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Sumário. Supremo Tribunal de Justiça Processo nº

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Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 085301

Relator: MIRANDA GUSMÃO Sessão: 07 Julho 1994

Número: SJ199407070853012 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: REVISTA.

Decisão: NEGADA A REVISTA.

DIREITO DE PREFERÊNCIA PROPRIEDADE HORIZONTAL

LOCATÁRIO OMISSÃO DE PRONÚNCIA

Sumário

I - Só existe omissão de pronúncia, quando o tribunal deixa de apreciar

questões submetidas pelas partes ao tribunal e não quando deixa de apreciar os argumentos invocados a favor da versão sustentada.

II - O direito de preferência do locatário - habitacional ou comercial - nasce no seu património sempre que se verifiquem os pressupostos que o condicionam : venda do prédio arrendado ou da fracção autónoma arrendada.

III - Extinto o direito de preferência do locatário por renúncia ou caducidade, renasce esse direito logo que volte a verificar-se os pressupostos que o

condicionam : venda do prédio arrendado ou da fracção autónoma arrendada.

IV - O direito de preferência que nasce no património de cada um dos locatários, após o prédio ter sido constituido em regime de propriedade horizontal, não atribui ao respectivo titular prioridade ou primazia na

celebração da venda de todas as fracções autónomas, mas tão só da fracção autónoma onde (mercê do contrato de arrendamento e da constituição do prédio em regime de propriedade horizontal), tem a sua habitação, ou o seu estabelecimento comercial.

V - Assim, à Autora e à Ré assiste-lhes, após a constituição do prédio em propriedade horizontal, apenas o direito de preferência nas fracções que ocupam como arrendatários.

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Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1. No 6. Juízo Cível da Comarca do Porto, A intentou acção com processo ordinário contra B e mulher e "Porfírio & Gonçalves Lda.", pedindo que se sentencie e reconheça a ela, Autora, a preferência na alinenação de 25 de Fevereiro de 1991 como compradora da fracção "C" do prédio descrito na petição inicial, substituindo assim a Ré Porfírio & Gonçalves Lda. como adquirente, bem como se sentencie o cancelamento de quaisquer registos prediais efectuados sobre a fracção em causa e posteriores ao dia 24 de Fevereiro de 1991, ou seja, efectuados na data ou posteriormente à data da escritura de compra e venda.

A Ré Porfírio & Gonçalves Lda. contestou.

Procedeu-se a audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença a julgar a acção procedente por provada e, em consequência, reconheceu-se e

declarou-se o direito de preferência da Autora sobre a venda da fracção "C" do prédio sito na Rua ..., cidade do Porto, celebrada através da escritura pública do 5. Cartório Notarial Cidade do Porto, em 25 de Janeiro de 1991, entre os primeiros Réus como vendedores e como compradora a terceira Ré "Porfírio &

Gonçalves Lda.", devendo aquela mesma Autora passar a figurar como adquirente; e ordenou-se o cancelamento de quaisquer registos efectuados sobre essa mesma fracção posteriormente à mencionada escritura.

A "Ré Porfírio & Gonçalves Lda.", apelou.

A Relação do Porto, no seu acórdão de 21 de Outubro de 1993, negou provimento ao recurso.

2. A Ré Porfírio & Gonçalves Lda. pede revista, formulando as seguintes conclusões:

1) Tendo o recorrente celebrado um contrato de arrendamento cujo conteúdo não pode ser alterado a não ser pelo consenso das partes, pelo produtor de direitos, como o de exercer o direito de preferência sobre a totalidade do prédio, a posterior alteração do regime de propriedade não prejudica os

direitos anteriormente adquiridos pelo arrendatário ao exercício do direito de preferência.

2) O entendimento anterior viola o disposto na artigo 406 C. Civil.

3) O ex Senhorio ofertou a todos os inquilinos a possibilidade de adquirirem o prédio no seu conjunto, sendo que se encontrava indisponivel para vender o prédio se alguma das fracções não fosse adquirida por qualquer dos

arrendatários.

(3)

4) Para além dos autos não mostrarem que qualquer dos restantes inquilinos tivesse exercido a preferência quer sobre a totalidade do prédio quer sobre a fracção, que não seria adquirida por um dos inquilinos, mostram os autos que foi o recorrente o único dos arrendatários que manifestou e exerceu o direito de preferência sobre o conjunto das fracções.

5) E se o não fizesse, o senhorio venderia o prédio a 3. interessado, uma vez que uma das fracções, pelo menos, ficaria por vender.

6) Havendo mais do que um interessado preferente, de harmonia com o artigo 1465, haveria que se determinar previamente qual o interessado a que caberia exercer esse direito.

7) Houve aqui também violação do disposto no artigo 1465 do Código de Processo Civil.

8) A venda do prédio foi efectuada no seu conjunto, sendo o valor atribuído a cada fracção, para fins meramente fiscais, uma vez que não houve

propriamente um contrato de compra e venda, mas um contrato efectuado com o recorrente, por este ter exercido o direito de preferência sobre o conjunto do prédio.

9) Pelo que, o senhorio não há-de prejudicar o preço do prédio no seu

conjunto, consoante o acórdão recorrido, violando o disposto no n. 1 do artigo 417.

10) O acódão recorrido violou, outrossim, o disposto na alínea d) do n. 1 do artigo 668 do Código de Processo Civil.

3. A recorrida apresentou contra-alegações onde salienta que:

1) A primeira e segunda conclusões são fruto de patente equívoco entre direito legal de preferência com pacto de preferência, com manifesto lapso quanto ao momento do nascimento do direito ora em causa.

2) As terceira, quarta e quinta conclusões violam, patentemente o que não ficou provado nas respostas aos quesitos 3., 3.A, 4., 5., 7. e 8. e mais não visa do que a alteração das respostas do Tribunal Colectivo.

3) Nas conclusões sexta e sétima, a recorrente confunde o objecto da lide. O que está em causa é somente a fracção "C" da qual a recorrida é locatária habitacional e sobre a qual a recorrente não é preferente.

Assim, tal direito sobre a dita fracção não pertence a várias, para que tivesse lugar o processo consignado no artigo 1465 do Código de Processo Civil.

4) A oitava conclusão assenta em matéria não provada pela resposta que receberam os quesitos 3.A e 8..

5) A nona conclusão faz apelo ao artigo 417 do Código Civil que não é aplicável à recorrente por não ser o vendedor. Mas mesmo que se lhe

aplicasse, sempre faltaria a indicação e a prova do prejuízo. E mesmo que este estivesse provado, sempre a recorrente colidiria com o facto de a fracção

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autónoma do prédio em propriedade horizontal ser independente, separável e separada do todo.

Corridos os vistos, cumpre decidir.

II

Elementos a tomar em conta:

1) C, marido da Autora, recebeu em arrendamento o 1. andar esquerdo do prédio situado na Rua ..., Porto, por contrato celebrado com o então

proprietário, em 1 de Maio de 1970.

2) O mencionado C faleceu em 14 de Novembro de 1980.

3) O prédio, referido em 1), encontra-se actualmente sob o regime de

propriedade horizontal, correspondendo aquele 1. andar esquerdo à fracção

"C".

4) No dia 25 de Fevereiro de 1991, por escritura pública celebrada no 4.

Cartório Notarial do Porto, os dois primeiros Réus na qualidade de

proprietários, venderam à terceira Ré, que comprou, o mesmo prédio referido em 1), pelo preço global de 35000000 escudos sendo atribuída à fracção "C"

um valor de 5398140 escudos.

5) A Ré Porfírio em 26 de Fevereiro de 1991 enviou carta ao falecido marido da Autora, dando notícia da compra referida em 4).

6) Os dois primeiros Réus comunicaram à Autora o projecto da venda do prédio indicado em 1).

7) Os Réus indicaram a quantia de 5845000 escudos como o preço da venda da fracção "C".

8) A Autora respondeu-lhes manifestando a sua vontade de exercer o direito de preferência quanto à mesma fracção "C".

III

Questões a apreciar no presente recurso.

A apreciação e decisão do presente recurso, delimitado pelas conclusões das alegações, passa, fundamentalmente, pela análise de três questões: a

primeira, a omissão de pronúncia: a segunda, se a alteração do regime de propriedade única de prédio para o de propriedade horizontal não prejudica o direito do arrendatário a exercer o direito de preferência sobre a totalidade do prédio: a terceira, se, de harmonia com o artigo 1465, do Código de Processo Civil, haveria que se determinar previamente qual o interessado a quem caberia exercer o direito de preferência.

A terceira questão ficará prejudicada na sua apreciação caso se decida a segunda questão no sentido de a alteração de regime de propriedade única para a de propriedade horizontal se reflectir no direito de preferência do locatário (habitacional/comercial) que transitou do primeiro para o segundo regime.

(5)

Por outras palavras, a terceira questão ficará prejudicada na sua apreciação caso se decida a primeira questão no sentido de o direito de preferência do arrendatário se confinar à coisa locada, da propriedade horizontal.

Abordemos tais questões.

IV

Omissão de pronúncia.

1. A recorrente Porfírio & Gonçalves Lda. sustenta que o acórdão recorrido violou o disposto na alínea d) do n. 1 do artigo 668 do Código de Processo Civil, na medida em que não apreciou as conclusões das alegações vertidas nos ns. 2, 3, 6, 7 e 11.

Que dizer?

2. A nulidade prevista na 1. parte da alínea d) n.

1 do artigo 668, do Código de Processo Civil, está directamente relacionada com o comando que se contém no n. 2 do artigo 660: o Juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

Tal norma suscita o problema de saber qual o sentido exacto da expressão

"questões" ali empregue.

O sentido de tal expressão é-nos dada por A. dos Reis aos escrever : "...assim como uma acção se identifica pelos seus elementos essenciais (sujeito, pedido, causa de pedir)... também as questões suscitadas pelas partes só podem ser devidamente individualizadas quando se souber não só quem põe a questão (sujeito), qual o objecto dela (pedido), mas também qual o fundamento ou razão do pedido apresentado" - Código de Processo Civil Anotado, vol. V, págs.

54.

Pois bem.

A Autora pediu, através da presente acção, o reconhecimento da sua

preferência na alienação de 25 de Fevereiro de 1991, como compradora da fracção

"C" do prédio que identificou, substituindo, assim, a Ré Porfírio & Gonçalves Lda. com o fundamento de ser legítima inquilina do 1. andar esquerdo desse prédio.

Através da contestação da Ré Porfírio & Gonçalves Lda. verifica-se que foram alegados factos tendentes a impedir o direito que a Autora tem de fazer valer, configurando uma verdadeira excepção peremptória. O

Sr. Juiz "a quo" relegou a apreciação da excepção invocada para a decisão final, pelo que os factos integrativos de tal excepção vieram a ser vasados no questionário (quesitos 3.A a 8.).

Tais quesitos sofreram resposta negativa.

(6)

Na sentença final precisou-se, por um lado, verificarem-se os factos constitutivos do direito invocado pela Autora e, por outro lado, não se verificarem os factos impeditivos desse direito, invocado pela Ré Porfírio.

Sendo estas as questões apreciadas na 1. instância, só estas poderiam ser reapreciadas pela Relação.

A Relação reapreciou a questão de saber se um dos direitos emergentes do facto de persistir o contrato de arrendamento consiste em o respectivo arrendatário poder exercer o direito de preferência sobre a totalidade do prédio (conclusão 2.).

A Relação não apreciou o que consta da conclusão

3., e não tinha de apreciar, na medida em que a mesma não encerra uma

"questão" (no alcance precisado), mas tão somente um argumento da questão colocada na conclusão 2..

A Relação também não apreciou as conclusões 4. e 6., e não tinha de as

apreciar, na medida em que as mesmas não passam de argumentos da questão colocada na conclusão 7. , sendo certo que esta questão não podia ser

reapreciada pela Relação. Na verdade, a questão constante da conclusão 7.

não foi apreciada na

1. instância por não ter sido submetida pela Ré ao Tribunal.

A Relação não apreciou a conclusão 11. por a mesma encerra questão que não foi apreciada na 1. instância e, assim sendo, apresentava-se como questão nova, afastada do objecto do recurso.

Conclui-se, assim, que o acórdão recorrido não enferma do vício invocado: - a omissão de pronúncia.

V

Se a alteração do regime de propriedade única de prédio para o de

propriedade horizontal não prejudica o direito do arrendatário exercer o direito de preferência sobre a totalidade do prédio.

1. Posição da Relação e das partes:

1.a) A Relação do Porto precisou que, por um lado, a Autora na era

arrendatária habitacional, há anos, do 1. andar esquerdo em causa, prédio esse que se encontra actualmente sob o regime de propriedade horizontal, correspondendo aquele 1. andar esquerdo à fracção "C". Por outro lado, os primeiros Réus celebraram com a Ré Profírio um contrato de compra e venda relativo à fracção ocupada pela Autora, sem que a esta tivessem dado

previamente conhecimento da identificação do comprador, preço, e condições de pagamento, como eram obrigados a dar por força do disposto no artigo 416, do Código Civil.

A Relação decidiu (com base em tais elementos e de modo implícito), que a Ré Porfírio, apesar de arrendatária comercial, não podia exercer o direito de

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preferência sobre aquela fracção, ou seja, não tinha direito de preferência sobre a totalidade do prédio.

1.b) A recorrente Porfírio & Gonçalves Lda. sustenta que o direito de

preferência atribuído ao arrendatário em caso de venda de prédio é um direito que resulta do contrato de arrendamento ajuízado, pelo que o Réu tal como a Autora têm direito - porque são arrendatários não de uma fracção mas de uma parte determinada de um andar (cave e rés do chão do prédio) - a exercer o seu direito de preferência sobre a totalidade do prédio.

Assim, os direitos adquiridos ao abrigo do contrato anterior à transformação do regime de propriedade não podem ser prejudicados por facto exclusivo do senhorio.

1.c) A recorrida A sustenta que o direito de preferência dos inquilinos na compra da sua fracção não surge com o contrato de arrendamento, mas somente no momento em que se efectua a notificação para preferência ou após o seu conhecimento de alienação já efectuada. Estamos perante um

direito legal e não contratual de preferência. Assim é errado defender-se que o tal direito de preferência reside ou nasce com a outorga de contrato de

arrendamento.

Que dizer?

2. Confrontando-se o direito de preferência do locatário habitacional ou do comercial com os direitos convencionais de preferência dotados de eficácia real (Lei 63/77, de 25 de Agosto, artigos 1117 e 421, ambos do Código Civil) verifica-se que, apesar de o respectivo exercício obedecer ao mesmo regime jurídico

(o regime dos artigos 416 a 418 e 1410), há elementos ou aspectos que os diferenciam, conforme sublinha o Prof. Henrique Mesquita, ao escrever:

"No primeiro caso, enquanto o preferente não fizer valer a prelação, cada venda de que o imóvel seja objecto origina um direito autónomo de

preferência.

O preferente pode, por conseguinte, desinteressar-se de determinada

alienação e vir a preferir numa outra que ocorra posteriormente. O direito de preferência deriva da lei e nasce (ou renasce) sempre que se verificam os pressupostos que o condicionam.

O arrendatário habitacional, por exemplo, tem o direito de preferir na venda ou dação em cumprimento do prédio arrendado.

O facto dele não preferir em certa venda (porque renunciou ao respectivo direito ou o deixou caducar) não impede de vir a fazê-lo mais tarde, se o prédio for novamente vendido.

Diversamente, se o direito convencional de preferência dotado de eficácia real, por isso que deriva de um contrato - que, em princípio, apenas pode criar

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direitos e obrigações para as partes (artigos 406 n. 2) - esgota toda a sua eficácia na primeira venda a ser objecto. Se o preferente não exercer aqui o direito que lhe assiste, este extingue-se e não renascerá em relação a uma nova venda que o adquirente do imóvel venha a fazer ulteriormente".

(Obrigações Reais e ónus Reais, paginas 196 e 197).

3. O que se deixa transcrito permite-nos afirmar que os locatários

(habitacionais/comerciais) verão (assistirão) renascer o direito de preferência sempre que se venham a verificar os pressupostos que o condicionam:

_ os indicados no artigo 1 n. 1 da Lei 63/77, de

25 de Agosto - "o locatário habitacional de imóvel urbano tem o direito de preferência na compra e venda ou dação em cumprimento do mesmo.

_ os indicados no artigo 1117 n. 1, do Código Civil:

"Na venda, dação em cumprimento ou aforamento do prédio arrendado, os arrendatários que nele exercam o comercio ou indústria há mais de um ano têm direito de preferência, sucessivamente e por ordem decrescente das rendas.

Sempre que se verifiquem os indicados pressupostos que condicionam o direito de preferência dos locatários (habitacional/comercial) este renasce e bem pode acontecer que venha extinguir-se de novo, por renuncia ou

caducidade.

4. Pode bem acontecer que o direito de preferência dos locatários

(habitacional/comercial) renasça numa ocasião em que o adquirente tenha constituído o prédio em propriedade horizontal por as fracções autónomas ou unidades independentes (- independência sob o ponto de vista a que se

destinam - habitação/ comércio -) que o compõem reunirem os quesitos a que alude o artigo 1415, do Código Civil.

O adquirente de prédio com locatários (habitacional/ comercial), bem pode o constituir em regime de propriedade horizontal, servindo a sua declaração unilateral de título constitutivo: exprime a vontade de sujeitar o edifício ao regime de propriedade de horizontal, indicando as partes correspondentes às várias fracções autónomas e fixando o valor relativo de cada uma delas,

expresso em percentagem ou permilagem do valor total do prédio (artigo 1418 do Código Civil e artigos 110 n. 1, do Código Registo Predial).

Este título constitutivo (a declaração unilateral do proprietário do edifício), embora não origine, só por si, uma situação plena e acabada da propriedade horizontal, pois esta pressupõe uma pluralidade de de condóminos - artigo 1414, do Código Civil - não é destituída de eficácia jurídica, conforme sublinha o Prof. Henrique Mesquita ao escrever:

"Em primeiro lugar, deve entender-se que, a partir da sua elaboração, o edifício fica juridicamente dividido, mesmo em relação ao proprietário, em

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várias fracções autónomas com individualidade jurídica própria.

O proprietário deixa de ter um direito único sobre o edifício e passa a ter tantos quantas as fracções autónomas. O título constitutivo é, assim, um acto de divisão do imóvel".

E mais adiante acrescenta:

"Pelo que respeita, pois, à autonomização das fracções do edifício que preencham os requisitos indicados no artigo 1415, o título constitutivo tem eficácia imediata: ex vi da declaração negocial do proprietário cada uma das fracções passa a constituir um objecto de direitos - uma coisa em sentido jurídico -, com todas as consequências daí resultantes" (A Propriedade Horizontal no Código Civil Português 1978, páginas 21 a 23).

5. Constituído o edifício em propriedade horizontal mediante declaração unilateral do seu único proprietário

(o adquirente da totalidade do prédio por extinção do direito de preferência dos locatários, por renúncia ou caducidade), bem pode vir a acontecer que esse proprietário queira vender as diversas fracções autónomas.

Verificados os requisitos que condicionam os direitos de preferência dos locatários (os citados artigos 1 da Lei 63/77 e 1117 n. 1, do Código Civil), renasce o direito de preferência dos locatários que na anterior venda (a venda do prédio objecto de um único direito de propriedade), deixaram extinguir o seu direito de preferir.

Não se assiste, agora, à venda de todo o prédio - ou seja, à transmissão de um único direito de propriedade -, mas à transmissão de tantos direitos de

propriedade quantas as fracções autónomas.

O direito de preferência que renasce no património de cada um dos locatários não atribui ao respectivo titular prioridade ou primazia na celebração da venda de todas as fracções autónomas, mas tão somente na da fracção

autónoma onde (mercê do contrato de arrendamento e da constituição do em regime de propriedade horizontal), tem a sua habitação, o seu

estabelecimento comercial.

6. Este nosso entendimento é alicercado quer na razão do ser do direito de preferência dos locatários (habitacional/comercial), quer na própria natureza desse direito.

Por um lado, a razão de ser do direito de preferência dos locatários

(habitacional/comercial) - que é um tornar livre a propriedade, o direito de propriedade dos arrendamentos - evidencia que o direito de preferência surge (nasce, renasce), sempre com vista a atribuir ao seu titular quer prioridade na celebração da venda da fracção autónoma, objecto do contrato de

arrendamento, quer o direito de se substituir ao adquirente da fracção autónoma, no contrato por este celebrado com o obrigado à prelação.

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Por outro lado, a natureza jurídica do direito de preferência (para uns, um "ius in re", incluido na categoria dos chamados direitos reais de aquisição

- Manuel Andrade, Teoria Geral da relação Jurídica, vol. II, página 53, nota 1;

Vaz Serra, Rev. Leg. Jurisp., ano 103, páginas 471; Antunes Varela, Rev.

Leg. Jurisp., ano 103, página 476; Oliveira Ascensão,

Direito Civil - Reais, 5. ed., página 574; P. Lima e A. Varela, Código Civil Anot.

vol. III, 2. ed., páginas 371 e 272: e acórdão deste Supremo Tribunal de 15 Outubro de 1980, Boletim do Ministério da Justiça n. 301, página 401- ; para outros: "uma relação jurídica complexa", integrada por direitos de crédito e direitos potestativos, que visam proporcionar e assegurar ao preferente uma posição de prioridade na aquisição, por via negocial, de certo direito, logo que se verifiquem os pressupostos que condicionam o exercício da prelação -

Henrique Mesquita, Obrigações Reais e ónus Reais, páginas 225) evidencia que o seu titular tem prioridade na transmissão que tenha por objecto a fracção autónoma de que é arrendatário.

Essa prioridade traduz-se "no direito real de adquirir o direito de propriedade sobre a fracção locada", para os que entendem que o direito de preferência tem natureza real.

Essa prioridade traduz-se "no poder exprimir uma vontade negocial" em relação à fracção locada, para os que entendem que o direito de preferência não tem natureza real.

7. Este nosso entendimento resulta inequivocamente do artigo 1.+ da Lei 63/77, de 25 de Agosto: o locatário habitacional tem direito de preferência na venda de imóvel urbano de propriedade única (n. 1): o locatário habitacional de fracção autónoma de imóvel urbano tem direito de preferência na venda dessa fracção (n. 2).

Este nosso entendimento resulta ainda da norma do n. 1 do artigo 1117 do Código Civil, na medida em que não se vê razões para dar a este preceito interpretação diferente da do artigo 1. da Lei 63/77, de 25 de Agosto.

8. O que se deixa exposto tem inteira aplicação ao caso dos autos: o

proprietário do imóvel urbano em causa, depois de terem celebrado contratos de arrendamento para habitação com a Autora e para comércio com a Ré

Porfírio & Gonçalves, Lda. para comércio, constituiram o mesmo em regime de propriedade horizontal. Em resultado da constituição do imóvel urbano, em causa, em regime de propriedade horizontal, os contratos de arrendamento passaram a ter por objecto as fracções autónomas correspondentes às partes que foram arrendadas. Posteriormente, os proprietários venderam à Ré sua locatária todo o imóvel urbano em causa, ou seja, todas as fracções

autónomas.

Com a venda de todas as fracções autónomas nasceu no património do

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locatário de cada uma das fracções autónomas o direito de, por via judicial - através de uma acção de preferência - se substituir ao adquirente da fracção autónoma de que é locatário, no contrato por este celebrado com o obrigado à prelação (os vendedores).

Enquanto o adquirente de todas as fracções autónomas

(a Ré Porfírio & Gonçalves, Lda., ora recorrente) tem direito à fracção de que era locatário, a Autora, na qualidade de locatária da fracção autónoma,

designada com a letra "C", tem direito de se substituir àquela Ré no contrato por esta celebrado com os proprietários do imóvel urbano em causa no que concerne

à fracção "C".

VI

Conclusões

Do exposto poderá extrair-se que:

1) Só existe a omissão de pronúncia (artigos 668, n. 1 alínea d), 1. parte, Código Processo Civil) quando o Tribunal deixa de apreciar (reapreciar)

questões submetidas pelas partes ao Tribunal e não quando deixa de apreciar os argumentos invocados a favor de versão sustentada.

2) O direito de preferêcia do locatário (habitacional/ comercial) nasce do seu património sempre que se verifiquem os pressupostos que o condicionam:

venda do prédio arrendado ou da fracção autónoma arrendada.

3) Extinto o direito de preferência do locatário (habitacional/comercial) por renúncia ou caducidade, renasce o direito de preferência logo que volte a verificar-se os pressupostos que o condicionam: venda do prédio arrendado ou da fracção autónoma arrendada.

4) O direito de preferência que nasce no património da cada um dos locatários (habitacional/comercial), após o prédio ter sido constituído em regime de propriedade horizontal, não atribui ao respectivo titular prioridade ou

primazia na celebração da venda de todas as fracções autónomas, mas tão só da fracção autónoma onde (mercê do contrato de arrendamento e da

constituição do prédio em regime de propriedade horizontal), tem a sua habitação, o seu estabelecimento comercial.

Face a tais conclusões, em conjugação com os elementos reunidos nos autos, poderá precisar que:

1.) O acórdão recorrido não enferma do vício de omissão de pronúncia.

2.) À Ré Profírio & Gonçalves, Lda. assiste-lhe após a constituição do prédio em regime de propriedade horizontal, o direito de preferência tão só na fracção (fracções) autónoma de que é mandatária comercial.

3.) A Autora A assiste-lhe, após a constituição do prédio em regime de

propriedade horizontal, o direito de preferência na venda da fracção "C" por

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ser arrendatária da mesma.

4.) O acórdão recorrido não merece censura por ser observado o afirmado em 2) e 3).

Termos em que se nega a revista.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 7 de Julho de 1994.

Miranda Gusmão.

Araújo Ribeiro.

Raul Mateus.

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