Hipertireoidismo:
Diagnóstico e tratamento
Reunião de Atualização em Temas Relevantes na
Prática Clínica
Disciplina de Endocrinologia
Dra. Marilena Nakaguma
Médica Residente do Programa de Endocrinologia e Metabologia da FMUSP
Dra. Suemi Marui
Chefe da Unidade de Tireoide do Serviço de Endocrinologia e Metabologia do HCFMUSP
Caso Clínico
•
Paciente do sexo feminino, negra, 48 anos
procura a UBS por dispneia e emagrecimento
há cerca de 4 meses
•
HPMA: Há 8 meses, paciente refere
palpitação, intolerância ao calor, irregularidade
menstrual, sudorese palmar e irritabilidade
•
Há 6 meses foi diagnosticada com ansiedade,
sendo prescrito fluoxetina 20 mg/d
•
Nega dor cervical anterior ou aumento do
Interrogatório sobre diversos aparelhos
•
Nega HAS ou cardiopatias
•
Palpitação principalmente com esforços físicos
•
Trato gastrointestinal: nada digno de nota
•
Trato genito-urinário: ciclos menstruais irregulares,
com ciclos de 20 até 50 dias. Nega uso de ACO.
Último parto há 12 anos, sem intercorrências
IIG IIP 0A
•
Sistema osteoarticular: nega artralgia
•
Sistema endócrino: nega diabetes ou dislipidemia
Antecedentes
•
Pessoais:
Nega uso de drogas ou etilismo
Tabagista (5 cigarros/dia desde 18 anos)
•Familiares:
•
Mãe com diabetes não-insulino dependente
•
Pai com HAS
•
Tia materna com bócio
Exame Físico
•
BEG, um pouco ansiosa, afebril
•
Frequência respiratória 20 rpm
•
Pulso e frequência cardíaca: 98 bpm rítmico
•
Discreto tremor fino de extremidades
•
Peso: 68 kg; Altura: 158 cm
•
IMC: 27,2 kg/m
2Exame Físico
•
Olhos: sem proptose e retração
palpebral, sem sinais
inflamatórios, movimentação
ocular extrínseca normal, tremor
palpebral
•
Tireoide difusamente aumentada
cerca de 3 vezes, firme, com
superfície regular
•
Coração, pulmões e abdômen:
ndn
Exames Solicitados na UBS
• Exames gerais normais
• T4 livre: 3,2 ng/dL (VR: 0,93 a 1,70 ng/dL)
• TSH: < 0,01 µIU/mL (VR: 0,27 a 4,20 µIU/mL)
• Anti-TPO: 68 IU/mL (VR: < 9 IU/mL)
•
Diagnóstico: Hipertireoidismo
•
Tratamento:
• PTU 600 mg (2 cps 3 x/dia)
Perguntas
• Quais os diagnósticos diferenciais?
• Exames complementares que auxiliam no diagnóstico
• Qual o tratamento inicial até o encaminhamento para o
endocrinologista ?
• Quais são os tratamentos disponíveis para o
hipertireoidismo?
Hipertireoidismo:
Diagnóstico e tratamento
Dra. Suemi Marui
Chefe da Unidade de Tireoide do Serviço de Endocrinologia e Metabologia do HCFMUSP
Diagnóstico da paciente
Sindrômico: Tireotoxicose
= Excesso de hormônios tireoidianos nos tecidos
•Fonte: tireoide, ingestão de hormônio, tecido
tireoidiano ectópico
Etiológico: Hipertireoidismo
= Produção excessiva de hormônios tireoidianos
pela glândula tireoide
•
Mais comum: doença de Basedow-Graves
Etiologias
HIPERTIREOIDISMO TIREOTOXICOSE
§ Doença de Graves
§ Bócio multinodular tóxico § Adenoma tóxico
§ Adenoma hipofisário secretor
de TSH
§ Tumores trofoblásticos (mola
hidatiforme, coriocarcinoma)
§ Struma ovarii
§ Hipertireoidismo induzido por
iodo
§ Tireoidite subaguda
§ Tireoidite induzida por
droga
§ Tireotoxicose exógena
Doença de Graves
• Diagnóstico é clínico: • Bócio+
• Tireotoxicose (hipertireoidismo)+
• Oftalmopatia de Graves • Dermatopatia de GravesDiagnóstico Diferencial:
Clinicamente
• Menopausa
• Ansiedade
• Síndrome do pânico
• Uso de cocaína, anfetaminas
• Feocromocitoma
Idade
Gravidade
Quais os exames laboratoriais
devem ser solicitados ?
T4 livre: 3,2 ng/dL
(VR: 0,93 a 1,70 ng/dL)
• Somente quando há dúvida no diagnóstico etiológico
de doença de Graves
• Aproximadamente 5% dos pacientes com doença de
Graves apresentam TRAb negativo
• Frequência de TRAb positivo no HC-FMUSP:
•
Radioimunoensaio: 96%
•
ECL: 100%
Quando solicitar TRAb ?
(Anticorpo contra o receptor de TSH)
Hyperthyroidism and Other Causes of Thyrotoxicosis:
Quando solicitar mapeamento e
captação da tireoide ?
• Somente quando há dúvida do diagnóstico clínico de
doença de Graves
• Quando palpar nódulo na tireoide
Hyperthyroidism and Other Causes of Thyrotoxicosis:
Management Guidelines of the ATA and AACE Thyroid, 2011 Captação cervical 131I
2h: 67% (VR 3-12%) 24h: 96% (VR 8-32%)
Quando solicitar ultrassonografia?
•
Somente se há dúvida na palpação
•
Hipoecogênico, vascularização aumentada
•
Avaliação de volume para o tratamento com
§ Tireoidite subaguda § Tireoidite induzida por
droga § Tireotoxicose exógena (iatrogênica, factícia)
Diagnósticos diferenciais:
Etiologias
HIPERTIREOIDISMO TIREOTOXICOSE § Doença de Graves§ Bócio multinodular tóxico § Adenoma tóxico
§ TSHoma
§ Tumores trofoblásticos (mola
hidatiforme, coriocarcinoma
§ Struma ovarii
Bócio Multinodular Tóxico
§ Geralmente mais em idosos
§ Bócio de longa duração
§ Hipertireoidismo mais leve
§ TRAb: negativo
§ Sem oftalmopatia
Ultrassonografia no BMNT
Mapeamento e captação no BMNT
•
2 h = 14 % (VR 3-12%)
•
24 h = 37 %
(VR 8-32%)
Adenoma Tóxico
§ Adultos jovens
§ Limitado a um único nódulo
§ Hipertireoidismo mais leve
§ Palpação e US: Nódulo com > 3 cm
§ Pode causar T3 tireotoxicose
§ TRAb : negativo
§ Mecanismo:
§ Mutações somáticas no receptor de
Mapeamento e captação da tireoide
• Indicado quando TSH suprimido e nódulo único
• Não precisa puncionar: adenoma folicular (benigno)
Captação cervical de 131I
2 h = 22 % (VR 3-12%) 24 h = 56 % (VR 8-32%)
Tireoidite Subaguda
• Dolorosa = Granulomatosa de Quervain
• Mecanismo: processo inflamatório da tireoide
• Precedido por infecção viral (IVAS):
• Coxsackievirus, adenovirus
• Quadro clínico:
• Dor à palpação da tireoide, pouco aumentada
• Dor irradiada para orelhas, mandíbula e pescoço
• Febre baixa
E. Pearce NEJM 2003
Tireoidite Subaguda
Tireotoxicose
Hipotireoidismo
Exames na tireoidite subaguda dolorosa
• VHS elevado
• Tireoglobulina aumentada
• Mapeamento e captação com 131I:
E. Pearce NEJM 2003
Tireoidite Subaguda
Captação baixaTireotoxicose
Hipotireoidismo
Recuperação
Ultrassonografia
Tireoidite Subaguda
• Linfocítica = Silente
• Mecanismo: processo inflamatório autoimune da
tireoide
• Geralmente no pós-parto
• Hipertireoidismo leve
Tireotoxicose
Indolor
Hipotireoidismo
Recuperação
Exames na tireoidite subaguda linfocítica
• Anticorpos anti-TPO elevados
• TRAb negativo
• Tireoglobulina aumentada
• Mapeamento e captação com 131I:
• Na fase tóxica: baixa
Tireotoxicose Factícia
§ Hipertireoidismo leve
§ Ausência de bócio
§ Questionar exaustivamente o uso de fórmulas para
emagrecimento, injeções e cremes para gordura localizada, vitaminas, suplementos e produtos naturais
Exames na tireotoxicose factícia
§ TSH suprimido
§ T3 alto
§ T4 baixo
§ Tireoglobulina baixa ou indosável
Quando pedir T3 total no
hipertireoidismo ?
• TSH baixo e T4 livre inapropriadamente normal ou
baixo T3 Total Alto Captação Baixa Normal ou alta Tireoglobulina Baixa Normal Diagnóstico Factícia T3 toxicose Subclínico
No caso clínico: Diagnóstico
Sindrômico: tireotoxicose
Etiologia: doença de Graves
Diagnóstico diferencial: Bócio multinodular Adenoma tóxico Factícia Tireoidite subaguda
ý
Palpação
ý
Palpação
ý
Bócio
þ
?
Exames Laboratoriais
• T4 livre: 3,2 ng/dL (VR: 0,93 a 1,70 ng/dL)
• TSH: < 0,01 µIU/mL (VR: 0,27 a 4,20 µIU/mL)
• Anti-TPO: 68 IU/mL (VR: < 9 IU/mL)
• TRAb: 7,35 UI/L (VR: < 1,75 UI/L)
Qual o tratamento pode ser feito até o
encaminhamento para o endocrinologista ?
Tratamento da tireotoxicose
1. Repouso
2. Beta-bloqueador
§ Propranolol 10 a 40mg até 160 mg/dia (3-4x/dia)
Maior experiência
Pode bloquear T4>T3 em altas doses (> 80 mg)
§ Atenolol 25 a 100mg (1-2x/d)
Beta 1 mais seletivo Maior aderência
Não bloqueia os sinais adrenérgicos periféricos
Tratamento da doença de Graves
•
Tratamento medicamentoso
•
Radioiodoterapia
Droga de escolha:
Metimazol = Tiamazol
•
Diminui a produção dos hormônios tireoidianos
através da inibição da tireoperoxidase
•
Ação autoimunidade
•
Iniciar: 15 a 30 mg/dia
•
Dose única
•
Comprimidos: 5 e 10 mg
•
Não tratar gestantes no 1
°
trimestre
Metimazol: Efeitos colaterais
§
Prurido (5%)
§
Anti-histamínico
§
Hepatopatia colestática ( até 6%):
§
Icterícia, náusea com dor abdominal
§
Dose dependente
§
Agranulocitose (0,2-0,5%):
§
Idiossincrático
§
Dose alta
Na receita sempre escrever:
• “Caso você apresente dor de garganta, febre, dor de
cabeça, mal estar deverá imediatamente suspender a medicação e procurar o Pronto-‐Atendimento para coleta de hemograma pela suspeita de agranulocitose.”
• “Caso você apresente dor abdominal acompanhada de
urina cor de coca-‐cola e fezes esbranquiçadas, deverá suspender a medicação e procurar o Pronto-‐ Atendimento para afastar hepa@te tóxica.”
Por que não usar PTU?
•
Hepatotoxicidade:
•
27% apresentam elevação das enzimas
hepáticas
•
Hepatite fulminante
•
Segunda causa de transplante hepático nos
EUA
•
Usar somente no primeiro trimestre de
gestação
•
Talvez usar na crise tireotóxica (por inibir a
Seguimento
§
Antes de iniciar o tratamento com metimazol:
leucograma, enzimas hepáticas e canaliculares
§
Sintomas melhoram em 2 semanas
§
T4 livre em 4 a 6 semanas
§
TSH não é útil
§
TRAb e volume tireoidiano: parâmetros de
Por quanto tempo mantenho o
metimazol para obter remissão?
§
Remissão: TSH, T4 livre e T3 normais por 12
meses
§
Tratar por 12-18 meses
§
Chance de remissão 50%
§
EUA: 20-30%
Preciso tratar por 12 meses?
§ Menor chance de remissão com metimazol:
§ Homem
§ Tabagista
§ Bócio volumoso
§ TRAb muito elevado
§ Se o paciente precisa de doses altas (> 30 mg)
Radioiodoterapia
§ Falência com tratamento medicamentoso
§ Efeitos colaterais com metimazol
§ Contra-indicação para cirurgia
§ Bócio pequeno
§ Não recomendado:
§ Mulheres que querem engravidar em 4-6 meses
§ Nódulo com citologia indeterminada
§ Oftalmopatia moderada a grave
Preparo para RIT
• Manter o beta-bloqueador
• Parar metimazol 5 a 7 dias antes do tratamento
• Se paciente tem risco cardiovascular: reiniciar
metimazol 3 a 7 dias depois da dose
• Dose fixa (10-15-30 mCi) ou dose calculada
Quando ocorre o hipotireoidismo
após RIT?
§ Dose é dada sempre com o objetivo de causar o
hipotireoidismo
§ Eutireoidismo em 3-6 meses
§ Serviço HC-FMUSP:
§ Hipotireoidismo após 3 meses da dose
§ 2/89 em eutireoidismo
Cirurgia
§ Falência com tapazol
§ Bócio volumoso ( > 80 g)
§ Sintomas compressivos
§ Oftalmopatia moderada a grave
§ Nódulo tireoidiano com citologia indeterminada ou
suspeita
Preparo para cirurgia
• Ideal operar em eutireoidismo: evitar crise tireotóxica
• Manter o tapazol até o dia da cirurgia
• Iodeto de potássio: diminui a vascularização da
tireoide
Caso clínico: Resumindo
•
Hipertireoidismo por doença de Graves
•
TRAb e captação da tireoide devem ser solicitados
somente quando há dúvida diagnóstica
•
Ultrassonografia da tireoide deve ser solicitada
somente se há dúvida no exame físico
•
Tratamento inicial deve ser feito com repouso e uso
de beta-bloqueador
•
Tratamento com metimazol deve ser cuidadoso
•