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Os aspectos controsos da usucapião familiar

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Academic year: 2018

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FACULDADE DE DIREITO

CURSO DE DIREITO

KLENCY DE ARAUJO OTAVIANO

OS ASPECTOS CONTROVERSOS DA USUCAPIÃO FAMILIAR

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KLENCY DE ARAUJO OTAVIANO

OS ASPECTOS CONTROVERSOS DA USUCAPIÃO FAMILIAR

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal Do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

ORIENTADOR: William Paiva Marques Júnior

FORTALEZA

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca Setorial da Faculdade de Direito

O87a Otaviano, Klency de Araújo.

Os aspectos controversos da usucapião familiar / Klency de Araújo Otaviano. – 2014. 74 f. : enc. ; 30 cm.

Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2014.

Área de Concentração: Direito Civil.

Orientação: Prof. Me. William Paiva Marques Júnior.

1. Posse (Direito) - Brasil. 2. Usucapião - Brasil. 3. Direito de propriedade – Brasil. I. Marques Júnior, William Paiva (orient.). II. Universidade Federal do Ceará – Graduação em Direito. III. Título.

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KLENCY DE ARAUJO OTAVIANO

OS ASPECTOS CONTROVERSOS DA USUCAPIÃO FAMILIAR

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal Do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

ORIENTADOR: William Paiva Marques Júnior

Aprovada em: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________

Me. William Paiva Marques Júnior (Orientador)

_________________________________________

Felipe Lima Gomes

________________________________________

(5)

A Deus.

Aos meus pais, Franscico Vieira Araújo e Lêda Maria Silva de Oliveira.

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RESUMO

A usucapião familiar é uma nova modalidade que ingressou no ordenamento jurídico no ano de 2011. Através desse instituto, o cônjuge ou o companheiro que deixa o imóvel da família, perde a sua fração em relação à propriedade do bem. O prazo é de apenas dois anos, contados a partir da entrada do art. 1240-A do Código Civil de 2002 no ordenamento jurídico brasileiro. A usucapião familiar não será concedida aos imóveis com tamanho superior a 250 m². As famílias que possuem outro imóvel urbano ou rural também não poderão obter a propriedade do bem através dessa modalidade de usucapião. O indivíduo só obterá a propriedade uma vez através da usucapião familiar. Para entender melhor o referido instituto, haverá um estudo geral sobre a usucapião, além disso, uma análise dos princípios constitucionais e do direito social à moradia, relacionando-os ao novel instituto civilista. Haverá uma abordagem sobre a relação da usucapião familiar com a volta da culpa no fim das relações conjugais, uma análise sobre o seu prazo exíguo, a questão da exclusividade de incidência nos imóveis urbanos e a questão processual e de competência para o julgamento das lides envolvendo essa nova modalidade de usucapião.

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ABSTRACT

The adverse possession familiar is a new modality that joined the legal system in the year 2011. Through this office, the spouse or partner who leaves the family estate, loses its fraction in relation to property. The deadline is only two years, counting from the entrance of the art. 1240-the Civil Code of 2002 in the Brazilian legal system. The adverse possession shall not be granted to family homes with superior size to 250 m². Families that have other urban or rural property also will not be able to obtain ownership of the well through this modality of adverse possession. The individual only obtains the property once through adverse possession. To better understand the aforementioned Institute, there will be a general study on adverse possession, in addition, an analysis of the constitutional principles and the social right to housing in relation to the novel-injury Institute. There will be a discussion on

the relationship of the adverse possession familiar with the fault at the end of the conjugal relationship, an analysis on your term is insignificant, the question of uniqueness of incidence in urban real estate and the question of procedure and competence for the judging of the deal involving this new modality of adverse possession.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 01

2 USUCAPIÃO -DELIMITAÇÃO CONCEITUAL E ASPECTOS GERAIS... 04

2.1 Breve Histórico...04

2.2 Conceito e Fundamento...05

2.3 Requisitos...08

2.4 Espécies ...16

3. PROTEÇÃO À MORADIA FAMILIAR À LUZ DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS...24

3.1 Princípio da Função Social da Propriedade …...24

3.1.1 Função Social da Propriedade Urbana... 28

3.1.2 Função Social da Propriedade Rural ...30

3.2 Princípio da Função Social da Posse...32

3.3 Princípio da Dignidade Humana...35

3.4 Princípio da Solidariedade...37

3.5 Princípio do Pluralismo das Entidades Familiares...39

3.6 Princípio da Vedação ao Retrocesso...40

4 OS ASPECTOS CONTROVERSOS DA USUCAPIÃO FAMILIAR...42

4.1 O Ingresso da Usucapião Familiar no Ordenamento Jurídico Brasileiro...42

4.2 A Questão da Culpa no Direito das Famílias e do Abandono do Lar...43

4.3 O Prazo da Usucapião Conjugal...52

4.4 A Questão da Aplicação Exclusiva nos Imóveis Urbanos...55

4.5 Os Aspectos Processuais da Usucapião Familiar...57

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS...60

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1 INTRODUÇÃO

No presente trabalho, será abordado o tema da usucapião familiar, também conhecida como usucapião pró-família, usucapião especial urbana por abandono do lar e usucapião conjugal. Essa nova modalidade surgiu no nosso ordenamento jurídico com a Lei nº 12.424 de 16 de junho de 2011, a referida norma trouxe mudanças na Lei nº 11.977/2009, que regulamenta o Programa Minha Casa Minha Vida, cujo objetivo era criar mecanismos de incentivo à moradia urbana, as alterações ocorreram mais precisamente no art.9° da Lei 11.977/2009, acrescentando dessa forma o art.1240 -A ao Código Civil de 2002.

Com o advento dessa nova espécie de usucapião, surgiram vários debates e discussões no meio jurídico a respeito da sua constitucionalidade material, pois alguns juristas entendem que o art.1240-A do Código Civil traz de volta ao nosso ordenamento jurídico a questão da culpa no fim das relações matrimoniais, algo que estava sem eficácia desde a Emenda Constitucional nº66/2010. Com a referida emenda, o divórcio direto passou a ser a única forma de dissolução do vínculo conjugal, tornando as normas que regulamentam a separação judicial sem eficácia no mundo jurídico.

Alguns juristas entendem que, ao voltar a questão da culpa no divórcio, a usucapião familiar está ferindo o princípio constitucional da vedação ao retrocesso, pois, não há dúvidas que o fim da intromissão do Estado nas relações entre os cônjuges ou companheiros é um grande avanço alcançado na sociedade, privilegiando as pessoas ao invés dos interesses patrimoniais. Nessa questão do fim das relações conjugais, a norma constitucional finalmente estava acompanhando as mudanças da sociedade atual. Para alguns especialistas do direito, essa nova modalidade de usucapião estava indo de encontro aos avanços sociais garantidos pela Emenda nº 66/2010.

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assim, pelo menos, a propriedade exclusiva do imóvel para a sua subsistência e a da sua família

Dessa forma, esses doutrinadores não concordam que a usucapião pró -família esteja em confronto com os valores constitucionais. Pelo contrário, a norma em questão veio dar efetividade a alguns princípios constitucionais, como a proteção à moradia e ao núcleo familiar, tornando estes princípios abstratos em normas concretas que visam à garantia também da dignidade humana e do direito fundamental à propriedade com a sua função social.

Outra questão polêmica que permeia a citada espécie de usucapião e que será estudada de forma aprofundada mais adiante, é entender quando está configurado o abandono do lar conjugal, que segundo o art.1240-A, é o marco inicial para a contagem

do prazo para usucapir o bem imóvel. O termo referenciado é um conceito jurídico indeterminado, e por isso, através de pesquisas doutrinárias, haverá uma análise

buscando entender o significado do termo no contexto da usucapião familiar e como será aplicado ao caso concreto, procurando assim, dar uma maior segurança jurídica quando os casos de abandono do lar forem apreciados no Judiciário.

Além das questões principais deste trabalho, existem outras que também serão abordadas de forma aprofundada no decorrer do presente estudo. Por exemplo, a questão da incidência exclusiva do instituto nos imóveis urbanos, excluindo os rurais; a parte processual do instituto: qual o rito processual e qual a vara competente para o julgamento das lides envolvendo a usucapião conjugal, entre outros temas que serão tratados no decorrer dessa monografia jurídica.

Entretanto, mesmo após a conclusão desses estudos, haverá ainda uma série de questões a serem debatidas na comunidade jurídica, pois o tema é recente e, além disso, percebe-se que o art.1240-A do Código Civil deixa muitas questões em aberto, ficando muitos aspectos do instituto a cargo da doutrina, através de livros e artigos científicos, que serão responsáveis por deixarem mais claros esses aspectos. Além disso, jurisprudências também serão importantes, até mesmo, porque algumas decisões podem virar precedentes de uma futura normatização mais detalhada e aprofundada da usucapião conjugal aplicada ao caso concreto.

Por outro lado, para entender melhor a respeito dessa espécie de usucapião, não somente haverá um estudo específico e delimitado sobre o tema principal do trabalho,

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2 USUCAPIÃO: DELIMITAÇÃO CONCEITUAL E ASPECTOS GERAIS

Antes de tratar sobre o tema da usucapião familiar, é importante a análise do instituto da usucapião em todos os seus aspectos, pois, apesar das suas peculiaridades, a modalidade pró-família possui características que são comuns a todas as demais espécies. Enfim, no presente capítulo, haverá uma abordagem sobre o caráter geral do clássico instituto do Direito Civil, tratando do seu aspecto histórico, do seu conceito e fundamentação, dos seus requisitos e, por último, das suas modalidades, exceto da usucapião conjugal, que será tratada no capítulo 4 do presente trabalho.

2.1 Breve Histórico

A usucapião é um instituto milenar que passou por várias transformações no decorrer da história. A palavra usucapião vem do latim usucapio, em que o termo capio quer dizer “tomar” e usu significa “pelo uso”. Na época da Roma Antiga, o referido instituto já era utilizado com a finalidade de obtenção da propriedade aliada ao fator temporal.

A sua origem se dá no período da Roma Antiga, mais precisamente com a Lei das Doze Tábuas, em que apenas o cidadão romano poderia adquirir a propriedade por usucapião, sendo assim, os estrangeiros não poderiam ter a sua posse transformada em propriedade pelo decurso do tempo.

Com o decorrer do tempo, ocorreram algumas mudanças com o objetivo de

delimitar a incidência da usucapião, com isso algumas leis romanas foram utilizadas para tal finalidade. Segundo Maria Helena Diniz, eram a Lei Atínia, a Lei Júlia e a Lei Plaucia, a primeira proibia que coisas furtadas fossem usucapidas e as duas últimas não permitiam que bens conseguidos através da violência fossem objetos de uma futura usucapião ( DINIZ, 2011, p.168).

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Com o passar do tempo, no Império Romano, não existiam mais diferenças entre a propriedade do cidadão e a do peregrino. Assim sendo, o estrangeiro poderi a obter a propriedade contra o antigo titular da coisa através da posse prolongada pelo tempo, fazendo jus ao instituto da usucapião.

No decorrer da história da Roma Antiga, nasceu um instituto que não apenas implicava na perda e aquisição da propriedade, mas significava a extinção do direito de ação, era chamada de praescriptio longissimi temporis. O que na época clássica era denominada com esta expressão em latim, nada mais é do que a prescrição e a usucapião, que foram utilizadas com a mesma denominação jurídica.

Maria Helena Diniz possui o seguinte posicionamento doutrinário, esclarecendo que:

...a usucapião é, concomitantemente, uma energia criadora e extintiva. Extintiva porque redunda na perda da propriedade por parte daquele que dela se desobriga pelo decurso do tempo. Aquisitiva porque ela leva à apropriação da coisa pela posse prolongada. Ao passo que a prescrição é puramente extintiva ( DINIZ, 2011, p.169).

O Código Civil francês adotou esse modelo monista do período da Roma clássica, ou seja, para a usucapião, os franceses a denominaram de prescrição

aquisitiva; já pra a prescrição, os mesmos a chamaram de prescrição extintiva. Já o Código Civil brasileiro adere ao modelo dualista, diferenciando prescrição de usucapião, tanto é que a primeira é estudada na parte geral dos Códigos de 1916 e de 2002, e também nos dois códigos, a segunda se encontra na parte referente ao Direito das Coisas. Sendo assim, o Brasil seguiu o modelo alemão, que é adepto da separação conceitual desses dois institutos.

2.2 Conceito e Fundamento

Segundo Caio Mário da Silva Pereira, o seu conceito para o referido instituto civilista seria assim: “...usucapião é a aquisição da propriedade ou outro direito real pelo decurso do tempo e com a observância dos requisitos estabelecidos em lei”( PEREIRA, 2003, p.138).

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adquirir-lhe-á a propriedade) e de outros direitos reais, como a servidão, prevista no artigo 1379 do mesmo código (O exercício incontestado e contínuo de uma servidão aparente, por dez anos, nos termos do art. 1242, autoriza o interessado a registrá-la em seu nome no Registro de Imóveis, valendo-lhe como título a sentença que julgar consumado a usucapião), o usufruto, previsto no artigo 1391 do Código Reale de 2002 (O usufruto de imóveis, quando não resulte de usucapião, constituir-se-á mediante registro no Cartório de Registro de Imóveis. O usufruto de imóveis, quando não resulte de usucapião, constituir-se-á mediante registro no Cartório de Registro de Imóveis), entre outros direitos, como uso e habitação.

Quanto ao modo de aquisição da propriedade, há entendimento doutrinário que considera como modo originário, ou seja, não há relação de transferência de domínio do

antigo proprietário para o usucapiente. Nesse caso, os vícios inerentes ao antigo proprietário não se transmitem ao adquirente, sendo assim, o mesmo recebe a propriedade

como se não existisse um antigo dono. É o entendimento de Maria Helena Diniz, que esclarece assim:

A usucapião é um direito novo, autônomo, independente de qualquer ato negocial provindo de um possível proprietário, tanto assim que o transmitente da coisa objeto da usucapião não é o antecessor, o primeiro proprietário, mas a autoridade judiciária que reconhece e declara por sentença a aquisição por usucapião ( DINIZ, p.170, 2011).

Já Caio Mário entende de forma contrária e não considera um direito novo, mas uma forma de aquisição derivada da propriedade, assim esclarece o autor:

Levando, pois, em conta a circunstância de ser a aquisição por usucapião relacionada com outra pessoa que já era proprietária da mesma coisa, e que a perde a titularidade da relação jurídica dominial em proveito do adquirente, conclui-se ser ele uma forma de aquisição derivada ( PEREIRA, 2003, p.138).

Apesar do posicionamento do referido autor ser pela aquisição derivada, logo após a citação acima, o mesmo faz uma ressalva e considera que falta na usucapião o requisito da transmissão voluntária da propriedade, algo presente nas aquisições por modo

derivado. Outro fator que comprova a não relação de transmissão da propriedade entre antigo e novo titular da coisa é a não incidência do ITBI (Impostos de Transmissão de Bens Imóveis), que está situado no art. 35 do CTN (Código Tributário Nacional), mais precisamente no inciso I.

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ocorre na usucapião. Apesar disso, o usucapiente terá a obrigação de pagar o Imposto Sobre a Propriedade Territorial Urbana (IPTU) ou o Imposto Territorial Rural (ITR), pois estes se relacionam com a coisa e não com o titular da mesma, então só haverá registro da sentença após o pagamento da mesma, a previsão legal dessa exigência está no art. 945 do CPC, que está transcrito dessa forma: A sentença, que julgar procedente a ação, será transcrita, mediante mandado, no registro de imóveis, satisfeitas as obrigações fiscais” O fundamento da usucapião é transformar a posse da coisa em propriedade, ou seja, fazer nascer um direito novo em uma situação de fato, dando assim a segurança jurídica na relação do novo proprietário com a coisa. Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald possuem o seguinte entendimento a respeito desse tema: “O proprietário desidioso, que não cuida do seu patrimônio, deve ser privado da coisa, em favor daquele

que, unindo posse e tempo, deseja consolidar e pacificar a sua situação perante o bem e a sociedade”. (FARIAS; ROSENVALD, 2013, p.397). E afirmam mais, quando citam dessa forma:

A usucapião é a ponte que realiza essa travessia, como uma forma jurídica de soluções de tensões derivadas do confronto entre a posse e a propriedade, provocando uma mutação objetiva na relação de ingerência entre o titular e o objeto ( FARIAS ; ROSENVALD, 2013, p.397). Um detalhe importante é que na maioria das modalidades de usucapião que serão estudadas a seguir, apenas a posse com animus domini seria necessária para se obter a propriedade, exceto na usucapião familiar, em que o usucapiente não detêm apenas a posse do bem, como também é coproprietário. Nesse caso, a propriedade é de ambos os cônjuges, mesmo assim, aquele que continua no imóvel, deverá exercer a posse sobre a

coisa pra que haja uma propriedade exclusiva no futuro, sendo assim, nessa nova modalidade o possuidor deverá ser também coproprietário do bem, o fator temporal transformará o mesmo em proprietário exclusivo do imóvel.

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nenhuma destinação a sua propriedade, tornando-a sem utilidade social e econômica. Assim entende Orlando Gomes, quando assevera que:

As teorias objetivas fundamentam a usucapião em considerações de utilidade social. É socialmente conveniente dar segurança e estabilidade à propriedade, bem como consolidar as aquisições e facilitar a prova do domínio. A ação do tempo sana vícios e os defeitos dos modos de aquisição porque a ordem jurídica tende a dar segurança aos direitos que confere, evitando conflitos , divergências e mesmo dúvidas. Bem certo é que “acabar com as incertezas da propriedade” é a “razão final” da usucapião. ( GOMES, 2007, p.187).

Uma citação interessante relacionando à usucapião e a sua teoria objetiva é a dos autores Flávio Tartuce e José Fernando Simão, quando se referem ao instituto dessa forma:

Pode-se afirmar que a usucapião garante a estabilidade da propriedade, fixando um prazo, além do qual não se pode mais levantar dúvidas a respeito das ausências ou vícios do título de posse. De certo modo, a função social da propriedade acaba sendo atendida por meio da usucapião.(TARTUCE; SIMÃO, 2012, p.158).

Com o advento da Carta Magna de 1988, a função social da propriedade tornou-se um princípio norteador das relações entre o indivíduo e a coisa, ou tornou-seja, passou a existir uma restrição ao direito de propriedade, algo que antes era um direito ilimitado do

proprietário. A função social da propriedade é direito fundamental e tem o seu embasamento legal no art. 5ª, inciso XXIII da Constituição Federal, cuja a transcrição é a seguinte:

Art. 5º- Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:[...]

XXIII- a propriedade atenderá a sua função social;

Com a usucapião não seria diferente, o princípio constitucional acima deu um cunho mais social ao referido instituto, pois a diminuição do prazo, o requisito do tamanho do imóvel, a proteção da família, são características do novo modelo social acrescentado ao clássico instituto do Direito Civil. Dessa forma, a teoria objetiva é que explica com maior exatidão o verdadeiro papel da usucapião nos dias atuais.

2.3 Requisitos

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coisa usucapida; os requisitos também podem ser reais, ou seja, quando se relacionam aos bens e direitos que podem ser usucapidos; e por último, há os requisi tos formais, que podem ser gerais, como a posse e o lapso temporal, como também, podem ser específicos, o exemplo disso é o justo título e a boa-fé, ambos estão presentes na usucapião ordinária. Na modalidade familiar, há também alguns requisitos específic os, como a copropriedade do bem imóvel e o fato do usucapiente ser cônjuge ou companheiro daquele que abandonou o lar.

Em relação aos requisitos pessoais da usucapião, existem algumas restrições ditadas pela lei civil, como no artigo 1244 do Código Civil. No caso da norma em questão, há a confluência das causas interruptivas, suspensivas e impeditivas da prescrição e da usucapião, o referido dispositivo está transcrito assim: “Estende-se ao possuidor o disposto quanto ao devedor acerca das causas que obstam, suspendem ou interrompem a prescrição, as quais também se aplicam à usucapião”

As causas impeditivas, interruptivas e suspensivas da prescrição encontram-se na parte geral do novo Código Civil, mais precisamente nos artigos 197, 198, 199 e 202 do referido Código. Vale ressaltar a diferença entre a suspensão e a interrupção da prescrição e da usucapião, na suspensão, o prazo anterior ao período suspenso contará para a soma do tempo restante; já na interrupção, a contagem do prazo volta ao início, sendo assim, o tempo anterior será descartado para efeitos tanto da prescrição como da usucapião.

Um fato interessante está relacionado ao inciso I do artigo 197 do novo Código Civil já citado acima. A regra é que os prazos da usucapião não correrão entre os cônjuges durante o vínculo matrimonial, entretanto no caso da usucapião familiar, há uma exceção, pois o requisito do abandono do lar conjugal por um dos consortes é o marco inicial da contagem do prazo da usucapião. Isto quer dizer que o prazo começa a fluir durante a constância do casamento, pois não precisa ocorrer o divorcio, a simples saída do lar conjugal junto com o abandono material são motivos que caracterizam o início da contagem pra a usucapião do bem imóvel.

No artigo 1244 do Código Civil de 2002, há um entendimento que os fatos que interrompem a usucapião estão relacionados com o artigo 202 do mesmo diploma legal em todos os seus incisos. Entretanto a opinião dos autores Cristiano Chaves de Farias

e Nelson Rosenvald diverge desta inteira correlação quanto ao fato da interrupção, quando cita o seguinte trecho abaixo:

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ser paralisada por qualquer via judicial ou extrajudicial, como permite em algumas hipóteses o art.202. Uma norma ordinária será reputada como excessiva, a ponto de ofender o princípio da proporcionalidade, ao permitir, exemplificadamente, que uma mera notificação seja capaz de determinar a interrupção do prazo de usucapião ( FARIAS; ROSENVALD, 2013, p.401).

Outro fato importante que se relaciona com as pessoas envolvidas na usucapião diz respeito ao condomínio, ou seja, se um coproprietário poderá usucapir contra os outros coproprietários. A resposta é a seguinte: enquanto for um condomínio pro indiviso , não se poderá realizar a usucapião, pois não há uma área delimitada que seja objeto para aquisição de propriedade por essa via jurídica. Só poderá ocorrer a usucapião, se um condômino se comportar como proprietário de uma área certa(pro diviso), ou seja, obter a posse de uma fração ideal em detrimento dos demais condôminos. Uma interessante decisão do STJ que retrata o referido tema da possibilidade de usucapir no condomínio está situada no seguinte trecho abaixo:

Ementa :AGRAVOT EM RECURSO ESPECIAL. IMÓVEL EM CONDOMÍNIO. POSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO POR CONDÔMINO SE HOUVER POSSE EXCLUSIVA. 1. O condômino tem legitimidade para usucapir em nome próprio, desde que exerça a posse exclusiva com animus domini e sejam atendidos os requisitos legais do usucapião(STJ - AgRg no AREsp: 22114 GO 2011/0114852-3, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 05/11/2013, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/11/2013)

Partindo desse , no caso da herança, esta é considerada pelo Código Civil com bem imóvel (Art. 80. Consideram-se imóveis para os efeitos legais: [...] II -o direito à

sucessão aberta.), e só poderá haver usucapião de um herdeiro em detrimento do outro após a partilha dos bens, assim sendo, as regras aplicáveis ao condomínio também serve para o caso da herança no momento anterior à partilha. Em relação às pessoas jurídicas de direito publico, os seus bens são considerados imprescritíveis, e assim sendo, não poderão sofrer os efeitos da usucapião.

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está no texto constitucional, mas qualquer bem público, incluindo os bens imóveis nessa lista de coisas não afetadas pela usucapião. As seguintes normas estão transcritas dessa forma: “Art. 102. Os bens públicos não estão sujeitos a usucapião; Súmula nº 340 do STF: Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião”.

Apesar da pacificação no entendimento doutrinário em relação ao tema referido acima, existiu grande divergência em épocas passadas a respeito desse assunto. Os bens dominicais e de uso especial poderiam ser usucapidos desde que fossem satisfeitos certos requisitos, como a posse mansa durante um lapso temporal de 40 anos, mas o Decreto nº 22.785 de 1933 pôs fim a tal entendimento, pois, a partir daí, os bens dominicais e os de

uso especial se tornariam imprescritíveis junto com os bens de uso comum, que já eram insuscetíveis de usucapião antes da entrada em vigor do referido decreto. No art. 2ª do

citado decreto, encontramos a fundamentação legal da imprescritibilidade dos bens públicos, quando assevera: “Art. 2º Os bens públicos, seja qual for a sua natureza, não são sujeitos a usucapião”

Com a entrada em vigor da Lei nº 6969/81, mais precisamente no seu art.2º, a usucapião rural poderia ser efetivada se o bem público fosse situado em áreas de terras devolutas ( bens dominicais), entretanto, como já citado anteriormente, a nova ordem jurídica constitucional, que surgiu com a Carta Magna de 1988, proibiu expressamente a usucapião de bens públicos em todas as suas modalidades. O referido art. 2º está transcrito assim: “A usucapião especial, a que se refere esta Lei, abrange as terras particulares e as terras devolutas, em geral, sem prejuízo de outros direitos conferidos ao posseiro, pelo Estatuto da Terra ou pelas leis que dispõem sobre processo discriminatório de terras devolutas”.

Apesar da proibição constitucional da usucapião de bens públicos, Cristiano

Chaves de Farias e Nelson Rosenvald criticam esse dogmatismo do legislador constitucional e entendem assim:

A absoluta impossibilidade de usucapião sobre bens públicos é equivocada, por ofensa ao valor (constitucionalmente contemplado) da função social da posse e, em última instância, ao próprio princípio da proporcionalidade. Os bens públicos poderiam ser divididos em materialmente e formalmente públicos. Estes seriam aqueles registrados em nome da pessoa jurídica de Direito Público, porém excluídos de qualquer forma de ocupação, seja para a moradia ou exercício de atividade produtiva. Já os bens materialmente públicos seriam aqueles aptos a preencher critérios de legitimidade e merecimento, postos dotados de alguma função social.

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dimensionamento do bem público, de acordo com a sua conformação no caso concreto. Ou seja: se formalmente público, seria possível a usucapião, satisfeitos os demais requisitos; sendo formal e materialmente púbico, haveria óbice à usucapião. Esta seria a forma mais adequada de tratar a matéria , se lembrarmos que, enquanto o bem privado “tem” função social, o bem público “é” função social( FARIAS; ROSENVALD,2013, p.404).

Em relação às cláusulas de inalienabilidade que gravam o bem usucapido, estas não são empecilhos para aquisição da propriedade pelo usucapiente. Pois, como foi

dito antes, a usucapião é uma forma originária de aquisição do bem imóvel, isto significa que não há relação entre o antigo proprietário e o adquirente, assim como os vícios da coisa não se transmitem na usucapião, estas cláusulas resultante de doação e pacto antenupcial, entre outros negócios jurídicos, também não acompanharão a coisa usucapida. Somente há uma exceção a essa regra, que é no caso da usucapião ordinária, pois esta modalidade necessita de justo título para se efetivar, ou seja, este título só irá vigorar se tiver origem em um negocio jurídico apto a transmissão do bem imóvel, com a cláusula de inalienabilidade , o referido negócio será nulo de pleno direito.

Quanto aos requisitos formais para aquisição por usucapião é necessário frisar que a abordagem nesse tópico será referente aos requisitos gerais como a posse e o lapso temporal. Já os requisitos específicos serão analisados em fases posteriores do presente trabalho. Estes requisitos suplementares, como o justo título e a boa-fé, são importantes para diminuir o lapso temporal necessário para a aquisição da propriedade.

Para ter direito à usucapião, é necessário que a posse seja mansa, pacífica, contínua e com a intenção de ser dono (animus domini). Sem um destes requisitos, a posse não estará apta a gerar uma futura aquisição da propriedade. Além isso, a posse ad usucapionem deverá ser justa, ou seja, sem a mácula da clandestinidade, da violência e da precariedade.

Primeiramente, o possuidor da coisa deverá ter a intenção de ser dono, através desse requisito, aquele que apenas detêm a coisa não poderá usucapi-la; e também àquele que possui o bem, mas que deverá devolver ao proprietário, cumprindo o negócio jurídico estipulado entre as partes. Sendo assim. Alguns contratantes, por exemplo, o locatário, o usufrutuário e o comodatário, além de outros, não poderão alegar uma usucapião decorrente de suas posses. Apesar de que, nessa posição jurídica, estes contratantes poderão defender a coisa contra àqueles que indevidamente perturbarem a suas posses, o meio de defesa será através das ações possessórias, como exemplos, há os interditos

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Outro requisito importante da posse é que a mesma seja mansa e pacífica. Um conceito interessante a respeito destes requisitos vem do autor Caio Mário da Silva Pereira, quando ele diz assim:

Requer-se, ainda, a ausência de contestação à posse, não para significar que ninguém possa ter dúvida sobre a conditio do possuidor, ou ninguém possa pô-la em duvida, mas para assentar que a contestação a que se alude á a de quem tenha legítimo interesse, ou seja, da parte do proprietário contra quem se visa a usucapir( PEREIRA, 2003, p.140).

Um fator essencial que constitui a posse ad usucapionem é a sua continuidade, com isso a lei civil considera que o indivíduo deverá exercer a sua posse sem intervalos para que tenha direito a usucapir o imóvel no futuro. Entretanto, essa posse pra ser

considerada contínua, não é necessária que seja exercida pela mesma pessoa, pois o art.1243 do Código Civil de 2002 permite a soma de posses sucessivas para a contagem do

prazo da usucapião, porém todas as posses deverão ter como características a continuidade e a mansidão , pois ausentes tais requisitos, essa soma não se dará. E no caso da usucapião ordinária, as posses somadas deverão ter os requisitos do justo título e o da boa-fé. O referido art. 1243 está transcrito dessa maneira:

Art. 1.243. O possuidor pode, para o fim de contar o tempo exigido pelos artigos antecedentes, acrescentar à sua posse a dos seus antecessores (art. 1.207), contanto que todas sejam contínuas, pacíficas e, nos casos do art. 1.242, com justo título e de boa-fé.

Em relação à accessio possessionis ou soma das posses, há uma ressalva a se fazer, que diz respeito à modalidade especial da usucapião. A questão é seguinte: a acessão das posses não ocorre na usucapião especial urbana e rural, inclusive o Enunciado 317 da IV Jornada de Direito ratifica esse entendimento, quando diz assim: “A accessio possessionis, de trata o art. 1239 e 1240 do mesmo diploma legal, em face da normatividade da usucapião constitucional urbano e rural, arts. 183 e 191, respectivamente”. Apesar disso, na usucapião urbana coletiva, é permitida a união das posses, a fundamentação legal da referida exceção encontra-se no parágrafo 1º do art.10º do Estatuto da Cidade, que está transcrito assim: “§ 1o O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas”

A acessão de posses é dividida em duas espécies: a acessão por título singular e a modalidade caracterizada pelo título universal. Esta tem como característica a

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vícios. Já aquela se caracteriza pelo fato do adquirente ter a escolha de somar a posse com a do antigo possuidor, caso não aceite somar, a contagem do prazo começará do zero, em compensação o bem não estará eivado pelos vícios da posse anterior. Como já foi dito antes, para que haja a soma das posses para a contagem dos prazos, ambas devem ser pacíficas e contínuas.

Outro detalhe importante está na dispensabilidade do requisito da moradia nas espécies ordinária e extraordinária. Para ressaltar tal entendimento, os autores Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald entendem desta maneira:

Nas duas hipóteses do caput do art.1238 e caput do art.1242. Nesta duas situações, qualquer pessoa poderá possuir a coisa por intermédio de seus funcionários ou daqueles a quem outorgou a posse direta, em virtude da relação jurídica( v.g; locatários, comodatários). A posse será descontínua quando o possuidor abandonar o poder físico sobre a coisa por prazo relevante, sem deixar qualquer daquelas pessoas ocupando o bem(FARIAS:ROSENVALD, 2013, p.419)

Um aspecto importante relativo ao prazo da usucapião diz respeito ao que está contido no Enunciado nº 497 da V Jornada de Direito Civil, que está descrito desta forma: “O prazo na ação de usucapião pode ser completado no curso do processo , ressalvadas as hipóteses de má-fé processual do autor’. Isto quer dizer que o autor poderá ingressar com a referida ação antes de completar o prazo necessário para a aquisição do direito, mas obedecendo o princípio da razoabilidade, é importante que este prazo já esteja no final, pois caso contrário, não teria sentido o autor alegar um direito futuro que ainda está distante de ser concretizado.

Um requisito essencial para a posse ad usucapionem é que ela seja justa e nas palavras de Maria Helena Diniz, a sua relação com a usucapião seria assim:

Tal posse há de ser justa, isto é, sem os vícios da violência, da clandestinidade ou da precariedade, pois se a situação de fato for adquirida por meio de atos violentos ou clandestinos ela não induzirá posse enquanto não cessar a violência ou clandestinidade e , se for adquirida a título precário, tal situação não se convalescerá jamais”( DINIZ, 2011, p.177).

No art.1208 do novo Código Civil, há a fundamentação legal que embasa o que está descrito na citação acima, o referido artigo está transcrito dessa forma: “Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade”.

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a posse clandestina é aquela conseguida sem o conhecimento dos interessados, ou seja, sem que o dono da coisa esteja ciente do ocorrido, e não basta o mero desconhecimento, a posse oculta deverá ser resultado do dolo do possuidor, sendo assim, este irá se utilizar do artifício da má-fé para se manter na posse. E por último, a posse não deverá ser adquirida a título precário, ou seja, é um tipo que se inicia como justa, mas o individuo utiliza-se da confiança do proprietário para manter-se como possuidor da coisa, um exemplo é o locatário que permanece no imóvel mesmo depois do fim do contrato e contra a vontade do locador, viciando dessa forma a sua posse.

Com relação ao requisito temporal para usucapir um determinado bem, é preciso entender que esse tempo irá variar conforme a espécie de usucapião, ou seja, essa variação será determinada pelo legislador. Uma citação interessante a respeito desse assunto,

Orlando Gomes entende assim, ao comparar o tempo entre a usucapião de imóveis e de móveis:

Em relação aos bens móveis, o prazo é mais curto. O encurtamento justifica-se pela dificuldade de individualização de tais bens e facilidade de sua circulação. Verdadeiramente, inspira-se na ideia deque as coisas móveis tem menor importância econômica, o que aliás, é falso como generalização. Mais longo o prazo para usucapir bens imóveis, por se entender que maior deve ser o lapso temporal no qual o proprietário fique com a possibilidade de opor-se à posse do prescribente, reivindicando o bem. Supõe-se que o dono de um imóvel tenha maior interesse em conservá-lo, de modo que sua inércia deve ficar sujeita à prova durante maior lapso de tempo (GOMES, 2007, p.190).

Apesar do entendimento doutrinário acima, há uma exceção a essa regra. O único caso em que o prazo da usucapião de imóveis é menor do que a de móveis, é a da sua modalidade familiar ou por abandono do lar conjugal, pois nessa espécie, o lapso temporal é de apenas 2 anos, enquanto na usucapião de móveis é de 3 anos com justo título e boa-fé, e de 5 anos se a posse não estiver acompanhada por estes dois requisitos. Uma das críticas à nova modalidade, a usucapião familiar, é justamente por causa do prazo curto para aquisição da propriedade, algo que parte da doutrina entende como um equívoco do legislador civil ao inserir tal prazo na referida norma, mas este assunto será abordado com

mais detalhes no capítulo referente à usucapião familiar.

Existem alguns requisitos que tornam o prazo mais curto, como o justo título e

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no prazo da usucapião extraordinária se estiverem presente as causas do parágrafo único do art.1238, como o requisito da moradia e de atividade produtiva no imóvel.

E na modalidade familiar, alguns requisitos específicos são necessários para completar o curto prazo prescricional, como o fato do usucapiente dividir a propriedade com aquele abandonou o lar, e também destes dois serem cônjuges ou companheiros, além de outros requisitos comuns à modalidade urbana, como o tamanho limite do bem e o fato de não ser proprietário de outro bem imóvel.

2.4 Espécies

Existem algumas espécies de usucapião no nosso ordenamento jurídico, os seus principais efeitos são garantir um título que servirá para registro imobiliário e eliminar as incertezas quanto a questão de ser o legítimo proprietário da coisa. Para que

tais efeitos sejam concretizados, os requisitos e os prazos de cada espécie serão diferentes de acordo com o que está na Constituição Federal, no Código Civil de 2002 e no Estatuto

da Cidade (Lei nº 10.257/2001).

A primeira modalidade a ser estudada no presente trabalho será a usucapião extraordinária, esta espécie está disciplinada no art.1238 do Código Civil, nos seguintes termos:

Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.

No entanto, a referida modalidade já foi diferente no Código Civil de 1916. No art. 550 do referido código, o prazo para usucapir, através desta modalidade, era de 30 anos, ou seja, o dobro de tempo em relação ao que é atualmente, quando se precisa de 15 anos com posse ininterrupta e intenção de dono. Além disso, chegava ao triplo de tempo quando comparada a redução para 10 anos que existe atualmente, nesse caso, há requisitos suplementares como a moradia habitual no imóvel ou algum serviço de caráter produtivo no bem.

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possuidor morasse ou tornasse produtivo o imóvel. Somente com o projeto do atual Código Civil é que os prazos atuais foram estabelecidos no ordenamento jurídico.

O requisito da moradia não é essencial para a aquisição da propriedade no tipo legal do caput do art.1238 do Código Civil de 2002. Assim sendo, o possuidor poderá deixar um detentor cuidando do seu bem, ou até mesmo, deixar outra pessoa morando no bem imóvel por força contratual, como exemplo, a relação contratual entre locador e locatário.

Dessa forma, basta o exercício da posse simples, que seria a utilização de qualquer dos poderes referentes à propriedade, como o uso e o usufruto, por exemplo. Com isso, essa posse estaria apta a gerar uma usucapião extraordinária em 15 anos, sem deixar de lado os outros requisitos complementares, que também são essenciais para a

transformação da posse em propriedade.

Segundo Orlando Gomes, a nomenclatura “ extraordinária” não retrata bem a referida modalidade, concluindo pela inversão no conceito quando comparada com a espécie denominada de usucapião ordinária. A citação do referido autor retrata a imperfeição terminológica nos seguintes termos:

A terminologia não é muito feliz. A chamada usucapião extraordinária requer apenas o concurso dos requisitos essenciais. Os outros requisitos, sendo suplementares, não deveriam configurar a forma ordinária da usucapião, justo porque lhe falta o cunho da generalidade. Todavia, o uso consagrou as expressões com o sentido invertido( GOMES, 2007, p.191).

Os requisitos do justo título e da boa-fé não se encontram na modalidade extraordinária, pois esses dois são presumidos no momento do inicio da posse ad usucapionem. Aliás, esses requisitos somente são necessários para a aquisição da propriedade pela usucapião ordinária.

Outro requisito que não é necessário para a espécie extraordinária é a continuação pelo tempo integral da posse pela mesma pessoa. A razoabilidade na citada norma está patente, pois, numa modalidade em que o tempo se estende por muitos anos, muitas vezes a posse não é exercida pelo mesmo indivíduo durante o lapso de tempo mínimo para a aquisição da propriedade.

Diferente das modalidades especiais da usucapião, pois nessas espécies , para ter efeito a posse deverá ser exercida pela mesma pessoa durante todo o prazo. Também é razoável para a norma dos tipos especiais da usucapião, pois o tempo é menor do que na

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Entretanto, na modalidade familiar, há entendimento que, para haver a usucapião, não é necessária que a posse seja exercida pelo mesmo indivíduo.

Em relação à nomenclatura dos tipos de usucapião extraordinária, os autores Flavio Tartuce e José Fernando Simão classificam o tipo do caput do art. 1238 como usucapião extraordinária regular ou comum e a categoria do parágrafo único do mesmo artigo como usucapião extraordinária por posse-trabalho. Já a autora Maria Helena Diniz nomeia a do caput como usucapião extraordinária geral e a do parágrafo único como extraordinária abreviada.

Como cita Caio Mário, em relação ao fundamento da usucapião extraordinária, o referido autor argumenta que: “o seu princípio básico está, portanto, na valorização do trabalho humano. Aquele que por quinze anos te como seu um imóvel, rural ou urbano,

cultivando-o ou tratando-o, tornando-o útil à comunidade, não pode ser compelido a deixá-lo à instância de quem o abandonou sem consideração pela sua utilidade econômica.(

PEREIRA, 2003, p.416).

Na parte final do caput do art.1238, o legislador enfatiza a questão da sentença judicial que servirá como título para o registro imobiliário, declarando assim uma situação preexistente que, no caso, é a aquisição do domínio através da usucapião extraordinária. Sendo assim, os efeitos da sentença não se estenderão apenas entres as partes( possuidor e antigo proprietário), mas também em relação a qualquer que venha a pôr em dúvida ou reivindica a titularidade a titularidade do bem, ou seja, os efeitos da sentença serão erga omnes ( contra todos), tornando-se uma forma de facilitar a prova da propriedade da coisa. Existe também a modalidade ordinária, cuja fundamentação legal encontra-se no art.1242 do novo Código Civil nos seguintes termos:

Art. 1.242. Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.

Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse social e econômico.

A diferença desta para a extraordinária, além do prazo temporal mais curto, há os requisitos suplementares do justo título e boa-fé. Um conceito interessante de justo título vem dos autores Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald quando afirmam nos seguintes termos:

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transferir a propriedade, malgrado apresente algum defeito que impeça a sua aquisição. Em outras palavras, é o ato translativo inapto a transferir a propriedade por padecer de um vicio de natureza formal ou substancial (FARIAS; ROSENVALD, 2013, p.422).

Outro requisito essencial para a aquisição da propriedade pela usucapião ordinária é boa-fé. Esta é a confiança do possuidor em adquirir o bem para si como se fosse o proprietário do mesmo, mas a convicção deve haver em relação a um título preexistente, não se admitindo boa-fé em um negócio proveniente de um título putativo. Se fosse assim, não seria necessário o requisito do justo título, bastaria a convicção de que o negócio jurídico era válido para que o possuidor pudesse usucapir o bem pela modalidade ordinária.

Uma questão importante a ser discutida era o tratamento dado à usucapião ordinária no Código Civil anterior no seu art.551, pois havia uma distinção temporal entre pessoas que moravam no mesmo município e as que residiam em cidades diferentes, ou também poderia dizer, entre presente e ausentes. No caso em questão , o prazo era de 15 anos entre estes, diminuindo pra 10 anos entre aqueles. Atualmente, este requisito perdeu a

sua eficácia, corroborando tal entendimento, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald afirmam o seguinte:

Hoje os meios de comunicação permitem ao proprietário a maior vigilância possível sobre os seus bens, mesmo que a distância física entre a sua residência e o local em que se encontra o imóvel objeto da usucapião seja imensa. A presença ou ausência do proprietário no local perde o seu sentido ( FARIAS; ROSENVALD,2013, p.421).

Em relação ao vício no justo título, que origina posteriormente a usucapião ordinária, vale ressaltar a diferenciação se o vício teve origem de um negocio eivado de nulidade absoluta ou começou através de um com nulidade relativa. Se o negocio for anulável, poderá ser utilizado para a aquisição do bem pela modalidade ordinária; caso o negócio estiver eivado de nulidade absoluta, então a espécie, em questão, não seria utilizada como meio facilitador para a aquisição do domínio da coisa.

Então, como assevera Orlando Gomes: “... o fim da usucapião ordinária é sanar o defeito que resulta da falta de qualidade do transmitente e não todos os que tornam ineficaz a alienação.”(GOMES, p.194, 2007). E o mesmo autor cita três causas que tornam ineficaz a transmissão da propriedade para o adquirente , viciando assim o título resultante do negócio jurídico:

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direito de dispor, ou transferir por ato nulo de pleno direito; III- O erro no modo de aquisição(GOMES, 2007 p.193)

A usucapião especial rural caracteriza-se pela sua correlação com os princípios

da função social da propriedade e da dignidade da pessoa humana, assegurados na Constituição de 1988. A função social é atendida, ao passo que o possuidor do bem dá uma destinação social e econômica através do seu trabalho, normalmente acompanhado dos

membros da sua família.Com esse trabalho, encontra-se um meio para garantir a sua subsistência e de sua família, cumprindo dessa forma, com a usucapião rural, o princípio da dignidade humana.

Para ter direito à usucapião rural, o possuidor deverá atender aos critérios estabelecidos no art.191 da Constituição Federal, transcritos no art.1239 do novo Código Civil. Ambos os diplomas legais citados, estão descritos na seguinte forma:

Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.

Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.

Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

O imóvel deverá estar localizado na zona rural, o tamanho deste não poderá ultrapassar o limite de 50 hectares , o prazo de 5 anos, a moradia e o trabalho são requisitos essenciais, além dos requisitos gerais como a posse pacífica, ininterrupta com a intenção de dono. Diferente das categorias ordinárias e extraordinárias, na usucapião rural, como em todas as categorias de usucapião especial, é proibido adquirir o domínio pela posse se o indivíduo já é proprietário de outro imóvel. Dessa maneira, percebe-se o caráter social que a Constituição Cidadã trouxe para a categoria especial de usucapião.

A usucapião rural foi instituída no ordenamento jurídico brasileiro na Constituição de 1934. Entretanto, foi através da Lei nº 6969/81, que a modalidade pro labore teve o

prazo de cinco ininterruptos da posse para usucapir. No entanto, na referida lei, haveria a possibilidade de usucapião nas terras devolutas, conforme o art.2º da mesma. O artigo

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Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald não concordam com essa vedação constitucional, afirmando que:

Trata-se de um retrocesso a vedação constitucional à usucapião de terras devolutas, pois viola o princípio da função social da propriedade a negativa ao acesso à aquisição originária dos bens formalmente públicos, mas que materialmente não ostentam qualquer legitimação ou merecimento, posto abandonados (FARIAS; ROSENVALD, 2013 , p.458).

Outra modalidade de usucapião é a urbana que , por sua vez, se divide em três espécies: a urbana individual, a coletiva e a familiar. Esta última será objeto de análise no presente trabalho mais adiante. Uma questão importante a ser enfatizada a respeito da modalidade da usucapião especial urbana, assim como na rural, é o seu caráter social trazido pelo legislador constitucional. Dessa forma, a citação de Caio

Mário retrata os valores e princípios constitucionais inseridos na modalidade especial da usucapião:

As características fundamentais desta categoria especial de usucapião baseiam-se no seu caráter social. Não basta que o usucapiente tenha a sua posse associada ao tempo. Requer-se, mais, que faça da gleba ocupada a sua moradia e torne produtiva pelo seu trabalho ou seu cultivo direto, garantindo desta sorte a subsistência da família, e concorrendo para o progresso social e econômico. Se o fundamento ético da usucapião tradicional é o trabalho, como nos parágrafos anteriores deixamos assentado, maior ênfase encontra o esforço humano como elemento aquisitivo nesta modalidade especial (PEREIRA,2003, p.152).

Na usucapião especial urbana individual, encontram-se os requisitos gerais como posse ininterrupta, pacífica e com animus domini. Como em toda modalidade especial, dispensa o requisito da boa-fé e do justo título. E, assim como na modalidade rural, o prazo para usucapir é de 5 anos. O requisito da moradia é obrigatório para os efeitos da usucapião urbana individual sejam caracterizados na prática, esta modalidade de usucapião também é denominada de pro misero. Os imóveis que ultrapassem o tamanho de 250 m² não serão usucapidos por essa modalidade.

A fundamentação legal para esta espécie de usucapião encontra-se em três dispositivos legais distintos, no art. 183 da Constituição Federal, no art. 1240 do Código Civil e no art. 9º do Estatuto da Cidade. O diploma legal constitucional encontra-se no seguinte termo abaixo:

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§ 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil. § 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

§ 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião. Como se está tratando de uma espécie de característica social, ou seja, visa a efetivação dos princípios da dignidade humana e da função social da propriedade, além do direito social à moradia do art. 6º da Constituição Federal, não será contemplado com tal se o possuidor já for proprietário de outro imóvel urbano e rural.

Assim como na espécie pro labore , na usucapião urbana individual não admitirá a acessão de posses, sendo assim, o possuidor que receber a posse de outrem, mesmo que esta não esteja eivada de vícios, o novo possuidor deverá aguardar o lustro legal para adquirir o domínio pela usucapião urbana individual.

Enquanto isso, a posse advinda do direito sucessório poderá somar-se a posse anterior, entretanto para o herdeiro obter este direito, o mesmo já deverá habitar o imóvel no momento da abertura sucessória, não necessita que esteja morando na residência desde o início do lustro legal. Assim sendo, baseando-se no parágrafo 3º do

art.9º do Estatuto da Cidade, entende-se que a união de posses na modalidade especial urbana não ocorrerá na transmissão entre vivos, como está estabelecido no art.1243 do Código Civil de 2002.

A finalidade da usucapião urbana é garantir o direito constitucional à moradia, sendo assim, se o possuidor mantiver no imóvel urbano apenas a função distinta da moradia, a sua posse não será qualificada para fins da usucapião especial urbana. Em compensação, se houver também a moradia no imóvel, além de outras atividades, então a posse será efetiva para aquisição da propriedade no futuro.

Uma questão importante é a análise da não incidência da usucapião urbana mais de uma vez para o mesmo possuidor. Isto quer dizer que o possuidor que adquirir um imóvel pela usucapião urbana, e depois aliená-lo, mesmo assim, não poderá adquirir posteriormente um outro imóvel urbano pela mesma modalidade de usucapião. Em compensação, este possuidor poderá adquirir um imóvel pelas modalidades ordinária e extraordinária. Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald entendem que a restrição se aplica à modalidade rural, apesar dos mesmos considerarem o seu posicionamento doutrinário minoritário ( p.444, 2013).

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contrário da individual, abrange uma área superior a 250 m², onde habitam populações de baixa renda, cuja área ocupada por cada família não esteja identificada. Como no próprio caput do art.10 do referido estatuto, a função dessa modalidade de usucapião é garantir moradia a uma população carente, dando-lhes a propriedade de terrenos abandonados, a função social do instituto está bem nítida no referido art. 10º do Estatuto da Cidade.

No § 1º do art.10º do Estatuto da Cidade, verifica-se a exceção da acessão das posses em relação à usucapião coletiva, pois é permitido ao novo possuidor somar a sua posse com a do antigo, sendo assim, aplica-se uma regra semelhante ao do art.1243 CC/2002. A única diferença é que a norma da Lei n° 10.257/2001 exige apenas que as posses sejam contínuas; já a do Código Civil, exige também a mansidão

de ambas as posses. Essa regra da acessão das posses não se aplica nas outras modalidades de usucapião especial.

Outras questões relativas à usucapião coletiva são o registro no cartório imobiliário do título resultante da sentença judicial.; além disso, o juiz, ao prolatar a sentença, dividirá a área de forma equitativa, mesmo com os usucapientes possuindo áreas de tamanhos distintos, só ocorrerá essa distinção de áreas determinada na sentença, caso haja um acordo escrito entre os ocupantes da área usucapida. O condomínio entre os possuidores só deixará de ser indivisível, caso haja uma votação de 2/3 dos membros. Além disso, a urbanização na referida área é essencial para que a ausência de divisão não exista mais entre os condôminos. E por último, as decisões tomadas pelo condomínio na ação de usucapião coletiva só terão efeitos caso sejam legitimadas pelo voto da maioria dos membros. A fundamentação legal dessas questões específicas da usucapião coletiva encontra-se no §2°,§3º, §4º e §5º do art.10 do Estatuto da Cidade.

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3 PROTEÇÃO À MORADIA FAMILIAR À LUZ DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

Antes da análise do instituto da usucapião familiar, é importante que a questão do direito à moradia familiar seja abordada e estudada nos seus diversos aspectos. Dessa forma, haverá um entendimento mais apurado em relação ao fundamento jurídico e social dessa nova modalidade de usucapião. A relação da moradia familiar com os princípios basilares da Constituição Federal de 1988 possibilitará uma visão mais aprofundada da usucapião familiar em seus aspectos de natureza constitucional.

3.1 Princípio da Função Social da Propriedade

O direito fundamental à moradia está intrinsecamente ligado ao princípio da função social da propriedade, pois ambos têm como fundamento a realização da justiça social através da proteção constitucional das camadas mais carentes da sociedade. No estudo referente ao tema deste trabalho, há uma percepção de que a tutela à moradia familiar é o principal objeto da usucapião por abandono do lar conjugal, mas para que haja

a concretização desta tutela, a propriedade do bem imóvel deverá ser analisada no âmbito da sua função social, ou seja, se a propriedade está cumprindo os fins visados pelo art. 5º,

XXIII, da Constituição de 1988.

Entretanto, o direito de propriedade nem sempre foi tratado dessa forma, enfatizando o seu caráter social com vistas ao bem comum. Antes, a propriedade era tratada como um direito absoluto, visando apenas o benefício do dono da coisa em detrimento da coletividade. Com essa visão do Liberalismo Clássico, aumentavam as desigualdades sociais, privando a maioria do mínimo existencial necessário para a garantia da sua dignidade.

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complexa relação envolvendo o direito de propriedade, pois não interessa apenas ao Direito Privado, mas também às relações do Direito Público, principalmente na questão inerente a sua função social. (SILVA J. A, 2005, p.271).

Propositadamente, o inciso relativo à função social do art. 5º da Carta Magna de 1988 vem logo após ao seu inciso XXII, no qual garante o direito de propriedade. Na verdade, o legislador constitucional quis ressaltar que o direito à propriedade só seria legitimado pela ordem jurídica se estivesse cumprindo a sua função social. Então, o princípio em questão, não é algo externo ao direito de propriedade, assim como as faculdades civis do referido direito encontradas no caput do art. 1228 do Código Civil (usar, gozar, dispor e reaver o bem), a função social é um dos elementos intrínsecos à propriedade, porém é o que garante a legitimidade dos outros elementos civis pertencentes ao referido direito fundamental.

Assim os direitos individuais do proprietário só receberão a tutela do ordenamento jurídico, se o mesmo estiver utilizando o seu bem em prol da coletividade e do bem-estar social. Assim sendo, Maria Amélia da Costa e Polyana Vidal Duarte entenderam da seguinte forma: “a propriedade só se legitima quando seu uso efetivo cumprir uma função de cunho social; em contrapartida, se tal requisito não for cumprido, não pode ser tutelada pelo ordenamento”. ( COSTA; DUARTE, online)

Na usucapião familiar, a função social da propriedade será realizada por parte do cônjuge que permanece no imóvel, sendo assim, a sua garantia será uma futura aquisição exclusiva da propriedade do bem em contraposição àquele consorte que não

exerce mais a posse sobre o imóvel Assim, este será punido juridicamente com a perda da sua parte da propriedade, pois deixou de cumprir a sua função social, não dando uma destinação útil ao imóvel familiar.

Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald consideram o direito de propriedade como uma relação jurídica complexa. Nessa relação, o proprietário deverá ter os seus poderes sobre o bem respeitados pela coletividade, aplicando-se a garantia da propriedade individual. Em compensação, as pessoas poderão exigir a utilização social da coisa por parte seu dono, efetivando assim a função social da propriedade.(FARIAS; ROSENVALD, 2007, p.320).

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freio à atividade do proprietário era baseado na teoria do abuso de direito, atualmente o Estado exige além disso, ou seja, que haja uma atuação positiva por parte do dono do bem em prol do interesse público, não sendo suficiente apenas a abstenção do titular do domínio em causar um dano a outrem.

Na referida teoria, os atos seriam considerados ilegais pelo ordenamento jurídico, se o único fim destes fossem provocar danos a terceiros. No Código Civil de 2002, mais precisamente no art. 1228, em seu parágrafo 2º, há uma referência a teoria do abuso do direito aplicada ao direito fundamental da propriedade:

Art.1228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou a detenha.[...]

§2º São defesos ao atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.

Os instrumentos de limitação da propriedade e a sua função social não possuem o

mesmo significado, pois ambos tem objetos jurídicos distintos, enquanto o primeiro é externo à propriedade, o segundo atua no interior do referido direito fundamental. Para ressaltar a diferença entre ambos, José Afonso entende essa distinção da seguinte forma: “A função social da propriedade não se confunde com os sistemas de limitação da propriedade. Estes dizem ao exercício do direito ao proprietário; àquela, à estrutura do direito mesmo, à propriedade”.(SILVA, 2005, p.281).

Os sistemas de limitação da propriedade como a desapropriação(art.5º, XXIV, CF),

a requisição(art.5º, XXV, CF) e o direito de vizinhança(art.1227, CC) atuam no aspecto negativo relativo ao exercício do direito por parte do titular do domínio. Em relação a isso,

entendem Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald da seguinte forma:

Referidas compressões ao exercício das faculdades emanam de imposições que objetivam evitar o exercício anormal do direito de propriedade e possuem conteúdo negativo no sentido de sacrificar a sua extensão ao impedir que proprietários possam prejudicar direitos de outros proprietários ou interesses urbanísticos. Portanto, cuida-se de obrigação de não fazer que priorizam interesses opostos aos do proprietário, limites negativos e externos ao direito de propriedade.( FARIAS; ROSENVALD, 2013, p.316).

Além do art.5º, XXIII, da Constituição Federal de 1988, outros dispositivos legais também tratam da função social da propriedade, como o art. 170, III, da CF; o

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