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O tratamento jurídico penal ao tráfico internacional de pessoas para fins sexuais no Brasil à luz da Convenção de Palermo

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BRASÍLIA – UCB

TATIANA EULÁLIO DANTAS GUEDES MARWELL

O TRATAMENTO JURÍDICO-PENAL AO TRÁFICO

INTERNACIONAL DE PESSOAS PARA FINS SEXUAIS NO BRASIL À

LUZ DA CONVENÇÃO DE PALERMO

(2)

TATIANA EULÁLIO DANTAS GUEDES MARWELL

O TRATAMENTO JURÍDICO-PENAL AO TRÁFICO

INTERNACIONAL DE PESSOAS PARA FINS SEXUAIS NO BRASIL À

LUZ DA CONVENÇÃO DE PALERMO

Dissertação de Mestrado

Dissertação apresentada, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre, no Curso de Mestrado em Direito Internacional e Econômico em Programa de Pós-graduação da Universidade Católica de Brasília - UCB.

Orientadora: Prof.ª Drª Arinda Fernandes

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7,5cm

M298t Marwell, Tatiana Eulálio Dantas Guedes

O tratamento jurídico penal ao tráfico internacional de pessoas para fins sexuais no Brasil à luz da Convenção de Palermo / Tatiana Eulálio Dantas Guedes Marwell 2009.

155 f. : il. ; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2009. Orientação: Arinda Fernandes

1.Direito Penal. 2. Tráfico Internacional de mulheres. 3. Prostuição. 4. Convenção de Palermo. I. Fernandes, Arinda , orient. II.Título.

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TERMO DE APROVAÇÃO

Dissertação defendida e aprovada como requisito parcial para obtenção de Título de Mestrado em Direito Internacional e Econômico em Programa de Pós-graduação da Universidade Católica de Brasília – UCB, defendida e aprovada, em ___ de _________ de 2009, pela banca examinadora constituída por:

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__________________________________

__________________________________

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DEDICATÓRIA

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AGRADECIMENTOS

Ao senhor, meu Deus, por tornar possíveis os meus sonhos, alimentando em mim, a cada dia mais, a vontade de vencer.

Aos meus queridos pais, Tadeu e Liana, por tudo que são, por tudo que sou. Ao meu esposo, Alexandre, por ser o meu amor e a minha força nos momentos mais difíceis.

À minha filhinha, Luma, pela capacidade de fazer-me sorrir sempre, fortalecendo a minha alma.

Aos meus irmãos, Tamy, Thaís e Tadeu Filho, avós, tios e primos pela constante torcida.

À minha família em Brasília, tia Mônica, Assis e Lara, pelos momentos maravilhosos que compartilhamos, por todo carinho e atenção a mim dedicados. Obrigada por tudo!

À grande amiga Geloesse Freitas pela amizade, confiança e por trazer ao meu alcance a possibilidade deste Mestrado.

Ao meu querido amigo José Ribamar Torres, em especial, por toda dedicação e apoio nos meus estudos, pelas ricas discussões e contribuições, pela parceria nas situações mais difíceis, por ser a inapagável “luz” a conduzir-me a este dia glorioso. Que momento! O que seria de mim, meu amigo, se não fosse você e a sua competência? Obrigada por ouvir as minha angustias, os meus dilemas...e agüentar tudo isso em nome da amizade.

Aos amigos, especialmente, Daniela, Fábia, Yonice, Lígia e Lia, amigas de fé, irmãs camaradas... pela sensibilidade de estarem ao meu lado quando mais preciso.

Aos amigos, Sérgio e Raimundo, pelo apoio e amizade demonstrada nos momentos em que tanto precisei.

Aos professores e funcionários da Universidade Católica de Brasília pela calorosa acolhida a esta piauiense.

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Ao professor Arnaldo Godoy por tornar os meus dias em Brasília, tão longe de minha família, mais leves e cheios de graça, abrilhantando-os com tamanha competência, alegria e carinho. Obrigada, também, por ter despertado em mim o tema em que, hoje, me faço mestre.

Ao professor Antônio de Moura Borges pelo compromisso na coordenação desse Mestrado, apoio e incentivo pessoal.

Aos professores Antônio Cachapuz, Antenor Madruga, João Rezende e Leila Bijus, por contribuírem enormemente com o meu aprofundamento no campo das pesquisas científicas. Meu muito obrigada.

À Marina P. P. de Oliveira pela importante colaboração técnica, disponibilidade e delicadeza em ajudar-me, e cujos trabalhos me instigaram para uma abordagem crítica sobre o assunto.

Ao Dr. Francisco Metom, o meu sincero agradecimento pela disponibilidade de fazer parte da banca examinadora e, sobretudo, pela grande honra e felicidade de ser avaliada por quem tenho tamanha admiração.

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RESUMO

O presente trabalho repousa sua análise sobre os trilhos da globalização, rumo à criminalidade transnacional, na figura específica do delito de tráfico internacional de pessoas para fins sexuais. Tal delito representa, na atualidade, um dos grandes males da civilização moderna, uma grave violação de direitos humanos, que nas últimas décadas alcançou níveis alarmantes, o que revelou, por parte da comunidade internacional, mormente do governo brasileiro, propósitos de enfrentamento.

Neste sentido, a pesquisa em tela volta-se a analisar o tratamento jurídico-penal conferido pelo Brasil ao delito, frente às necessárias medidas de prevenção e combate ao ilícito, professadas no Protocolo de Palermo, considerando a postura deste País diante do compromisso internacional assumido, quando da ratificação do citado Instrumento, em 2004. No contexto de mundo globalizado, o trabalho adverte para uma cenário econômico-social pouco propício à absorção de políticas normativas de prevenção e combate ao ilícito. Tal abordagem direciona a pesquisa a problematizar o potencial de eficácia da normatização penal brasileira acerca do tema, considerada a tipificação conferida ao delito no Código Penal em vigor, bem como a Política Nacional de Enfrentamento ao Trafico de Pessoas e o conseqüente Plano Nacional de Enfrentamento, vigentes no País.

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ABSTRACT

This paper rests its analysis on the paths of globalization, towards transnational crime, in particular, the crime of international people trafficking for sexual purposes. This offense is, in actuality, one of the great evils of modern civilization, a serious violation of human rights, that in recent decades has reached alarming levels, which reveled, by the international community, especially the Brazilian government, aims to combat.

Accordingly, the search has concentrated its analyses at the criminal-legal treatment given by Brazil to the offense, facing the necessary measures to prevent and combat the illicit, professed in the Palermo Protocol, considering the posture of this country before the international commitment, when the ratification of that instrument in 2004. In the context of the globalized world, the work advices for a social-economic environment not conducive to the absorption of regulatory policies for preventing and combating illicit. This approach directs the search to discuss the potential effectiveness of ruling on the Brazilian criminal matter, considered the definition given to the offense in the Criminal Code in force, as well as the National Policy to Combat People Trafficking and the subsequent National Plan for Confronting, existing in Brazil

Keywords: international people trafficking. Sexual exploitation / prostitution. Convention / Protocol of Palermo. Globalization. Transnational crime.

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LISTA DE SIGLAS

ONU – Organização das Nações Unidas. OIG - Organizações Intergovernamentais. ONG - Não-Governamentais.

(ONG) CATW - Coalition Against Trafficking in Women. (ONG) GAATW - Global Allience Against Traffic in Women. IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais.

UNODC - Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime.

UNICRI - Instituto das Nações Unidas de Pesquisa sobre Justiça e Crime Inter-regional). MJ – Ministério da Justiça.

OIM - Organização Internacional de Migrações

PNETP - Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas.

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LISTA DE GRÁFICOS

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 12

1 A GLOBALIZAÇÃO E SEUS REFLEXOS À CRIMINALIDADE TRANSNACIONAL ... 21

1.1 A transnacionalidade do crime no mundo globalizado. ... 21

1. 2. Reflexos sócio-econômicos da globalização e o tráfico internacional de pessoas para fins sexuais. ... 30

2 O TRÁFICO INTERNACIONAL DE PESSOAS PARA FINS SEXUAIS: UMA ABORDAGEM JURÍDICO-CONCEITUAL ... 47

2. 1. O perfil do ilícito e sua evolução histórico-jurídico-penal na legislação brasileira. . 47

2. 2. Histórico das convenções internacionais acerca do tráfico internacional de pessoas. ... 53

2. 3. A definição de tráfico de pessoas segundo o Código Penal Brasileiro vigente e o Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças – Protocolo de Palermo. ... 63

3 MEDIDAS POLÍTICO-NORMATIVAS NO BRASIL DE PREVENÇÃO E COMBATE AO TRÁFICO INTERNACIONAL DE PESSOAS À LUZ DO PROTOCOLO DE PALERMO ... 81

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 100

REFERÊNCIAS ... 112

ANEXO A ... 117

ANEXO B ... 129

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12

INTRODUÇÃO

Nos alicerces do fenômeno sócio-econômico crescente conhecido por globalização, residem fatores que facilitam e até mesmo estimulam a criminalidade transnacional. Em se tratando de um processo de integração econômica mundial, à luz de um capitalismo avançado, movido pelo predomínio de interesses financeiros, privatizações de empresas públicas, a desregulamentação dos mercados, acompanhado de um avanço nos meios de comunicação, de transportes, trocas de informação e aproximação dos povos, trouxe a globalização à civilização moderna, além de inúmeros e inegáveis benefícios, um ambiente social e econômico propício à criminalidade transfronteiriça, cuja atividade inicia-se no território de um Estado, ultrapassa suas fronteiras, e vem a atingir seus objetivos em outro.

Os criminosos e organizações criminosas, diante do cenário delineado pelo presente fenômeno mundial, evoluíram em suas práticas delituosas, antes adstritas a limitações territoriais estatais. Os ilícitos assumiram versões transnacionais, rompendo barreiras geográficas e dificuldades estruturais pré-existentes.

A facilitação e a intensificação das relações sociais a uma escala global, moldadas em acontecimentos que se dão a quilômetros de distância, revelou, assim, práticas criminosas de alcance e conseqüências transnacionais. Tal qual a incidência e o crescimento alarmante do delito de tráfico internacional de pessoas para fins de prostituição.

Nas palavras do mestre Damásio de Jesus:

O tráfico internacional de seres humanos está inserido no contexto da globalização, com a agilização das trocas comerciais planetárias ao mesmo tempo em que se flexibiliza o controle de fronteiras.1

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Os traficantes do sexo, nos passos da globalização dos mercados, ampliaram o potencial de suas atividades, estendendo para além das fronteiras dos Estados a mercancia da prostituição, gerando altos índices de lucratividade na escala de valores da criminalidade transnacional, vindo a ocupar, atualmente, terceiro lugar no aspecto receita alcançada – à frente do tráfico de drogas e de armas2.

Ademais, a par dos elementos determinantes à proliferação da criminalidade transnacional, resultantes do processo de globalização, considerado o avanço na área das telecomunicações, o aumento no tráfego internacional aéreo, o crescimento do comércio internacional, a facilitação nos meios de circulação de pessoas, bens, e dinheiro, dentre outros fatores que propiciam o intercâmbio e a aproximação dos povos, a nova estrutura de economia global revela a chamada “crise da modernidade”3, diante de um panorama econômico e social desigual, deixando à mostra uma realidade de disparidades no cenário mundial.

A estrutura de mercado e economia globalizada, reflexo do crescente fenômeno sócio-econômico global, traduz-se hodiernamente em um crescimento desigual das economias das sociedades contemporâneas, o que vem a resultar na fragilidade da autonomia de Estados desfavorecidos economicamente, bem como de seus nacionais, movidos à busca incessante por melhores condições de vida. Tomando-os, neste aspecto, tais nacionais, seriam vítimas em potencial dos mercadores internacionais do meretrício, que, por sua vez, promovem, intermediam ou facilitam o ingresso destes cidadãos a outros países a pretexto de conduzi-los a um ambiente sócio-econômico mais favorável.

Neste marco, o processo de transposição das fronteiras viabilizado pelos traficantes do sexo, dá-se, em alguns casos, mediante atos fraudulentos, enganos e falsas promessas de trabalho honesto, longe do comércio carnal, e, outras vezes, por maioria, cientes tais cidadãos da prostituição que os aguarda no Estado de destino, muito embora

2 LEAL, Maria Lúcia P., LEAL, Maria de Fátima P..

Tráfico de mulheres, crianças e adolescentes para fins de exploração sexual comercial: Um fenômeno transnacional. SOCIUS (Centro de Investigação em Sociologia Econômica e das Organizações), Working Paper no. 4, Universidade Técnica de Lisboa, 2005. In: <http://pascal.iseg.utl.pt/~socius/publicacoes/wp/wp200504.pdf>. Acessado em 01 de fevereiro de 2009. 3 LEAL, Maria Lúcia, LEAL, Maria de Fátima. Enfrentamento do Tráfico de Pessoas: uma questão possível?.In:

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desconheçam as condições de abusos físicos e morais a que serão submetidos no país de destino.4

Como se vê, o presente delito tem as suas raízes ficadas no desenvolvimento desigual do mundo capitalista globalizado e no colapso sócio-econômico de alguns Estados. Os traficantes aproveitam-se da frágil situação social e econômica em que se encontram cidadãos oriundos de países de economia fragilizada, absorvidos pelo constante desrespeito a direitos humanos. Tais pessoas, homens ou mulheres, são atraídas por promessas de vastos ganhos, uma situação econômica bem mais farta do que aquela que lhes é ofertada em seu país de origem e onde vivem, recursos estes capazes de lhes proporcionar não apenas o próprio sustento, mas também de seus familiares.

Em sendo assim, temos que o tráfico internacional de pessoas para fins sexuais encontra-se alicerçado no acesso escasso a recursos financeiros, no desemprego, na ausência de educação, bem como na triste realidade da exclusão social. Observando-se, neste contexto, serem as mulheres, as maiores vítimas deste delito, posto que mais vulneráveis por motivos que repousam na discriminação, na dificuldade do pleno acesso ao mercado de trabalho e até mesmo na violência doméstica por vezes submetida.

O delito de tráfico internacional de pessoas para fins sexuais polarizou-se na rota países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento a países desenvolvidos, acentuando os diferentes níveis de economia estatal, condições propícias a uma vida digna e respeito aos direitos individuais dos cidadãos. Neste particular, vale assinalar a inclusão do Brasil nesse segmento de exploração sexual, a par da incidência de fatores como: a baixa escolaridade do nosso povo; os níveis gritantes de pobreza; o grande hiato entre os mais ricos e os mais pobres; a facilidade com que estrangeiros chegam e instalam seus negócios no País, bem como as dimensões territoriais – que facilitam o uso de rotas internas e externas.5

4

DOEZEMA, Jô. Loose Women or Lost Women? The Re-Emergence of the Myth of “White Slavery” in Contemporary Discourses of “Trafficking in Women”. Gender Issues, Vol. 18 (1), 2000, p. 23-50. In: <http://www.walnet.org/csis/papers/doezema-loose.html>. Acessado em 2 de março de 2009.

5 COLARES, Marcos. I diagnóstico sobre o tráfico de seres humanos: São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e

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Neste oportuno, é salutar aferir a participação do Brasil no processo global de combate e prevenção ao ilícito. Ressaltando-se a participação deste País no movimento de enfrentamento ao delito por meio de medidas jurídicas e não-jurídicas, o que incluiria o desenvolvimento de pesquisas, projetos, ações e pertinentes reformas, acréscimos e adaptações legislativas relativas ao tráfico para fins de prostituição, aclamando a importante contribuição do Brasil nesta luta.

Temos que o Brasil, à luz do Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças, mais conhecido como Protocolo de Palermo, por ter sido lá (Palermo/Itália) o palco de sua aprovação, proferiu mudanças significativas na sua legislação, aproximando-a dos ditames traçados no corpo do referido Diploma Internacional, ratificado pelo Brasil em 20046, e considerado pela comunidade internacional um grande marco no processo histórico de enfrentamento ao ilícito.

Em consonância ao Protocolo de Palermo, foi alterado, pela incidência da Lei n. 11.106 de 2005, o Código Penal Brasileiro, no que pertine ao tipo penal descritivo do delito, alterando o nome juris “tráfico de mulheres” para “tráfico de pessoas”, pelo qual ampliou-se o rol de vítimas, de mulheres, apenas, a “pessoas”, homens e mulheres. Ademais, alargou-se o conhecimento acerca do ilícito, intensificando amplas pesquisas de mapeamento e diagnóstico, assinaladas em Palermo, o que veio a viabilizar a formatação e implementação de uma Política Pública específica intitulada de Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, via Decreto Presidencial n. 5.948/06, atuante quando do tráfico para fins sexuais e outras finalidades, delineando princípios, diretrizes e ações preventivas, repressivas e de atenção às vítimas do tráfico, considerado o caráter complexo e multidimensional do ilícito.

Nestes termos, a presente política ocupa-se, sob o critério da inalienabilidade dos direitos humanos, reconhecidos internacionalmente, em preceituar ações em diferentes órbitas afetas ao tráfico de pessoas, tais como: justiça e segurança pública; relações exteriores; educação; saúde; assistência social; promoção da igualdade racial; trabalho e emprego; desenvolvimento agrário; turismo; dentre outras.

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16

Em seqüência, e ainda à luz do referido Protocolo Internacional, fora instituído, pelo Decreto n. 6.347/08, o Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas – PNTP, pelo qual pretender-se-á dar real concretude e efetividade às ações consubstanciadas na Política Nacional, fixando propostas, prazos e organismos responsáveis por cada ação, dirigida a prevenir, reprimir o delito, bem como assistenciar suas vítimas, não permitindo reduzir-se a mencionada Política Nacional a uma mera Carta Política de intenções.

Ressalte-se que, por todo o processo formal de adaptação e reestruturação do Sistema Jurídico Pátrio, à luz de diretrizes básicas firmadas no Protocolo de Palermo, pretendeu o Brasil inserir-se de forma significativa e eficaz no patamar dos Estados comprometidos com os compromissos assumidos internacionalmente, como assim o fez ao ratificar o Diploma Internacional de enfrentamento ao tráfico de pessoas.

Neste oportuno, a presente pesquisa buscará o aprofundamento acerca do tratamento jurídico-penal conferido pela legislação brasileira ao tráfico internacional de pessoas para fins sexuais, consoante o Protocolo de Palermo, bem como suas condições reais de aplicabilidade e eficácia aos fins a que se destina de combate e prevenção ao ilícito.

Neste marco, observaremos os critérios utilizados pelo legislador no propósito de conformar o ordenamento jurídico brasileiro às determinações constantes no Protocolo, aferindo os termos assumidos pela legislação nacional em vigor. Considerando, sobremodo, o potencial de eficácia das normas atinentes ao combate e à prevenção do delito proporcionado pelo sistema legal anti-tráfico implantado, a par das reais condições sócio-econômicas atuais a que são submetidos os seus nacionais, atestando pela viabilidade ou não de operacionalidade e concreção das medidas legais de enfrentamento ao tráfico internacional de pessoas para fins de prostituição.

Observada a complexidade do tema, a pesquisa se norteará pelos seguintes questionamentos:

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A normatização penal brasileira no tocante ao tráfico internacional de pessoas para fins sexuais estaria apta a alcançar os fins a que se propõe de prevenção e combate ao ilícito?

A destacar, o campo de análise da pesquisa fica restrito à ocorrência do tráfico internacional de pessoas (não alcançando o tráfico interno, interestadual e intermunicipal) e desde que para fins sexuais, não alcançando, portanto, o delito quando praticado para outros fins, voltado a outras formas de exploração (como escravidão, remoção de órgãos e outras) constantes no Protocolo de Palermo ou mesmo na Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas.

A pesquisa fora desenvolvida em 3 (três) capítulos: a globalização e seus reflexos à criminalidade transnacional; o tráfico internacional de pessoas para fins sexuais: uma abordagem jurídico-conceitual; medidas político-normativas no Brasil de prevenção e combate ao tráfico internacional de pessoas à luz do Protocolo de Palermo.

O Capítulo I faz uma abordagem acerca da transnacionalidade criminosa em tempos de globalização, observando, nesse fenômeno, fatores de facilitação e incremento ao crescimento da criminalidade transfronteiriça, tal como ocorre diante de seus reflexos sócio-econômicos na estrutura interna de cada país, fomentando em nacionais de países marcados pela desigualdade de rendas, pela miséria, pela opressão, pelas dificuldades no acesso a educação e emprego, o ingresso à criminalidade, como modo de ganhar a vida, ou mesmo o propósito perene de buscar em terras distantes, outros Estados e continentes, melhores condições de subsistência, tornando-se, assim, presas fáceis dos mercadores do meretrício.

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O Capítulo II da pesquisa tem por objeto traçar o perfil do delito de tráfico de pessoas para fins de prostituição considerados os aspectos conceituais e de definição legal do delito, ressalvando a transnacionalidade do ilícito no processo de globalização. Nesta etapa, a pesquisa apresenta a evolução histórico-jurídico-penal do delito de tráfico de pessoas na legislação brasileira, bem como, assinala, ao longo dos tempos, as convenções e acordos internacionais acerca do tema, com destaque àquelas as quais o Brasil fez-se signatário, a ressaltar, o Protocolo de Palermo. Por fim, desenvolve uma análise comparativa de definição do delito segundo o referido Protocolo Internacional e segundo o Código Penal Brasileiro, observando os pontos em comum e os desacertos entre os citados Diplomas Legais.

O Capítulo III encerra uma análise acerca das medidas político-normativas adotados pelo Brasil como forma de enfrentamento ao tráfico internacional de pessoas para fins de prostituição à luz do Protocolo de Palermo, tal qual a Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, instituída pelo decreto presidencial n. 5.498 de 26/20/2006 e o Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (PNETP), efetivado via decreto presidencial n. 6.347, em 09 de janeiro de 2008. Neste Capítulo, a avaliação abrange considerações relativas ao potencial de aplicação e eficácia das referidas medidas de combate e prevenção ao ilícito, haja vista as condições sócio-econômicas a que são submetidos os cidadão brasileiros.

É salutar ressaltar, acerca do delito em estudo, a importância em avaliar a situação brasileira presente com os olhos voltados para o passado, onde nos é permitido observar que o tráfico de seres humanos faz parte da história deste País. Um passado revelador de uma postura de exploração do trabalho humano, servidão agrícola, doméstica, violações físicas e exploração sexual, concebidas por intermédio do tráfico de seres humanos, perpetrado por 300 longos anos, via transporte em navios negreiros repletos de homens, mulheres e crianças com destino à escravidão. Neste oportuno, vale lembrar que o Brasil fora o último país ocidental a abolir o trabalho compulsório, fazendo-o em 1888.7

Abolida a escravidão, começo de um novo século, deu-se início a um novo fluxo transfronteiriço de pessoas. Fugindo da fome e da opressão que assolava países da

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Europa àquela época, pessoas deslocavam-se em direção aos países do Novo Mundo, a exemplo, o Brasil, à procura de melhores condições de vida, encontrando nestes países situação diversa, caracterizada pela dura realidade do trabalho semi-escravo. Neste contexto, emergiu o tráfico de mulheres brancas, crianças e jovens, advindas da Europa para fins de exploração sexual em países eivados pela crescente economia capitalista. O tráfico e a prostituição seguiam os passos do capitalismo e a direção a que se moviam os recursos monetários. 8

Atualmente, a situação não parece diferente. Milhares de pessoas, por intermédio de traficantes, permeiam o mercado internacional do sexo, cruzam fronteiras com destino a outros Estados e continentes em busca de um sonho, de uma remuneração digna pelo trabalho desempenhado, seja este ou não o exercício da prostituição, embarcando em uma viagem marcada pela indiferença e pelo sofrimento físico e moral9, advindo de intensas e constantes violações a direitos humanos a que são compelidas as vítimas nas mãos dos mercadores do sexo.

Em sendo assim, é possível observar que a questão do tráfico de pessoas para fins de prostituição não pode ser encarada como uma situação nova, um evento típico da civilização atual, trata-se de um problema antigo, que atravessou a nossa história e, hoje, assume o modelo de uma moderna forma de escravidão, evento antigo que o mundo democrático ocidental pensava extinto.

Neste contexto, temos que o Brasil, nos últimos 100 anos, passou de País de destino, na rota do tráfico, a País fornecedor da mercadoria, homens, mulheres e crianças, inseridos no comércio internacional da prostituição, com destino traçado a países de primeiro mundo, como Espanha, Itália, Portugal, Alemanha e Suíça, por exemplo.10

8 JESUS, Damásio E. de. Tráfico Internacional de Mulheres e Crianças. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 71.

9 QUAGLIA. Giovanni. Tráfico de pessoas, um panorama histórico e mundial. In: Cartilha Ministério da

Justiça: Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Brasília, 2007, p. 40.

10 JESUS, Damásio E. de .

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Diante do exposto, consoante a evolução histórica do ilícito em estudo, bem como a posição atual ocupada no cenário da criminalidade transnacional, tem-se no tráfico internacional de pessoas para fins de prostituição um dos grandes impasses da civilização moderna ao alcance do pleno respeito aos direitos fundamentais do homem, objeto de tantas discussões, acordos e convenções a nível mundial. Fato que preocupa o Brasil e o resto do mundo, vez que o presente delito, fonte de constantes violações aos referidos direitos inalienáveis, vem revelando-se, nos últimos anos, um problema de dimensões cada vez mais alarmantes, conforme aferido pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), que atestou, em 2005, a ocorrência de aproximadamente 2,4 milhões de vítimas do tráfico de pessoas, estimando-se que 43% destas pessoas tenham sido subjugadas à exploração sexual.11

A pesquisa em tela, com objetivo de alcance dos fins a que se propôs, utilizará como forma de abordagem do tema a metodologia qualitativa, voltada à compreensão e explicação do fenômeno em análise, através de um estudo histórico-comparativo e análise documental acerca do assunto. A pesquisa será desenvolvida sob os seguintes aspectos: globalização; criminalidade transnacional; tráfico de pessoas; e exploração sexual. Para tanto realizar-se-á coletas de dados bibliográficos, embasamentos teóricos e doutrinários, com análise e estudo de seus conteúdos acerca do tema proposto. Os procedimentos e técnicas serão empregados como instrumentos de conhecimento acerca do tratamento jurídico-penal conferido pelo Brasil ao tráfico internacional de pessoas para fins sexuais à luz da Convenção de Palermo.

11 Dados constantes no relatório “Uma Aliança Global conta o Trabalho Forçado”. ESTRELA, Tatiana Silva. O

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1 A GLOBALIZAÇÃO E SEUS REFLEXOS À CRIMINALIDADE

TRANSNACIONAL

O panorama político-econômico global, o cruzamento de culturas, o inter-relacionamento entre os povos, as facilidades nos meios de transporte e comunicação, e, de um modo geral, o estado de mundo globalizado, trouxe inúmeros benefícios à coletividade, entretanto, por outro lado, intensificou e revelou com maior evidência grandes males à sociedade contemporânea. Dentre estes a criminalidade transnacional.12

A par desta realidade, observa-se, atualmente, no seio da comunidade internacional, uma das principais fontes de violação aos direitos humanos: o crime de tráfico internacional de pessoas para fins sexuais. O presente delito, que há séculos permeia e contamina a sociedade, atingiu velocidade espantosa nos trilhos da globalização e, hoje, perfaz-se em constante afronta a dignidade da pessoa humana, suscitando medidas urgentes, nacionais e internacionais, de prevenção e combate à sua proliferação.

1.1 A transnacionalidade do crime no mundo globalizado.

A globalização traduz a internacionalização das relações entre os povos, o inter-relacionamento entre os Estados, e mais precisamente entre os povos destes Estados, construindo uma espécie de “aldeia global”13.

A estrutura atual de mundo globalizado trouxe consigo um inegável avanço nos meios de comunicação, transporte, trocas de informação e, diante disso, o encontro de culturas, pessoas, serviços, enfim, uma aproximação dos povos.

12 CHAMBEL. Fernando Silva.

Criminalidade organizada, terrorismo e intelligence na era da globalização. 06/01/2008. In: <http://www.jornaldefesa.com.pt/noticias_v.asp?id=545>, p. 1/2. Acesso em 02 de junho de 2008.

13YÚDICE, George. A conveniência da cultura: usos da cultura na era global. Belo Horizonte: UFMG, 2006,

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Como enfatiza Domingos Lima Filho:

O fenômeno da globalização – seja no âmbito de suas manifestações materiais ou no contexto de suas dimensões simbólicas e ideológicas – passou a assumir no último quarto do século passado e no limiar do presente século uma importância central nas relações sociais em escala mundial.14

Entretanto, a par dos inegáveis benefícios no campo da tecnologia, transportes, comunicação, mercado e serviços, trazidos pela globalização, há de se ressaltar também pontos negativos advindos deste fenômeno como a internacionalização do crime e dos criminosos, revelando-se a globalização como um agente facilitador da expansão da criminalidade. Os criminosos, organizações criminosas e grupos terroristas, nesta fase de mundialização, interligação e interdependência entre os países, passaram a crer e a fazer do mundo globalizado um ambiente favorável à expansão do crime e do terror, melhor dizendo, das suas atividades criminosas.15

Nas palavras de Raimundo Santos Júnior, acerca da globalização:

A produção, moeda, línguas, classes sociais e partidos políticos mobilizam-se como se transcendessem sobre as fronteiras políticas. É como se tudo estivesse desterritorializado. Este conceito não se aplica somente às companhias transnacionais e mercados financeiros, mas também às ideologias, grupos sócias, étnicos e movimentos sociais que se animam como se não tivessem uma filiação territorial. A globalização tende a desenraizar idéias, pessoas, informações etc.16

Com a facilitação do intercâmbio, comunicação fácil e barata, transportes também baratos, tornou-se praticamente impossível conter a disseminação da violência e do

14 LIMA FILHO, Domingos Leite. Dimensões e limites da globalização. 1ª ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2004, p. 09.

15 PUNGS, Reinier. Esforços Brasileiros no combate ao tráfico de seres humanos / discurso de abertura do

I Seminário Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Seres Humanos. 19-05-2005. In: <http://www.unodc.org/brazil/pt/articles_speechs_thb.html>. Acesso em 01 de fevereiro de 2009.

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crime. As redes internacionais de comunicação ligam empresários, estudantes, cientistas e também criminosos, promovem o contato e a interação.17

As atividades transnacionais de criminalidade vêm ganhando terreno para desenvolverem-se diante dos grandes avanços tecnológicos decorrentes do processo de globalização. As melhorias na área das telecomunicações, inclusive telefone, fax e meios de comunicação rápido pela internet, o aumento no tráfego internacional aéreo, e o crescimento do comércio internacional facilitaram a circulação de pessoas e produtos, e, desse modo, o crescimento dos crimes transfronteiriços. Os criminosos movimentam pessoas, bens, dinheiro, armas e explosivos num mundo que, em fase de globalização, aproximação dos povos, acaba por facilitar-lhes essa conquista.

A ideologia de livres mercados, livre comércio e diminuta intervenção estatal, são pilares fortes do processo de mundialização18.

Nas palavras de Domingos Lima Filho acerca da globalização:

É necessário liberalizar os mercados nacionais para chegar a um espaço mundial no qual circulem livremente mercadorias, capitais, serviços, pessoas – deve ser considerada com “herética” qualquer forma de proteção nacional.19

Em sendo assim, traduz-se como pressuposto deste fenômeno a redução de regulamentações e barreiras internacionais às transações comerciais e aos investimentos, circunstâncias estas que, ao tempo em que propiciam o ambiente globalizado, são decisivas à proliferação da criminalidade.20

17 CHAMBEL. Fernando Silva. Criminalidade organizada, terrorismo e intelligence na era da globalização. 06/01/2008. In: <http://www.jornaldefesa.com.pt/noticias_v.asp?id=545>, p. 2. Acesso em 02 de junho de 2008.

18 SHELLY, Louise. A globalização do crime e do terrorismo. eJournal USA: Questões Globais. Os desafios da globalização, fevereiro de 2006, p.42. In:< http://www.america.gov/media/pdf/ejs/ej0206po.pdf>. Acesso em

03 de fevereiro 2008.

19 LIMA FILHO, Domingos Leite. Dimensões e limites da globalização. 1ª ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2004, p. 38.

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24

Neste contexto, o afrouxamento nos controles estatais fronteiriços vem abrindo caminho à expansão da criminalidade transnacional. Criminosos e as organizações criminosas internacionais vêm atuando diante do novo modelo de mercado globalizado numa velocidade espantosa, ampliando suas atividades ao resto do mundo.21

Enquanto o comércio legal internacional é facilitado diante de uma regulamentação estatal flexível, favorável à formação de um mercado global e competitivo, os grupos criminosos transnacionais exploram livremente tais brechas dos sistemas jurídicos estatais para aumentarem o seu raio de ação. Eles ampliam para além das fronteiras dos estados a execução e as conseqüências da criminalidade interna, redesenhando os crimes numa versão internacional; viajam para regiões onde não podem ser extraditados; instalam suas operações em países onde a lei é aplicada de forma ineficaz e corrupta; e lavam seu dinheiro sujo, produto do crime, em estados com sigilo bancário ou controles pouco eficazes.

O fato é que, hoje, temos, como uma realidade preocupante, fomentada pelos progressos tecnológicos da globalização, a criminalidade transnacional organizada, uma indústria do crime sem limites fronteiriços, voltada à busca incessante do lucro maior.

Os criminosos e as grandes organizações criminosas globalizam as suas atividades pelas mesmas razões que as corporações multinacionais legítimas. Assim como as grandes multinacionais são movidas à expansão de seus negócios promovendo a abertura de sucursais por todo o mundo com o propósito de tirar vantagem da mão-de-obra atrativa, bem como dos mercados de matérias-primas, o mesmo ocorre com os negócios ilegais, voltados à expansão da lucratividade. É o que estamos vendo, por exemplo, ocorrer quanto ao tráfico internacional de pessoas para fins sexuais, trata-se de uma verdadeira indústria, uma máfia da prostituição. Os mercadores do sexo abastecem os países com produto “novo”, importam e exportam homens, mulheres e crianças para fins de exploração sexual.

De fato, crimes, antes, contidos, reprimidos, nacionalmente, ganharam versões internacionais, incrementados pela indústria transnacional do crime. É o caso do tráfico

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internacional de drogas, de armas e de pessoas, o mercado mundial do sexo, e a comercialização transfronteriça de orgãos humanos. “A globalização tem como traço fundamental a capacidade de desenraizar negócios, dilemas, movimentos sociais e uma gama de acontecimentos que, se tinham alcance local, regional ou nacional, agora pairam sobre as nações e a todas envolvem indistintamente”22.

Assim, nas últimas décadas, observou-se a ascensão das mais diferentes formas de crimes globalizados, crimes estes que atingiram lucros gigantescos, o que fez, inclusive, com que vários grupos terroristas utilizassem as referidas formas criminosas como fonte de financiamento.

Outros crimes que também vêm preocupando os governos devido a expansão no contexto de mundo globalizado é o comércio ilegal de espécies em perigo de extinção, o roubo de obras de arte e de antiguidade, a falsificação e o crime globalizado relacionado com cartões de crédito. Isso sem falar na indústria de serviços voltada a atender os criminosos transnacionais como: fornecedores de documentos falsos, lavadores de dinheiro e até mesmo profissionais de alto nível que prestam serviços jurídicos, contábeis e financeiros às organizações criminosas transnacionais, de modo a revelar que as atividades criminosas internacionais nem sempre permanecem na economia informal, chegando inclusive a cruzar com o sistema econômico legítimo.

A acrescentar, vale ressaltar que no mundo globalizado a internet tem sido um instrumento poderoso como meio de comunicação e, como tal, eficaz na facilitação e incremento à criminalidade. De fato, com o avanço nos meios de comunicação, a internet principalmente, o Estado perdeu o controle da informação, importante forma de conter as forças criminosas, o que fragilizou a segurança nacional e internacional.

O uso da internet vem sendo explorado como forma de planejamento e de execução às atividades criminosas. No atentado de 11 de setembro às torres gêmeas, por exemplo, é sabido que os terroristas usaram os computadores de acesso para enviar mensagens e comprar passagens aéreas.

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26

A internet trouxe, ainda, inovações, métodos, formas novas de praticar velhos crimes. “As granadas e outros engenhos explosivos foram substituídos por e-amils, fóruns, chats, fotos e vídeos digitais”.23 Além disso, o anonimato proporcionado pelo mundo virtual o

torna bastante atraente às práticas criminosas, é mais uma estratégia importante da qual se valem as organizações criminosas no mundo globalizado. O crime organizado e o terrorismo globalizaram-se escudados por inovações tecnológicas como a internet.24

Por tudo quanto aludido, temos que, atualmente, a sensação é de insegurança, o que requer uma ação conjunta dos Estados com o objetivo de combater este mal que é a criminalidade organizada transnacional. A ordem do momento é cooperar. Os órgãos de inteligência dos Estados devem atuar conjuntamente, mediante parcerias estratégicas, trocas de informações, pesquisas compartilhadas, tudo com a rapidez que o mundo globalizado permite, num rápido cruzamento de notícias, ou seja, o combate ao crime também há de ser globalizado.

Nas palavras de Paula Dobrianski, Ex-vice-secretrária de Estado para Assuntos Globais dos Estados Unidos, responsável por assuntos de política externa que incluíam democracia, direitos humanos e criminalidade transnacional, no que pertine ao crime globalizado:

À medida que emergem novos riscos, necessitamos ser dinâmicos e flexíveis em nossa abordagem. Somente podemos ter sucesso através de ações unidas, prolongadas e determinadas.25

23 CHAMBEL. Fernando Silva. Criminalidade organizada, terrorismo e intelligence na era da globalização. 06/01/2008. In: <http://www.jornaldefesa.com.pt/noticias_v.asp?id=545>, p. 2. Acesso em 02 de junho de 2008. 24 CHAMBEL. Fernando Silva. Criminalidade organizada, terrorismo e intelligence na era da globalização. 06/01/2008. In: <http://www.jornaldefesa.com.pt/noticias_v.asp?id=545>, p. 3. Acesso em 02 de junho de 2008. 25 DOBRIANSKY, Paula. Crescimento explosivo do crime globalizado. Questões globais: Coibição do crime

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Os Estados não devem deixar-se levar pela “ideologia do medo”26, promovendo o simples enrijecimento das fronteiras, endurecimento no sistema de defesa dos limites fronteiriços, de modo a impedirem a mobilidade e os meios de financiamento dos agentes do terrorismo internacional e do crime organizado transnacional. É o que se vê diante do acrescido controle de passageiros e mercadorias nos aeroportos e portos. Esta é uma atitude covarde e anti-globalizante.

Conforme infere Domingos Leite Lima Filho, numa versão otimista e apologética acerca da globalização: “...Considerada como um imperativo econômico e tecnológico dos tempos atuais, com força e inexorabilidade comparável às dos fenômenos naturais...”27

Acrescentando, Renato Riggiero declara: “Quem pensa que se pode deter a globalização, deveria dizer-nos como quer congelar o processo econômico e tecnológico. Tentar fazer isso é como tentar parar a rotação da Terra”.28

Observe-se que, a globalização é um fenômeno que, muito embora traga malefícios como os aqui apresentados, também traz grandes benefícios à sociedade e aos Estados como um todo. Desta forma, os países, em um mundo globalizado, não devem agir na contramão da globalização. Devem unir-se, reunir esforços, usando muitas das vezes dos mesmos recursos globalizantes que as redes criminosas (facilitação nos meios de comunicação, por exemplo) e combater o mal que lhes atormenta e causa desordem: a criminalidade e o terror.

É salutar, de fundamental importância, a formação de parcerias internacionais. A “inteligência” dos países, agindo em conjunto, na investigação, troca de informação e

26 CHAMBEL. Fernando Silva. Criminalidade organizada, terrorismo e intelligence na era da globalização. 06/01/2008. In: <http://www.jornaldefesa.com.pt/noticias_v.asp?id=545>, p. 4. Acesso em 02 de junho de 2008. 27 LIMA FILHO, Domingos Leite. Dimensões e limites da globalização. 1ª ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2004, p. 18.

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28

notícias, deve ser um instrumento defensivo e ofensivo válido contra a criminalidade transnacional.

A importância dessa política de cooperação internacional veio a tornar-se mais evidente após os atentados de 11 de setembro, quando a União Européia reforçou a EURAPOL e disponibilizou seus serviços à inteligência norte-americana. Do mesmo modo, Israel disponibilizou sua tecnologia de segurança e informação sobre as redes terroristas do oriente médio. Ademais, França, Alemanha, Polônia, Japão, Turquia, Índia, dentre outros, forneceram seus serviços de informação ao serviço de inteligência norte-americano. Entretanto, países cuja colaboração seria bastante significativa, como os países árabes mostraram-se reticentes em passar informações ao serviço de inteligência norte-americano, por depararem-se com a resistência interna em ceder informações de conteúdo sensível à manutenção de seus regimes internos.29

Hoje, vemos com clareza que a luta contra a criminalidade transnacional merece e depende de uma internacionalização dos serviços de informação e parcerias estratégicas. Como sinal dos novos tempos, temos que o fortalecimento de um esforço conjunto, a par de uma “inteligência” transnacional e operante, globalizada no sentido de combater ameaças também globais, é fundamental na defesa do mundo contra o crime globalizado. A exemplo desta iniciativa tivemos a criação de um centro de informações regional na América do Sul destinado a combater o crime e a corrupção transnacionais originados na região da tripla fronteira, entre Brasil, Argentina e Paraguai.30

A acrescentar, devemos ressaltar que o combate à criminalidade transnacional também requer dos Estados uma ação voltada a reestruturação interna e internacional do ambiente social, econômico e político que alimenta esta prática nefasta. É sabido que a criminalidade nacional e internacional está intrinsecamente ligada a problemas profundos resultantes de desequilíbrios econômicos internos dos países, regimes autoritários e a falta de oportunidade. A oferta de bons empregos, a disponibilidade de meios essenciais a uma vida digna, enfim, um mundo em desenvolvimento, sem restrições, sem excluídos, já seria, desde

29 CHAMBEL. Fernando Silva. Criminalidade organizada, terrorismo e intelligence na era da globalização. 06/01/2008. In: <http://www.jornaldefesa.com.pt/noticias_v.asp?id=545>, p. 5/6. Acesso em 02 de junho de 2008.

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logo, um agente inibidor da criminalidade, inclusive transnacional, de modo que, a exemplo disso, os agricultores afegãos e latino-americanos não venham a depender do cultivo e comercialização internacional da droga para sustentar suas famílias em um mundo marcado por uma grande pobreza em meio a tanta abundância.

O próprio Banco Mundial, em seu informe sobre el Desarrollo Mundial 2000/2001: lucha contra la pobreza, reconheceu o acirramento da exclusão social em nível global, propondo estratégias para o “alívio da pobreza” em um mundo “caracterizado pela desigualdade”.

Informa, ainda, a referida instituição que a riqueza mundial, o intercâmbio internacional e a capacidade tecnológica são agora maiores que nunca. Porém, a distribuição dessas melhoras tem sido extraordinariamente desigual. A renda média nos 20 países mais ricos é 37 vezes maior que a das 20 nações mais pobres. Esta disparidade duplicou nos últimos 40 anos (Banco Mundial, 2000).

No mundo globalizado, diferentemente do anunciado pelos profetas, aos passos do capitalismo, são acentuadas suas características fundamentais de concentração de renda e riqueza e de exclusão social, fomentando, assim, o sentimento de desprestígio de uns em relação aos outros, de descaso, de desrespeito, a revolta, e, por fim, a criminalidade e o terror.

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30

1. 2. Reflexos sócio-econômicos da globalização e o tráfico internacional de

pessoas para fins sexuais.

Além das facilidades que a estrutura de mundo globalizado oferece às redes de criminalidade transnacional, há de se ressaltar, outrossim, que o modelo de economia global, então estabelecido, acrescenta um outro dado não menos importante. Tal realidade evidencia o hiato entre países pobres e países ricos, fomentando nos países de baixa renda uma ilusão por parte de seus cidadãos de que uma vida mais digna os aguarda em países mais favorecidos economicamente.

Neste contexto, tornam-se, tais cidadãos, vítimas em potencial das redes criminosas que movimentam o tráfico. Pessoas que sonham com melhores condições de vida no exterior e que, por intermédio de traficantes vinculados à industria do sexo, migram para outros países em busca de uma vida economicamente mais digna.

O comércio internacional da prostituição floresceu a olhos vistos no centro e na periferia do capitalismo. Mulheres, homens e crianças vêm com o passar dos anos sendo agenciados por traficantes mundiais, que ora promovem, ora facilitam e ora intermediam o fluxo imigratório.

As vítimas são encaminhadas ao estrangeiro, por vezes, conscientes de que lá exercerão a prostituição, outras, sob falsas promessas de trabalho honesto (como serviços de garçonete, modelo, babá e outros). Neste último caso, são ludibriadas pelos torpes mercadores do meretrício e embarcam para outras “terras” onde vêem seus maiores sonhos transformarem-se em seus piores pesadelos.31

Nas palavras do ilustre professor Damásio de Jesus:

As principais causas do tráfico internacional de seres humanos e de fluxo imigratório são: a ausência de direitos ou a baixa aplicação das regras internacionais de direitos humanos; a

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discriminação do gênero; a violência contra a mulher; a pobreza e a desigualdade de oportunidades e de renda; a instabilidade econômica; as guerras; os desastres naturais e a instabilidade política.32

As vítimas do tráfico são levadas a outros países para fins de exploração sexual, aproveitando-se os criminosos de sua frágil situação social e econômica. Nos países de destino são mantidas em regime de total ou “quase” escravidão, obrigadas a entrar e/ou a continuar na prostituição, submetidas às mais diversas formas de coação, a começar pela exigência de reembolso pelos pesados custos ainda assumidos em seus países de origem a título de transporte e documentação, além de ameaças de violência e uso de toxicodependência como estratégia utilizada pelos exploradores para evitar fugas e assegurar a permanência da exploração.33

O domínio sobre as vítimas parece ser ainda mais forte quando as organizações criminosas têm o controle acerca de toda a ação que envolve o tráfico, desde o recrutamento, o transporte, até a fixação da vítima no local de destino onde se dará a exploração. E ainda maior quando tais organizações recebem o apoio de motoristas de táxi, funcionários de aeroportos, policiais, por fim, agentes que facilitam o caminho percorrido na rota do tráfico até que sejam atingidos os seus fins, colaborando para a perpetuação desta atividade.

O tráfico internacional de pessoas para fins sexuais, além de um ilícito, é um negócio desumano e degradante. Uma prática que nega valores inerentes à dignidade humana, como o direito à liberdade, o direito de escolha, o direito a integridade física e psíquica, dentre outros. O delito em tela, portanto, consubstancia-se em uma afronta a ordem jurídica interna (pertinente aos direitos fundamentais constitucionalmente assegurados) e internacional (no que pertine a tutela dos direitos humanos).

Em verdade, o tráfico de pessoas para fins de exploração sexual, como atividade comercial, em especial relativamente a mulheres e crianças, padece sobre a

32 JESUS, Damásio E. de. Tráfico Internacional de Mulheres e Crianças. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p.

19.

33

IMIGRANTES. Como no passado. O trabalho escravo e as redes de prostituição constituem neste

momento, um dos negócios mais lucrativos em todo o mundo. In:

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32

sociedade desde a Grécia Antiga. A esta época, as crianças de até cinco anos já eram comercializadas a título de escravas e obrigadas a prestarem “favores sexuais” aos seus “donos”. Desde então, o mercado do sexo e a exploração sexual acompanhou o processo civilizatório, alçando a dinâmica assustadora a que assistimos nos últimos anos. Práticas antigas que ganharam fôlego, fortaleceram-se, e encontram-se em plena expansão no século XXI.

Conforme estatísticas divulgadas pela ONU no 12º Período de Prevenção do Crime e Justiça Penal, realizado na Áustria, em 2003, para cuja obtenção colaboraram organizações não governamentais, o próprio governo e a mídia, cerca de 700.000 (setecentas mil) mulheres e 1.000.000 (um milhão) de crianças são traficadas por ano.34 E segundo o Ministério da Justiça e o relatório da PESTRAF (Pesquisa sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes)35, realizada em 2002, o Brasil, verdadeiro celeiro de vítimas, contribuiu para tanto com, aproximadamente, 241 rotas de tráfico de seres humanos, caminho percorrido rumo à prostituição ou trabalho forçado.

A expansão absurda deste ilícito, segundo informações divulgados pelo UNODC (Escritório das Nações Unidas contra as Drogas e o Crime), dá-se em razão dos altos níveis de lucratividade que emana do tráfico de pessoas para as redes criminosas. Cerca de US$ 9 bilhões de dólares ao ano, US$ 30 mil dólares por pessoa traficada. Deste modo, o tráfico de pessoas ocuparia o 3º lugar na escala de valores da economia criminosa, atrás apenas do tráfico de drogas e contrabando de armas.36

Em acréscimo, apontou a ONU, no mencionado encontro, na Áustria, que 92% das vítimas do tráfico são destinadas à exploração sexual (as demais ao trabalho forçado) e que, dentre estas, apenas 4% são homens, o restante, mulheres e crianças.37

34 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, v.3, p. 100.

35 LEAL, Maria Lúcia P. e LEAL, Maria de Fátima P. Pesquisa sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e

Adolescentes para fins de Exploração Sexual Comercial no Brasil. Brasília: PESTRAF/ CECRIA, 2002. 36 BRASIL.“Tráfico de seres humanos lucra US$ 30 mil por pessoa”. 19/05/2004. In: <www.unodc.org/brazil>. Acesso em: 01 jul. 2008.

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A relatar, já remonta de longas datas a preocupação dos Estados, em especial o Brasil, acerca do tráfico de pessoas. O Brasil, conforme já analisado, ao longo de sua história aderiu a diversas Conferências Internacionais que propuseram medidas contra o tráfico de pessoas. Disso resultaram os Decretos nº 5.591, de 13 de julho de 1905, promulgando o Acordo de Paris de 1904; o de nº 4.756, de 28 de novembro de 1923, que promulgou a Convenção firmada nessa mesma capital em 1.910; o de nº 23.812, de 30 de janeiro de 1934, que aprovava as conclusões da Convenção Adicional à Conferência de Genebra de 1921, dentre outras medidas jurídicas também voltadas a combater o ilícito.38

Diante de todo o processo evolutivo no campo jurídico nacional até a ratificação do Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças – Protocolo de Palermo, em 2004, e a conseqüente modificação no Código Penal no que pertine ao delito, à luz do referido Protocolo, somos forçados a crer que o tráfico internacional de pessoas para fins sexuais, problema que tanto aflige a sociedade mundial, é muito mais de ordem estrutural, social e econômica, que jurídica.

Questões como a pobreza, o desemprego, a desesperança, a fome, o difícil acesso à educação e à assistência a saúde são fatores que alimentam nos cidadãos o ímpeto à criminalidade seja ela interna ou internacional, adstrita ou além dos limites das fronteiras dos Estados. Além do que, como já aludido anteriormente, o colapso sócio-econômico de um Estado, deixa os seus cidadãos em situação de vulnerabilidade a tornarem-se vítimas dos torpes mercadores do meretrício.39

Observa-se, nos termos do Protocolo de Palermo, art. 9, parágrafo 4º, o reconhecimento de que fatores como a pobreza, o subdesenvolvimento e a desigualdade de oportunidades tornam as pessoas, especialmente mulheres e crianças, mais vulneráveis ao

38 NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, v.3, p. 243.

39 LEAL, Maria Lúcia P., LEAL, Maria de Fátima P.. Tráfico de mulheres, crianças e adolescentes para fins

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34

tráfico, sendo assim razão explícita para que os Estados Partes tomem ou reforcem medidas voltadas a reduzi-los ou mesmo anulá-los.

Combater a criminalidade transnacional, em especial o tráfico internacional de pessoas, exigiria, antes de tudo, uma mudança na estrutura e no modo de conduzir a economia mundial. O mundo globalizado, na sua visão de mercado capitalista e de exclusão social, em nada contribui para conter a criminalidade, pelo contrário, favorece e estimula a sua ascensão.

Diante desta realidade, temos que os países desenvolvidos, hoje, formam o grande mercado consumidor em face do tráfico internacional de pessoas, ao tempo em que os países menos favorecidos, os maiores fornecedores do que podemos chamar de “produto” no mercado da prostituição. O padrão indica que as vítimas partem dos países do chamado terceiro mundo, ou das novas democracias, e são encaminhadas para os países desenvolvidos. Os mercadores do meretrício importam e exportam a “mercadoria” do tráfico para os países mais abastados economicamente, abastecendo-os e fortalecendo a indústria transacional do sexo.

Neste sentido, observa Damásio de Jesus:

Os países subdesenvolvidos ainda são responsáveis pela maioria das pessoas traficadas no mundo, mas o segmento que mais cresce está localizado na Europa central e Oriental e nos países da antiga União Soviética. Vários especialistas têm notado vínculo entre o tráfico e os deslocamentos associados com a transição econômica, particularmente o crescimento da pobreza e do desemprego das mulheres.

O fluxo está dirigido para os países industrializados e envolve praticamente todos os membros da União Européia.40

Neste aspecto, podemos observar os resultados da pesquisa de Indícios de tráfico de pessoas no universo de deportadas e não admitidas que regressam ao Brasil via o aeroporto de Guarulhos41. Vejamos nos gráficos a seguir:

40 JESUS, Damásio E. de. Tráfico Internacional de Mulheres e Crianças. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p.

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Fonte: UNODC / 2005.

Fonte: UNODC / 2005.

41 GIANNICO, Débora. Indícios de tráfico de pessoas no universo de deportadas e não admitidas que

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36

Ciente da gravidade do problema e da necessidade de conhecê-lo em toda a sua extensão, o governo brasileiro, por meio do Ministério da Justiça, firmou parceria com o UNODC – Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime - passando a subsidiar amplas pesquisas voltadas ao mapeamento, análise e discussão acerca do ilícito, o que viria a contribuir para o desenvolvimento de políticas públicas no combate e prevenção do ilícito.

Desta feita, em abril de 2004, fora apresentado o relatório da pesquisa intitulada como “I diagnóstico sobre o tráfico de seres humanos: São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e Ceará”42, desenvolvida no Brasil, fruto da parceria. Tal pesquisa teve como base de informações para análises 22 processos judiciais e 14 inquéritos policiais instaurados entre janeiro de 2000 e dezembro de 2003. Goiás e Ceará foram escolhidos por serem importantes pontos de origem das vítimas. Rio de Janeiro e São Paulo, com seus aeroportos internacionais, por serem as principais portas de saídas.

A pesquisa revelou um baixo nível de escolaridade das vítimas do tráfico, o que as tornaria mais vulneráveis. A pouca escolaridade para ler o mundo, fragiliza-as nesse mister, criando campo mais fértil para a ação do tráfico. É o que infere o gráfico a seguir, ilustrado na referida pesquisa43:

42 COLARES, Marcos. I diagnóstico sobre o tráfico de seres humanos: São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e

Ceará. Brasília: Secretaria Nacional de Justiça, 2004. (Relatório de Pesquisa, Escritório das Nações Unidas Contra Drogas e Crime - Ministério da Justiça).

43 COLARES, Marcos.

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Fonte: UNODC / 2004.

Em circunstâncias assemelhadas, observa-se os resultados expostos na pesquisa centrada em Indícios de tráfico de pessoas no universo de deportadas e não admitidas que regressam ao Brasil via aeroporto de Guarulhos44. Assim, vejamos:

Fonte: UNODC / 2005.

44 GIANNICO, Débora. Indícios de tráfico de pessoas no universo de deportadas e não admitidas que

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38

Fonte: UNODC / 2005.

Fonte: UNODC / 2005.

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devidamente garantidos, continuarão estas a serem as vítimas preferenciais da violência e do tráfico.45

Nestes termos, observa-se o relatório da mencionada pesquisa “I diagnóstico sobre o tráfico de seres humanos: São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e Ceará”46:

Fonte: UNODC / 2004.

Entenda-se que, dos 36 casos que compõem a amostra, apenas uma vítima é do sexo masculino.

Em conclusões semelhantes, podemos considerar o resultado da pesquisa sobre Indícios de tráfico de pessoas no universo de deportadas e não admitidas que regressam ao Brasil via aeroporto de Guarulhos. Conforme figuram em dados percentuais os quadros a seguir47:

45 JESUS, Damásio E. de. Tráfico Internacional de Mulheres e Crianças. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 20.

46 COLARES, Marcos. I diagnóstico sobre o tráfico de seres humanos: São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e Ceará. Brasília: Secretaria Nacional de Justiça, 2004, p. 27. (Relatório de Pesquisa, Escritório das Nações Unidas Contra Drogas e Crime - Ministério da Justiça).

47 GIANNICO, Débora. Indícios de tráfico de pessoas no universo de deportadas e não admitidas que

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40

onte: UNODC / 2005. F

(43)

Fonte: UNODC / 2005.

Parte dessas vítimas seria formada por profissionais do sexo, outras seriam estudantes, empregadas domésticas, cabeleireiras, vendedoras, manicures, comerciárias, dentre outras profissionais de pouca ou nenhuma ascensão econômica. De modo que, na perspectiva de superar seus estados de pobreza, muitas seriam aliciadas por falsas promessas de emprego e de melhoria nas condições de vida ao estabelecerem-se no exterior. É o que também demonstra (em números) o relatório do I Diagnóstico sobre o tráfico de seres humanos, considerados os 36 casos que compõem a amostra 48:

(44)

42

Fonte: UNODC / 2004.

Outra constatação no curso da pesquisa, ora citada, fora a presença de outros crimes, como formação de quadrilha, falsificação de documentos, evasão de divisas e tráfico de drogas, interligados ao tráfico internacional de pessoas, uma atividade criminosa de movimentação em teia e resultados em cadeia. O que alavancaria a lucratividade que emana do ilícito às redes criminosas em patamares bem superiores aos outrora mencionados.

De acordo com notícia veiculada, em 04-02-2007, pelo jornal Folha de São Paulo, in verbis:

O tráfico de mulheres gera receitas anuais de US$ 32 bilhões no mundo todo, e 85% desse dinheiro vem da exploração sexual, que só na América latina e no Caribe fez 100 mil vítimas em 2006.

São dados de um relatório da Organização Internacional de Migrações (OIM), fornecido pelo diretor regional do Cone Sul do órgão Eugenio Ambrosi, que declarou que uma mulher pode ser “vendida” para uma rede de exploração sexual por entre US$ 100 e US$ 1.600.49

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Ademais, vale lembrar, que não é apenas com a importação e a exportação das vítimas voltadas a exploração sexual que se lucra, mas também com a própria exploração prolongada no tempo e maximizada devido ao fato de que as mulheres exploradas são em grande parte das vezes mantidas em situação de total ou semi-escravidão, ocupando a posição do que conhecemos hoje como as chamadas “escravas brancas”, sujeitas a violências, graves sevícias, violações, maus-tratos e todos os tipos de pressão e coação moral no exterior, para onde foram levadas.

Acerca do autor do delito em tela, o traficante, o mercador internacional do meretrício, temos, segundo dados apresentados na pesquisa do I Diagnóstico sobre o tráfico de seres humanos, que se trata, na maioria das vezes, de homens, embora considerável também seja a presença de mulheres nesta atividade. Além do que, independentemente do sexo, a maioria dos brasileiros acusados deste ilícito é intermediário em um conjunto de negócios que envolvem além do tráfico para fins sexuais, o tráfico de drogas, a lavagem e o contrabando de dinheiro dentre outras ações ilícitas com matriz no exterior.

Tais mercadores apresentam faixa etária acima dos trinta anos e aspectos ligados a um baixo nível de oportunidades de trabalho no mercado que, somado ao desejo de um lucro rápido, pode ser apontado como fator impulsionador à presente prática criminosa, de pouca expressividade midiática, posto que subterrânea, embora com graves implicações na ofensa aos direitos humanos. Ademais, por tratar-se de pessoas na grande maioria das vezes envolvidas em relacionamentos estáveis (casamento, união estável), os deveres de sustento também poderiam funcionar, como em outros casos, de estímulo a criminalidade.

No que pertine à ocupação destes criminosos, tratam-se em maior parte de empresários, envolvidos em negócios como casa de show, comércio (inespecífico), casa de encontros, bares, discotecas, agência de turismo, salão de beleza e cassino. Ressaltando-se serem pessoas com bom nível de escolaridade, fato que se explica em razão da necessidade que têm de estabelecer conexões em diferentes países e transitar fora do Brasil. É o que se compreende da análise do gráfico a seguir50:

50 COLARES, Marcos. I diagnóstico sobre o tráfico de seres humanos: São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e

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44

Fonte: UNODC / 2004.

São, em verdade, os criminosos em questão, captadores de “mão-de-obra” no campo da prostituição que abordam suas vítimas utilizando das mais diversas táticas como publicação de anúncios em jornal, nos quais o trabalho a desenvolver não está claramente especificado, testes de elenco para trabalhar no mundo da publicidade, ou como modelos, ou mesmo de recrutamento direto nos bares e discotecas utilizados para atrair as vítimas, as quais muitas das vezes nem sequer desconfiam que trabalharão como prostitutas no exterior, outras, conscientes de que exercerão o meretrício, não imaginam que serão mantidas em condições semelhantes à escravatura, sendo incapazes de escapar de seus exploradores.51

Os referidos traficantes, aproveitando-se da frágil situação econômica das vítimas, na maioria mulheres de classe social baixa, precário nível educacional e poucas ou quase nulas opções de trabalho, conforme já frisado anteriormente, além de um entorno familiar instável e dispostas a migrarem em busca de melhores condições de vida, encarregam-se de suas despesas de viagem, de modo que tais vítimas ao atingirem os países de destino já têm uma dívida contraída, razão inicial para sua exploração sexual em regime de coação e ameaças de violência.

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A decisão de migrarem para países mais desenvolvidos economicamente representa, muitas vezes, às vítimas do tráfico, uma indiscutível ascensão social. Mudar-se para o primeiro mundo – mesmo que para viver da própria exploração sexual – significaria subir na vida, diante da baixíssima mobilidade social de vários segmentos populacionais, sobretudo de mulheres e negros.

Pelo exposto, considerados sob diversas formas os aspectos sócio-econômicos que envolvem o delito em tela, bem como aferidas medidas legislativas no âmbito interno e internacional acerca do assunto, e a necessidade premente de prevenção e repressão ao ilícito, há de se ressaltar que o tráfico de pessoas, ilícito que afronta a ordem jurídica e os bons costumes, valores supremos inerentes à dignidade humana, requer uma ação voltada à instauração de um novo modelo social, político e econômico de governo, uma nova estrutura de economia interna e mercado globalizado.

Essa tomada de consciência resultou na formatação da “Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas”, que após ser referendada pela sociedade civil, fora publicada por meio de Decreto presidencial (decreto n. 5.498/06), apresentando diretrizes e conteúdo a revelar um caminho para uma política de enfrentamento independente e pautada na garantia dos direitos humanos, além de envolver um grande número de secretarias e ministérios.52

A constatação das razões e conseqüências sociais e econômicas do tráfico de pessoas para fins sexuais, aferidas no âmbito de pesquisas especializadas53, viabilizadas, conforme outrora salientado, pelo Ministério da Justiça, no Brasil, e o UNODC – Escritório das Nações Unidas Contra Drogas e Crime – em parceria, reafirmou tais circunstâncias como sendo fatores desencadeantes e consolidadores para o crescimento descontrolado do ilícito.

52 OLIVEIRA, Marina Pereira pires. Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Brasília, 2007. In: <www.unodc.org/brazil>. Acesso em: 01 jul. 2008.

53 COLARES, Marcos. I diagnóstico sobre o tráfico de seres humanos: São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e

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