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Jornal de Estudos Espíritas - Resumo - Art. N. 010203

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Jornal de Estudos Espíritas 3, 010203 (2015) - (8pgs.) Volume 3 – 2015

Deus, Espírito e Matéria: Como podemos entender “O arcanjo começou

pelo átomo”?

Leonardo Marmo Moreira

1,a

1

São João del-Rei, MG

e-mail:aleonardomarmo@gmail.com

(Recebido em 17 de Março de 2015, publicado em 05 de Abril de 2015). RESUMO

O “Monismo” é uma visão filosófica que propõe que todas as coisas sejam formadas de uma única substância. Tendo em Spinoza um dos seus mais célebres defensores, o Monismo tem bastante presença no movimento espiritualista brasileiro. Alguns estudiosos espiritualistas consideram que a famosa frase “...tudo se encadeia na Natureza,

desde o átomo primitivo até o arcanjo, pois ele mesmo começou pelo átomo”, que faz parte da resposta dos Espíritos à questão 540 de O Livro dos Espíritos (LE), daria suporte ao Monismo. A partir da análise, à luz da Doutrina Espírita, dos conceitos dos três princípios gerais do Universo - Deus, espírito e matéria - o presente estudo sinaliza que, apesar de serem mutuamente interagentes, espírito e matéria são completamente independentes e que, portanto, não é plausível a proposta de que o Monismo tenha respaldo na obra de Allan Kardec. Um número significativo de afirmações contidas na Codificação Kardequiana é apresentado em suporte dessa conclusão. Este trabalho também analisa o processo evolutivo do espírito (“princípio inteligente do universo”), apresentando uma interpretação espírita para a frase acima, a qual está inserida na resposta à questão 540 de LE.

Palavras-Chave: princípio espiritual; princípio material; Lei de Progresso; panteísmo; O Livro dos Espíritos; monismo.

I

I

NTRODUÇÃO

Um das frases mais impactantes da Doutrina Espí-rita é a famosa proposição, registrada em “O Livro dos Espíritos” (LE) (KARDEC, 2001): “...tudo se encadeia

na Natureza, desde o átomo primitivo até o arcanjo, pois ele mesmo começou pelo átomo.”, a qual se encontra

in-serta na resposta à questão 540 do LE (KARDEC,2001). Essa sentença denota quão amplo é o processo evolutivo do princípio espiritual. Porém, seu entendimento requer o estudo um pouco mais aprofundado da Doutrina Espí-rita já que é comum vê-la interpretada e divulgada como “o arcanjo foi um átomo”, ou “o átomo será arcanjo” em comentários doutrinários dos Centros Espíritas.

Nessa proposição, fica explícito o caráter evolutivo da criação, o que se pode inferir não somente a partir da frase propriamente considerada, mas também de todo o contexto em que ela foi enunciada (vide a questão 540 e respectiva resposta de LE). Também sugere, implici-tamente, o que está registrado de forma categórica em outros trechos das obras de Allan Kardec e é conhecido como o “Princípio da Não-Retrogradação do Espírito”, o qual recebeu uma profunda discussão na edição de ju-nho de 1863 da Revista Espírita (KARDEC,2002). Vale registrar igualmente as questões 118, 612 e 778 de LE:

118. Os Espíritos podem degenerar?

R. Não. À medida que avançam, compreendem o que os afasta da perfeição. Quando o Espírito con-cluiu uma prova, adquiriu conhecimento e não mais o perde. Pode permanecer estacionário, mas não retro-gradar.

612. O Espírito que animou o corpo de um homem poderia encarnar-se num animal?

R. Isso seria retrogradar, e o Espírito não retrograda. O rio não remonta à nascente.

778. O homem pode retrogradar para o estado natu-ral?

R. Não, o homem deve progredir sem cessar e não pode voltar ao estado de infância. Se ele progride, é que Deus assim o quer; pensar que ele pode retrogra-dar para a sua condição primitiva seria negar a lei do progresso.

Aliás, nem sequer permanecer estacionado, o Espírito, em princípio, poderia, como se depreende das seguintes palavras dos Espíritos no LE:

116. Há Espíritos que ficarão perpetuamente nas clas-ses inferiores?

R. Não; todos se tornarão perfeitos. Eles mudam, embora devagar, porque, como já dissemos uma vez um pai justo e misericordioso não pode banir eterna-mente os seus filhos. Querias que Deus, tão grande, tão justo e tão bom, fosse pior que vós mesmos? Realmente, a chamada “Lei de Progresso” (que é discutida no capítulo VIII, de mesmo nome, da ter-ceira parte/livro terceiro intitulado “As Leis Morais” de LE (KARDEC,2001)) constitui um dos princípios bási-cos da Doutrina Espírita e consiste em um dos pontos capitais do pensamento espírita. A própria reencarnação (pluralidade das existências físicas), está, de certa forma, submetida à Lei de Progresso, pois existe não como um fim em si mesma, mas como um mecanismo eficiente pelo qual a Criação promove a evolução dos Espíritos, ou seja,

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trata-se de um dos principais mecanismos pelos quais é empreendido o progresso dos seres espirituais.

Muitas hipóteses, discussões e aprofundamentos no estudo da questão evolutiva vêm sendo promovidos, moti-vados, pelo menos em parte, pelo estudo da frase contida na questão 540 de LE, anteriormente destacada. Allan Kardec elabora a obra A Gênese, os Milagres e as

Predi-ções segundo o Espiritismo (GE) (KARDEC,1995a) que busca avançar nessa área. Posteriormente, Gabriel De-lanne elabora A Evolução Anímica (DELANNE, 2001); DENIS(1908), em O Problema do Ser, do Destino e da

Dor tece comentários sobre o processo evolutivo,

abran-gendo diversas etapas prévias ao período hominal; e An-dré Luiz publica Evolução em Dois Mundos e igualmente reforça esta linha de estudo doutrinária (XAVIER & VI-EIRA, 2002).

Vale lembrar a antiga polêmica a respeito de uma pressuposta frase atribuída a Léon Denis sobre a cha-mada “evolução anímica”, a qual foi muito bem discutida por Paulo Neto, no artigo intitulado “A alma dorme no Mineral?” na revista eletrônica O Consolador (NETO, 2011):

É comum ouvirmos a frase: “A alma dorme na pe-dra, sonha no vegetal, agita-se no animal e acorda no homem”, cuja autoria é atribuída a Léon Denis. Só que, curiosamente, até hoje ninguém nos demonstrou que, de fato, ele tenha dito exatamente isso. Mas, na busca em que nos empenhamos para encontrá-la, acabamos por nos deparar com a frase verdadeira, vejamo-la: Na planta, a inteligência dormita; no

animal, sonha; só no homem acorda, conhece-se, possui-se e torna-se consciente; a partir daí,

o progresso, de alguma sorte fatal nas formas infe-riores da Natureza, só se pode realizar pelo acordo da vontade humana com as leis Eternas. (Grifos em negrito, de Paulo Neto).

Na verdade, a frase atribuída a Léon Denis parece ter sido uma interpretação do pensamento do filósofo es-pírita de Tours por parte do professor José Herculano Pires, a qual encontra-se inserta em sua obra Agonia das

Religiões, no capítulo 5 (PIRES,1976):

Para Léon Denis, todo o processo de transformação se explica por esta frase genial: A alma dorme na pe-dra, sonha no vegetal, agita-se no animal e acorda no homem.

Infelizmente, Herculano Pires não cita a fonte específica da suposta frase de Léon Denis. Além disso, ele não grifa ou fornece qualquer tipo de destaque à frase (não coloca, por exemplo, entre aspas), o que sugere a hi-pótese de ter sido uma espécie de “leitura”, por parte do Herculano, do pensamento do célebre “apóstolo do Espi-ritismo”, Léon Denis. Realmente, o principal texto que deve ter servido de referência para a afirmação de Hercu-lano é a supracitada frase de Denis na obra O problema

do ser, do destino e da dor.

Poderíamos até supor que Denis considerasse a hipó-tese da interação inicial do princípio inteligente com o mi-neral, mas não teria, a priori, registrado isso de forma tão contundente, conforme se infere a partir do texto de Her-culano Pires. Analisando o contexto da obra O problema

do ser, do destino e da dor, Herculano, provavelmente,

interpretou que Denis admitia a interação entre o prin-cípio espiritual e o prinprin-cípio material já na fase mineral, mas, de fato, tal afirmação não tem sido encontrada nos textos de Léon Denis, o que é importante deixar claro.

Vale mencionar, como fonte de futuras reflexões para os estudiosos dessa questão, que Emmanuel, na obra

Vi-nha de Luz, capítulo 22 intitulado “Corrigendas” ( XA-VIER, 2005), afirma: “O mineral dorme. A árvore

so-nha. O irracional atende ao impulso. O homen selvagem obedece ao instinto. A infância brinca. A juventude ide-aliza. O espírito consciente esforça-se e luta. O homem renovado e convertido a Jesus, porém, é o filho do céu, colocado entre as zonas inferiores e superiores do cami-nho evolutivo. Nele, o trabalho de iluminação e aperfei-çoamento é incessante...”

II

U

MA IMPORTANTE POLÊMICA ENVOL

-VENDO A

E

VOLUÇÃO DO

P

RINCÍPIO

I

N

-TELIGENTE

Um dos pontos mais polêmicos dentro dessa linha de pesquisa, que envolve a chamada evolução anímica, ou seja, a evolução do princípio inteligente (o princípio espi-ritual), diz respeito à suposta fase “mineral”, dessa evo-lução anímica. De fato, Herculano, André Luiz e Emma-nuel1admitem uma interação do princípio espiritual com a matéria desde essa época, o que muitos confrades ques-tionam, pois, a priori, não teria um respaldo concreto explícito na obra de Kardec. Há, apenas, uma rápida descrição feita pelo Espírito Galileu em mensagem publi-cada no item 19 do cap. VI de GE (KARDEC,1995a). Ele diz:

Aos que desejem religiosamente conhecer e se mos-trem humildes perante Deus, direi, rogando-lhes, to-davia, que nenhum sistema prematuro baseiem nas minhas palavras, o seguinte: O Espírito não chega a receber a iluminação divina, que lhe dá, simultane-amente com o livre-arbítrio e a consciência, a noção de seus altos destinos, sem haver passado pela série divinamente fatal dos seres inferiores, entre os quais se elabora lentamente a obra da sua individualização. Unicamente a datar do dia em que o Senhor lhe im-prime na fronte o seu tipo augusto, o Espírito toma lugar no seio das humanidades.

Essa discussão remete-nos, indiretamente, a outra in-formação extremamente relevante e impactante de LE: O espírito (com “e” minúsculo que significa o “princí-pio inteligente do universo”, vide questão 23 de LE: “23.

Que é espírito? R. O princípio inteligente do universo”)

foi criado “simples e ignorante” (questão 115 de LE). O que significa “simples e ignorante”? E, em que patamar

1Analisando o trecho de “O Problema do Ser, do Destino e da Dor” (DENIS,1908), em torno da frase registrada porNETO(2011),

observamos que não é possível detectar se Léon Denis admitia que a interação entre princípio espiritual e princípio material inicia-se na fase mineral.

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de manifestação material, caracterizamos esse início da epopeia de evolução do espírito?

Os questionamentos acima levantados não constituem tópicos triviais, dentro dos esforços dos estudiosos espíri-tas para o entendimento do processo evolutivo espiritual. E, portanto, um longo caminho de estudo, perquirição e busca de evidências ainda precisa ser percorrido nessa área.

De qualquer maneira, mesmo admitindo que real-mente, de alguma forma, o princípio espiritual (princípio inteligente do universo) comece a interagir com a maté-ria na fase mineral, é importante frisar alguns paradigmas para nossos futuros estudos. De fato, na ideia “ele mesmo [o arcanjo] começou pelo átomo”, temos que entender que átomo foi um termo escolhido provavelmente para ser-vir como referência de unidade material básica ou mais simples (embora atualmente saibamos da existência de uma série de partículas subatômicas). Na época de Kar-dec, muito antes dos trabalhos de Boltzmann, Einstein e Perrin (PATTERSON,2007), somente a menção à pala-vra átomo já representava grande avanço científico pois, por exemplo, o trabalho de Einstein sobre o movimento browniano, que contribuiu para a aceitação definitiva da existência dos átomos, somente seria publicado em 1905. Além disso, o termo “átomo” representa um símbolo do meio através do qual o princípio espiritual pode se manifestar e não o princípio espiritual propriamente dito. É evidente que átomo foi utilizado no referido contexto como sinônimo de “unidade material básica”, o que não quer dizer que o princípio inteligente evoluído, hoje na condição de arcanjo, tenha sido matéria. Ele não foi, portanto, átomo (nesse contexto, “unidade material bá-sica”), embora possa, nessa hipótese de trabalho, ter passado por estágios de evolução anímica, nos quais o respectivo princípio espiritual (princípio inteligente), em condição extremamente rudimentar, interagiu com uma ou várias unidades atômicas materiais.

É importante notar que a tradução do francês para o português de LE feita por Guillon Ribeiro (KARDEC, 1995b) gera essa confusão de conceitos. Ela diz: “... tudo

se encadeia na Natureza, desde o átomo primitivo até o arcanjo, que também começou por ser átomo.”

(Gri-fos em negrito, meus). Já a tradução feita por Herculano Pires (KARDEC, 2001) apresenta “...tudo se encadeia

na Natureza, desde o átomo primitivo até o arcanjo, pois ele mesmo começou pelo átomo.” (Grifos em negrito,

meus). Note a sutileza na diferença de significados: a ideia contida na expressão “começar pelo átomo” é muito diferente da ideia inerente à expressão “começar por ser

átomo”. “Começar pelo átomo” pode significar,

perfeita-mente, que o princípio inteligente rudimentar começa o processo evolutivo através da interação inicial com a ma-téria por meio de ligações preliminares com os elementos da matéria que são seus átomos. Assim, o átomo seria uma espécie de veículo de manifestação rudimentar do princípio inteligente nessa situação extremamente primi-tiva. “Começar por ser átomo” significa de modo direto que o arcanjo foi um átomo. Qual tradução é a correta? De fato, a tradução de Herculano Pires é a mais correta,

uma vez que o texto kardequiano original em francês é o seguinte: “C´est ainsi que tout sert, tout s´enchaine dans

la nature depuis l‘atome primitif jusqu´á l´archange, qui

lui-même a commencé par l´atome.” (Grifos em ne-grito, meus).

Essa discussão acima, à luz do pensamento kardequi-ano, não se trata de especulação, mas de paradigma dou-trinário sólido, o qual somente poderia ser efetivamente questionado por evidências muito contundentes. Real-mente, o LE é taxativo ao estabelecer como princípios fundamentais do universo: Deus; espírito e matéria.

III

O

S

P

RINCÍPIOS

F

UNDAMENTAIS DO

U

NIVERSO

: D

EUS

,

ESPÍRITO E MATÉ

-RIA

Conforme a “Falange do Espírito da Verdade” es-tabelece no LE, os princípios Deus, espírito e maté-ria são interagentes, mas completamente independentes. Em um primeiro momento, busquemos analisar o pen-samento dos mentores de LE a respeito da independên-cia de Deus. Para isso, vejamos as questões 14 e 15 do item IV-Panteísmo, inserto no capítulo primeiro, Deus, do Livro primeiro/Primeira parte denominado “Deus” de LE (KARDEC,2001):

14. Deus é um ser distinto, ou seria, segundo a opi-nião de alguns a resultante de todas as forças e de todas as inteligências do Universo reunidas?

R. Se assim fosse, Deus não existiria, porque seria efeito e não a causa; ele não pode ser, ao mesmo tempo, uma coisa e outra.

Deus existe, não o podeis duvidar, e isso é o essen-cial. Acreditai no que vos digo e não queirais ir além. Não vos percais num labirinto, de onde não pode-reis sair. Isso não vos tornaria melhores, mas

tal-vez um pouco mais orgulhosos, porque acre-ditaríeis saber, quando na realidade nada sa-beríeis. Deixai, pois, de lado, todos esses sistemas;

tende que vos desembaraçar de muitas coisas que vos tocam mais diretamente. Isto vos será mais útil do que querer penetrar o que é impenetrável. (Grifos em negrito, meus).

15. Que pensar da opinião segundo a qual todos os corpos da Natureza e todos os seres, todos os globos do Universo seriam partes da Divindade e constitui-riam, pelo seu conjunto, a própria Divindade; ou seja, que pensar da doutrina panteísta?

R. Não podendo ser Deus o homem quer pelo menos ser uma parte de Deus.

Note que Kardec foi muito sábio em dizer que ques-tões envolvendo a natureza Divina e as origens do prin-cípio inteligente e da vida espiritual podem, no máximo, tornar os indivíduos “mais orgulhosos, porque

acredita-ríeis saber, quando na realidade nada sabeacredita-ríeis.”

Agora analisemos as questões de 25 a 27 do Capí-tulo II, Elementos Gerais do Universo, da supracitada primeira parte de LE, o qual assevera taxativamente que

(4)

espírito e matéria são realidades completamente distin-tas:

25. O espírito é independente da matéria, ou não é mais do que uma propriedade desta, como as cores são propriedades da luz e o som um propriedade do ar?

R. São distintos, mas é necessária a união do espírito e da matéria para dar inteligência a esta.

25-a. Esta união é igualmente necessária para a ma-nifestação do espírito? (Por espírito entendemos aqui o princípio da inteligência, abstração feita das indivi-dualidades designadas por esse nome).

R. É necessária para vós, porque não estais organi-zados para perceber o espírito sem a matéria; vossos sentidos não foram feitos para isso.

26. Pode-se conceber o espírito sem a matéria e a matéria sem o espírito?

R. Pode-se, sem dúvida, pelo pensamento.

27. Haveria, assim, dois elementos gerais do Universo: a matéria e o espírito?

R. Sim, e acima de ambos, Deus, o criador, o pai de todas as coisas. Essas três coisas são o princípio de tudo o que existe, a trindade universal. Mas ao elemento material é necessário ajuntar o fluido uni-versal, que exerce o papel de intermediário entre o espírito e a matéria propriamente dita, demasiado grosseira para que o espírito possa exercer alguma ação sobre ela. Embora, de certo ponto de vista, se pudesse considerá-lo como elemento material, ele se distingue por propriedades especiais. Se fosse sim-plesmente matéria, não haveria razão para que o es-pírito não o fosse também. Ele está colocado entre o espírito e a matéria; é o fluido, como a matéria é matéria; susceptível, em suas inumeráveis combina-ções com esta, e sob a ação do espírito, de produzir infinita variedade de coisas, das quais não conheceis mais do que uma ínfima parte. Esse fluido universal, ou primitivo, ou elementar, sendo o agente de que o espírito se serve, é o princípio sem o qual a matéria permaneceria em perpétuo estado de dispersão, e não adquiriria jamais as propriedades que a gravidade lhe dá.

A interação entre espírito e matéria, por exemplo, é importante, basicamente, para a evolução espiritual. No LE há uma interessante afirmação, inclusive com significativa ênfase, de que o mundo espiritual é mais importante e poderia prescindir do mundo material. No referido texto é dito que o mundo material poderia nem sequer ter existido, deixando evidente a independência do mundo espiritual em relação ao mundo material propria-mente dito. Vejamos as questões de LE em que tal rea-lidade é explicitada (item II - Mundo Normal Primitivo, do Capítulo I, intitulado “Dos Espíritos” do Livro Se-gundo/Segunda Parte denominada “Mundo Espírita ou dos Espíritos”):

84. Os Espíritos constituem um mundo à parte, além daquele que vemos?

R. Sim, o mundo dos Espíritos ou das inteligências incorpóreas.

85. Qual dos dois, o mundo espírita ou o mundo cor-póreo, é o principal na ordem das coisas?

R. O mundo espírita; ele preexiste e sobrevive a tudo. 86. O mundo corpóreo poderia deixar de existir, ou nunca ter existido, sem com isso alterar a essência do mundo espírita?

R. Sim; eles são independentes, e não obstante a sua correlação é incessante, porque reagem incessante-mente um sobre o outro.

Semelhantemente, a Falange do Espírito de Verdade tem uma interessante preocupação de rejeitar taxativa-mente o chamado “panteísmo”, logo no início das ques-tões de LE, após definir Deus, na questão número 1 como sendo “...a inteligência suprema, causa primária de todas

as coisas”, apresentando existência independente do

res-tante do Universo, o qual é criação sua e constituído dos Espíritos e da matéria. A título de ilustração, vejamos a questão 16 de LE, com a subsequente nota explicativa de Kardec, na qual o Codificador do Espiritismo chama o panteísmo de “sofisma”:

16. Os que professam essa doutrina (o panteísmo) pretendem nela encontrar a demonstração de alguns dos atributos de Deus. Sendo os mundos infinitos, Deus é, por isso mesmo, infinito; o vácuo ou o nada não existindo em parte alguma, Deus está em toda a parte; Deus estando em toda parte, pois que tudo é parte integrante de Deus, dá a todos os fenômenos da Natureza uma razão de ser inteligente. O que se pode opor a este raciocínio?

R. A razão. Refleti maduramente e não vos será difícil reconhecer-lhe o absurdo.

“Esta doutrina faz de Deus um ser material que, em-bora dotado de inteligência suprema, seria em ponto grande aquilo que somos em pequeno. Ora, a matéria se transformando sem cessar, Deus, nesse caso não teria nenhuma estabilidade e estaria sujeito a todas as vicissitudes e mesmo de todas as necessidades da Humanidade; faltar-lhe-ia um dos atributos essenci-ais da Divindade: a imutabilidade. As propriedades da matéria não podem ligar-se à ideia de Deus, sem que o rebaixemos em nosso pensamento, e todas as sutilezas do sofisma não conseguirão resolver o pro-blema da sua natureza íntima. Não sabemos tudo o que ele é, mas sabemos aquilo que não pode ser, e este sistema está em contradição com as suas propri-edades mais essenciais, pois confunde o criador com a criatura, precisamente como se quiséssemos que uma máquina engenhosa fosse parte integrante do mecâ-nico que a concebeu. A inteligência de Deus se revela nas suas obras, como a de um pintor no seu quadro; mas as obras de Deus não são o próprio Deus, como o quadro não é o pintor que o concebeu e executou". (Grifos em negritos, meus).

Portanto, em várias passagens de LE é enfatizada a existência e a independência dos três princípios do Uni-verso, a saber: Deus; espírito; e matéria.

Para concluir esse tópico, segue a transcrição da ques-tão 28 de LE (tal quesques-tão denota que o princípio espiri-tual não é algo subjetivo e apresenta existência concreta, mas difere de tudo aquilo que chamamos matéria, ou seja,

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representa uma realidade completamente distinta daquilo que o conceito de matéria representa) com sua respectiva resposta e subsequente comentário de Allan Kardec:

28. Sendo o espírito, em si mesmo, alguma coisa, não seria mais exato, e menos sujeito a confusões, designar esses dois elementos gerais pelas expressões: matéria inerte e matéria inteligente?

R. As palavras pouco nos importam. Cabe a vós for-mular a vossa linguagem, de maneira a vos entender-des. Vossas disputas provêm, quase sempre, de não vos entenderdes sobre as palavras. Porque a vossa linguagem é incompleta para as coisas que não vos tocam os sentidos.

“Um fato patente domina todas as hipóteses: vemos matéria sem inteligência e um princípio inteligente in-dependente da matéria. A origem e a conexão dessas duas coisas nos são desconhecidas. Que elas tenham ou não uma fonte comum e os pontos de contato ne-cessários; que a inteligência tenha existência própria, ou que seja uma propriedade, um efeito: que seja, mesmo, segundo a opinião de alguns, uma emanação da Divindade, - é o que ignoramos. Elas nos

pare-cem distintas, e é por isso que as consideramos formando dois princípios constituintes do Uni-verso. Vemos, acima de tudo isso, uma inteligência

que domina todas as outras, que as governa, que de-las se distingue por atributos essenciais: é a esta in-teligência suprema que chamamos Deus”. (Grifos em negrito, meus).

IV

U

MA INTERPRETAÇÃO NÃO

-

KARDEQUI

-ANA DE

“ele mesmo começou pelo

átomo”

A frase “...tudo se encadeia na Natureza, desde o

átomo primitivo até o arcanjo, pois ele mesmo começou pelo átomo” é bonita e também ilustrativa de como a

evolução é ampla e do quanto ainda estamos longe de compreendê-la totalmente. Mas, é uma frase muito enig-mática. Ela é muito mais provocativa (no bom sentido, ou seja, motivadora de futuros estudos) do que expli-cativa, principalmente no que se refere à situação, em termos de “evolução espiritual”, do átomo.

Assim sendo, utilizar somente tal frase como um pres-suposto respaldo das obras básicas kardequianas ao Mo-nismo, embora esteja em franca oposição a várias passa-gens de LE e de toda a obra da Codificação, constitui postura ilógica e, por conseguinte, anti-científica. Essa interpretação da resposta à questão 540 de LE é, por-tanto, não-kardequiana.

De fato, sem considerar Deus nessa avaliação, consta-tamos que o Espiritismo é explicitamente dualista, pois considera espírito e matéria os dois princípios fundamen-tais do Universo, os quais embora interagentes, são total-mente independentes. Se incluirmos Deus nessa análise, vemos que o Espiritismo é pluralista (Deus, espírito e matéria). Mas, definitivamente, o Espiritismo não é mo-nista.

É importante mencionar que Monismo (do grego μ´ονος mónos, “sozinho, único”) é “o nome dado às teorias

filosóficas que defendem a unidade da realidade como um todo (em metafísica) ou a identidade entre mente e corpo (em filosofia da mente) por oposição ao dualismo ou ao pluralismo, à afirmação de realidades separadas” (WIKI-PEDIA,2015). O Monismo teve em Spinoza um dos seus principais proponentes e divulgadores e tem tido espaço, atualmente, dentro do contexto do movimento espiritua-lista brasileiro.

V

A

TITUDE CIENTÍFICA DE

K

ARDEC

: E

S

-TUDAR O EFEITO PARA REMONTAR ÀS CAUSAS

Kardec, sabiamente, evitava ficar excessivamente de-tido em questões como a origem do universo, criação, Deus etc. porque tais questões são obviamente dificílimas de serem totalmente resolvidas e não foram e nem serão a curto e médio prazos. Kardec não quis partir de causas postuladas para chegar, por consequências, aos efeitos, pois tal postura tem muito pouco de critério científico e consiste na repetição de uma série de equívocos reli-giosos históricos, incluindo postulações teológicas de di-versas instituições, tais como a igreja católica apostólica romana.

Seria o caso de perguntarmos: que condições nós te-mos, no atual momento histórico, de conhecer “intima-mente” a Deus, ou a criação, ou o momento inicial da criação do princípio espiritual, bem como sua interação com o princípio material nesse referido contexto?!

O conhecimento atual da maioria das pessoas, in-cluindo estudiosos da espiritualidade, a respeito do que seriam, de fato, a matéria e o espírito, é ainda muito li-mitado. Isso sem falar no mecanismo pelo qual se dá a interação entre matéria e espírito, que permanece sendo um grande desafio, mesmo para renomados estudiosos.

Assim sendo, querer, nos dias atuais, especular so-bre a interação entre o princípio inteligente e o princípio material no começo da evolução do princípio inteligente trata-se de mera pretensão. Vide acima o destaque dado ao comentário de Kardec após a questão 14 de LE. E o que é pior, sem nenhuma evidência física, nem informa-ção consistente de origem espiritual que seja submetida e aprovada pelo controle universal do ensino dos Espíritos (CUEE). De fato, é preciso convir que mesmo que hou-vesse grande número de evidências físicas e espirituais, em assunto de tamanha complexidade, o bom senso e a cautela deveriam prevalecer. Ou seja, mesmo que tais evidências existissem, a recomendação de Erasto, em O

Livro dos Médiuns (KARDEC,1996), de que “é preferível

rejeitar dez verdades a aceitar uma única mentira, uma única teoria falsa” deveria ser a postura adotada. Ainda

mais se não existirem as referidas evidências numerosas e de alta qualidade intrínseca, o que representa a realidade atual do tópico em questão.

VI

O

PORQUÊ DAS ESPECULAÇÕES SEM

RESPALDOS CIENTÍFICOS

O ser humano em geral (e o espiritista frequentemente não constitui uma exceção) apresenta uma tendência a

(6)

ter predileção por especulações bastante subjetivas sobre as causas primárias. Essa curiosidade comum que, em alguns casos, é sadia, torna-se perniciosa quando, sem nenhum critério, essas mesmas especulações ganham ares pseudo-científicos e passam a se tornar diretrizes de com-portamento e referência científico-filosófico-religiosa des-ses temas. De fato, tal tendência pode ser causada por vários fatores já que, como diria RaulTEIXEIRA(2002), tais temas “não nos comprometem”. Isto é, não afetam a nossa necessidade urgente de melhoria individual. Real-mente, nós não nos sentimos significativamente afetados individualmente (exceto pelo orgulho como frisou Kardec no comentário após a questão 14 de LE), em nossa reali-dade existencial objetiva, por discussões sobre a origem do universo, a união do princípio material com o prin-cípio espiritual, a vida em outros planetas, a realidade íntima de Deus.

Vale lembrar Jesus no Sermão da Montanha quando disse: “Bem-aventurados os puros de coração porque

ve-rão a Deus.” (Mateus 5:8). Portanto, fica evidente com

base até mesmo no Evangelho de Jesus, que a compre-ensão profunda de Deus somente será alcançada em es-tágios muito avançados de evolução, bem acima do ní-vel atualmente alcançado pela humanidade terrestre. A forma mais eficiente de conhecermos com maior rapidez essa realidade e outras de alta complexidade consiste em aprofundar os conteúdos mais imediatos, partindo do es-tudo dos efeitos para as causas (e não o contrário!), a fim de galgarmos paulatinamente pré-requisitos concei-tuais. Além disso, chegaremos mais rapidamente a es-ses patamares se nos esforçarmos sinceramente em nossa transformação moral, fator determinante para o acesso a oportunidades evolutivas mais auspiciosas.

A discussão proposta no parágrafo anterior é total-mente respaldada pelo item III - Atributos da Divin-dade, do capítulo I, intitulado “Deus”, do livro pri-meiro/primeira parte, “As Causas Primárias”, de LE. Vejamos algumas questões do referido item que mostram como é pretensioso, no atual estágio evolutivo da humani-dade terrestre, almejar uma compreensão definitiva, pro-funda e íntima de Deus:

10. O homem pode compreender a natureza íntima de Deus?

R. Não. Falta-lhe, para tanto, um sentido.

11. Será um dia permitido ao homem compreender o mistério da Divindade?

R. Quando o seu espírito não estiver mais obscure-cido pela matéria e pela sua perfeição, tiver se apro-ximando dela, então a verá e compreenderá.

“A inferioridade das faculdades do homem não lhe permite compreender a natureza íntima de Deus. Na infância da Humanidade o homem o confunde muitas vezes com a criatura, cujas imperfeições lhe atribui; mas, à medida que o seu senso moral se desenvolve, seu pensamento penetra melhor o fundo das coisas e ele faz, então, a seu respeito, uma ideia mais justa e mais conforme com a boa razão, embora sempre incompleta.”

Obviamente, os complexos tópicos comentados e ou-tros relacionados (tais como Deus; a criação; o momento inicial da criação do princípio espiritual; o momento ini-cial da criação material; o mecanismo de interação en-tre princípio material e princípio espiritual) são relevan-tes por envolverem questões relacionadas à nossa vida, às nossas origens e o nosso processo de evolução. O problema é que como estamos extremamente distantes das condições ideais de se obter um aprofundamento seguro sobre tais temas, acabamos, em muitas dessas discussões, por cair no hábito popularmente conhecido como “achismo” (“acho que...”), já que não temos como avaliar, de nenhuma forma consistente, científica e/ou filosoficamente, tais questões. São assuntos tão difíceis e distantes de nossa realidade de estudos objetivos, que es-tes tópicos acabam caracterizando as discussões denomi-nadas popularmente de “sexo dos anjos”, tamanho o nível de especulação, e muitas vezes de utopia que as mesmas apresentam. Temos que admitir que essas especulações são puramente filosóficas (na melhor da hipóteses), sem, portanto, nenhum respaldo científico.

A análise de Raul Teixeira (TEIXEIRA, 2002) no DVD “Vivência Espírita”, já comentada no presente ar-tigo, consistia em parte de resposta à seguinte pergunta com “ares científicos”: “Como ocorre a ligação do Espí-rito no clone humano?” Ora, se não sabemos nada além do que os Espíritos ensinaram sobre como se processa a ligação do Espírito ao corpo humano de um indivíduo co-mum, como saber como essa ligação se processa no caso de um clone humano? Tal curiosidade denota que muitas vezes “pulamos” pré-requisitos conceituais, o que, princi-palmente quando se tratar de comportamento habitual, pode ser muito negativo no processo pedagógico de nossa formação doutrinária. A gente costuma querer ter orgu-lho2 de saber coisas especiais, e por isso “pulamos” eta-pas de estudo mais fundamentais. Temos muitas outras questões mais prioritárias para o momento que ainda não foram devidamente respondidas ou, se foram respondi-das por alguém, podemos, individualmente, desconhecer a resposta por falta de estudo pessoal. Portanto, com um pouco mais de método e perseverança nos estudos, seguindo os pré-requisitos de um bom trabalho de pes-quisa, lenta, mas natural e gradualmente, chegaremos às questões mais complexas.

Infelizmente, é preciso reconhecer que no atual mo-mento histórico-evolutivo da nossa humanidade, não te-mos como abordar com eficiência educacional tais as-suntos. Discussões e especulações ociosas sobre temas tão complexos geram pouco efeito produtivo do ponto de vista intelectual e, do ponto de vista moral, podemos di-zer que os ganhos seriam verdadeiramente desprezíveis. É por isso que Galileu afirmou “De novo peço: não

cons-truais sobre as minhas palavras os vossos raciocínios, tão tristemente célebres na história da Metafísica. Eu prefe-riria mil vezes calar-me sobre tão elevadas questões, tão acima das nossas meditações ordinárias, a vos expor a desnaturar o sentido de meu ensino e a vos lançar, por culpa minha, nos inextricáveis dédalos do deísmo ou do

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fatalismo.” (item 19, cap. VI de GE (KARDEC,1995a)). De ganhos pequenos ou desprezíveis, no entanto, a situação pode piorar muito. De fato, quando tais es-peculações são taxadas de “revelação científica ou di-vina”, sem maior avaliação crítica prévia, a “dogmati-zação” de conceitos e a “fanati“dogmati-zação” de apegos a rótulos e à própria opinião pode até mesmo enganar incautos e comprometer toda uma reencarnação. No próprio Novo Testamento, há uma recomendação contundente: “Não

creiais em todos os Espíritos, mas provai se os Espíritos vêm de Deus” (I João 4:1). Será que estamos tentando

“provar” se nossas referências e diretrizes são provenien-tes realmente de Espíritos superiores, representanprovenien-tes de pensamento mais avançado intelecto-moralmente?! Será que nossas diretrizes comportamentais estão baseadas em referências intelecto-morais sólidas, ou seja, verdadeira-mente testadas do ponto de vista evangélico-doutrinário?! Mesmo quando as especulações advêm de encarnados, sendo os encarnados também Espíritos, suas teorias não devem ser igualmente analisadas com critério?

Todo cuidado é pouco, pois o fanatismo e a vaidade intelectual são males dos mais difíceis de serem extir-pados da personalidade humana, sobretudo em ambien-tes religiosos. De fato, se o fanatismo, historicamente, sempre apresentou grande manifestação em meios reli-giosos, a vaidade intelectual é tendência comum tanto a meios religiosos como a ambientes científicos. Assim sendo, como o Espiritismo é uma Doutrina de tríplice as-pecto (científico, filosófico e religioso), o movimento espí-rita está, naturalmente, susceptível de receber impactos de atitudes fanáticas e/ou personalistas.

Kardec, respeitando as bases científicas da doutrina, preferiu focar no que era acessível experimentalmente, naquilo que estava mais imediatamente próximo da nossa percepção, da nossa vivência social e de nossos métodos de análise. Nessas questões mais profundas e mais di-fíceis, ele forneceu a base e, sem precipitações, deixou que o futuro trouxesse mais informações, através de mais estudos e pesquisas (por sinal, como toda área do conhe-cimento séria faz). Lamentavelmente, é justamente nes-sas áreas menos sujeitas a uma concreta e objetiva ava-liação racional que diversas religiões tradicionais e livre-pensadores espiritualistas aventuram-se mais, postulando inconsequentemente, uma série de “dogmas”, que mui-tos autores contemporâneos identificam como “revolução científica” e até mesmo “atualização e/ou reforma” da obra de Allan Kardec. Como são propostas que, por se-rem complexas e inacessíveis à investigação experimental, também não podem ser completamente eliminadas por provas irrefutáveis, sempre adquirem alguns defensores, seja por desconhecimento doutrinário, seja por fanatismo ou por vaidade intelectual.

Consequentemente, tais ideias acabam perturbando o Movimento Espírita, em função de “discussão de pala-vras” (vide resposta dos Espíritos à questão 28 de LE transcrita anteriormente no presente artigo), o que é muito comum em abordagens meramente filosóficas que não têm nenhuma base científica. Logicamente, tais pro-postas não são, de fato, respaldadas pelo Espiritismo que

é uma doutrina de estrutura conceitual tríplice, isto é, científico-filosófico-religiosa.

VII

C

ONCLUSÕES

A Doutrina Espírita é muito explícita em estabelecer que há no Universo dois elementos gerais e, “acima de

tudo Deus, o criador, o pai de todas as coisas. Deus, espírito e matéria constituem o princípio de tudo o que existe, a trindade universal.” (questão 27 de LE).

Ressalta-se que embora Deus, espírito e matéria formem uma trindade de tudo o que existe no Universo, espí-rito e matéria são dois princípios criados por Deus, en-quanto Deus é a causa (não-causada) de tudo o que existe. O texto kardequiano é tão contundente que re-jeita especificamente o panteísmo, e afirma que o mundo espiritual prescinde do mundo material, isto é, este úl-timo poderia nunca ter existido. Portanto, considerar que Allan Kardec bem como a “Codificação” admitem o chamado “Monismo” constitui desconhecimento doutri-nário. Por outro lado, a frase “...tudo se encadeia na

Natureza, desde o átomo primitivo até o arcanjo, pois ele mesmo começou pelo átomo” constitui um símbolo e

um desafio intelectual para o futuro, tamanha a comple-xidade dos conceitos que ela aborda. Entretanto, jamais poderíamos admitir que tal enunciado, isoladamente, res-palda doutrinariamente o Monismo, até porque, o foco desse enunciado está diretamente relacionado à “Lei de Progresso” e não à constituição do Universo e sua com-posição material. Note que dizer que o arcanjo

“come-çou pelo átomo” não implica, necessariamente, dele ter

sido um átomo no passado, mas ter iniciado seu processo de individualização através da ligação do princípio inte-ligente aos elementos materiais. Como diria o Apóstolo Paulo: “A letra mata e o espírito vivifica” (II Coríntios 3:6). Tomemos cuidado para não repetir equívocos histó-ricos, sobretudo das religiões tradicionais, na interpreta-ção de textos, sem considerar seus respectivos contextos e intertextos, além de outros textos e evidências. Promova-mos um esforço comparativo entre diversos tipos de evi-dências em real busca pela Verdade, independentemente de predisposições meramente emocionais.

A

GRADECIMENTOS

O Autor agradece penhoradamente à leitura crítica e às inestimáveis sugestões de Alexandre Fontes da Fon-seca.

R

EFERÊNCIAS

DELANNE, G. 2001. A evolução Anímica. 9a ed., FEB, Rio de Janeiro.

DENIS, L. 1908. O Problema do Ser, do Destino e da Dor. FEB, Rio de Janeiro.

KARDEC, A. 1995a. A Gênese. 36aed., FEB, Rio de Janeiro. KARDEC, A. 1995b.O Livro dos Espíritos. 76a ed., FEB, Rio de

(8)

KARDEC, A. 1996. O Livro dos Médiuns, 62a ed., FEB, Rio de Janeiro.

KARDEC, A. 2001. O Livro dos Espíritos. 2a ed., LAKE, São Paulo.

KARDEC, A. 2002. “Do Princípio da Não-Retrogradação do Es-pírito”, Revista Espírita - Jornal de estudos psicológicos. No6. Junho/1863. p.165-169. Araras, SP: IDE.

NETO, P. 2011. “A alma dorme no mineral?”, O Consolador 233, link: http://www.oconsolador.com.br/ano5/233/ especial.htmlacessado em 17/03/2015.

PATTERSON, G. 2007. “Jean Perrin and the triumph of the ato-mic doctrine”, Endeavour 31, 50-53.

PIRES, J. H. 1976. Agonia das Religiões. Paideia, São Paulo. TEIXEIRA, J. R. 2002. Inserto em DVD “A Vivência Espírita”

-FRANCO, Divaldo e TEIXEIRA, Raul. Conferência Estadual Espírita do Paraná de 2002. Curitiba, Paraná, Brasil. 93 min. 14/04/2002.

XAVIER, F. C., VIEIRA, W. 2002. Evolução em Dois Mundos (Di-tado pelo Espírito de André Luiz). 20aed., FEB, Rio de Janeiro. XAVIER, F. C. 2005. Vinha de Luz (Ditado pelo Espírito de

Em-manuel). 1aed. especial, FEB, Rio de Janeiro.

WIKIPEDIA. 2015. Definição de “Monismo”. Link: http://pt. wikipedia.org/wiki/Monismo. Acessado em 17/03/2015.

Title and Abstract in English

God, Spirit and Matter: How can we understand “The archangel started by atom”?

Abstract: The “Monism” is a philosophical approach, which proposes that all things are formed by a single substance. Spinoza

is one of most celebrated advocates of the Monism, which has large presence in the Brazilian spiritualist movement. Some spiritualist scholars consider that the famous phrase “... everything is linked together in nature, from the primitive atom to the

archangel, for he himself started by atom”, which is part of the answer to the question 540 of The Spirits’ Book (SB), supports

Monism. From a Spiritist Doctrine based analysis of the meanings of the three general principles of the Universe - God, spirit and matter - this study shows that, despite mutually interacting, spirit and matter are completely independent. Therefore, it is not plausible to propose that the Monism is supported by the Allan Kardec’s work. A significant body of statements contained in Kardec books is presented in support of this conclusion. This work analyses also the evolutive process of the spirit (“intelligent principle of the universe”), presenting a spiritist interpretation to the above mentioned sentence, which is present in the answer to the question 540 of SB.

Referências

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