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Ser responsável pelo próprio tempo

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Academic year: 2021

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Ser responsável pelo próprio

tempo

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"Eu não tenho tempo! Será que alguém roubou?"

Texto: Emiliano Bonifetto Imagem: Pixabay

Quase cinquenta anos atrás, o escritor alemão Michael Ende (1929-1995) publicou

Momo, um livrinho profético no qual ele descrevia homens cinzentos imaginários que,

literalmente, roubavam tempo dos seres humanos (suas "flores-horas"), e mostravam a suposta inutilidade do lazer e das horas de descanso, prometendo aos homens que, se seguissem seus conselhos, poderiam valorizar todo seu tempo. No livro Momo, os

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homens cinzentos foram derrotados graças à aliança com Mestre Hora, o Senhor do Tempo. Mas, se olharmos para a vida humana atual, na realidade os vencedores bem que poderiam ser os homens cinzentos descritos por Ende!

Há mais de 2.000 anos, durante um debate sobre a efemeridade da vida humana, Sêneca disse:

“Na realidade, o tempo que temos não é curto, mas o desperdiçamos demais. A vida é suficientemente longa e nos foi dada generosamente, na medida exata para permitir a realização das coisas maiores – isso se ela for totalmente bem empregada. Mas, quando ela se esvai no luxo e na

indiferença, quando não a empregamos em nada de bom, seremos forçados pela fatalidade a perceber que ela já passou antes mesmo que tivéssemos a consciência de que estava passando. Portanto, a vida não e curta: somos nós que a fazemos ser quando a desperdiçamos” (Sobre a brevidade da

vida).

Quando Momo pede ao Mestre Hora para impedir que os homens cinzentos roubem o tempo dos seres humanos, ele responde: "Não, eu não posso, porque os homens têm que decidir como gastar seu tempo, e cabe a eles defendê-lo. Eu só posso distribuir". Se for verdade que todo ser humano é responsável pela administração de seu tempo, é necessário considerar que o tempo contém um mistério, que agora tentaremos examinar mais de perto. Anos, meses, semanas, dias, horas, minutos, segundos... a medida do tempo parece ser a mesma para todos hoje em dia. A hora marcada pelos relógios de satélite é válida para todos, mas todos nós já passamos por um período que nos pareceu muito longo, ou por longos períodos de tempo que desapareceram em um piscar de olhos.

Por que a percepção do tempo nem sempre é a mesma?

O que faz com que o passar dos minutos seja tão flexível? Emoção, talvez? Ou consciência? Por que os momentos que precedem um possível incidente duram por muito tempo e contêm uma consciência que às vezes envolve uma vida inteira? Por que um grande amor que dura apenas alguns meses ocupa um espaço tão grande em nossas memórias?

A consciência é um dos principais atributos da alma. E emoções, sentimentos e pensamentos são elementos que, antes de tudo, alimentam a consciência. Assim,

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podemos dizer que existe um "Tempo do Corpo" e um "Tempo da Alma". Em relação ao Tempo do Corpo devemos lembrar que o primeiro medidor de tempo é o batimento cardíaco – apenas pense que a duração de um minuto (sessenta segundos)

geralmente engloba um pouco mais de sessenta batimentos cardíacos. Portanto, o corpo está alinhado com o tempo do relógio.

Sobre o Tempo da Alma, entramos em um campo muito mais variado, uma vez que a alma pode assumir conotações e características muito diferentes. Por natureza, a alma – como disse Platão – pode estar muito próxima do corpo e muito próxima do Espírito, dependendo de sua orientação e de seu estado de desenvolvimento.

Portanto, ela pode sentir o fluxo de tempo de várias maneiras, dependendo de muitos fatores.

Dois tipos de tempo

Os antigos gregos usavam dois termos distintos para nomear o tempo: Cronos e Kairós . Enquanto o primeiro se refere ao tempo cronológico e seqüencial – a linha do

passado-presente-futuro, o segundo indica um tempo indefinido no qual "algo

especial" acontece. Do ponto de vista individual e pessoal, o lema "Carpe Diem" é um exemplo típico de ação que acontece ao longo do tempo em Kairós. De um ponto de vista espiritual, podemos observar que, no Novo Testamento, o termo Kairós indica

"o tempo no qual Deus age".

Até mesmo a tradição pré-colombiana, na América Central, já conhecia dois tipos de tempo: o Tonal e o Nagual. O Tonal é o tempo linear da vida diária, o tempo em que uma hora dura 60 minutos. O Nagual é o tempo espiritual: um tempo fluido, no qual a experiência da duração é variável. Tonal é unidimensional, enquanto Nagual é a ponte entre duas dimensões: a dimensão interior individual e a dimensão de outro mundo – o mundo espiritual. Ele também é chamado de "infinito estranho", uma vez que não pode ser reproduzido em palavras e só pode ser vivenciado internamente. No tempo de Nagual, a consciência do ser humano faz perguntas como: Quem sou eu? O que a

vida significa para mim? O que resta de mim, quando sou despojado de meus papéis e de minha suposta identidade? Existe um núcleo espiritual em mim? Qual é a minha aspiração mais profunda?

Quando vivenciamos esse estado de ser, nem que seja por um curto período de tempo, o Nagual se torna indispensável. Caso contrário, ficamos agitados,

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Em nossa atual civilização ocidental, às vezes falamos do tempo e da eternidade, mas esses conceitos foram profundamente mal-entendidos. Explica-se: geralmente

acreditamos que o tempo é algo sempre novo, diferente, que evolui e se transforma constantemente, ao passo que a eternidade é uma representação fundamentalmente estática – uma realidade concreta e sempre igual a si mesma, inalterável.

Por outro lado, a História mostra que o tempo segue cursos e recorrências, por meio de um processo de desenvolvimento cíclico e repetitivo – como se não fosse

realmente direto, mas sim circular e fechado em si mesmo (do dia para a noite, da primavera para o inverno e depois novamente para a primavera, por exemplo), enquanto que a eternidade é um "presente vivo", com sequências contínuas de momentos únicos que escapam ao controle da razão.

Será que existe uma maneira de ir de Cronos a Kairós, de Tonal a Nagual, do lugar do tempo ao lugar da eternidade? Onde estará a porta que conecta esses dois mundos? A cruz, que é um símbolo antigo utilizado muito antes do cristianismo, mostra a

interseção do "tempo linear horizontal" (a sucessão linear do passado-presente-futuro) com o "tempo vertical-espiritual" (o que está fora do tempo). Por outro lado, quando o ser humano estica os braços, torna-se um exemplo perfeito de uma cruz viva – então, podemos nos indagar: Qual é o ponto central na intersecção dos dois raios? Afinal, naquele momento Cronos e Kairós, Tonal e Nagual – enfim, o tempo e a eternidade – estão entrando em contato.

Entre o tempo e a eternidade

O ser humano está no cruzamento entre o Tempo e a Eternidade. Portanto, contamos com certo período de tempo – e ele é curto ou longo dependendo de como iremos utilizá-lo. Nosso corpo tem um prazo – o qual desconhecemos – mas também possuímos uma alma que pode atravessar a fronteira que separa os dois mundos! Os seres humanos estão perdidos no tempo e no espaço, até que finalmente percebem que é indispensável decifrar o mistério da vida. Então, escolhem um caminho existencial que, mais cedo ou mais tarde, os levará à Gnosis, ao

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Para eles, agora tudo não passa de uma fraude. Mas tudo começa a assumir outro significado, uma vez que sua existência se torna um fluxo contínuo de "agoras", e em cada "agora" eles podem moldar sua própria realidade.

Referências

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