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Tombamento como instrumento de preservação ao patrimônio cultural, política urbana e política cultural.

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PRESERVAçãO AO PATRIMÔNIO CULTURAL, POLÍTICA

URBANA E POLÍTICA CULTURAL

TIPPING AS A MEANS OF PRESERVING THE HERITAGE,

URBAN POLICY AND CULTURAL POLICY

ALESSANDRA MARA DE FREITAS SILVA1 JESMAR CéSAR DA SILVA2

RESUMO

O presente artigo busca analisar o instituto do tombamento a partir do texto constitucional, que o define como um dos instrumentos que deve ser utilizado para promover e proteger o patrimônio cultural. Será analisada a questão da promoção do patrimônio cultural a partir do tombamento, no sen-tido de se utilizar o patrimônio tombado para melhorar e promover o meio ambiente urbano e cultural e, por consequência, a educação e o implemento de uma efetiva política cultural. Apontaremos algumas diretrizes para que o Tombamento atenda seu fim através de três vertentes, bem como sua defini-ção, sua utilização como política pública e sua relação com os particulares. Por fim, o texto busca mostrar a relação do tombamento como planejamen-to urbano e sua importância ressaltada no texplanejamen-to constitucional através das emenda nº 48 de 2005 e nº 71 de 2012, que trazem a previsão do planejamento cultural através do Plano Nacional de Cultura.

1 Mestre em Instituições Sociais, Direito e Democracia pela Universidade FUMEC. Graduada em Direito pela Faculdade Milton Campos. MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas e LLM em Direito pela Fundação Getúlio Vargas. Professora de Direito Administrativo, Deontologia Jurídica, Ética e Prática Jurídica. Coordenadora do Curso de Direito do Centro Universitário UNA Belo Horizonte/Contagem. Professora de Direito Administrativo do Curso MERITUS ON LINE. Professora de Pós Graduação na Estácio de Sá, IUNIB e diversos cursos para Concursos Públicos. Professora da Escola de Formação de Soldados da Polícia Militar de Minas Gerais. Advogada Associada no Escritório de Advocacia Ananias Junqueira Ferraz e Relatora da Comissão de Ética da Ordem dos Advogados do Brasil. Tem experiência na área de Ciência Política, com ênfase em Direito Constitucional e Direito Administrativo.

2 Advogado militante, mestrando em Direito Público PUC MG, Pesquisador do NUJUP e Secretário Geral da OAB Contagem.

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Palavras-chave: meio ambiente; proteção; cultura.

ABSTRACT

This article seeks to analyze the institution of tipping from the Constitution, which defines it as an instrument that should be used to promote and protect cultural heritage. The question of the promotion of cultural heritage will be analyzed from tipping in the direction of using the equity tumbled to enhance and promote urban and cultural environment and, consequently, education and implement an effective cultural policy. Consider some guidelines for the Tipping meets its end through three strands, as well as its definition, its use as a public policy and its relationship with the individual. Finally, it attempts to show the relationship of tipping as urban planning and its importance emphasized in the constitution through the 48th amendment No. 2005 and No. 71 of 2012, brin-ging the prediction of cultural planning through the National Culture Plan.

Keywords: environment; protection; culture.

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo busca analisar o instituto do tombamento a partir do texto constitucional, que traz expresso que o tombamento é um dos instru-mentos que deve ser utilizado para promover e proteger o patrimônio cultural.

Primeiramente serão expostas a definição e utilidade do Tombamento tendo por base a legislação brasileira. Em seguida, serão analisados os crité-rios para o Tombamento. Não será objeto do nosso estudo os procedimentos para que o mesmo seja constituído.

Ainda, será explicitada a questão da promoção do patrimônio cultural a partir do tombamento, no sentido de se utilizar o patrimônio tombado para melhorar e promover o meio ambiente urbano e cultural e, por consequência, a educação e o implemento de uma efetiva política cultural.

Abordaremos a acepção do Tombamento como Política Pública bem como sua relação com o particular.

Por fim, o texto buscará mostrar a relação do tombamento como plane-jamento urbano e sua importância ressaltada no texto constitucional através da emenda nº 48 de 2005 e emenda nº 71 de 2012, que trazem a previsão do planejamento cultural através do Plano Nacional de Cultura.

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2. DEFINIÇÃO E UTILIDADE DO TOMBAMENTO

O artigo 216 da Constituição Federal Brasileira define expressamente o que é patrimônio cultural brasileiro:

Os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se in-cluem as formas de expressão; os modos de criar, fazer e viver; as criações científicas, artísticas e tecnológicas; as obras, objetos, documentos, edifi-cações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. (BRASIL, 2014).

As formas de proteção à cultura estão divididas entre os particulares e o poder público que deverá, com a colaboração da comunidade, promover e proteger o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, regis-tros, vigilância, tombamento, desapropriação e de outras formas de acaute-lamento e preservação, podendo ser acrescentados todos os meios possíveis de proteção e preservação da Cultura, desde que em harmonia com o texto constitucional.

O Decreto-lei 25 de 30 de novembro de 1937 prevê que o patrimônio histórico e artístico nacional é constituído de bens móveis e imóveis, parti-culares ou públicos, vinculados a fatos memoráveis da história do Brasil e bens de excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico, sendo de interesse nacional sua conservação.

Destaca-se ainda que os monumentos naturais de feição notável que te-nham sido dotados pela natureza ou gerados pela indústria humana devem ser lançados nos livros tombos e em nenhum caso, podem ser destruídos, demo-lidos ou mutilados, sem prévia autorização especial do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

Considerando que a norma constitucional recepcionou o decreto 25/37, fica claro que o respeito à diversidade, aos meios de vida dos povos repre-senta valor para sociedade que o rodeia; o que se produz e se produziu e teve impacto na vivência histórica de cada indivíduo com relevância emocional ou técnica artística, valorizando a coletividade o saber e o sentir coletivo; é classificado como Patrimônio Cultural.

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Nos dizeres de Carlos Magno de Souza Paiva:

[...] a tutela jurídica de um bem cultural deve atender a um biônimo fun-damental que deve ser considerado ao se adotar quaisquer das medidas públicas de salvaguarda: relevância e reciprocidade coletiva. Justamente por que o papel que o Patrimônio Cultural deveria exercer, enquanto elemento reflexivo de um povo, hoje, não pode estar subjugado pela im-portância tecnocentrista. (PAIVA, 2011, p. 5).

Fica claro que o Patrimônio Cultural não se limita ao listado através de caráter técnico pelos historiadores, antropólogos, arqueólogos ou críti-cos de arte, mas também decorre da vontade do povo em querer protegê-lo. O tombamento é procedimento administrativo conduzido pelo executivo na esfera da administração pública (Municipal, Estadual ou Federal), pos-sibilitando a manifestação do proprietário do bem tombado, a avaliação técnica do órgão competente, seguida da participação da sociedade por meio de seus representantes no conselho deliberativo específico do local do bem tombado.

O texto constitucional traz expresso que o tombamento é um dos ins-trumentos que devem ser utilizados para promover e proteger o patrimônio cultural. Ao interpretar e aplicar a lei no que tange ao tombamento deve-se observar o decreto 25/37 no que não for contrário a Constituição Federal.

Ressalta-se que proteger não é parar o bem no tempo, muito embora o decreto mencione que em nenhum caso o bem poderá ser destruído, demo-lido ou mutilado, sem prévia autorização especial do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. A Constituição Federal de 1988 traz clara a questão da promoção do patrimônio cultural, que não tem apenas o caráter de monumentalidade e de excepcionalidade trazido no decreto.

O procedimento do tombamento pode ser via judicial ou legislativa, ou ainda através do MP ou da sociedade civil. Porém tais procedimentos não terão aprofundamentos no presente artigo, o que se ressaltará é que patrimô-nio cultural deve ser promovido, no sentido utilizá-lo para melhorar e pro-mover o meio ambiente urbano e cultural e por consequência a educação e o bem estar da população.

Merece destaque que o Estatuto da Cidade, no seu art.4°, lista os ins-trumentos jurídicos do planejamento urbano e refere-se expressamente ao “tombamento de bens imóveis ou de mobiliário urbano” (inc. V, alínea d). O

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tombamento é aí referido junto com outros institutos jurídicos, listados nas várias alíneas dos seis incisos do referido art.4°, objetivando, simplesmente, exemplificar os vários instrumentos que podem ser usados na gestão do pla-nejamento urbano³.

Se não bastasse o tombamento ter sido incluído no Estatuto da Cidade como instrumento de planejamento urbano, o texto constitucional através da emenda nº 48 de 2005 traz a previsão do planejamento cultural através do Plano Nacional de Cultura. O referido instrumento foi fortalecido com a emenda 71 de 2012, com o objetivo de incentivar o desenvolvimento cultural do País e a integração do poder público.

Busca-se através do expresso no texto Constitucional articular uma Política Pública financeira para a defesa e valorização do patrimônio cultural brasileiro; produção, promoção e difusão de bens culturais, formação de pes-soal qualificado para a gestão da cultura em suas múltiplas dimensões e; por fim, a democratização do acesso aos bens de cultura. O texto constitucional traz todas as normas estruturantes do sistema de implementação das políticas culturais, devendo as políticas culturais observarem tais premissas para serem efetivamente implementadas nos termos do texto constitucional. Assim, fica claro que o tombamento por ser instrumento de promoção de cultura e por estar integrado através do texto constitucional ao sistema Nacional de cultu-ral, é instrumento também de política cultural.

Assim, definindo tombamento, entendemos que temos que romper a visão do tombamento como limitação de direito de propriedade; trata-se de instrumento de proteção e promoção ao patrimônio cultural, urbanização das cidades e dinamização de políticas³.

Lei 10.257, de 10 de julho de 2001, conhecida com Estatuto da Cidade, regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências culturais, que busca tornar o patrimônio ambiental urbano tombado um instrumento que pode ser utili-zado nas esferas estaduais, municipais e federais para desenvolvimento social. Merece destaque que a municipalidade origem do tombamento deve ser valorizada e dada um especial importância face a regionalidade dos valores culturais.

Outrossim, nos casos em que a norma ativa federal ou estadual for com-patível com as normas municipais, ambas devem ser aplicadas, por exemplo, se a norma municipal for mais restritiva do que a federal (ou estadual), no sentido de trazer maiores cuidados ao bem tombado, aquela será aplicável.

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3. CRITÉRIOS PARA O TOMBAMENTO

Conforme exposto, o Tombamento é instituto de preservação ao patri-mônio cultural, política urbana e política cultural, assim, quando este instituto for utilizado é devemos ter em mente a viabilidade do atendimento dessas três vertentes. Sem ter a pretensão de esgotar o assunto, traçaremos aqui algumas diretrizes para que o Tombamento atenda seu fim.

O diálogo na produção do tombamento é importantíssimo, de nada adianta a Administração Pública vir através de ato unilateral determinar o tombamento do bem. É necessário que os cidadãos locais sejam atores prin-cipais nesse processo e reconheçam o bem como passível de tombamento. Conforme dito, o caráter de monumentalidade e excepcionalidade do bem, não significa o sucesso do tombamento no sentido da promoção do patrimô-nio cultural.

O bem pode ter monumentalidade, mas sem o envolvimento da socieda-de, isso pode significar seu definhamento e não promover políticas urbanas e culturais. Quanto mais o bem tombado encontrar-se inserido em uma política cultural e urbana, mais ele será valorizado, visto, respeitado e poderá inclusive dar retorno financeiro a população do entorno, sendo que no caso de bem particular o retorno financeiro é direito do seu proprietário. Núcleos urbanos são organismos dinâmicos e complexos, o acervo cultural preservado pode abrir possibilidades econômicas de desenvolvimento e indicar alternativas de sustentabilidade local.

Assim, se o bem tiver apenas o caráter de monumentalidade ou excep-cionalidade não será suficiente para o sucesso do tombamento, tem que haver em conjunto ações públicas e privadas que valorizem o planejamento urbano do entorno e ainda políticas culturais que valorizem o uso e apropriação do bem pela população, incluindo trabalho educacional com a população para a valorização do bem.

Embora o bem possa ser particular, o seu destaque é coletivo e deve ser valorizado por todos, pois seu tombamento se deu por questões que interes-sam a toda a sociedade. Surge assim mais um viés do tombamento que é o educativo, na medida em que a população a partir do tombamento pode se enriquecer culturalmente e fortalecer sua identidade com o lugar resgatando vivências importantes.

É recomendável um trabalho educacional e promocional sobre o bem, informador e formador da população do entorno, pois o poder público corre

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o risco de entregar para a população algo que a população não está preparada para receber e que por consequência, pode não ser valorizado, pois como já exposto, deve haver o reconhecimento do bem tombado. Assim, o tombamen-to realmente atenderia a “função social da propriedade” A identificação do bem objeto de tombamento deve ser criteriosa.

Nesse sentido observemos que numa época na qual a universalidade das técnicas de construção e das formas arquitetônicas ameaça provocar uma uni-formidade nos assentamentos humanos, a salvaguarda dos complexos históri-cos tradicionais pode contribuir para o aprofundamento dos valores culturais e sociais próprios de cada nação, e favorecer o enriquecimento do patrimônio cultural mundial do ponto de vista. Seguimos o entendimento da Professora Marinella Machado Araújo sobre a função social da propriedade exposto no texto abaixo:

[...] a expressão função social da propriedade empregada com sentido de qualquer limitação ao direito de propriedade tendo em vista um fim de natureza pública e que em nossa ordem jurídica, em razão do modelo de Estado Democrático por ela adotado-democrático participativo. E que o interesse público que justifica a persecução deste fim é compreendido como todo o interesse privado que se projeta na esfera pública em razão de racionalidade de seus fundamentos e da necessidade de coerência da atuação do Poder Público com o princípio a solidariedade característicos desses modelos arquitetônicos. (FERNANDES, 2010, p. 193)

A preservação não pode ser dissociada da modernização das cidades, dinâmicas por excelência. Sobre o direito à cidade destacamos:

O direito à cidade é composto por feixe de direitos que incluem o direito a moradia (implícita a regularização fundiária), à educação, ao trabalho, à saúde, aos serviços públicos (implícito o saneamento), ao lazer, à segu-rança, ao transporte público, à preservação do Patrimônio Cultural, his-tórico e paisagístico, ao meio ambiente construído equilibrado (implícita a garantia do direito a cidades sustentáveis). (CAVALLAZZI, p. 130).

Se não bastasse o critério técnico (urbanístico, histórico e cultural), a participação da sociedade civil é imprescindível na elaboração de normas, principalmente em se tratando da nossa Constituição Federal, que traz como

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fundamentos da República Federativa do Brasil o princípio democrático e a soberania popular (art. 1º e art. 14 da CR/88).

A necessidade dessa participação é melhor compreendida na medida em que reconhecemos os cidadãos como destinatário e coautores das normas. Essa co-originariedade normativa, traduzida e aplicada à cooperação inte-rinstitucional pode dimensionada em maior responsabilidade e eficiência das instituições à medida que cada um reconhece a responsabilidade que lhe cabe e dela se apropria como coator da norma. Principalmente, as normas sobre planejamento, ordenação e desenvolvimento do solo urbano, uma vez que, em verdade, cerca de 80% dos brasileiros, segundo o IBGE, vivem em cidades.

Assim, o indivíduo cidadão, além de destinatário da prestação do Estado, é também corresponsável juntamente com ele pela construção do que é interesse público informador das ações desenvolvidas pelo Governo/ Administração Pública como políticas públicas, por exemplo.

O interesse público é, então, visto como todo o interesse privado na esfe-ra pública por força da esfe-racionalidade do discurso decorrente de relações dia-lógicas. Essa concepção de construção de interesse público implica mudança de postura tanto do gestor público, quanto do cidadão. O gestor deve buscar uma mudança de postura de modo a chamar pra si a responsabilidade pela eficiência da gestão, e o cidadão deve buscar mecanismos de participação ao invés de responsabilizar o Estado. A iniciativa de transformação individual repercute sobre o coletivo (ARAUJO, 2010, p 144).

O Tombamento, dado seu viés cultural, educacional, urbanizador de-sempenha papel de saneamento social na organização das cidades.

4. TOMBAMENTO E PLANEJAMENTO

Já vimos que o Tombamento é ato administrativo e que pode ter sua origem no âmbito municipal, estadual ou federal seguindo políticas culturais, protegendo o patrimônio e privilegiando a evolução das cidades; assim, é im-prescindível que o tombamento seja objeto de planejamento.

O tombamento isolado não é suficiente, pois planejamento não é o fim e sim o meio. É dever formular e executar as políticas culturais. A eficiência do planejamento administrativo, financeiro e orçamentário depende da ade-quação à realidade social, econômica, administrativa da unidade federativa e da legitimidade das ações propostas. Quanto maior o consenso sobre as ações,

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maior a força vinculante da decisão, que só é possível obter por meio da par-ticipação popular na gestão pública (ARAUJO, 2010, p. 145).

Considerando que o tombamento é um ato administrativo dentro do planejamento do poder público é:

O direito que condiciona a criação e execução de soluções, políticas e programas pela administração Pública. O dever básico do adminis-trativista é trabalhar na ampliação do leque de alternativas para a ação administrativa encontrar no direito sua base e seus limites, mas sem comprometer a extensão da função criadora que a administração tiver recebido da legislação, nos termos constitucionais. A grande missão do administrativista contemporâneo não é tolher a criação administrativis-ta para defender o espaço do legislador; é assegurar que o direito, em suas múltiplas formas, influa o espaço de deliberação administrativa, mas sem monopolizá-lo. (SUNDFELD, 2012, p. 136).

A questão do planejamento nas áreas onde se dará o tombamento deve ser verificada, o entorno deve garantir que as novas edificações se harmo-nizem ou complementem as edificações tombadas, deve haver melhorias no meio ambiente, integração da sinalização, garantia que o trânsito se harmo-nize com a passagem, instituir benefícios fiscais e estímulos financeiros para a recuperação das edificações do entorno, educação patrimonial e conscien-tização histórica, projetos para viabilizar a exposição do bem tombado e sua exploração econômica no sentido de gerar renda não só para o proprietário, mas para o entorno. Enfim, o tombamento deve vir acompanhado de uma série de benefícios para a população e não isolado.

A Professora Marinella Machado Araújo bem destaca a função executiva para implementar o planejamento e efetivação das ações pelo poder público:

A função executiva, que se desdobra na função política e na função administrativa, deve ser concebida de forma integrada. Um dos funda-mentos da administração pública dialógica é a integração dessas duas funções: uma não vai abduzir a outra. É preciso pensar a função admi-nistrativa de forma articulada com a função política e vice-versa. Como formulador ou como governante, é preciso pensar naquele que vai apli-car aquela legislação. Esse movimento de integração coloca o governante na condição de administrador público e vice-versa, criando condições para uma maior colaboração (ARAUJO, 2010, p. 149).

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Sobre o planejamento especificamente no tocante ao tombamento im-portante mencionar que, no seio desse debate, vem sendo redefinida a impor-tância do planejamento territorial para a efetividade das políticas de proteção ao patrimônio cultural, bem como o reconhecimento crescente da necessida-de necessida-de integração entre órgãos necessida-de planejamento urbano, tutela ambiental e ór-gãos culturais, que gradualmente tem ganhado uma grande importância para a garantia da gestão de políticas eficientes na tutela do patrimônio cultural brasileiro (SUNDFELD, 2012, p. 136).

A Secretaria de Cultura ou o órgão responsável pela cultura na Administração Pública deve ter uma interface planejada com o urbanismo. Merece atenção o tombamento de conjunto, tombamento de áreas que não se restringem a apenas um bem. Tais tombamentos não podem ter o condão de restringir a evolução e a qualidade de vida da área. As possibilidades de desenvolvimento do conjunto tombado, implicações culturais, sociais, econô-micas e políticas devem ser consideradas nestes tombamentos. É necessário um diálogo permanente entre conservadores urbanistas e gestores culturais, possibilitando requalificação dos espaços urbanos tombados.

Políticas participativas são necessárias, não envolvendo apenas os mora-dores das áreas afetadas, mas também associações locais, câmaras de comér-cio e demais agentes com interesse nas áreas a serem protegidas devem fazer parte da ação planejadora do tombamento. A inserção de jovens neste pro-cesso através da educação e da capacitação profissional é indispensável para os objetivos do tombamento. O morador não pode crescer distanciado de seu próprio ambiente, não pode ser afastado aquele que melhor pode conservar e valorizar o bem tombado.

A Administração Pública deve ser voltada para o futuro. No Estado contemporâneo, extremamente complexo, seria impensável que a lei sem-pre determinasse, até os últimos pormenores, qual deveria ser o compor-tamento e a atuação dos diferentes agentes administrativos. A noção que a Administração pública é meramente aplicadora das leis e tão anacrônica e ultrapassada quanto à de que o Direito, seria apenas um limite para o administrador. Por certo, não prescinde a Administração Pública de uma base ou de uma autorização legal para agir, mas, no exercício da competên-cia legalmente definida, têm os agentes públicos, se visualizado no estado globalmente, um dilatado campo de liberdade para desempenhar a fun-ção formadora que é hoje universalmente reconhecida ao poder público. (SUNDFELD, 2012, p. 136).

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A lei fria não garante nada, tem que haver um conjunto de ações e en-volvimento no que tange ao tombamento. Não é difícil comprovar essa ideia. A lei nacional de tombamento (Decreto 25/37) especifica exatamente quais são as restrições que a administração pode impor ao direito de propriedade. Segundo a lei, em seu art. 17, as coisas tombadas não poderão, “em caso ne-nhum, ser destruídas, demolidas ou mutiladas, nem, sem prévia autorização especial do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ser repara-das, pintadas ou restauradas”.

A solução normativa parece perfeita pela lógica. Tem quem considera que o importante é a própria lei quem deve definir as restrições possíveis. De fato, as restrições estão legalmente definidas, porém não basta apenas a restrição legal. Na experiência com o tombamento em todo o Brasil, o que conteve a arbitrariedade administrativa nesses anos todos não foi a densidade substantiva do art. 17 da lei, mas os aspectos institucionais de que a legislação cuidou: o tombamento tem de ser feito por processo administrativo, a com-petência é de um colegiado de especialistas, as comcom-petências tem limitações finalísticas etc. (SUNDFELD, 2012, p. 136).

O planejamento do tombamento deve ser ainda combinado com aspec-tos de zoneamento e preservação, posturas municipais, isenções fiscais, entre outros, numa tentativa de se integrar a preservação e planejamento urbano. A administração pública deve buscar resultados concretos, conforme lição do prof. Carlos Ari:

O que os administrativistas têm que fazer é trabalhar no aperfeiçoa-mento tanto teórico como normativo dos outros mecanismos jurídicos que não a vinculação da administração ao legislador. Precisam contri-buir mais na discussão sobre quais são arranjos institucionais admi-nistrativos capazes de garantir os valores democráticos e os direitos, quando da tomada de decisões. Precisam investir suas energias nos debates sobre as várias classes de processo administrativo, especial-mente as audiências e consultas públicas de projetos de regulamento. (SUNDFELD, 2012, p. 136).

Deve haver a visão global, não se deve ficar restrito a apenas a um órgão da administração pública. “Muitas ações de planejamento ficam concentradas no universo do órgão que as concebe em razão da falta de visão global do planejamento”. (ARAUJO, 2010, p. 148).

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O tombamento como instrumento isolado tem gerado efeitos perversos, tem congelado a realidade, a história, a dinâmica da vida, tem realizado um pacto com a fotografia: ao capturar a vida, inviabiliza a continua transforma-ção da paisagem urbana. (CAVALAZZI, 2010, p. 139)

É dever através do tombamento implementar políticas culturais, urbanas, educacionais e inclusive desenvolvimento econômico.

5. PODER PÚBLICO E O PARTICULAR NA MANUTENÇÃO

DO PATRIMÔNIO TOMBADO

Conforme já exposto é importante que ultrapassemos a visão do tom-bamento como limitação de propriedade, através de incentivos tais quais a adoção de medidas compensatórias como isenção de IPTU para o bem que esteja e bom estado de conservação e com suas características arquitetônicas e decorativas relevantes respeitadas; isenção de ISS dos serviços de reforma, reestruturação ou conservação de imóveis de interesse histórico ou cultural ou de interesse para preservação ambiental, desde que visando a recolocá-los ou a mantê-los em suas características originais relevantes; isenção da Taxa de Obras em Áreas Particulares reconhecidas como de interesse histórico, cultural ou ecológico, desde que visando a recolocá-las ou a mantê-las em suas características originais relevantes Além de políticas públicas, são ins-trumentos para que o particular se interesse pela proteção e manutenção do bem tombado.

Ademais, também existe uma possibilidade de garantir verbas para a manutenção dos prédios históricos por meio da Lei 8.392, de 2008. Em seu artigo 5º, a Lei prevê o financiamento de projetos que envolvam os patri-mônios históricos e culturais, como as obras de manutenção e restauro dos mesmos. O proprietário pode apresentar um projeto da obra que vai fazer e submetê-lo à aprovação como qualquer outro empreendedor que entre com um projeto na Linc. Ele tem todas as possibilidades de conseguir, desde que a comissão entenda pela viabilidade da obra. E ainda a Lei Federal de Incentivo à Cultura (Lei nº 8.313 de 23 de dezembro de 1991), conhecida também por Lei Rouanet. trás possibilidades de captação de recursos para investimento em bem tombado.

Outro instrumento de incentivo é a transferência do direito de cons-truir. A partir do momento em que um imóvel é classificado como digno de

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preservação, a possibilidade de eventual construção é eliminada. O proprie-tário não poderá destruir o bem que se pretende preservar para fazer no em-preendimento, porém poderá utilizar-se do potencial construtivo permitido para a zona em que se situa.

O proprietário não é impedido de exercer seus direitos sobre o bem, sendo que a restrição imposta é parcial, o que, em regra não garante ao pro-prietário direito a indenização, salvo se demonstrar que o prejuízo adveio do tombamento. Não entraremos no mérito se essas compensações, isenções ou incentivos, são suficientes, porém é importante manter o diálogo e estimular a participação propositiva para dar contornos mais viáveis para o desenvolvi-mento econômico e social através do Tombadesenvolvi-mento.

Transferir unilateralmente a responsabilidade do cidadão para os agen-tes públicos mascara o problema e dificulta sua solução. Tratar o Estado como oponente do cidadão indivíduo é um equívoco e leva a cisão entre os papéis desempenhados pelo gestor público e pelo particular. Sobre a transferência do Direito de Construir é muito esclarecedor artigo: “Tombamento e transfe-rência do Direito de Construir: Dois institutos que se complementam”. Cap. 9. GASPARINI, Audrey. FERNANDES, Edésio; AFONSIN, Betânia (coord.). Revisitando o instituto do tombamento . Belo Horizonte: Fórum, 2010. Cidadão na construção de uma sociedade mais justa e a concorrência entre o interesse público e privado ( ARAUJO, 2010,p 145).

E continua a Professora Marinella:

A superposição de papéis sociais e políticos leva ao conflito de interesses e de posturas. Somos cidadãos e gestores, propositores e destinatários de leis. Como indivíduos, reivindicamos políticas públicas, direitos funda-mentais que correspondam cada vez mais às nossas demandas pessoais. Como gestores, sabemos que limitações econômico-financeiras impõem barreiras à satisfação desse direitos. Essa percepção de público e privado vicia processos políticos e contribui para que LUHMANN denomina acoplamento estrutural dos sistemas político e jurídico e NEVES consi-dera ser das razões para a força simbólica de direitos no Brasil (ARAUJO, 2010, p. 146).

O tombamento deve ser visto como uma oportunidade principalmen-te para o estímulo ao consumo cultural pela sociedade. A sociedade principalmen-tem que consumir mais cultura, gerando renda e ficando mais culta. No caso do

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tombamento, valorizando sua história local, criando maior sensação de per-tencimento ao local e um o ambiente urbano sustentável.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Num país tão diverso como o Brasil a regionalidade deve ser respeitada. O Tombamento isolado não é suficiente par seu fim constitucional, devendo ser fruto de uma ação planejada promovendo a cultura, o urbanismo, a educa-ção, protegendo realmente o patrimônio cultural como um todo e não apenas o bem.

Ações educacionais conjuntas ao tombamento são um ganho para a so-ciedade ao aumentar a sensação de pertencimento dos cidadãos valorizando o meio ambiente urbano. O Tombamento não pode ser visto pelo particular como uma punição ou como um instrumento que para seu bem no tempo. O tombamento deve ser visto como uma oportunidade para desenvolvimento social na medida em que for implementado com base no que dispõe o texto constitucional.

Mecanismos de incentivo ao particular para proteger o bem tombado são fundamentais para a visualização de retorno rápido no que tange ao tom-bamento. O particular mais pragmático, dono do bem tombado, não enxerga as políticas públicas como um ganho. A esse particular devem ser dados mais incentivos, evitando inclusive que o bem perca valor em razão do tombamen-to, o que geraria indenização e significaria mais ônus para os cofres públicos. O planejamento por parte do poder público e a efetiva participação da população é essencial para que o tombamento alcance seu fim constitucional de ser instrumento de preservação ao patrimônio cultural, política urbana e política cultural.

REFERÊNCIAS

1. ARAUJO, Marinella Machado. Fundamentação jurídico-legal e financiamento da

cooperação Interinstitucional: construindo administrações dialógicas. In: CASTRO,

Erika de et al. (Org.). Inclusão, colaboração e governança urbana: perspectivas brasilei-ras. Rio de Janeiro; Observatório das Metrópoles, 2010.

2. BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Editora Saraiva 1998.

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3. BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em: <www.planalto.gov.br> Acesso em: 21 out. 2014.

4. COSTA, Rodrigo Vieira. Cultura e Patrimônio Cultural na Constituição da República

de 1988: a autonomia dos direitos Culturais. São Paulo: Revista CPC USP nº 6, p. 21-46,

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5. CUNHA FILHO, Francisco Humberto. Direitos culturais como direitos fundamen -tais no ordenamento jurídico brasileiro. Brasília Jurídica, 2000 Cultura e democracia na Constituição Federal de 1988: a representação de interesses e sua aplicação Programa

Nacional de Apoio à Cultura. Rio de Janeiro: Letra Legal, 2004.

6. FERNANDES, Edésio; AFONSIN, Betânia (coord.). Revisitando o instituto do tomba -mento. Belo Horizonte: Fórum, 2010.

7. MIRANDA, Marcos Paulo de Souza. Tutela do patrimônio cultural brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 2006.

8. PAIVA, Carlos Magno de Souza. A tutela Jurídica do Patrimônio Cultural. Contagem. Revista por dentro da História, ISSN 2177471-4, 2011.

9. SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo para céticos. Editora Malheiros, 2012.

Recebido em: 20/10/2014 Aprovado em: 28/10/2014

Referências

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