depender gran-díssimos perigos; pensa em primeiro logar que este exa-gero na massa sanguínea tem uma grande influencia sobre o estado local da ferida operatória, perturbando-lhe a mar-cha por congestões locaes, abcessos e suppurações demo-radas; em segundo logar uma acção accéléra dora sobre as reincidências, quando a operação foi provocada por mani-festações locaes d'uma moléstia diathesica, como a escro-fulose e a carcinose. Obstáculo a uma reparação rápida e estimulo de novas lesões orgânicas, os efFeitos da ischemia artificial devem ser, segundo Silvestri, prevenidos n'estes casos, por intermédio de depleções sanguíneas locaes ou

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