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Macaé: cidade do petróleo versus cidade favelizada. O reflexo do crescimento de uma cidade capitalista e desigual

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DE HUMANIDADES E SAÚDE - IHS FACULDADE FEDERAL DE RIO DAS OSTRAS CURSO DE GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL

Danilo Gonçalves Barcelos

MACAÉ: CIDADE DO PETRÓLEO VERSUS CIDADE FAVELIZADA.

O reflexo do crescimento de uma cidade capitalista e desigual.

RIO DAS OSTRAS DEZ / 2014 1 . I N T R O D U Ç Ã O . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1 0

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DE HUMANIDADES E SAÚDE - IHS

FACULDADE FEDERAL DE RIO DAS OSTRAS CURSO DE GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL

DANILO GONÇALVES BARCELOS

MACAÉ: CIDADE DO PETRÓLEO VERSUS CIDADE FAVELIZADA.

O reflexo do crescimento de uma cidade capitalista e desigual.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Serviço Social da Universidade Federal Fluminense – Polo Universitário de Rio das Ostras como requisito parcial para a obtenção do Grau de Bacharel.

Orientador: Prof. Dr. Edson Teixeira da Silva Junior

Rio das Ostras – RJ 2014

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MACAÉ: CIDADE DO PETRÓLEO VERSUS CIDADE FAVELIZADA.

O reflexo do crescimento de uma cidade capitalista e desigual.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Serviço Social da Universidade Federal Fluminense – Polo Universitário de Rio das Ostras como requisito parcial para a obtenção do Grau de Bacharel.

Aprovado em 11 de dezembro de 2014.

BANCA EXAMINADORA

Orientador Prof. Dr. Edson Teixeira da Silva Junior UFF – IHS

Dr. Felipe Melo da Silva Brito UFF - IHS

Ms. Matheus Thomaz UFF - IHS

RIO DAS OSTRAS 2014

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RESUMO

A cidade macaense se desenvolveu de forma meteórica desde a chegada da Petrobras, na década 1970. Um desenvolvimento desestruturado e desigual, ocasionando a exclusão do acesso à cidade formal para aqueles que não estavam inseridos no mercado de trabalho ou que não tinham poder aquisitivo para o acesso ao espaço urbano, sendo uma cidade propicia para expansão econômica, demarcada pela especulação imobiliária em detrimento de um desenvolvimento social muito abaixo do esperado, ocasionando uma diversidade de problemas sociais estruturais, tais como, favelização e empobrecimento da população.

Palavras-chave: Déficit Habitacional. Segregação. Favela. Urbanização, Macaé. Petrobras.

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ABSTRACT

Macaé city's development skyrocketed after the arrival of Petrobras, in the 1970s, in an unstructured and uneven fashion, that excluded of the formal areas of the city those who were outside the labor market or lacked enough purchasing power to access the urban areas. Macaé favors economic expansion, marked by significant real estate speculation and social development below expectations, in a model that causes a series of structural social problems, such as burgeoning favelas and the impoverishment of the people.

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Dedico este trabalho,

A toda minha família pelo grande apoio dado durante todos os obstáculos propostos pela vida, em especial aos entes queridos, Bento, Dalva, Davi e Viviane.

A minha querida e amada esposa Michelle, por sua cumplicidade e notório carinho, por ser uma grande companheira nas horas de alegria e tristeza.

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AGRADECIMENTOS

Ao professor Edson, por aceitar o desafio de me orientar e pelo suporte na construção do TCC, aos Professores Felipe e Matheus por aceitarem fazer parte de minha banca examinadora.

A minha família, por estar ao meu lado sempre, nas derrotas e vitórias.

Aos grandes amigos da vida, e aqueles conquistados durante o percurso na Universidade, que se tornaram imprescindíveis para o meu crescimento pessoal também para o restante da minha caminhada, tentarei enumerá-los, como um ato de uma singela homenagem à todos aqueles que me cederam sua atenção e pelo os quais tenho grande admiração.

Ao amigo Alan, agora compadre, por seu companheirismo e por estar presente, sendo imprescindível em minha caminhada acadêmica.

Ao amigo Glaube, pelos debates etílicos proporcionados durante a formação acadêmica.

A amiga Jaqueline, com sua alegria incomparável de viver.

Ao amigo e camarada Rafael (Bom Jesus), pelo apoio e paciência e principalmente por suas contribuições na construção do TCC.

Agradeço a todos os supervisores de campo que retribuíram com o seu conhecimento profissional e paciência, principalmente a Srª Ronilda Maria Rodrigues da Costa, a qual contribuiu para a escolha do tema presente.

Aos demais que fizeram parte da minha caminhada na UFF e sabem a significância e espaço que conquistaram em minha vida.

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“Não adianta olhar pro céu, com muita fé e pouca luta Levanta aí que você tem muito protesto pra fazer e muita greve, você pode, você deve, pode crer Não adianta olhar pro chão, virar a cara pra não ver Se liga aí que te botaram numa cruz e só porque Jesus sofreu não quer dizer que você tenha que sofrer Até quando você vai ficar usando rédea? Rindo da própria tragédia? Até quando você vai ficar usando rédea? (Pobre, rico, ou classe média). Até quando você vai levar cascudo mudo? Muda, muda essa postura Até quando você vai ficando mudo? Muda que o medo é um modo de fazer censura.” (Até Quando? / Gabriel O pensador).

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Introdução

Este trabalho foi idealizado tendo como alusão a minha inserção como estagiário de Serviço Social no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), que tinha como o cerne a urbanização de assentamentos precários no município de Macaé, o que contribuiu para o vislumbramento da realidade Macaense, contribuindo para a construção de uma visão crítica da ocupação urbana e as consequências da falta de estruturação da referida cidade.

A atenção se voltou para o crescimento econômico e o crescimento populacional da cidade de Macaé em detrimento do não acompanhamento do crescimento social, exilando os pobres em áreas insalubres do município que tem em seu histórico, como os demais municípios brasileiros, a tendência de excluírem estas demandas das cidades formais. A cidade informal é caracterizada como indesejável, sua população é realocada e removida para espaços sem a devida estruturação e suporte do Estado, espaço fecundo para a propagação e aprofundamento das desigualdades sociais.

Para o desdobramento e realização deste trabalho foram realizadas uma série de pesquisas documentais, bibliográficas e de experiência de campo de estágio. Dentre estas pesquisas realizadas, foram analisados artigos retirados da internet, bibliografia relacionada ao tema, pesquisa no órgão de competência municipal (Secretária de Habitação de Macaé).

A finalidade deste trabalho é evidenciar a ocupação desigual em um espaço urbano tão prospero economicamente, a cidade de Macaé; identificar os fenômenos ocasionados por uma ocupação desordenada e consequente segregação, os impactos gerados pela inserção de uma grande empresa, reestruturando produtivamente a localidade (Petrobras), elencar alguns dos problemas ocasionados por esta expansão, como o déficit habitacional, sem o devido planejamento e a construção de uma cidade pobre socialmente, apesar de sua abundante riqueza,

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10 ainda sim 1/3 de sua população encontra-se vivendo de forma precária e insalubre em diversas ocupações espalhadas pela cidade.

Objetivamos também mostrar as políticas sociais financeiras construídas historicamente pelo Estado, tais como, BNH (Banco Nacional de Habitação), até os nossos dias atuais com a CEF (Caixa Econômica Federal), e suas características financistas que beneficiam ao interesse de pequenos grupos, como, empreiteiros e o mercado imobiliário.

O presente Trabalho de Conclusão de Curso foi dividido em dois capítulos para a desenvoltura da temática.

No primeiro capítulo, com o título de “A Urbanização do Brasil: um processo de agravamento das desigualdades construídas historicamente”, faremos uma contextualização histórica do Brasil, iniciando no período Imperial, e findando nos dias atuais, observando como foi fracionado o território brasileiro, utilizando como principal exemplo a cidade do Rio de Janeiro. O posicionamento que foi tomado pelo Estado no que diz respeito à política de expansão, enriquecendo poucos em detrimento da pobreza de muitos. O processo de exclusão dos pobres à cidade formal, desde a implementação da Lei das Terras (1850), esta caracterizou a terra como uma mercadoria de acesso único e exclusivamente através do mercado, gerando dificuldade ao acesso principalmente para os trabalhadores das lavouras (Imigrantes e ex-escravos). Por fim, a caracterização da cidade segregada entre cidade formal e cidade informal e o crescimento econômico em prejuízo do crescimento social.

No segundo capitulo, “A Capital Nacional do Petróleo: a construção da ocupação desigual do espaço urbano de Macaé” debateremos sobre as formas de ocupação do território macaense que determinaram as formas de investimentos e construção da cidade capitalista atual e suas consequências. Buscaremos apresentar as principais influências das indústrias para ocupação e evolução urbana de Macaé, principalmente após a chegada da Petrobras (década de 1970). Confrontaremos o crescimento econômico com o crescimento da pobreza da localidade, assim como estudaremos a propagação do espaço marginalizado pela

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11 cidade formal. Abordaremos o déficit habitacional e favelização crescente como um problema estrutural da cidade de Macaé. E por fim, apresentaremos os investimentos estimados para construção do novo porto, ou TERLOM (Terminal Logístico de Macaé), comparados aos investimentos entre esfera federal e municipal direcionados para a solução do crescimento do déficit habitacional do município.

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12 Introdução ... 9 Capítulo 1 - A Urbanização do Brasil: um processo de agravamento das desigualdades construídas historicamente. ... 14

1. A Segregação do espaço urbano no Brasil Moderno... 14 1.2 – Fim da escravidão: a emergência do trabalho “livre”. ... 17 1.3 – Exclusão do negro ao acesso da urbanização e a Terra como mercadoria para um seleto grupo. ... 20

1.4 – Processo de aglomeração urbana: Construção do espaço denominado favela, diferenciação do espaço ocupado por ricos e pobres. ... 24

1.5. Brasil de grande déficit habitacional e mercantilização dos Direitos. ... 33 1.5.1 - Políticas Habitacionais de Cunho Mercantil: BNH ao Minha Casa, Minha Vida. ... 36

1.5.2 – Momento pós- BNH, Projeto Minha Casa Minha Vida. ... 41 Capítulo 2 – A Capital Nacional do Petróleo: a construção da ocupação desigual do espaço urbano de Macaé. ... 46

2.1 – Breve histórico do surgimento do município de Macaé. ... 46 2.2 - A Petrobras na Cidade de Macaé (1970) e a reestruturação urbana da cidade. ... 50

2.3 – Desenvolvimento das Questões Sociais de Macaé: aumento da riqueza e a evolução da pobreza urbana. ... 53

2.3.1 – O Déficit Habitacional e a favelização de Macaé. ... 59 2.3.2– Capital do Petróleo versus Cidade Favelizada: Uma única Cidade e duas Soluções. ... 71

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13 4 - Referências Bibliográficas: ... 79

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Capítulo 1 - A Urbanização do Brasil: um processo de

agravamento das desigualdades construídas historicamente.

1. A Segregação do espaço urbano no Brasil Moderno.

Iniciaremos este Capítulo retomando o século XIX, resgatando acontecimentos cruciais para a inauguração da aglomeração, ou ocupação desigual do espaço urbano, que culminou também na segregação e criminalização, durante todo o processo de construção do Brasil urbano. Utilizar-se-á neste período a cidade do Rio de Janeiro como exemplo, já que esta era a maior cidade do Brasil naquele período.

O processo de segregação espacial discorreu antes mesmo do processo de uma urbanização mais adensada, durante o período da escravidão no Brasil (entre o século XVI ao XIX). Segundo Moura (1987:17 apud Campos, 2005:32), as organizações quilombolas surgiram “[...] desde a implantação do sistema escravagista de produção”, quando no país prevalecia a produção de mercadorias de origem agrícola. Neste momento, a maior parte da população ainda estava localizada no campo, a mão de obra negra destacava-se no cultivo de cana-de-açúcar, dentre outras atividades.

O espaço coletivo de ocupação da massa trabalhadora do período da escravidão, denominado quilombola, se tornou um espaço de resistência da massa trabalhadora explorada neste período. Uma comparação que nos é imprescindível para nossos estudos futuros, segue abaixo:

O quilombo, como espaço de resistência à ordem imperial, tem alguns pontos em comum com as atuais favelas brasileiras, sobretudo aquelas localizadas nas grandes cidades. Ambas as estruturas espaciais foram e são estigmatizadas ao longo da historia sócio-espacial da cidade. Se, no passado a resistência era constituída em torno do não-aprisionamento dos negros (primeiro ocorrendo apenas com escravos e, posteriormente, com os negros que se tornaram livres), ao longo do século XX a resistência aconteceu em torno da permanência nos locais “escolhidos” para moradia. Entre residir e serem cooptados pela ação dos grupos dominantes associados aos interesses do Estado, que no passado procuravam estender

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a cerca,seja para ampliar as suas propriedades, seja para valorizar as terras urbanas, os segmentos de baixa ou nenhuma renda toma em geral um posicionamento político que venha a priorizar a permanência do espaço apropriado. (Campos, 2005:31).

Uma ocorrência que prepararia a cidade do Rio de Janeiro rumo á uma urbanização, desigual, foi o desembarque da família real portuguesa1 que segundo Maricato (1997:16), trouxe mais de 10 mil pessoas fugindo da perseguição de Napoleão; e dentre seus acompanhantes: ministros, juízes, funcionários do tesouro e etc. A acomodação de todo este contingente se deu de forma problemática, ainda segundo a autora: “[...] as melhores edificações foram desocupadas para receber a família real. Suas portas eram marcadas com as letras PR, que significavam Príncipe Regente, ou, na versão dos cariocas “prédio roubado”, ou “ponha-se na rua.” Através destas ações ficou caracterizada uma opressão recorrente do Estado Brasileiro em nosso cotidiano.

A cidade do Rio de Janeiro, que era apenas mais uma dentre outras da colônia de Portugal aqui no Brasil, passou a ser uma área de refúgio do reino, concentrando e sendo a sede do reinado português, trazendo consigo uma vasta gama burocrática e seu maquinário para a continuidade do funcionamento pleno das atividades da coroa. O aumento da população da cidade ocorreu devido à tamanha atratividade exercida pela chegada da Coroa Portuguesa; com as várias oportunidades emergidas (Abertura dos Portos, Fundação da Biblioteca Nacional e do Banco do Brasil, etc.) Trouxe ainda, segundo Maricato (1997:16), um salto vertiginoso no quantitativo de habitantes, aumentando de 50 mil para 100 mil.

A produção industrial também foi finalmente liberada, rompendo-se o estatuto colonial. Embora a pressão dos produtos ingleses sobre o mercado brasileiro tenha constituído grave fator de inibição da produção manufatureira local, iniciou-se a partir daí o desenvolvimento de vários campos da atividade produtiva, como a metalurgia e a mineração. A ciência

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A chegada da família foi ocasionada por uma investida de Napoleão à cidade de Lisboa, em 1808 após a fuga instalam-se aqui no Brasil trazendo consigo toda a corte portuguesa.

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moderna, que causou impacto na Europa no século XII, chegou ao Brasil somente no século XIX, com a vinda da família real. (Maricato, 1997:16).

Alguns fatos que ocorreram no século XIX, período imperial, incidiram diretamente sobre o processo de urbanização do Brasil, assim:

Em 1822, o Brasil tinha doze núcleos classificados como cidades. Ainda que não se tenha passado por rupturas importantes, foi durante o período imperial que começaram a ser gestadas as mudanças fundamentais responsáveis pelo deslanche do processo de urbanização no Brasil. As disputas políticas que se estenderam por todo o Império (1822 a 1889), culminando com a Lei de Terras (1850), a abolição da escravidão (1888)e a proclamação da República (1889),compõe um conjunto de medidas e acontecimentos que viabilizariam condições para a industrialização/urbanização no final daquele século. (Maricato, 1997:16-17).

A construção histórica da sociedade urbana brasileira perpassa por estes momentos marcantes; levando-nos a considerar que a sociedade urbana teve sua ascendência ancorada em uma série de restrições para as classes menos favorecidas, evidenciadas em diversos momentos históricos. Atemo-nos aqui ao momento de “pré-urbanização” (Século XIX), onde o fim da escravidão eclodiu o “trabalho livre” e a terra foi caracterizada como produto de poucos, como propriedade privada.

Se o acesso à terra foi legalmente vedado a um determinado segmento social, a questão fundiária sempre foi tratada como uma questão policial. O resultado é que massas de alforriados, juntamente com brancos pobres, deslocaram-se para as cidades ou para os quilombos periurbanos ou rurais. Na cidade, os negros ocuparam inicialmente os cortiços, no caso do Rio de Janeiro, ou se tornaram quilombolas em áreas periurbanas. (Campos, 2005:42).

As variações de eventos históricos que foram acima citados não trouxeram a igualdade para os trabalhadores, aliás, potencializou a exclusão do espaço urbano para aqueles que não detinham capital, explicitando um desenvolvimento urbano desigual pautado no enriquecimento de poucos e de exploração continua de muitos. A terra torna-se cada vez mais um artigo de luxo para obtenção de poucos.

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1.2 – Fim da escravidão: a emergência do trabalho “livre”.

O fim da escravidão se deu através de muita luta e resistência histórica por parte dos negros explorados por este regime. A culminação do fim desta regulação escravagista foi uma conquista histórica, um êxito conquistado através da persistência e organização coletiva; entretanto, as consequências e a não absorção dos negros no mercado formal criou um dos pivôs de uma urbanização segregadora. Nesse período, uma das unidades de resistência coletiva dos escravos contra o poder imperial eram as comunidades quilombolas, que são vistas como “classe perigosa” e são colocados à margem da sociedade, tendo suprimidos uma diversidade de direitos, mesmo após a abolição da escravidão, o que presumiria um acesso igualitário aos direitos à todo este contingente.

A cidade imperial era sustentada pelo trabalho dos escravos, que realizavam todo e qualquer tipo de serviço para os seus senhores.

Seria absolutamente impossível entender a cidade colonial ou imperial sem o trabalho escravo. Os escravos, dentre muitas outras funções, eliminavam os dejetos (carregando barris cheios de fezes, que no Rio de Janeiro, por exemplo, eram jogados nas praias), abasteciam as casas de água, uma vez que a canalização era inexistente, abasteciam de lenha a cozinha, eliminavam o lixo. Tanto o transporte de mercadorias como o de pessoas na cidade eram feitos por escravos. (Maricato, 1997:18).

Os escravos realizavam uma diversidade de tarefas braçais nas cidades coloniais, como também, nas cidades imperiais, e não seria exagero em dizer que os escravos impulsionavam a economia como um todo.

Não era, portanto, apenas no latifúndio rural que o trabalho escravo constituía o motor da colônia e mais tarde do Império. As cidades também eram movidas por esse tipo de trabalho. Sua importância vai além disso: o escravo constituía também uma espécie de “capital”. Até 1850, a terra não servia como objeto de hipoteca para a realização de empréstimos, mas os escravos sim. Eles eram fonte de renda e, portanto, de investimento. É importante lembrar que até essa época a terra não mereceu tratamento jurídico mais elaborado no Brasil. (Maricato, 1997:18).

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18 A Lei de Terras (1850), lei Eusébio de Queiroz (1850) - que proíbe o tráfico de escravos para o Brasil - e a abolição da escravidão (1888) não foram fatos aleatórios para a urbanização e ocupação do espaço das cidades brasileiras, foram processos que expuseram a marginalização e restrição do acesso a terra para a camada mais pobre da população, os negros, e aumentou a riqueza dos exploradores desta mão de obra.

Não por coincidência, uma semana separa essa lei e outra que tratava da propriedade da terra. Esta continua sendo um privilégio das parcelas mais ricas, que podiam adquiri-la, pois a propriedade baseada na ocupação ou cessão pública, como feita através do antigo sistema de sesmarias, não é mais permitida. Os escravos são substituídos pela terra como condição para o exercício do poder e o controle da produção. (Maricato, 1997:18-19).

Como visto anteriormente, as Leis que poderiam servir de sustentáculo, dentre elas a Abolição da Escravatura (Lei Imperial n.º 3.353)para uma guinada de postura da sociedade brasileira ocasionaram justamente o inverso, ou deixaram claro que não houve nenhuma ruptura com a postura construída historicamente de segregação entre ricos e pobres, negros e brancos ricos2·. Claramente os maiores beneficiários dessa lei foram os ex-proprietários dos escravos que receberam um

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As leis abolicionistas e suas possíveis conquistas no decorrer século XIX na verdade representavam a manutenção do ideário escravocrata beneficiando diretamente os senhores de escravos, tornam-se medidas paliativas para fins de amenizar as revoltas, pressões externas pelo fim do regime de escravidão dentre outros posicionamentos divergentes a este regime.

A Lei do Ventre Livre (1871), a primeira lei com sentido abolicionista, de acordo com esta lei os filhos de escravas nascidos depois desta ganhariam a sua liberdade, entretanto, este deveria permanecer nas terras do seu “dono” até os 21 anos, ou seja, falsa liberdade, expropriação da maior parte da vida produtiva do escravo que viviam em média até os 40 anos de idade.

Lei dos sexagenários (1885), esta lei dava liberdade aos escravos com idade superior aos 65 anos, como explicitado anteriormente, a expectativa de vida dos escravos no período era em média de 40 anos de idade, ou seja, uma lei sem valor em seu uso.

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19 subsídio, e os maiores prejudicados neste processo de exploração mais uma vez foram os trabalhadores negros, que foram simplesmente descartados ou pouco aproveitados como mão de obra livre.

Nem mesmo a abolição da escravatura, consumada apenas em 1888, significou o fim da discriminação sofrida pelos negros africanos ou pelos negros nascidos aqui. Grande parte dos escravos libertados, especialmente nas regiões que apresentavam declínio da cultura do café, vale do Paraíba, tomaram o rumo das cidades e aí ofereceram sua força de trabalho,agora livre,concorrendo em desigualdade de condições com os brancos pobres e os imigrantes que aqui chegavam.(Maricato,1997:19).

Com este contingente se concentrando nas cidades brasileiras, e especificamente no Rio de Janeiro, ficam expostas as feridas de uma urbanização caótica e desestruturada que se agravam ainda mais com a chegada de imigrantes europeus, sendo assim, o mercado de trabalho ficou ainda mais restrito para os recentemente livres, ex-escravos, venderem a sua força de trabalho.

A crise da habitação, presente na Corte desde a chegada da Família Real, ganhou maior dimensão à medida que os imigrantes aportaram à cidade, principalmente a partir da efetivação da política de importação de mão-de-obra branca para trabalhar nas nascentes industriais e nos campos (Campos, 2005:39).

Essas relações societárias desiguais, que até o momento foram expostas, acrescidas ainda das reformas urbanas do inicio do século XX3 dinamizaram e concentraram um grande contingente no espaço urbano, voltando os investimentos para a construção da cidade capitalista, privando muitos do acesso à moradia, ou a terra, expulsando-os com medidas de higienização, destruindo morros, que já eram locais de habitação da camada mais pobre da população. Somado a isso, outras

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Segundo passagem importante de Maricato (2001:15):

As reformas urbanas, realizadas em diversas cidades brasileiras entre o final do século XIX e início do século XX, lançaram as bases de um urbanismo moderno “à moda" da periferia. Realizavam-se obras de saneamento básico para eliminação das epidemias ao mesmo tempo em que se promovia o embelezamento paisagístico e eram implantadas as bases legais para um mercado imobiliário de corte capitalista. A população excluída desse processo era expulsa para os morros e franjas da cidade. Manaus, Belém, Porto Alegre, Curitiba, Santos, Recife, São Paulo e especialmente o Rio de Janeiro são cidades que passaram por mudança que conjugaram saneamento ambiental, embelezamento e segregação territorial, nesse período.

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20 medidas foram utilizadas para esconder os problemas sociais, ocasionados pela presença da massa com menor poder aquisitivo.

[...] foram as reformas urbanas do final do século XIX e começo do século XX, entretanto, que definiram mais fortemente a nova face da cidade republicana ou da sociedade sem o escravo. Nela, a massa trabalhadora pobre e em especial os negros desempregados serão “varridos para baixo do tapete”, ou seja, serão expulsos das áreas centrais [...]. (Maricato, 1997:19).

1.3 – Exclusão do negro ao acesso da urbanização e a Terra

como mercadoria para um seleto grupo.

Para compreendermos a propriedade privada da terra no estágio atual, faz-se necessário recuperar, historicamente, onde foi originado todo este interesfaz-se pela propriedade privada.

Como relata Maricato (2005:21), com a Revolução Francesa (17894) proporcionou o que poderia ser o início da propriedade privada, apesar da participação da massa camponesa e da classe pobre neste processo.

A declaração dos Direitos do Homem de 1789, que servirá de preâmbulo da Constituição Francesa resultante da revolução (1791), trata a propriedade como dos “direitos naturais e imprescritíveis do homem”, além de “direito inviolável e sagrado”. De maneira semelhante, a constituição de 1776, a primeira do continente americano, considerou a propriedade privada um dos “direitos essenciais e inalienáveis”. Maricato (2005:21).

A primeira regra para distribuição da propriedade privada originada aqui no Brasil foi à sesmaria, que consistia em concessões de terras controladas pela coroa portuguesa, com diversas restrições e obrigações a serem obedecidas (não contemplaria negros e pobres), caso contrário se descumpridas o risco de perda da terra era eminente. Notabilizou-se, desde o início desta a implementação da

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Neste período a relação de vassalagem estabelecida no período monárquico deu importância à propriedade da terra, segundo Maricato (2005:21): “A revolução exigia liberdade para o homem e para a terra”.

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21 propriedade privada aqui no Brasil, caracterizada pela restrição do acesso ou da concessão de terras para as camadas mais pobre da população brasileira, sendo um ambiente propício para o aumento da riqueza, por ausência de controle da Coroa portuguesa, criando um campo fértil para o crescimento dos latifúndios de alguns em detrimento da multiplicação da pobreza de muitos.

A abundância de terras desocupadas no Brasil, contudo, dispensou o rigor na aplicação das regras que regulavam as concessões. O latifúndio resultante da concessão de sesmarias foi fundamental para a economia da Coroa portuguesa e depois para o Império brasileiro, mas o que contava mais que a terra era a capacidade de ocupá-la e nela produzir: dada pelo trabalho escravo. Assim, a propriedade de escravos era tão importante quanto a terra, ou mais. A dependência dos pequenos proprietários era indiscutível, principalmente na comercialização da sua produção. Lembremos mais uma vez que o senhor rural era autoridade municipal e depois tornou se também autoridade militar, com a Guarda Nacional. (Maricato, 2005:22).

Para compreensão desta primeira distribuição de terras, consequentemente distribuição de poderes, houve a entrega do poder local para os detentores de terras, ou seja, para os senhores rurais (“coronéis”), construindo-se vilas, moradias, dentre outras medidas. Os administradores determinavam a ocupação do espaço rural ou de um prelúdio urbano, que em maior parte era feito de forma autoritária.

A Câmara Municipal e os administradores locais tinham a competência de doar terras – as datas- a quem as solicitasse, a fim de morar ou produzir. Essas datas eram gratuitas, com a condição de ocupação, produção e pagamento de dizimo. Tal pratica se prestou ao exercício arbitrário do poder dos burocratas e grandes proprietários. Novamente aqui constata a falta de fronteiras entre o público e o privado, relação que marca toda nossa historia. (Maricato, 2005:22).

Segundo Maricato (2005:22), o sistema de sesmaria deixou de vigorar em 1822, sendo justificado o seu fim diante do descontrole da ocupação das terras, agricultura estagnada, latifúndio e etc.

A lei que iria propor a normatização do acesso às terras se arrastou dentre várias discussões e defesas de interesses de 1822 até 1850, período no qual foi estabelecido o poder dos coronéis latifundiários: “é nesse período que se consolida de fato o latifúndio brasileiro – com a expulsão de pequenos posseiros, que antes

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22 tinham o hábito de ocupar terras virgens – e a sua substituição por poderosos proprietários rurais.” (Maricato, 2005:23).

Com a Lei de Terras visava-se regulamentar a posse da propriedade. Esta Lei consistia em deliberar o acesso a terra via comércio, para fins de arrecadação de fundos, subsidiando a chegada dos imigrantes europeus para que estes adquirissem pequenas propriedades e produzissem. Este posicionamento ameaçava diretamente os interesses dos latifundiários, ou seja, não era da vontade dos poderosos em promover o acesso igualitário a terra, pois queriam que os trabalhadores se mantivessem em suas rédeas, isto é, trabalhando continuadamente, obtendo os lucros de seu trabalho; e pouco importava se fossem trabalhadores europeus ou não.

O fácil acesso a propriedade da terra inviabilizaria a disponibilidade da força de trabalho que iria substituir os escravos, especialmente nas fazendas de café. Por isso foram mantidos os obstáculos ao acesso à terra, e essas experiências de colonização acabaram bastante limitadas.[...]A demarcação das terras devolutas encontrou resistências no poder local, dominado pelos “coronéis”, que responderam com imprecisões às solicitações do governo central sobre a situação das terras. Um vasto patrimônio do Estado, urbano e rural, passou então para a esfera privada. [...] A promulgação da Lei das Terras teve, contudo, maior impacto sobre a ordenação das ruas e casarios nos núcleos urbanos, já que ela distingue pela primeira vez na historia do país, o que é solo público e o que é solo privado. (Maricato, 2005:23).

A importação da mão de obra européia em substituição aos escravos, os quais foram colocados em “liberdade” para sobreviverem e venderem a sua força de trabalho os deixando a sua própria sorte. O projeto de urbanização no Brasil excluía principalmente o negro, como também os pobres. Assim, a importação da proposta européia de urbanização, incluindo seu contingente de operários, para uma possível adaptação aqui no Brasil gerou uma maior concorrência, dificultando ainda mais a realocação laboral dos libertos oriundos do antigo regime escravagista. Conforme relata Campos (2005:45). “[...] a construção de um país onde os padrões da cultura europeia fossem levados às últimas consequências, e o negro, a bem da verdade, não fazia parte desse projeto”.

Fomentando a ideia de que o Brasil desenvolveu-se pautado na desigualdade social, racial e econômica, a disparidade do acesso do trabalhador

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23 negro em detrimento ao branco no mercado de trabalho era visível, assim extraímos que,

Esses indivíduos tiveram de se sujeitar ao trabalho mal remunerado da agricultura em regime de semi-escravidão ou migrar para a cidade para viver nos quilombos periurbanos ou naqueles que se localizavam nas freguesias rurais. Sobre a concorrência efetuada pelos trabalhadores europeus, SODRE (op. Cit. p.41) opina que a facilitação da entrada de imigrantes no país – de 1.125.000 entre 1891 e 1900 – foi uma decisão contra o negro: a concorrência estrangeira viria prejudicar em muito o acesso de ex-escravos às vagas oferecidas pela indústria e pelo comércio. Tratava-se de uma decisão político-cultural, com uma lógica orientada pelo reforço da aparência branca da população urbana. (Campos, 2005:48).

A exclusão do negro ao acesso a terra, a segregação racial e social ficavam evidenciadas por medidas adotas pelo Estado no período Imperial. Por conseguinte, quem legislava e ditava as regras para o convívio em sociedade era a elite de fazendeiros (“coronéis”), pois estes, a cada decreto excluíam a massa negra e pobre do acesso a terra e enriqueciam seu pequeno grupo com medidas que favoreciam claramente o acúmulo de terra e a exploração dos trabalhadores.

[...] esses mesmos fazendeiros, em sua maioria também políticos residentes na cidade, votavam as leis que excluíam ou dificultavam o acesso do negro ao mercado de trabalho das indústrias emergentes. (Campos, 2005:49).

A condenação carregada por ser negro não foi suprimida pela revogação da escravidão e sim foi um processo que evoluiu juntamente com a urbanização brasileira, afastando cada vez mais o negro das oportunidades reais de desenvolvimento social. O mesmo foi excluído tanto do acesso da riqueza como do acesso aos mais simples e diversos direitos. Em certos momentos tratados ainda como objeto de troca, ou simplesmente como uma “coisa”. Como ainda relata Campos (2005:49) “Na sociedade ‘branca’ o mulato é um homem livre, estigmatizado pelas marcas raciais de ‘outro’ grupo, daqueles que foram escravos”.

Resquícios dos traços da escravidão, discriminação em virtude da cor da pele persistem no momento pós-abolição, os negros eram considerados como o “Outro”. Para alguns autores naquele período, os negros ainda eram como praga, e

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24 também como não iguais, mesmo sendo considerados “livres”; “[...] porém, o “Outro”, não de forma clara, continuou muito diferente, não somente na cor, mas em todas as atividades, considerados , quase sempre, como inferiores”.(Campos,2005:50).

1.4

– Processo de aglomeração urbana: Construção do

espaço denominado favela, diferenciação do espaço ocupado por

ricos e pobres.

Ainda continuaremos no século XIX para tratarmos do processo de aglomeração do espaço urbano, processo este que foi consumado e baseado na desigualdade, exclusão, marginalização dos negros e dos desprovidos causando a exponenciação da segregação e criminalização desta população ficando à margem de direitos durante todo o processo de urbanização brasileiro: ainda utilizando a cidade do Rio de Janeiro como exemplo de urbanização.

As primeiras favelas do Rio de Janeiro datam da virada do século XIX para o XX. Nesse caso, o marco seria o Morro da Providência, onde surgiu o “morro da Favella”. Alguns autores reconhecem o ano de 1897 como um marco dessa forma específica de ocupação dos morros cariocas, chamando a atenção a densidade populacional e às casas construídas por seus próprios donos. (Ferreira, 2008:4).

O surgimento dessa nomenclatura “Morro da Favella” para esta ocupação se deu por conta da ocupação de soldados da Guerra de Canudos5 cerca de 10 mil soldados que vieram para a capital federal, Rio de Janeiro, com a promessa de que

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Guerra de Canudos, que ocorreu um pouco depois do período republicano, entre 1896 e 1897. Este movimento foi um movimento de resistência ao novo regime, o republicano, separando o Estado da Igreja, o que deixou indignando vários fanáticos religiosos, dentre eles Antonio Conselheiro, um cenário de penúria, junto ao fanatismo religioso no nordeste e em todo o país evidenciaram movimentos populares deste tipo.

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25 lhe seriam fornecidas habitações e que ali se alojassem, de forma provisória, reverenciando esta ocupação com nome de “morro da favela”, haja vista em que tais morros, semelhante aos de Canudos, eram revestidos de um arbusto de nome “Favela”.

Já presente embrionariamente desde 1897, quando foi dada a autorização para que os praças retornados da campanha de Canudos ocupassem provisoriamente os morros da Providencia e Santo Antônio, esta forma de ocupação dos morros logo se revelou a solução ideal para o problema da habitação popular do Rio de Janeiro. De local de moradia provisório, esses morros na área central logo foram transformados em opção de residência permanente. (Abreu, 1992:90 apud Campos, 2005:58).

Além dessas aglomerações destinadas para população com menor poder aquisitivo (“Favelas”), existiam também ocupações nas áreas centrais da cidade, os cortiços, que eram um ambiente marginalizado ocupado por pobres e negros. A estrutura, nesses cortiços eram precárias para o desenvolvimento humano, porém uma área de grande atratividade econômica por estarem localizadas na área central da cidade e próximo das áreas de maior empregabilidade do município.

As condições de higiene sempre foram precárias no Rio de Janeiro [...]. O núcleo urbano denso e apertado, cercado ainda de mangues e de terrenos paludosos, cortados por enormes quantidades de valas que, por estarem constantemente entupidas por dejetos lançados pela população, não conseguiam escoar a água da chuva [...]. Para isso contribuía também a proliferação das habitações coletivas pela cidade, especialmente o ‘cortiço’. Este tipo de habitação caracterizava-se pela disposição de uma multiplicidade de quartinhos em volta de uma área aberta que, entretanto, era mantida quase constantemente encharcada, já que era ali que lavadeiras [...] faziam seu trabalho. (Campos, 2005:53 apud Abreu, 1988:68).

Segundo Campos (2005:53), neste período cerca de 50% da população residiam em cortiços. Para termos ideia da relevância desse tipo de moradia para uma cidade como a do Rio de Janeiro, estas moradias concentravam-se nas áreas centrais da cidade, atingindo posteriormente altos valores para sua revenda, atraindo a atenção de diversos investidores, sendo um espaço valorizado e consequentemente não pertencente àqueles que não detinham capital.

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Além de o Estado tentar impedir a existência de cortiços na área central da cidade, havia o problema dos altos preços alcançados pelos terrenos disponibilizados que impediam uma ocupação mais efetiva pelas classes populares. (Campos, 2005:52).

Esta espécie de ocupação absorvia um grande contingente populacional nas áreas centrais e os seus residentes eram constituídos da camada pobre da população. Com isso a ocupação dos espaços urbanos ocorreu de forma intensa no século XX, agravando ainda mais as desigualdades impostas por este processo de urbanização, ou também das chamadas reformas dos centros urbanos, isolando as camadas populares desse processo.

O que era uma área de pouca atratividade para os investimentos tornou-se um chamariz para diversos investimentos do setor imobiliário e da construção civil. O Estado se posiciona politicamente mais uma vez para exclusão dos desvalidos ao acesso a seus direitos, em detrimento de interesses do capital; a expulsão dos negros e pobres para áreas longínquas do perímetro urbano ocorre com a camuflagem de “higienização” da cidade, coibindo a organização habitacional em formas de cortiços, e destruindo os aqueles já existentes e impedindo a construção de outros.

Realizavam-se obras de saneamento básico para eliminação das epidemias, ao mesmo tempo em que se promovia o embelezamento paisagístico e eram implantadas as bases legais para um mercado imobiliário de corte capitalista. A população excluída desse processo era expulsa para os morros e franjas da cidade. Manaus, Belém, Porto Alegre, Curitiba, Santos, Recife, São Paulo e especialmente o Rio de Janeiro são cidades que passaram por mudanças que conjugaram saneamento ambiental, embelezamento e segregação territorial, nesse período. (Maricato, 1997:17).

Por volta de 1866, concebeu-se esta ideologia de higienização, segundo Campos (2005:53), e sendo esta posta ação em 1873, quando as pressões dos grupos dominantes tiveram resultado, não sendo mais permitidas as construções dos cortiços na área central da cidade do Rio de Janeiro, restringindo definitivamente este tipo de moradia.

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Não serão mais permitidas as construções chamadas ‘cortiços’ entre as praças D. Pedro II e Onze de Junho e todo o espaço da cidade entre as ruas do Riachuelo e Livramento [...] Outra postura reforçaria a proibição, esclarecendo que a interdição à construção de cortiços valia mesmo quando os proprietários insistiam em chamá-los de ‘casinhas’ ou com nome equivalente. (Chalhoub, 1996: 33 apud Campos, 2005:53).

É salutar também lembrar que as favelas, ou cortiços, tornaram-se um espaço de moradia constituído por ex-escravos e pobres: “[...] a restrição do acesso à terra pelos ex-escravos, que, na falta, também procuraram a cidade em numero cada vez mais significativo em busca de trabalho e de moradia. “(Campos,2005:58).

Assim, exclusão do acesso a terra trouxe um grande fluxo para os centros urbanos. Os alforriados buscavam vender sua força de trabalho em igualdade com os demais trabalhadores, mas sempre sem sucesso.

Com a extinção dos cortiços, esta camada da população migrou, na verdade expulsa, para as favelas, esta abrigou um enorme contingente. A falsa ideia de emprego nos grandes centros atraiu diversas pessoas do país, os centros econômicos foram polarizados no centro-sul do Brasil, atraindo os escravos para estes locais.

A predominância do Centro-Sul, pra onde o eixo econômico se deslocara a partir do ciclo do ouro, se consolida com o café. Mais de 100 mil escravos são transferidos do Nordeste para essa região, entre 1850 e 1880. Melhora a comunicação entre os centros urbanos de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. (Maricato, 1997:25).

Rio de Janeiro e São Paulo tiveram um grande adensamento habitacional em suas áreas urbanas (centrais), em especial no final do século XIX: um aumento populacional, somado a desestruturação urbana para acomodação desta tamanha demanda, ocasionou a exposição de várias problemáticas que acompanham a história da urbanização do Brasil.

Entre 1887 e 1900 nele (Estado de São Paulo) entraram 599 pessoas que vinham principalmente da Europa. A cidade de São Paulo cresceu 3% entre 1872 e 1886,8% entre 1886 e 1890 e 14% entre 1890 e 1900. O processo migratório era tão intenso que, em 1920, a maioria absoluta da população de São Paulo era Italiana. [...] No Rio de Janeiro, para onde acorreram muitos escravos libertos das fazendas decadentes, a população quase dobrou entre 1872 e 1890. O crescimento urbano acarretou uma demanda por moradia, transporte e demais serviços urbanos até então inédita. Em 1861, 21. 929 pessoas, de uma população de 191.002, viviam em cortiços. Em 1888 esse número foi para 46.680. A concentração da pobreza, a

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ausência de saneamento básico, o desemprego, a fome, os altos índices de criminalidade, as epidemias, a insalubridade e o congestionamento habitacional nos cortiços e casa de cômodo como degradantes e imorais, e ameaças à ordem pública. (Maricato, 1997:26-27).

Nesta tabela, apresentada por Maricato (1997:27) podemos visualizar de forma quantitativa a ocupação do solo urbano brasileiro, em suas maiores cidades.

Tabela: 1 : Evolução demográfica urbana.

1872 1890 1900 Rio de Janeiro 274.972 522.651 691.656 Salvador 129.409 174.412 205.813 Recife 116.671 111.556 113.106 Belém 61.997 50.064 96.560 São Paulo 31.385 64.934 239.820

Fonte: Anuário estatístico de 1912. Rio de Janeiro, 1916.

Tamanha concentração urbana causou medidas que seriam paliativas, como o surgimento de ocupações nos morros (favelas). Uma das teorias do surgimento das favelas no município do Rio de Janeiro coloca em evidência a política habitacional destinada para os pobres e negros, logo depois do retorno dos combatentes, os quais perderam o território onde residiam, foi à alocação provisória destes em áreas próximas ao Ministério da Guerra, em áreas de pouco valor comercial, que iniciaram as políticas habitacionais direcionadas para a camada mais pobre da população.

[...]o acampamento nas proximidades do Ministério da Guerra foi a solução provisória, assim como provisória foi a ocupação dos cortiços e das encostas da área central. [...] favela e cortiço como lugares de moradia dos mais pobres, escrevem que as casas de tijolos são escassas, insuficientes para abrigar boa parte da população, obrigada a habitar em favelas ou cortiços. Campos (2005:57).

Esta medida provisória, como é de conhecimento, tornou-se definitiva em alguns pontos da cidade, como medida alternativa direcionada para esta fração da

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29 população (ocupação em favelas), é comprovado o descaso do Estado para com estes, neste período não existe política social de habitação destinada a esta parcela da população, os mesmos são obrigados utilizarem como alternativa se aventurarem em ocupações em áreas insalubres, terrenos abandonados e íngremes, encostas e etc. Entretanto, neste momento estão longe do alcance da cidade formal onde não podem incomodar ou deixar a cidade feia, sendo esta uma oportunidade de segregação e marginalização dos citados.

As reformas urbanas na cidade do Rio de Janeiro confirmaram ainda mais que o destino da ocupação dos morros cariocas, os quais estavam destinados a grande massa de negros e pobres.

[...] o mesmo crescimento urbano acelerado que levou à proliferação de loteamentos nas encostas dos morros no final do século XIX tornou também inevitável a sua posterior ocupação pelos mais pobres, principalmente disperso pela reforma urbana realizada na cidade, no inicio do século XX, que redefiniu os usos e as funções da área central, retirando dela a responsabilidade de dar abrigo às classes mais pobres da sociedade. (Abreu,1988 apud Campos, 2005:57).

Estas reformas foram ocasionadas pelos interesses de estruturação da cidade para o aporte do capital, as reformas moldaram a cidade para os meios e fins econômicos deixando de lado todos aqueles que foram protagonistas desta, e também o sustentáculo para criação do espaço urbano, estes foram excluídos, pois suas moradias eram consideradas como nocivas estas avaliações foram embasadas no ideário higienista: “[...] os hábitos de moradias coletivas seriam focos de erradicações de epidemias, além de, naturalmente, terrenos férteis para a propagação de vícios de todos os tipos.” (Chalhoub, 1996a: 29 apud Campos, 2005:60).

O espaço urbano carioca, talvez em todo o Brasil, foi construído de forma a favorecer sempre ao capital, se adequando as necessidades deste, deslocando forçadamente a população dos cortiços e favelas, áreas de que passaram a ser de interesse comercial.

Entendemos como desconstrução do espaço favelado a ação do Estado associada aos interesses da classe dominante, quando esses dois agentes

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impõem, de maneira compulsória, o deslocamento forçado da população mais pobre de uma determinada área da cidade, visando reassenta-la em áreas distantes. Essa política visa, tão somente, à valorização da área desocupada para futuros empreendimentos, sejam eles públicos ou privados. Dessa maneira, o que era considerado depósito de entulho humano (os espaços supracitados) é agora valorizado em função do interesse que grupos hegemônicos têm pela área. (Campos, 2005:66).

Estas decisões de remoções realizadas pelo Estado, sempre foram camufladas sob a questão da saúde (insalubridade), ou então, o cerne é a questão ambiental, para assim dissimular o real interesse e captar apoio da população para tais medidas arbitrárias.

A questão da higiene foi fundamental para justificar a construção capitalista no espaço do Rio de Janeiro, colocando-se, em nome do bem comum (quase de todos), a necessidade de afastar da área central grande parte dos cortiços que abrigavam os negros egressos da escravidão e, em menor proporção, outros segmentos sociais. Posteriormente, entrou em cena o “risco” ambiental, quando foram removidas (desconstruídas) centenas de favelas. (Campos, 2005:71).

A reforma urbana de cunho higienista e de recorte capitalista, principalmente na cidade do Rio de Janeiro, que foi apresentada como ideia central para uma urbanização exclusivista das grandes cidades no Brasil, ficando o que é a prioridade para o Estado, consistindo em adequar o espaço urbano para aporte ou atração do capital estrangeiro, foram tomadas medidas como: a ampliação do porto do Rio de Janeiro, um dos maiores no começo do século XX, ampliação das ruas e avenidas para maior facilidade para o escoamento das mercadorias dentre outras medidas em prol da “evolução” da produção da cidade. A utilização do ideário da “limpeza” urbana adotado pelo Estado na época, uma decisão política exclusivista.

Para tamanha reforma urbana, através de indicação direta do presidente do Brasil, Rodrigues Alves em 1902, foi nomeado o Engenheiro Francisco Passos, como prefeito do Distrito Federal, Rio de Janeiro.

Esta indicação trouxe poderes decisórios e concentração do poder para as mãos do Prefeito, a realização de uma reformulação, leia-se expulsão dos pobres, foi realizada de maneira muito efetiva.

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Foram construídos 120 novos grandes edifícios no lugar de 590 prédios velhos em apenas vinte meses. As famílias pobres eram despejadas sem complacência dos cortiços ou “cabeças-de-porcos” (casas cujos cômodos eram repartidos por várias famílias) localizados nas áreas centrais. O rápido crescimento populacional urbano sem o acompanhamento de serviços de saneamento foi a causa de epidemias – cólera, febre amarela – que tomavam conta da cidade. (Maricato, 1997:28).

A estruturação de uma modernização urbana que se apresenta como segregadora, que investe na cidade dos grandes capitais e deixa de lado a base motriz de todo este desenvolvimento econômico, a classe trabalhadora, as quais são isoladas e expulsas das áreas que já ocupavam, estes espaços que interessam comercialmente, para serem alocados sem estruturação em diversas áreas de pouco valor e de alto risco para ocupação humana.

[...] o urbanismo que iria se consolidar durante todo o século XX no Brasil: a modernização excludente, ou seja, o investimento nas áreas que constituem o cenário da cidade hegemônica ou oficial, com a consequente segregação ou diferenciação acentuada na ocupação do solo e na distribuição dos equipamentos urbanos. [...] a cidade da Republica separa o trabalho do ócio. Expulsa os negros e brancos pobres para as periferias, para os subúrbios, para os morros ou para as várzeas. [...] A cidade oculta o trabalho e segrega o trabalhador. (Maricato, 1997:30).

Uma diversidade de regimentos que proíbem a construção de cortiços, pelo menos em áreas formais da cidade, são elementos contributivos para o principio de um mercado muito lucrativo, o mercado imobiliário e construtor.

Diversas exigências como plantas, posse legal do terreno, dentre outras requisições estimulam a exclusão dos pobres para os subúrbios e morros, onde a lei e o interesse deste mercado não existiam.

Os códigos de posturas de São Paulo (1886) e do Rio de Janeiro (1889) tornam proibitiva a construção de cortiços nas áreas centrais, que proliferam então nos subúrbios já existentes, ao lado da pratica da autoconstrução da moradia. As favelas, que irão marcar a realidade urbana do Rio de Janeiro desde o começo até o final do nosso século, instalam-se, inicialmente nos morros mais próximos do centro. (Maricato, 1997:30).

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32 Ainda Segundo Maricato (1997:30), a questão da expansão do transporte urbano foi essencial para a ligação da área central até o subúrbio, principalmente o transporte ferroviário, expandindo a cidade para as proximidades de onde se passavam as linhas férreas.

Onde existe uma maior proximidade, ou ainda, se tem infraestrutura (água, esgoto, praças e etc.), o preço da terra ou imóvel se torna maior do que em outros espaços, ou seja, as terras em áreas estruturadas são de acesso restrito, pois seu valor especulativo de mercado passa a se tornar enorme, assim sendo, mais uma vez, mercadoria cara e de luxo para poucos.

Como parte desse valor vem dos investimentos públicos aplicados nas obras urbanas, é fundamental, para os proprietários de terra e para o nascente capital imobiliário, o controle sobre os recursos públicos. Na construção das obras urbanas coletivas, as empreiteiras que começam a substituir profissionais autônomos garantiam, frequentemente, o financiamento. Inicia-se uma articulação pela qual passarão, nas próximas décadas, as mais importantes decisões sobre a produção do espaço urbano. Ela vincula os proprietários de terra e imóveis, capitais imobiliários, construtoras, parlamentares e governantes e as concessionárias de serviços públicos contratadas por capital estrangeiro. (Maricato, 1997:31).

Como observamos, o gerenciamento do Estado no enfrentamento das questões sociais vivenciadas pela classe trabalhadora ocorre de forma pontual, ou inexistente, o controle social é efetivado de forma repressiva, tratando a questão social habitacional, ou outra qualquer, como caso de polícia.

O controle exercido pelo Estado sobre os grupos menos favorecidos é, em geral, expresso pela marca da violência com que são tratados os mais pobres. Hoje início do século XXI, mudaram as estratégias, mas a questão dos mais pobres continua como uma questão policial. Neste caso estamos nos referindo à violência tácita,seja na ocupação do espaço, seja na ação coletiva, onde a repressão é a melhor arma para a negociação entre o Estado e os desvalidos da sociedade. (Campos, 2005:64).

Além do poder repressivo exercido pelo Estado, este também exerce um poder, que segundo Campos (2005:64), intelectual e cultural que é incontestável e influência diretamente no cotidiano da classe trabalhadora.

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[...] grande parte dos grupos subalternos encontrava-se fora da escola e à margem da sociedade, as instituições (escola, igrejas, clubes) serviram como meio de reproduzir os valores que manteriam os grupos considerados subalternos em condição de precariedade de vida durante todo o século XX. (Campos, 2005:64).

A esfera Estatal acaba por endossar o ideário da classe dominante, com ideias e estigmas discriminatórios e segregacionistas direcionados para as classes mais pobres, como também, em sua área de convivência e habitação.

Como a favela, ainda hoje, está umbilicalmente ligada à questão do “risco”, as classes dominantes criam, em cada momento, um discurso que vinha dando sustentação às suas práticas sócio-espaciais, baseando-se quase sempre nos ideários discriminatórios e segregacionistas. A questão da higiene foi fundamental para justificar a construção capitalista no espaço do Rio de Janeiro, colocando-se, em nome do bem comum (quase de todos), a necessidade de afastar da área central grande parte dos cortiços que abrigavam os negros egressos da escravidão e, em menor proporção, outros segmentos sociais. Posteriormente, entrou em cena o “risco” ambiental, quando foram removidas (desconstruídas) centenas de favelas. Atualmente, vê-se a sociedade buscar soluções contra o “risco” da segurança pública, principalmente no que tange ao tráfico de drogas e varejo. (Campos, 2005:71).

As decisões políticas são tomadas á favor de uma cidade apta para o aporte do capital, em detrimento da exclusão ou afastamento da classe operária, ou pobre, esta cidade formal ganhará formato que evidência ainda mais o fortalecimento do capital imobiliário, construtores, investidores internacionais e etc.

1.5. Brasil de grande déficit habitacional e mercantilização

dos Direitos.

Um grande problema que há de ser enfrentado para a existência de uma urbanização igualitária e de alcance a todos, é o déficit habitacional, um dos maiores problemas ocasionados por uma urbanização de viés capitalista em detrimento de grandes lacunas apresentadas na política pública de habitação, Boulos (2012:13) tipifica os déficits:

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[...] o quantitativo (número de famílias que não tem casa) e o qualitativo (número de famílias que moram em situação extremamente inadequada). Estes dois dados juntos formam o quadro do problema habitacional brasileiro.

Ainda segundo Boulos (2012:13), que se utiliza de dados relacionados a estudos realizados pela Fundação João Pinheiro (2007/2008), dados estes que são utilizados pelo Governo os quais apontam um déficit quantitativo de 6.273.000 famílias, algo no entorno de 22 milhões de pessoas que não tem moradia.

Até o momento somente foram apresentados números que dizem respeito ao déficit quantitativo de moradias, para agravamento destes dados já relacionados ainda temos o déficit habitacional qualitativo, onde são sinalizadas as moradias com o mínimo de conforto para os seus habitantes, como nos apresenta Boulos (2012:14):

[...] o problema se completa com o chamado déficit habitacional qualitativo, que refere-se à inadequação das condições básicas para uma vida digna. Este número é maior que o anterior: são quase 15.307.406 famílias nesta situação, isto é, cerca de 53 milhões de pessoas. Ou seja, quase 1/3 dos brasileiros sofrem com a falta de condições mínimas de moradia digna.

Os problemas que atingem a maior camada das famílias citadas são a falta de diversos serviços básicos para manutenção ou ausência de uma moradia salubre com condições ideais para habitação, dentre estas necessidades estão: inexistência de luz elétrica, esgoto, água encanada, coleta de lixo, como também, o grande adensamento das residências, ficando caracterizada uma grande concentração pessoas por um espaço ínfimo.

Os principais atingidos por uma inexistência de uma política pública de habitação igualitária e eficaz são os trabalhadores e os mais pobres que são cada vez mais excluídos do acesso às cidades formais e buscam como alternativa a ocupação em áreas de risco e de menor valor de mercado.

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Os brasileiros que sofrem com o problema de moradia- seja pela falta, seja pela inadequação das casas ou ausência de serviços básicos – são os trabalhadores mais pobres, em especial aqueles que vivem nas periferias urbanas. Os dados mostram 90% das famílias que não tem casa no Brasil vivem com renda menor que 3 salários mínimos por mês. (Boulos, 2012:15).

Apesar dos dados apresentados citando a ausência de moradias no Brasil, essa idéia pode ser desmentida a seguir:

[...] são 6.273.000 de famílias que não tem casa nos país. Problema muito grave, principalmente quando a mesma pesquisa nos mostra que existem 7.351.000 de imóveis vazios, sendo que 85% deles teriam condições de serem imediatamente ocupados por moradores. Ou seja, há mais casas sem gente do que gente sem casa. Em tese, nenhum imóvel precisaria ser construído para resolver o problema habitacional do Brasil. (Boulos, 2012:17).

Com estes dados confirma-se que não existem habitações disponíveis somente para a camada mais pobre da população, ou seja, uma política pública habitacional de um Estado conivente com o capital imobiliário, tratando um direito assegurado em constituição à todos como uma mera mercadoria excluindo uma grande parcela da população ao seu acesso, caracteriza-se como um produto de grande valia e de enriquecimento de grandes construtoras e especuladores imobiliários.

A moradia não é tratada ou entendida como um direito, como deveria, e sim como uma mercadoria para quem for capaz de realizar a sua compra via mercado imobiliário.

[...] Entender a moradia como direito significa pensa-la a partir da necessidade e do uso. Ao contrário, a lógica capitalista dominante trata a moradia – e todos os “direitos” sociais – a partir do valor medido em dinheiro, o valor de troca. Para o capital, pouco importa se há gente precisando de moradia, importa se há quem possa pagar por ela e trazer lucro às construtoras e donos de terra. Tudo é transformado em mercadoria, independente das necessidades sociais. Se não fosse assim, seria inexplicável haver tantas casas vazias ao lado de tanta gente sem-teto. (Boulos, 2012:18).

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36 O direcionamento das políticas públicas sociais habitacionais brasileiras foram direcionados à atender o mercado imobiliário e construtores,e consequentemente a classe média emergente, como também, os ricos, restando ao trabalhador apenas ocupar áreas de risco, alugueis de longos períodos, dentre outras medidas de sobrevivência e resistência.

Segundo Boulos (2012:18), se o Estado cumprisse o seu dever de garantir os direitos de moradia, dentre outros, iria interferir diretamente no mercado, seja ele imobiliário ou outro qualquer, por exemplo, o educacional, o investimento na criação de escolas de qualidade iria interferir diretamente no mercado lucrativo de escolas particulares, deixando de gerar lucros instituições particulares de ensino, e para outros investidores.

1.5.1 - Políticas Habitacionais de Cunho Mercantil: BNH ao

Minha Casa, Minha Vida.

Os primeiros programas habitacionais que foram gerenciados pelo Estado, emergem sob o nome de SFH (Sistema Financeiro de Habitação) e BNH (Banco Nacional da Habitação), programas criados para conquistar a simpatia ao regime militar, pois bem, o principal objetivo destes seria o de sanar o déficit habitacional, qualitativo ou quantitativo, entretanto, já em sua nomenclatura identificamos sua caracterização capitalista e financeira, “Banco”, qual seria o comprometimento de um “Banco” com uma população sem renda para financiar suas moradias? Podemos observar em Boulos (2012:19) o que representaria a inserção de um Banco como gestor de uma política habitacional.

Os programas habitacionais desenvolvidos pelo Estado brasileiro não representaram jamais um contraponto à lógica de eliminação da moradia como direito. Ao contrario: aprofundaram o caráter excludente e mercantil desta lógica.

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37 Este projeto de programa público de habitação surgiu em 19646, com o já citado BNH que teve grande aporte financeiro do Estado, entretanto, sua gestão capitalista e bancária não atingiu aos que necessitavam diretamente dele, isto é, a camada mais pobre da população, esta política foi direcionada para o capital imobiliário, caracterizando uma gestão puramente financeira da política social de habitação.

Isso ocorreu por conta da lógica bancária e empresarial do BNH. Não havia praticamente nada de subsídio, isto é, o valor completo do imóvel tinha que ser pago pelo mutuário do programa. Além disso, as prestações eram elevadas e seguiam as normas de crédito bancário privado. (Boulos, 2012:19).

A subordinação do Estado aos ditames capitalistas fundamentaram a construção do espaço urbano brasileiro, superando a necessidade real de superação do déficit habitacional, além da crescente aglomeração urbana fundamentada nesta lógica excludente do acesso a moradia através do mercado.

Este será um processo em que a população urbana do Brasil saltará de 31,3%, em 1940, para 74,8%, em 1991, a maioria ligada ás classes populares, que para a lógica da “cidade do capital” não constituem demanda para políticas urbanas, o que irá gerar um espaço urbano extremamente fragmentado e excludente (Botega, 2008:2).

A formação urbana brasileira foi fundamentada nestes moldes, os quais excluíam aqueles que não detinham capital para obtenção da mercadoria habitação, aprofundando as desigualdades, a segregação sócio-espacial das camadas populares que acabavam por se utilizar como instrumento de resistência a ocupação de terrenos nas áreas periféricas da cidade formal.

[...] o principal recurso que historicamente as classes populares têm buscado para suprir a crise de habitação, qual seja, a ocupação de terrenos vazios que, no caso do Rio de Janeiro, eram os subúrbios e as encostas dos morros. (Botega, 2008: 4).

6

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38 O grande crescimento urbano somado as políticas de habitação capitalista excludentes contribuíram substancialmente para o agravo da questão social que circunda esta política, podemos observar na tabela a seguir o crescimento urbano em detrimento da diminuição da população rural.

Tabela: 2 - Alocações da população brasileira entre 1940 e 1991.

Década de: População Urbana em % População Rural em % 40 31,2 68,8 50 36,2 63,8 60 45,4 54,6 70 55,9 44,1 80 67,7 32,4 E 1991 24,5 24,5 Fonte: IBGE.

Através dos dados expostos na tabela anterior podemos notar que as décadas de 50 e 60 foram os momentos cruciais para construção das políticas voltadas para área de habitação e urbanização por ser um período de grande êxodo rural e migração para o espaço urbano, um momento político de maciço investimento na área industrial e urbana.

O BNH, que deveria construir moradias de interesse social para atingir a camada popular da sociedade brasileira, foi gerido sob lógica de mercado e adaptou-se a sua demanda, reorientando os investimentos ou créditos para a classe média alta, excluindo a maioria da população deste financiamento, apesar da utilização do FGTS (Fundo de Garantia e Tempo de Serviço) como mecanismo de arrecadação, configurando um dos maiores bancos do Brasil durante todo o seu funcionamento.

A política habitacional, SFH/ BNH, ligados intimamente ao mercado imobiliário sofreu um grande abalo diante às crises inflacionárias da década de 1980. Segundo Botega (2008:9), a grande inflação decorrente desta crise fez o

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