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O direito de exoneração previsto em cláusulas contratuais : em especial nas sociedades anónimas

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DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

ALUNA: Mónica Pereira Sousa Mota da Fonseca Área: Ciências Jurídico-Empresariais

Orientadora: Professora Maria de Lurdes Pereira

O DIREITO DE EXONERAÇÃO PREVISTO EM CLÁUSULAS

CONTRATUAIS - EM ESPECIAL NAS SOCIEDADES ANÓNIMAS

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2 Modo de Citar

Na primeira citação, as obras serão citadas, identificando-as pelo nome do autor, título da obra, volume, edição, editora, local de publicação, ano, indicando a página ou páginas.

Posteriormente, as obras serão citadas pelo nome do autor, primeira ou primeiras palavras do título e indicação da página ou páginas.

Em cada note de pé de página, sendo citado mais de um autor, serão indicados por ordem alfabética.

Quando sejam referenciadas disposições legais sem indicação da fonte elas correspondem a artigos do código das sociedades comerciais, aprovado pelo decreto-lei n.º262/86, de 2 de Setembro.

Poderão ser utilizadas abreviaturas constantes da lista que se segue. Foram consideradas obras publicadas até Dezembro de 2016.

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3 Índice de Abreviaturas A. – Autor (a) AA. – Autores Ac. – Acórdão Acs. – Acórdãos Al. – Alínea Art.- Artigo Arts.- Artigos

BMJ – Boletim do Ministério da Justiça CCIt – Código Civil Italiano

CC – Código Civil Português (1966)

CCom – Código Comercial Português (1888) Cit – Citado

CPC – Código de Processo Civil

CRP – Constituição da República Portuguesa

CSC – Código das Sociedades Comerciais Português (1986) CVM – Código dos Valores Mobiliários

D.L. – Decreto-lei

OPA – Oferta Pública de Aquisição Pág. – Página

SS. – Seguintes Vol. – Volume

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4 INTRODUÇÃO

O presente trabalho, elaborado no âmbito do mestrado em ciências jurídico-empresariais, leccionado na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, visa compreender a figura do direito de exoneração no direito comercial português, em especial nas sociedades anónimas.

O direito de exoneração é um mecanismo que permite aos sócios, mediante a verificação de certas circunstâncias, desvincularem-se da sociedade obtendo o reembolso da sua participação. Pode traduzir-se em um “…direito do sócio, que quebra o princípio de que não se pode derrogar ou revogar unilateralmente um contrato…”1.

Este mecanismo visa proteger várias finalidades, entre as mais relevantes estarão a protecção dos sócios no sentido de não ficarem reféns da vontade da maioria no que concerne a decisões de especial relevo na vida da sociedade e a possibilidade de desvinculação quando haja existido um vício da vontade na entrada para a sociedade.

No presente trabalho tentei, primariamente, uma abordagem ampla à figura do direito de exoneração, nomeadamente quanto à sua noção e aplicabilidade. Foi preciso compreender o seu surgimento no direito português, bem como a contextualização da sua evolução histórica. Outra pertinente e inevitável abordagem é a comparação entre diferentes ordenamentos jurídicos onde o direito de exoneração é também comtemplado. Foram analisados os ordenamentos jurídicos europeus mais influentes, o italiano, o francês e o espanhol.

Posto isto, era fulcral a análise do regime do direito de exoneração no direito português, balizando o instituto e demonstrando o seu funcionamento. Na análise do instituto deparamo-nos com disposições legais que o permitem, bem com a admissibilidade de cláusulas contratuais que o contemplem. E é nestas últimas, a propósito das sociedades anónimas, que surgem as maiores reservas e divergências doutrinais, derivadas do silêncio do legislador, que foi preciso tentar interpretar e integrar.

Têm sido apontadas várias causas para este silêncio, designadamente, o princípio da livre transmissibilidade de acções em especial nas sociedades abertas. Isto porque esta possibilidade resolveria muitos dos problemas que o direito de exoneração se propõe a resolver, porém esta possibilidade nem sempre se verifica.

1

JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, Direito Comercial: Sociedades Comerciais, Parte Geral, Vol. IV, Faculdade de Direito de Lisboa, Lisboa, 2000, pág.371.

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Outra questão que decorre do estudo da figura do direito de exoneração é a sua previsão distinta consoante o tipo societário em causa. Esta questão é tão mais importante quando abordamos as sociedades por quotas e as sociedades anónimas, ambas sociedades de capitais, e em que se verifica uma disparidade enorme entre os regimes. O presente trabalho tentou dar resposta a estas e outras questões relevantes para aplicação do mecanismo do direito de exoneração.

Finalmente, no seguimento de alguns estudos recentes2, foi feita uma incursão pela disciplina do direito dos valores mobiliários, onde se pensa existir um direito de exoneração em sentido impróprio que é exercido através das ofertas públicas de aquisição obrigatórias. Esta figura do direito dos valores mobiliários visa permitir às minorias desvincularem-se da sociedade, quando esta esteja sobre domínio e controlo de uma determinada entidade, sem que para isso haja perda do investimento efectuado, ou pelo menos que haja uma perda diminuta. O motivo desta figura é conferir ao (s) sócio (s) a possibilidade de abandonarem a sociedade bastando apenas para isso alienarem a sua participação social.

2 MARIA ELISA DE SOUSA CARMO, A OPA obrigatória como direito de exoneração, Dissertação de

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6 PRIMEIRA PARTE

ENQUADRAMENTO GERAL

Noção e Principais Elementos Caracterizadores

1. Noção de direito de exoneração

O direito de exoneração é um direito adquirido em simultâneo com a participação social, é o direito do sócio de retirar-se, desvincular-se da sociedade mediante a ocorrência de certas condições legais ou contratuais.

A formação de qualquer sociedade, seja ela comercial ou civil, é realizada através de um contrato, contrato esse que, à semelhança dos demais, tem origem na liberdade contratual.

Imperando nas sociedades comerciais a regra do respeito e da imposição pelas decisões da maioria, o direito de exoneração visa tutelar as minorias quando as decisões societárias têm significativo relevo e não seja conveniente ou justo serem suportadas pelos que não as aprovaram.

O direito de exoneração é o direito de um sócio abandonar a sociedade, de natureza potestativa, renunciável a posteriori pelo seu titular, realizável através de uma declaração receptícia e que se efectiva com o reembolso da participação social.3

3 No Direito português existem várias posições doutrinais no que concerne à definição do direito de

exoneração.

COUTINHO DE ABREU, Curso de Direito Comercial, Vol.II, Das sociedades, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2007, p.418, define o direito de exoneração dos sócios como “a saída ou desvinculação deste,

por sua iniciativa e com fundamento na lei ou no estatuto, da sociedade”.

DANIELA FARTO BAPTISTA, O direito de exoneração dos accionistas das suas causas, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, pág. 84, concretiza este direito como “ individual não potestativo, inderrogável e

indisponível pela maioria mas renunciável a posteriori pelo seu titular, de exercício unitário e de consagração legal ou convencional, que permite ao accionista, quando alguma vicissitude societária torna inexigível a sua permanência na organização social, abandonar voluntaria e unilateralmente a sociedade anónima a que pertence e que subsiste para além da sua exoneração, através do reembolso do valor das acções por ele detidas no património social e a consequente extinção da qualidade de sócio que manteve até então.”

JOÃO MARIANO CURA, Direito de exoneração dos sócios nas sociedades por quotas, Almedina, Coimbra, 2005, pág. 27, afirma: ” Sendo o direito de exoneração um direito subjectivo, uma vez que o seu

exercício se encontra na livre disponibilidade da vontade do seu titular, apresenta-se como um direito subjectivo stricto sensu”

JOSÉ OLIVEIRA ASCENSÃO, Direito Comercial: Das sociedades comerciais, Parte Geral, Vol. IV, pág. 371, “Direito do sócio, que quebra o princípio de não se puder derrogar ou revogar unilateralmente

um contrato”

Mª AUGUSTA FRANÇA, Direito à exoneração, Novas perspectivas do direito comercial, Almedina, Coimbra, 1988, pág.207, entende que o direito de exoneração será “a faculdade concedida ao sócio de se

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Os contratos não devem ser eternos, nem limitar as opções dos contraentes, uma vez que tudo muda, também os contratos devem acompanhar estas mudanças.

2. Elementos Caracterizadores do Direito de Exoneração 2.1 Direito exclusivo dos Sócios

O direito de exoneração destina-se exclusivamente aos que, no momento do facto legalmente previsto para a exoneração, eram sócios da sociedade, não se aplicando assim aos promitentes-compradores nem a usufrutuários.

2.2 Direito Potestativo

A maioria da doutrina analisa o direito de exoneração como um direito de natureza claramente potestativa.4 Contrariamente, Daniela Baptista considera-o um

direito subjectivo comum5, justificando a sua posição no facto de a sociedade poder alterar ou revogar a causa que originou o direito de exoneração e porque apenas considera concretizado o direito de exoneração quando o sócio é ressarcido do valor da sua participação social. Cura Mariano6, apresenta como objecção à qualificação do direito de exoneração como um direito potestativo o facto deste só se efectivar com a saída do sócio aquando da liquidação.

Ora vejamos. Embora apenas com a liquidação se torne efectiva o fim da relação societária a verdade é que o direito de exoneração está na livre disponibilidade do sócio desde que reunidas as condições que permitam a exoneração. A sociedade limita-se a receber a declaração de intenção do sócio em quebrar o vínculo contratual com aquela. Isto mais não é que um direito potestativo, tendo o poder de pôr fim àquela relação sem necessidade de consentimento dos demais.

2.3 Renunciável a posteriori

Alguma doutrina tem-se debruçado sobre a questão da irrenunciabilidade deste direito. Para alguns pode ser renunciável por cláusula estatutária, com ou sem unanimidade.

4 No direito Português a doutrina tem sido praticamente unanime.

AMADEU FERREIRA, Amortização de quota e exoneração de sócio, Reflexões acerca das suas

Relações, Lisboa, 1991, pág.23-26

MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito das Sociedades, II - Das Sociedades em Especial, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2007, pág.323.

RAÚL VENTURA, Sociedades por quotas, Vol. II, artigo 240º a 251º, Comentário ao Código das

Sociedades Comerciais, 3ª reimpressão da 2ª edição de 1989, Almedina, Coimbra, 2004 pág.10.

5 DANIELA FARTO BAPTISTA, O Direito de Exoneração dos Accionistas Das Sua Causas, pág.

149-151.

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À luz do direito Português vigente parece não ser possível a priori renunciar a este direito, por um lado porque é um imperativo legal que não prevê discricionariedade na sua aplicação e de outro modo ainda que se vislumbrasse essa possibilidade desvirtuaria por completo tudo aquilo que o direito de exoneração visa proteger.

Contudo sendo um direito exclusivo do sócio, pertencente à sua, e apenas à sua esfera jurídica, podendo este usar a faculdade do seu exercício ou não, isto torna este direito renunciável, à posterior, perante uma concreta causa de exoneração já verificada.

2.4 Realização através de uma declaração receptícia. Direito unilateral.

Dada a natureza potestativa do direito de exoneração, como analisado supra, ele realiza-se através de uma mera comunicação da pretensão do seu exercício pelo sócio à sociedade. Esta questão é independente do momento da concretização da exoneração, dado que a sociedade pode alterar ou revogar a causa que originou a pretensão do direito de exoneração.

Pode até, porventura, o sócio, antes de reembolsado do valor da sua participação social, alterar a sua vontade.

Contudo, todo o processo de exoneração tem início na vontade do sócio em abandonar a sociedade, por não conseguir conceber a continuação daquele contrato, quando se dirige à sociedade, a expressar o seu desejo, explicando claramente os seus motivos e pedindo a efectivação daquele direito com o reembolso da sua participação.

Esta declaração não depende de qualquer acto ou mesmo de concordância da sociedade, dos restantes sócios ou dos administradores.

2.5 Efectivação com o reembolso da capital

A primeira ilação após o envio da declaração de exoneração é a obrigação que impende sobre a sociedade de fazer extinguir a relação societária.

A extinção desta relação pode acorrer através de diferentes instrumentos de que a sociedade dispõe, porém todos se concluem no reembolso da participação ao sócio exonerado.

Em termos gerais, sem prejuízo de análise mais aprofundada para cada tipo societário, a sociedade pode extinguir a participação social amortizando, adquirindo ou fazendo adquirir por sócios ou terceiros a participação social.

Em última análise pode a sociedade ser dissolvida, a requerimento de um interessado, sendo este ressarcido do valor da sua participação social aquando da dissolução da sociedade.

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Assim, o processo de exoneração apenas fica concluso quando a sociedade, depois de seleccionado o processo de reembolso, o efectiva.

SEGUNDA PARTE

A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DE EXONERAÇÃO NO DIREITO PORTUGUÊS

1. Das Ordenações Filipinas às Companhias Pombalinas

A previsão legal do Contrato Social7 e da Companhia verificou-se no ordenamento jurídico nacional nas Ordenações Filipinas – 1595 a 1603 - (Livro IV, Título XLIV (do contrato da Sociedade e Companhia), recolhido do Digesto de Justiano (D., 17, 2: Pro socio).

Estabelecem-se aqui, pela primeira vez, o direito de renúncia. A renúncia de um sócio impulsionava o termo da sociedade, isto porque conduzia, obrigatoriamente, à dissolução da mesma.

Verifique-se, no entanto, que apesar da predita realidade algo destrutiva, a verdade é que os demais sócios não se encontravam ao abrigo de uma penumbra de completa desprotecção, na medida em que, sobre aquele que exercia o direito à renúncia impendia o dever de indemnizar os demais sócios pelo prejuízo.

A este preceito, refira-se que, a temática da licitude da livre desvinculação do sócio, no quadro supra descrito, era objecto de ponderação, assim, bifurcando-se a sua admissibilidade em dois cenários distintos: (i) cenário das sociedades constituídas por tempo ilimitado; (ii) cenário das sociedades constituídas com prazo de duração.

Com efeito, cumpre analisar, infra, os condicionalismos verificados em cada um dos casos individualmente considerados.

Ora, no âmbito das sociedades constituídas por tempo indefinido, era permitida a livre renúncia sem a verificação de quaisquer óbices ou consequências. Porém, de contrário, nos casos em que a sociedade havia sido constituída por um determinado período (com um termo, à priori, definido), existiam circunstâncias em que o direito de indemnizar não era imposto ao sócio desvinculante, por razões que se reputavam

7

RUI MANUEL DE FIGUEIREDO MARCOS, As companhias pombalinas – Contributo para a

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indubitavelmente justificativas da sua livre libertação, sem que sobre o mesmo recaíssem ónus. E assim, os referidos casos concretos em que sócio que pretendia desvincular-se em momento anterior ao fim do prazo de vigência, eram, habitualmente, os seguintes: (i) Quando a manutenção da relação com outro sócio fosse impraticável (incompatibilidades pessoais); (ii) Quando lhe fosse imposto o ingresso numa missão oficial; (iii) Quando o mesmo tivesse violado alguma regra correlativa da sua condição

de carácter de permanência na sociedade; (iv) Quando lhe tivesse sido embargado património, objecto de entrada para a sociedade.

Sucede que, posteriormente, no século XVII, nas Companhias Pombalinas, constata-se uma evolução no que tange a exoneração do sócio, sendo que numa lógica mais proteccionista dos direitos dos sócios e afastando-se da realidade algo redutora que subjazia na consequência de dissolução imediata da sociedade com a saída de um sócio, estabeleceu-se que a renúncia não dava lugar à imediata dissolução. Com esta alteração acolheu-se a ideia de que se sucedessem modificações supervenientes, consideradas de especial expressão das cartas da instituição ou caso se verificassem incumprimentos no que tangia aos privilégios atribuídos pelo rei, não haveria a dissolução imediata.

Ora, a livre desvinculação, nestes dois panoramas, originava a possibilidade àquele que renunciasse a ser ressarcido com o capital representativo das suas acções, num cúmulo com os lucros que à data lhe fossem devidos. 8

2. Código Comercial de 1833 à Lei das Sociedades Anónimas de 1867

Em 1833, em Portugal, foi aprovado o primeiro Código Comercial Português, com José Ferreira Borges (respectivo autor), não sendo de somenos importância referir que o mesmo era uma réplica do Código Comercial Francês criado em 1807.

Neste código o direito de exoneração não tinha consagração autónoma, era exercido de forma indirecta, através da possibilidade de dissolução da sociedade.

Assim, quando a sociedade não tivesse duração fixada previa o artigo CLXVIII (N.º693) que qualquer sócio poderia requere a dissolução da sociedade, desde que informasse os restantes sócios da sua intenção. Quando a duração da sociedade fosse limitada qualquer sócio poderia requerer judicialmente a sua dissolução nos termos do artigo CLXXI (N.º 696) mediante prova de um dos seguintes factos: mau comportamento de um dos restantes sócios; impossibilidade de continuação da

8 RUI MANUEL DE FIGUEIREDO MARCOS, As companhias pombalinas, pág. 599, nota 1610

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sociedade nos termos em que foi convencionada ou existindo abuso de boa-fé por parte de qualquer um dos restantes sócios.

A saída do sócio efectivava-se através da dissolução da sociedade.

A lei de 22 de Junho de 1867, reguladora das Sociedades Anónimas, não introduziu qualquer alteração ao regime em vigor da exoneração dos sócios.

3. Código Civil de 1867

No Código Seabra, a propósito do contrato de sociedade civil, o direito de renúncia manteve as mesmas admissibilidades nos dois cenários, supra ilustrados, ou seja, no caso das sociedades constituídas por tempo ilimitado e nos casos das sociedades constituídas por tempo determinado.

4. Código Comercial de 1888 até ao Decreto-lei 262/86 de 2 de Setembro

A 28 de Junho de 1888 foi promulgado o novo Código Comercial Português, produto dos esforços do então Ministro da Justiça, Veiga Beirão, através do qual se atestou a tipificação mercantil, diferenciando-se tipos societários, tais como: as sociedades em nome colectivo, as sociedades anónimas e as sociedades em comandita. No âmbito deste código a temática da dissolução aplicava-se a qualquer uma das tipologias mercantis, sendo que, a feição encerrada pelo mesmo que apontava no sentido de admissibilidade da livre desvinculação apenas era aceite em casos atípicos, podendo, desde que houvesse consensualidade, os estatutos regular esta realidade.9 E mais: as regras do código civil não se aplicavam subsidiariamente ao direito de exoneração, imbuído no novo Código Comercial Português.

No novo Código Comercial, no capítulo da dissolução, dentre várias formas de dissolução, porém, na vertente ora em análise e que nos cumpre descortinar, consagrou-se, a título pontual, a hipótese de dissolução pela vontade de um único sócio, no caso das sociedades por tempo indeterminado, desde que se tratassem de sociedades em nome colectivo. Todavia, esta regra era apenas de exclusiva aplicação às sociedades em nome colectivo, não se aplicando às sociedades anónimas e às sociedades comanditas.

Acontece que, o Código Comercial de 1888, nas sociedades em comandita por acções, estipulou que se na circunstância de em resultado de deliberação dos sócios houvesse sido decidido a demissão de um gerente, concedia-se àqueles que eram os

9 RAÚL VENTURA, Sociedades Comerciais: dissolução e liquidação de sociedades, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, Almedina, Coimbra, 1987, Pág. 453.

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sócios opositores daquela resolução, o recurso à prerrogativa de libertarem-se da sociedade, usufruindo do benefício ao reembolso do respectivo capital, na correspondente proporção que resultasse do último balanço de contas da sociedade.

A 11 de Abril de 1907, foi criada a Lei Reguladora das sociedades por quotas procurando com a mesma instituir um regime de efectiva responsabilização dos sócios, pela assunção das obrigações sociais.

A este propósito, para o tema sobre o qual nos debruçamos no presente estudo, importa-nos, no que se referia ao direito de exoneração dos sócios, sublinhar que foram contempladas, expressamente, regras das causas conducentes à exoneração e qual o

modus operandi para que tal ocorresse. Atentemos, então, aos casos em que tal

realidade era exequível: (i) quando o sócio se opusesse com a redução, reintegração ou aumento do capital social; (ii) quando o sócio não concordasse com a procrastinação do prazo de vigência da sociedade; (iii) quando o sócio não estivesse de acordo com a fusão da sociedade. Nos casos ilustrados, verificava-se a diminuição do capital social porquanto o sócio opositor era reembolsado no valor da sua quota.

O direito da livre exoneração dos sócios, nas sociedades constituídas por tempo indefinido, sem que tal acto desse lugar à extinção da sociedade, apenas teve previsão legal no Código Civil, criado em 1966.

Já nas sociedades constituídas por tempo limitado, a realidade era distinta, isto é, o exercício do direito à exoneração apenas se admitia nos casos de justa causa ou ainda quando pacto social assim o previsse.

Posteriormente, com o D.L. 583/73 de 8/11, surgiram novas regras para a livre desvinculação dos sócios, desenhadas para os quadros de fusão da sociedade, nas quais se determinado sócio não acolhesse tal decisão, poderia exonerar-se e, em consequência, recebia da sociedade uma contrapartida pela absorção da sua participação social por parte da sociedade.

Com o D.L. 262/86 de 2/9 aprovou-se o Código das Sociedades Comerciais, que se encontra, presentemente em vigor, mediante o qual, finalmente, consignaram-se regras concretas que permitem o direito de exoneração, extensível a todas as tipologias societárias. 10

10 FERNANDO OLAVO, Alguns apontamentos sobre a reforma da legislação comercial, no B.M.J., n.º

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13 TERCEIRA PARTE

O DIREITO DE EXONERAÇÃO NO DIREITO COMPARADO 1. O “diritto di recesso” no direito italiano

1.1. BREVE RESENHA HISTÓRICA DO DIREITO DE EXONERAÇÃO NO DIREITO ITALIANO

CÓDIGO COMERCIAL DE 1882

A primeira referência legislativa ao direito de exoneração surgiu no Código de Comércio Italiano de 1865. Mas foi o Codice di Commercio italiano de 1882 no seu artigo 158.º a regular, pela primeira vez, um diritto di recesso para os accionistas em desacordo11.

Esta disposição legal visava o equilíbrio entre a vontade da maioria, quando esta alterasse os estatutos, e o sócio discordante com essas mesmas alterações. As causas eram: a fusão, a reintegração ou aumento do capital social, modificação do objecto da sociedade e a prorrogação da sua duração para além do previsto na constituição da sociedade.

Relativamente à fusão, o direito de exoneração poderia ser avaliado em dois cenários distintos, vejamos:

(i) Num quadro em que se verificasse a fusão por via da incorporação, ao sócio da sociedade incorporante não lhe deveria ser permitida a libertação da sociedade, dado que, por princípio, não se dava a alteração do pacto social. Porém, neste cenário, a exoneração era admitida, nos casos em que concomitantemente à fusão se deliberasse no sentido da amplificação do capital social ou modificação do seu objecto social. (ii) Já num quadro em que se verificasse uma fusão por via da conglobação de duas sociedades distintas: neste, considerando que a ambas as sociedades seriam subtraídas as suas identidades originárias (nos termos em que haviam sido concebidas), enquanto sociedades individualmente consideradas, larga porção da doutrina comungava do sentido de que qualquer um dos sócios, de uma das duas, poderia exonerar-se.

É importante dar nota que nesta modalidade as duas sociedades ter-se-iam que se dissolver, admitindo-se ainda que, em virtude da dissolução, o sócio dissidente pudesse exercer o seu direito à absorção da sua quota-parte da liquidação.

11 TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração do sócio no código das sociedades comerciais, Almedina, Coimbra,2008,pág. 95, nota 265.

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Por outro lado, nos casos em que se desse a alteração do objecto social, era sempre acolhida a possibilidade de exoneração, uma vez que estar-se-ia perante uma outra sociedade que não a primariamente constituída12. Todavia, existia uma dissidência semântica que provocava discórdia no seio da doutrina e que se prendia com a própria expressão “alteração do objecto social”. Ou seja, as hesitações eram suscitadas quando não se estava face a uma modificação total do objecto social, sendo apenas uma parte da mesma tema de alteração.

Apesar do referido, era consensual que o direito de exoneração era admitido quando o objecto social era totalmente substituído por outro ou nos casos em que o objecto social primordial era coarctado.13

No que concerne ao aumento do capital social que se corporalizava através da subscrição de novas acções para os sócios, sendo que apenas tinha lugar quando havia um incremento real e materializado - não se admitindo a exoneração com base na mera expectativa da verificação desta realidade.14 Da leitura do Código Comercial Italiano de 1882, alguma doutrina15 detectava quanto a esta matéria uma lacuna, na medida em que se entendia que a subscrição de novas acções não era uma figura de carácter imperativo para os sócios e, por força desse entendimento, consequentemente, o direito de exoneração não era reconhecido aos sócios dissidentes.

Ora, o alcance de tal raciocínio focalizava-se no facto de que o aumento do capital social era visto como uma ocorrência trivial da boa gestão societária, condicio

sine quo non para êxito e manutenção do negócio. Ou seja, poder-se-ia entende-la como

um acto de visão estratégica visando o futuro, por parte dos sócios.

Ainda nesta senda, esta corrente preconizava que os sócios encontravam-se amparados, num quadro de incremento do capital social através de entradas em dinheiro, dada a admissibilidade legal do exercício do respectivo direito de preferência de cada um.

Uma outra corrente16 contra a exoneração nos casos de aumento do capital social defendia que uma deliberação nesse sentido apenas, e no limite, poderia ser nefasta para a sociedade e nunca propriamente para os sócios. Pois vejamos, perfilhava-se que não se estaria frente a uma modificação de especial expressão e importância dos estatutos e

12 Ac. Da CssIt de 17.10.1910, pg. 1135 a 1144.

13TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração…,pág. 103.

14TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração…,pág. 101, nota 290.

15 GIANCARLO FRÉ, Sul dirrito di recesso, riv. dir. comm., ano 31, Parte I, Milão, 1933, pág. 772-782. 16 TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração…,pág. 101, nota 292.

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ainda que tal acto enquadrava-se numa conduta que faria parte daquela que se concebe como a prática de actos de gestão elementares de uma empresa. Contudo, apesar das honrosas correntes supracitadas, era praticamente unânime que o exercício do direito de exoneração encontrava-se excluído quando se trata-se de uma amplificação decorrente de reservas, que se consubstanciava mediante uma repartição de novas acções, desonerada custos, para os sócios.17

Mais ainda, no quadro ilustrado, o não exercício do direito de exoneração acondicionava o afiançar do direito do sócio a preservar a sua participação social sem que, em virtude do aumento do capital social, houvesse para o mesmo despesas de carácter financeiro. Assim, o sócio assistiria a uma ampliação da sociedade, o que só poderia ser benéfico para o sucesso do negócio, e caso se socorresse do direito de exoneração, naturalmente que, numa perspectiva de racionalidade económica, sairia prejudicado.

Relativamente à modificação do objecto social, quando se verificasse, a doutrina era unanime na permissão e aplicação do direito de exoneração 18. Contudo quando apenas se verificasse a ampliação ou restrição do objecto social a doutrina já não reconhecia aos sócios o direito de se exonerarem pois não se verificava uma verdadeira alteração.

No que tange à procrastinação do tempo de vida da sociedade, a mesma implicava, naturalmente, uma amplificação da durabilidade da assunção da qualidade de qualquer sócio, assumida por estes aquando da respectiva constituição.

Contudo, havia opositores à ideia de que tal facto figurava condição bastante para o desencadear da prerrogativa, aqui estudada, de exoneração, isto porque poder-se-ia reputar que o tempo de vida da sociedade não conformava um elemento essencpoder-se-ial. Tal ideia encontrava-se respaldada na realidade do bom modelo de gestão societário, no qual só se justificaria a prorrogação do prazo final num quadro em que se perspectivasse a prossecução bem-sucedida do negócio. Todavia, sublinhe-se que, para grande parte da doutrina, tal causa consubstanciava um fundamento justificativo bastante conducente ao direito de exoneração do sócio dissidente.

Quanto as termos e condições a observar para o exercício do direito de exoneração do sócio dissidente eram as seguintes:

(i) Direito de reembolso:

17 TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração…,pág. 101, nota 294. 18 GIANCARLO FRÉ, Sul dirrito di recesso…pág. 788-789.

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Era líquido na doutrina que ao sócio dissidente que pretende-se exonerar-se, assistia-lhe o direito a ser reembolsado pela monta correspondente à sua participação social. Porém, as divergências da quantificação do valor do reembolso reconduziam-se à determinação do parâmetro através do qual se calculava a monta a entregar. Isto é, as dúvidas surgiam se deveria ter-se em linha de conta o último balanço aprovado (ainda que extraordinário), ou se, por outra banda, se teria como parâmetro o balanço ordinário aprovado19. Seja como for, autonomamente da matriz a considerar para a correcta determinação do reembolso, o sócio que julgasse que o mesmo lhe havia ser atribuído incorrectamente, poderia recorrer às vias judiciais, impugnando tal acto.

(ii) Prazo para apresentação da declaração de exoneração:

Os sócios que não tivessem estado presente na assembleia geral na qual se tivesse deliberado sobre qualquer uma das matérias supra descritas, dispunham do prazo de um mês, para exercer o direito de exoneração, a partir da data da publicação da decisão social.

Os sócios intervenientes na assembleia geral, dispunham de vinte quatro horas, desde o momento em que a mesma tivesse sido encerrada e na qual se tivesse deliberado sobre qualquer uma das matérias supra descritas.

(iii) Legitimidade

Grande parte da doutrina pugnava pelo entendimento em que se admitia que os sócios que se tinham abstido podiam exonerar-se20.

Por outro lado, estreita fracção da doutrina reputava que esse direito apenas assistia àqueles que tivessem intervindo activamente na assembleia, votando desfavoravelmente e ainda àqueles que não se encontravam presencialmente na mesma.

(iv) Forma da declaração

Existia no âmbito da legislação em apreço total liberdade de forma na apresentação da declaração de exoneração.

CÓDIGO CIVIL ITALIANO DE 1942

O novo código civil de 1942 veio reforçar a tendência de excepcionalidade do direito de exoneração que já vinha a ser usual desde 1915.

Dos principais aspectos sentidos ao nível do direito de exoneração com a vigência do código civil italiano de 1942 destaca-se a exclusão do acesso ao direito de

19

TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração…,pág. 104, nota 303.

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exoneração quando houvesse uma deliberação social que determinasse a fusão, procrastinação do tempo de vida da empresa, incorporação e ainda aumento do capital social. Esta limitação do acesso ao direito de exoneração implicou que o mesmo apenas se pudesse desencadear no caso de determinada deliberação optasse por reavaliar o valor das entradas, translação da sede para o estrangeiro e modificação do objecto social.

No que tange à reavaliação do valor das entradas eram tidas em consideração várias premissas, a saber:

(1.ª Premissa)

(i) Mitigou-se as facilidades dos actos que aparcassem as causas legais conducentes ao direito de exoneração, sendo aliás nulas as medidas que contrariassem essa possibilidade, pelo que, em consequência, enfatizou-se a índole pública do direito de exoneração21.

(ii) O direito de exoneração passou a conter um carácter excepcional22.

(iii) No entanto, resultado de leis avulsas especiais fora aditado às causas legais de admissibilidade outras três previsões, designadamente:

(1.º Caso) Quando se estivesse em causa acordos parassociais, celebrados com duração indefinida, desde que mesmos versassem sobre o direito de voto e as partes contraentes fossem sociedades cotadas.23

(2.º Caso) Quando se tratassem de sociedades cujo desígnio era privatiza-las, a libertação da sociedade era permitida ao sócio que discordasse da deliberação que determinasse a entrada do direito de veto do Estado.

(3.º Caso) Quando se estivesse perante uma deliberação de fusão de uma sociedade contada em bolsa, isto desde que a sociedade a primitiva ou aquela que fosse a ser constituída ao aquele que fosse objecto de fusão não fosse cotada na bolsa.24

Quanto as termos e condições a observar para o exercício do direito de exoneração do sócio também aqui houve alterações:

21 TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração… pág. 106.

22 TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração…,pág. 106, nota 309.

23 Art. 128.º do Decreto-Lei n.º 58, de 24.02.1998, Texto Único em Matéria de Intermediação Financeira. 24 Art. 131.º do Decreto-Lei n.º 58, de 24.02.1998, Texto Único em Matéria de Intermediação Financeira,

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Legitimidade

A doutrina maioritária continuava a considerar que a legitimidade para o exercício do direito de exoneração pertencia tanto ao sócio discordante como ao sócio que se absteve.

Declaração e Prazos

Com a entrada em vigor do CCit de 1942 iniciou-se a exigência de forma da declaração de exoneração, esta agora, deveria ser efectuada por carta registada.

No que aos prazos concerne passou a conceder-se uma extensão dos mesmos, que passou de 24 horas para 3 dias para os sócios participantes na assembleia geral, quanto aos sócios que nela não intervieram o prazo seria de 15 dias contados desde a inscrição no registo da deliberação social. Findos estes prazos o direito ao exercício do direito exoneração caducaria.

1.2 DIREITO VIGENTE

O decreto-legislativo n.º6, de 17 de Janeiro de 2003 transformou pronunciadamente as regras legais disciplinadoras do direito de exoneração, com especial enfoque nas sociedades anónimas, objecto do presente estudo.

Com a reforma legislativa o legislador tentou dirimir as divergências doutrinais que até à data se verificavam, designadamente a tipicidade ou não das causas de exoneração, a possibilidade de os estatutos preverem um reembolso pelo valor real das acções, a obrigatoriedade ou não de proceder à redução do capital social por força do reembolso, a admissibilidade de a sociedade revogar a deliberação que originou a causa de exoneração, a legitimidade do exercício do direito de exoneração por parte dos sócios que se abstiveram na assembleia geral.

A alteração legislativa reconduziu as causas de exoneração a três modalidades: as causas legais obrigatórias, as causas legais não obrigatórias e as causas estatutárias.

As causas legais obrigatórias são as que não podem ser derrogadas pelos estatutos. A sua verificação origina sempre o direito de exoneração do sócio. Actualmente constituem causa legais de exoneração as seguintes situações:

a) Modificação da cláusula do objecto social: a modificação estatutária do objecto social confere o direito de exoneração ao sócio dissidente. Esta modificação pode operar por substituição, redução ou ampliação do objecto social mas é necessário que se verifique uma alteração substancial das condições iniciais do risco de investimento;

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b) Transformação da sociedade: na lei em vigor a alteração do tipo societário constitui causa de exoneração;

c) Transferência da sede social para o estrangeiro; d) Cessação da liquidação da sociedade;

e) Eliminação de causas estatutárias ou derrogáveis de exoneração: o legislador previu esta norma de forma a proteger o princípio da confiança. Esta norma deve também ser aplicada nos casos de alteração que dificultem o exercício de tais cláusulas25;

f) Alteração dos critérios de avaliação das acções em caso de exoneração; g) Modificações relativas ao direito de voto ou participação.

h) Exoneração Ad nutum: a reforma de 2003 veio permitir a exoneração ad nutum pelos sócios de sociedades constituídas por tempo indeterminado desde que não sejam abertas ao mercado;

i) Exclusão da cotação de acções: esta norma visa assegurar o direito de exoneração quando o princípio da livre transmissibilidade de acções não pode ser aplicado;

j) Reavaliação das entradas em espécie ou de créditos;

k) Exoneração de sócio de sociedade sujeita a controlo e direcção de outra.

As cláusulas de exoneração legais não obrigatórias são as que a lei prevê mas que os estatutos podem afastar. Actualmente, a legislação prevê, duas destas cláusulas:

a) Prorrogação do Termo da Sociedade;

b) Introdução ou Remoção de Limitações à circulação de acções.

No que concerne às cláusulas estatutárias estas surgiram com a reforça de 2003. Esta possibilidade é admitida às sociedades que não tenham recorrido ao mercado do capital de risco.

Principais linhas orientadoras do direito de exoneração actual

Há a possibilidade de a sociedade, se assim o entender, proceder à revogação da deliberação que deu lugar ao direito de exoneração, ficando o mesmo sem qualquer efeito.

O accionista dissidente, ou seja, aquele que se exonerou de forma legítima, tem o direito ao reembolso correspondente ao valor das acções da sua titularidade. Quando cabe à administração determinar esse valor são tidos em linha de conta critérios para

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que de forma justa se possa aferir a monta da liquidação; tais como: i) condição patrimonial da empresa, ii) prospecções de futuro no que tange à liquidez da sociedade e por fim, iii) o valor de mercado das acções. Porém, nos casos em que a sociedade se encontra cotada em bolsa, “o valor da liquidação das acções é calculado de maneira directa, através da média aritmética o seu preço de fecho nos seis meses anteriores à publicação/ recepção da convocatória da assembleia geral que legitimou a exoneração”26. Nas situações em que há diferendos quanto aquele que foi o valor atribuído às acções é nomeado um perito judicial para avaliar imparcialmente as mesmas.

Consignou-se legalmente a possibilidade de compra por parte dos sócios que permanecem na sociedade das acções do sócio que se exonerou, esta aquisição é feita em proporção às acções da titularidade dos mesmos. Com esta introdução legal pugna-se pelo equilíbrio e integridade da estrutura societária na medida em que é dada a possibilidade aos sócios de manterem, ainda que em modos proporcionais, aquela que era a sua quota-parte antes da exoneração. É possível também que as participações sociais sejam vendidas a não sócios no caso das mesmas não serem adquiridas pelos próprios. Mais ainda, face à inexistência de proponentes-compradores (accionistas ou terceiros alheios à sociedade), o futuro que se dá às acções é o de que as mesmas são absorvidas pela própria sociedade através das reservas existentes.

Ainda num cenário mais “negro” no qual nem as reservas são suficientes para adquirir as acções do sócio que se exonerou, o reembolso é efectuado com recurso à diminuição do capital social ou in extremis à própria dissolução da sociedade.

Para o exercício do direito de exoneração existem também regras de natureza formal a observar, como por exemplo, a obrigação da existência de uma declaração de exoneração mediante carta registada depois do registo da deliberação social, 15 dias depois. O prazo pode ser dilatado para 30 dias quando estejamos face a causas estatutárias, ou seja, quando não estamos perante causas legais obrigatórias ou causas legais não obrigatórias. Da declaração de exoneração deverá fazer constar o sócio que se pretende exonerar, a indicação das acções de que é titular e que serão objecto de exoneração, dentre outras menções.

Quanto à legitimidade esta reforma solucionou também uma questão muito importante, a legitimidade para o exercício do direito de exoneração pertence, quando

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estejamos perante deliberações sociais, aos sócios que não tenham contribuído para a sua aprovação.

2. O “DROIT DE RETRAIT” NO DIREITO FRANCÊS

2.1. BREVE RESENHA HISTÓRICA DO DIREITO DE EXONERAÇÃO NO DIREITO FRANCÊS

O direito de exoneração sempre teve parca expressão no direito francês, é omisso na lei e por isso pouco discutido na doutrina. Pese embora esse facto existe doutrina e jurisprudência que o admitem plasmado em cláusulas estatutárias27.

Na versão primitiva do Código de Comércio Francês de 1807, não havia regras focadas na dissolução da sociedade. João Espírito Santo, justifica tal omissão socorrendo-se do facto de que o contrato de sociedade reger-se-ia pelo direito civil e pelas convenções entre as partes28. A feição do entendimento do autor tem lógica, dado estarmos perante uma realidade que possibilitava a livre contratação sobre este aspecto, tal poderia ter contribuído para que legislador não sentisse um especial apelo à necessidade de ser debruçar sobre esta matéria.

No entanto, em momento anterior ao Código do Comércio Francês de 1807, nas cartas de instituição das Companhias Coloniais, previa-se que aquele que pretendia desvincular-se da companhia, só poderia fazê-lo depois de vendida a sua parte, significando isto que, a despeito da cessão da correspondente participação social, a companhia manter-se-ia a laborar, não conduzindo tal acto à dissolução da mesma.

2.2 DIREITO VIGENTE

Pese embora a parca expressão do direito de exoneração no direito francês, a sua contemplação não é totalmente invisível, admitindo-se a possibilidade, sob alguns entendimentos, que no âmbito do pacto social, tal prerrogativa poderá consignar-se.

Na senda do referido, actualmente, no ordenamento jurídico francês, no que tange às sociedades anónimas, inexiste qualquer previsão legal sobre o direito de libertação do sócio, baseando-se tal raciocínio, no primado da livre transmissão de acções (princípio que também se verifica no direito português). Todavia, ainda assim, a jurisprudência prevê a admissibilidade de um mecanismo de protecção dos sócios

27 TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração…,pág. 65, nota 148.

28 JOÃO ESPIRÍTO SANTO, Exoneração do sócio no direito societário-mercantil português, Almedina,

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minoritários, que se designa como “abuso da maioria”29. Este quadro verifica-se nas situações em que, consequência de determinada deliberação pela maioria dos sócios, seja tomada qualquer determinada decisão que possa, no limite, afectar ou não ser perfilhada pelo (s) sócio (s) minoritário (s). Ora, no cenário acima referido, o (s) sócio (s) minoritário (s) pode (m) transmitir as acções, ao abrigo da tal previdência proteccionista.

Ainda nas sociedades anónimas, designadamente nas sociedades cotadas em bolsa ou em mercados secundários, o direito de exoneração surgiu por via da Lei 2.04 (1989); sendo que esta lei consagra o seguinte esquema: caso 95% dos direitos de voto pertencerem ao mesmo accionista ou grupo de accionistas, assiste a possibilidade dos accionistas minoritários poderem requerer ao Conselho dos Mercados Financeiros a apresentação de uma oferta pública de exoneração. A mencionada oferta pública de aquisição será, num primeira fase, objecto de estudo, para, ulteriormente, ser acolhida ou rejeitada por parte do Conselho dos Mercados Financeiros.

Já no que se refere às sociedades por quotas, cuja abordagem se fará de forma sumária, dado o tema não ser objecto nevrálgico do presente estudo, o direito de exoneração é admitido quando se trate de uma cessão de quotas a terceiro e quando tal acto seja rejeitado pelos demais sócios. No quadro descrito no precedente parágrafo, no caso de repúdio pelos demais sócios, os mesmos dispõem de uma de duas soluções, nos 3 meses subsequentes contados do momento da rejeição:

(i) Os próprios absorvem para si a quota que se pretendem ceder; ou,

(ii) Os próprios obtêm um adquirente para as quotas que se pretendem ceder.

Por fim, nas sociedades em nome colectivo e em comandita simples, o direito de exoneração é absolutamente imperceptível, vejamos o porquê:

Concretamente, nas sociedades em nome colectivo, considerando que nas mesmas toda e qualquer decisão só poderá ser aprovada pela maioria, tal premissa redunda na inelutável conclusão de que nenhum sócio minoritário com determinada posição contrária à maioria, logrará sucesso num entendimento díspar do demais. 30

29 TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração…,pág. 65, nota 153. 30 TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração…pág.65 a 66.

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3. O “DERECHO DE SEPARACIÓN” NO DIREITO ESPANHOL

3.1. BREVE RESENHA HISTÓRICA DO DIREITO DE EXONERAÇÃO NO DIREITO ESPANHOL

A primeira referência legislativa ao direito de exoneração (derecho de separación)31 no direito espanhol surgiu no código de comércio de 1829 no seu artigo 334 onde se dispunha que:”…socio que por su vonluntad se separa de la compañia(…) no puede impedir que se concluam (…) las negociaciones pendientes…”. Pese embora este normativo não dispusesse de regulamentação admitia-se a sua consagração e regulamentação estatutária em todos os tipos societários.

Posteriormente, o real decreto de 15 de Abril de 1847 e a Ley sobre sociedades mercantiles por Acciones de 28 de Enero de 1848 vieram impor um controlo governativo sobre os estatutos das sociedades anónimas restringindo assim a possibilidade de previsão estatutária do derecho de separación. Esta situação manteve-se até à aprovação do decreto de 28 de Octubre de 1868 que derrogou a anterior legislação e consequente necessidade de autorização governativa.

Com a Ley das Sociedades Anónimas de 1951 (LSA) o derecho de separación para os accionistas foi efectivamente consagrado32. A LSA consagrou, por influência da legislação italiana, as mesmas causas de exoneração previstas no códice civile italiano, a saber, a alteração do objecto social, a transformação e a fusão da sociedade anónima. 3.2 DIREITO VIGENTE

Após algumas reformas legislativas e integração de directivas comunitárias surge o real decreto legislativo 1564/1989, de 22 de Diciembre, que aprovou o texto refundido de la ley de sociedades anónimas (TRLSA) actualmente em vigor, que permite o exercício do direito de exoneração dos accionistas em caso de alteração do objecto social (artigo 147.º), transferência de sede para o estrangeiro (artigo 149.º) e em caso de transformação de sociedade (artigo 225.º).

No que concerne ao regime, em termos de legitimidade, ela é atribuída a todos os que votaram contra a deliberação social que originou o direito de exoneração.

Em termos de prazo para o exercício do direito de exoneração, os sócios que pretendem exonerar-se devem emitir a declaração no prazo de um mês a contar da data de registo da deliberação, isto quando a causa de exoneração seja a alteração do objecto

31 TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração…,pág. 71, nota 163. 32 TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração…,pág. 73, nota 169.

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social ou a transferência de sede para o estrangeiro. Quando a causa originária do direito de exoneração for a transformação da sociedade esta efectua-se de forma automática para os sócios que não tenham votado a favor da deliberação e que não a ratifiquem no prazo de um mês.

Após a recepção da declaração de exoneração a sociedade deve proceder ao reembolso das acções. O regime do reembolso será distinto consoante estejamos, ou não, perante sociedades abertas. Na primeira hipótese o valor do reembolso resultará do valor médio das acções apurado no último trimestre33. Quando a sociedade não for aberta ao mercado o cálculo do valor reembolsado será em primeira linha o acordado entre o sócio que pretende exonerar-se e a sociedade, na falta de acordo o cálculo do valor a reembolsar será aferido por auditor designado para o efeito, nomeado pelo Conservador do registo comercial da sede social (artigo 147.º/2/LSA)34.

O reembolso do valor das acções origina uma redução do capital social, pese embora a doutrina já admita a possibilidade de as acções serem adquiridas por outro sócio ou terceiro, evitando a redução do capital social35.

Relativamente a cláusulas estatutárias de exoneração do accionista, tema do nosso estudo, a doutrina espanhola tem-se pronunciado a favor da sua admissibilidade, impondo como limites o respeito pela lei, pelos princípios gerais de direito e pelos credores sociais. O fundamento legal invocado pela doutrina espanhola é o artigo 10.º da LSA que permite a criação de cláusulas estatutárias para persecução dos interesses dos accionistas36.

QUARTA PARTE

O REGIME ACTUAL DO DIREITO DE EXONEÇÃO NO DIREITO PORTUGUÊS CAPÍTULO I

Enquadramento Legal 1. Nas associações

O princípio da liberdade de associação requer também que o regime de saída da mesma esteja na livre disponibilidade do associado.

33 Redacção da lei n.º 44/2002, de 22.11. 34 Redacção da lei n.º 44/2002, de 22.11.

35 TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração…,pág. 91, nota 253. 36 TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração…,pág.93, nota 260.

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Nas associações a perda da qualidade de associado caracteriza-se pela vontade do próprio aquando da decisão de saída ou pela vontade da associação, no caso de decidir excluir o associado, conforme dispõe o artigo 167.º, n.º2 do C.C.37. A lei contudo não descurou a questão patrimonial, prevendo no artigo 181.º do C.C. os efeitos da saída ou da exclusão.

Em ambas as situações o associado não obtém o direito de restituição das quotizações já pagas e perde o direito ao património social, mantendo-se obrigado à regularização de todas as prestações relativas ao tempo em que foi membro da associação. Esta saída voluntária nas associações aproxima-se assim da figura do direito de exoneração.

2. Nas sociedades civis

Nas sociedades civis dedicou o legislador o artigo 1002.º do C.C. a regular o direito de exoneração. Caracterizando-o como a vontade de saída unilateral de um sócio de uma sociedade.

Segundo Pires de Lima e Antunes Varela “exonera-se o sócio quando, por vontade unilateral, dissolve os vínculos que o ligavam à sociedade e deixa de lhe pertencer”38. Nos termos do artigo supra referido “ Todo o sócio tem o direito de se exonerar da sociedade, se a duração desta não tiver sido fixada no contrato; não se considera para este efeito, fixada no contrato a duração da sociedade, se esta tiver sido constituída por toda a vida de um sócio ou por período superior a trinta anos.” Estamos aqui perante uma exoneração ad nutum, uma vez que não requer fundamento. Para Pires de Lima e Antunes Varela só existirá um prazo mínimo se isso resultar do próprio objecto da sociedade.

O n.º2 do artigo 1002.º do C.C. prevê um tipo de exoneração condicionada. Ora condicionada pelo contrato, ora ocorrendo justa causa, isto sempre que o prazo da sociedade esteja fixado.

O exercício do direito deve ser feito por declaração aos outros sócios.

Pese embora que independentemente do momento da comunicação nos termos do n.º 3 do artigo 1002 do C.C. a exoneração só se torna efectiva no final do ano social em que é declarada, mas nunca antes de decorridos três meses após a sua comunicação.

37 As condições de saída ou da exclusão podem ser determinadas pelos estatutos mas não podem ser de tal

forma penosas que inviabilizem o exercício do direito, MENEZES CORDEIRO, Tratado de Direito Civil, Almedina, Coimbra, 2007, pág.726-730.

38 PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª edicção, Coimbra Editora,

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Ainda assim, a vinculação para o sócio é imediata uma vez que estamos perante uma acto unilateral e irrevogável.

Não é permitida a supressão ou modificação das cláusulas legais de exoneração e só por unanimidade podem ser supridas ou modificadas as cláusulas contratuais.

A exoneração não isenta o sócio de responsabilidade pelas dívidas sociais contraídas até ao momento da exoneração nos termos do artigo 1006.º, n.º1 do C.C.

A liquidação da quota do sócio que se exonerar deve ser feita nos termos do artigo 1021.º do C.C.

3. Nas sociedades comerciais

No direito vigente regula a questão o CSC, tendo o legislador comercial reunido um pouco de toda a evolução histórica nesta matéria.

Dá-se ao sócio o direito se desvincular de uma situação que já não lhe é favorável, “exoneração de sócio é a saída ou desvinculação deste, por sua iniciativa e com

fundamento na lei ou no estatuto, da sociedade”39. Extingue-se, então, por vontade do sócio o vínculo que o ligava à sociedade, extinguem-se os deveres e também os direitos, tal qual de uma situação de resolução contratual se tratasse sem acarretar os demais.

Envolvem-se neste processo, unicamente, o sócio exonerado e a sociedade, ainda que a quota seja adquirida por terceiros. Os fundamentos para que a exoneração seja possível estarão previstos na lei ou no caso da sua admissibilidade nos estatutos societários.

CAPÍTULO II

Causas Legais de Exoneração SECÇÃO I

Causas Legais Aplicáveis a Todas as Sociedades Comerciais 1. Transferência da Sede da Sociedade para o Estrangeiro

Conforme estipula o artigo 3.º as sociedades têm como lei pessoal a lei do Estado em que se encontre situada a sede principal e efectiva da administração.

A sede estatutária corresponde à sede que consta dos estatutos da sociedade. Esta é a imposição legal que consta do artigo 9.º, n.º1, alínea e), tendo o seu desrespeito

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como consequência a nulidade ou a invalidade do contrato de sociedade nos termos do disposto nos artigos 42.º, n.º 1, alínea b) e 43.º, devendo a mesma ser estabelecida em local concreto conforme artigo 12.º.

A sede efectiva corresponderá ao local de funcionamento dos órgãos de administração da sociedade.

Regra geral a sede estatutária e a sede efectiva coincidirão.

A transferência de sede efectiva para o estrangeiro exige nos termos do artigo 3.º, ns.º 4 e 5 uma deliberação aprovada com pelo menos 75% dos votos correspondentes ao capital social, podendo o pacto social exigir uma maioria ainda mais qualificada mas nunca inferior.

Os sócios que não tenham votado favoravelmente na deliberação de transferência de sede para o estrangeiro podem exonerar-se nos termos do disposto no artigo 3.º, n.º 5.

O fundamento desta norma reside no facto de ser necessário tutelar o interesse de um sócio que subscreveu uma sociedade com lei pessoal portuguesa e depois vê este estatuto alterar-se por força da maioria. A transferência de sede implica alterações legais e geográficas o que consequentemente implicará uma alteração ao exercício dos direitos do sócio justificando a permissão do direito de exoneração.

A tutela desta norma é ampla e além de tutelar o interesse dos sócios que votaram contra a deliberação da transferência também tutela os que se abstiveram e os que não compareceram à assembleia geral40.

2. Regresso à Actividade de Sociedade Dissolvida

A extinção de sociedades exige um processo. Processo esse que foi cuidadosamente regulado pelo legislador e constituído por três fases, a primeira fase é a dissolução, uma segunda que se concretiza na liquidação e por último a partilha entre sócios.

É importante frisar que a sociedade mantém a sua personalidade jurídica durante a fase da liquidação sendo por isso lícito aos sócios alterarem a decisão relativa à dissolução da sociedade.

40 Neste sentido DANIELA FARTO BAPTISTA, O direito de exoneração dos accionistas …, pág. 166;

JOÃO CURA MARIANO, Direito de exoneração dos sócios …, pág. 67-68; MARIA AUGUSTA FRANÇA, Direito à exoneração, Novas Perspectivas…, pág. 214; TIAGO SOARES DA FONSECA, O

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Quando ocorre uma deliberação de regresso à actividade finda-se o processo de liquidação e consequentemente a partilha. É a esta deliberação que se reporta o artigo 161.º, n.º5 e pressupõe que esteja já encerrada a liquidação (artigo 161.º, n.º1 e n.º 3, al. a) e artigo 156.º). Esta deliberação deve ser realizada com maioria igual à que foi exigida para deliberação de dissolução de acordo com o artigo 161.º, n.º2 CSC.

Conclui-se, assim, de acordo com o estipulado na lei que a exoneração só será possível depois de iniciada a partilha. Para que exista direito de exoneração do sócio devem estar preenchidos, de acordo com a norma, pelo menos três requisitos cumulativos: um primeiro e indiscutível, que haja sido aprovada a deliberação para regresso à actividade, o segundo e também consensual, a data da deliberação supra referida ter sido posterior ao início da partilha e por último que haja para o sócio uma diminuição da participação social face ao que detinha anteriormente à liquidação. Estarão assim a priori fora do propósito de protecção da norma os sócios que à data da deliberação nada tenham recebido e aqueles que já tenham sido ressarcidos na totalidade do valor da sua participação.

Um ponto controverso nesta matéria é o de saber se, além destes sócios excluídos pela própria norma, o legislador terá tido a intenção de excluir mais algumas situações, querendo unicamente proteger os sócios discordantes, com manifestação de discórdia através do seu voto contra o regresso à actividade.

Para João Espírito Santo41, a norma do artigo 161.º, n.º5 visou a protecção de todos os sócios, quer daqueles que se manifestaram contra na deliberação, quer dos ausentes, quer dos que se abstiveram e até mesmo daqueles que votaram favoravelmente para o regresso à actividade. Raúl Ventura42, Maria Augusta França, Daniela Farto Baptista e João Mariano Cura entendem que a norma apenas deverá proteger os ausentes, os que se abstiveram e que votaram desfavoravelmente.

Quanto a nós tendemos a acompanhar a posição de João Espírito Santo. Não há exigência legal, contrariamente a outras disposições legais relativas ao direito de exoneração, de que o sócio que pretenda exonerar-se tenha votado contra ou não tenha votado a favor na deliberação de regresso à actividade de sociedade dissolvida.

41 JOÃO ESPIRÍTO SANTO, Exoneração do sócio…pág.225.

42 RAÚL VENTURA, Sociedades por quotas, Vol. II…, pág.27; MARIA AUGUSTA FRANÇA, Direito à exoneração, Novas Perspectivas…, pág. 215; DANIELA FARTO BAPTISTA, O direito de exoneração dos accionistas …, pág. 265; JOÃO CURA MARIANO, Direito de exoneração dos sócios …, pág.

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SECÇÃO II

Causas Legais de Exoneração Aplicáveis às Sociedades em Nome Colectivo e em Comandita Simples

A lógica plasmada na introdução da presente dissertação de que os contratos não devem ser eternos, nem vincular pessoas sem limite temporal, tem aqui, no âmbito das sociedades em nome colectivo franca aplicabilidade.

“Todo o sócio tem o direito de se exonerar da sociedade nos casos previstos na lei ou no contrato…” (artigo 185.º)

Da leitura do artigo 185.º retiramos desde logo que o sócio da sociedade em nome colectivo pode exonerar-se com base em outro ponto da lei ou com fundamento em cláusulas de exoneração previstas no contrato social.

1. O Direito de Exoneração Ad Nutum

A alínea a) do n.º1 do artigo 185.º prevê a hipótese de os sócios de uma sociedade em nome colectivo, há mais de dez anos, se possam exonerar se não tiver sido contratualmente fixada a duração da sociedade, ou se esta for constituída por toda a vida de um sócio ou ainda se a duração da sociedade for superior a trinta anos. Estas hipóteses não estão na dependência de uma causa, estão apenas na vontade do sócio, cujo único requisito que lhe é exigido é que detenha aquela qualidade há mais de dez anos.

Atendendo à letra da lei estaríamos, em princípio, perante dois requisitos cumulativos. Mas assim não será, vejamos porquê. Comparativamente a outras causas de exoneração ad nutum, ainda que para outros tipos societários, verificamos que a lei não exige a cumulação destes dois requisitos. Veja-se a propósito das sociedades por quotas, o artigo 229.º, n.º1, esta disposição legal prevê a possibilidade do exercício do direito de exoneração do sócio desde que decorridos dez anos do seu ingresso na sociedade e que haja uma proibição de cessão de quotas, não relevando para esta exoneração ad nutum a duração da sociedade.

Ambas as normas visam evitar a perpetuação, que no entender do legislador, acontecerá decorridos dez anos, do vínculo social. A lei não impede em ambos os casos a criação e /ou manutenção de vínculos societários perpétuos43, permite sim que o sócio altere a sua decisão de manter esse vínculo. Visa proteger o sócio, que o seja há mais de

43 TIAGO SOARES DA FONSECA, O direito de exoneração… pág. 218; PAULO ALBERTO

VIDEIRA HENRIQUES, A desvinculação unilateral ad nutum nos contratos civis de sociedade e de

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dez anos, independentemente da duração da sociedade. Questão suscitada na doutrina, a este propósito, é a de saber se os sócios podem contratualizar o direito de exoneração ad

nutum num período inferior a dez anos. Ou seja, a fixação do prazo legal de dez anos

terá carácter imperativo?

Para Paulo Videira Henriques44, a norma é imperativa tanto para o mínimo como para o máximo. O autor não vê na possibilidade da diminuição do prazo qualquer justificação. Já Raúl Ventura45, admite a supletividade relativamente ao prazo mínimo e a imperatividade relativamente ao prazo máximo.

Face à evolução das sociedades comerciais, a muitos níveis, que nem sempre é acompanhada da respectiva evolução legislativa, e ao carácter cada vez menos duradouro das mesmas tendemos a acompanhar a posição de Raúl Ventura.

2. A Exoneração do Sócio fundada em Justa Causa

A justa causa foi a possibilidade elencada na alínea b) do n.º1 do artigo 185.º para que o sócio possa exonerar-se.

O n.º2 do mesmo artigo veio concretizar esta previsão, enumerando situações de justa causa, são elas:

a) As situações em que contra o voto expresso do sócio a sociedade não delibere destituir um gerente havendo justa causa para tanto;

b) As situações em que contra o voto expresso do sócio a sociedade não delibere excluem um sócio, ocorrendo justa causa de exclusão;

c) Quando o sócio for destituído da gerência da sociedade;

Estas três possibilidades têm em comum a exigência de um voto contra uma deliberação social.

Releva aqui analisar a divergência doutrinária em relação à classificação como taxativas ou enunciativas as hipóteses previstas no n.º 2 do artigo 185.º Considerando as hipóteses como taxativas o sócio da sociedade em nome colectivo pode sair, exercendo o direito de exoneração, sempre que uma daquelas se verifique. Admitindo, em contrário, que as hipóteses previstas no n.º 2 do artigo 185.º são enunciativas torna-se necessário delimitar o conceito de justa causa de exoneração para aferir quando estaremos perante a possibilidade do exercício do direito de exoneração fundado em justa causa.

44 PAULO ALBERTO VIDEIRA HENRIQUES, A desvinculação unilateral ad nutum …, pág.57-59. 45 RAÚL VENTURA, Sociedades por quotas, Vol. I…, pág.602.

Referências

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