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Estado laico e a liberdade religiosa: uma análise de decisões emblemáticas do Supremo Tribunal Federal

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Academic year: 2021

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ESTADO LAICO E A LIBERDADE RELIGIOSA:

UMA ANÁLISE DE DECISÕES EMBLEMÁTICAS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Palhoça 2015

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SÉFORA RODRIGUES HILLESHEIM DA SILVA PERES

ESTADO LAICO E A LIBERDADE RELIGIOSA:

UMA ANÁLISE DE DECISÕES EMBLEMÁTICAS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Danielle Maria Espezim dos Santos, Msc.

Palhoça 2015

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE ESTADO LAICO E A LIBERDADE RELIGIOSA:

UMA ANÁLISE DE DECISÕES EMBLEMÁTICAS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca desta monografia.

Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico.

Palhoça, 09 de novembro de 2015.

_____________________________________

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Este trabalho é dedicado àqueles que mais importam na minha vida: Deus, meu pai Moacir e meu marido Guilherme.

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AGRADECIMENTOS

Por primeiro a Deus, sempre a Ele. Minha vida, todas as bênçãos, a capacidade de poder estudar, de adquirir conhecimento e até contestar a Sua presença no Estado em um trabalho monográfico é permissão Dele.

Agradeço à minha família primeira, meu laboratório do amor. Meus irmãos que me ensinaram a dividir e ensinaram a somar. Ao meu pai, Moacir, pois me deu todo o estudo, todo o suporte, todo o amor. Ensinou-me a questionar, a ir atrás do que quero e a não desistir. Os ensinamentos que tive e tenho com ele vão além do que se pode mensurar. A gratidão e o amor são infinitos.

Aos meus avós que proporcionaram os meus primeiros estudos, que me deram embasamento para que eu estivesse onde estou. Ao meu avô Ireno que sonhou e sonha comigo cada conquista deste curso e ao meu avô Dário, que por seu esforço para que pudéssemos ter tudo não está mais presente.

Agradeço também à minha orientadora Danielle Espezim, pois, desde um trabalho realizado em sua aula de Direito Constitucional II, despertou em mim a vontade dessa temática. Além disso, é minha inspiração dentro daquilo que acredito do Direito e do que podemos modificar na sociedade com nosso conhecimento. Acreditou em mim, julgou que eu pudesse muito mais do que realmente posso, me deu apoio, conselhos. Quero ser uma docente, pesquisadora e ser humano tão bom quanto ela.

Aos meus colegas de turma e aos amigos que a faculdade me deu: Simone, Bruna, Fabiana e Maria. Vocês tornaram a caminhada muito mais fácil, não me deixaram desanimar, auxiliaram, fizeram-me rir, foram verdadeiros companheiros. Desejo o mundo de conquistas à vocês. Não posso e não devo esquecer principalmente do meu amigo Daniel, que desde a primeira fase esteve ao meu lado, fez todos os trabalhos comigo, dividiu suas aflições, mas fez mais: dividiu sua vida comigo e permitiu que eu dividisse a minha.

Aos professores que tive durante essa jornada acadêmica fica o meu mais sincero agradecimento. A função nem sempre é fácil, mas imensamente importante. Agradeço em especial aos que foram além de sala de aula e despertaram em mim muito mais do que a vontade de aprender. Espero que em breve possamos ser colegas de profissão.

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Agradeço àqueles que tornam a minha vida mais alegre, mais divertida, mais rica. Aos que preenchem espaços em diversas ocasiões, os quais chamo de amigos. Obrigada a esses que aguentaram e aguentam minhas oscilações, minhas ocupações, minhas lágrimas, minhas risadas, dúvidas. Àqueles que com uma frase, com sua presença e com orações me fazem uma pessoa melhor, mais completa.

Peço licença aos demais amigos para agradecer nominalmente minha amiga Lari; a única amiga que também cursou Direito e desde o começo da minha graduação se colocou à disposição para tirar dúvidas, emprestar material, ajudar, e também a falar mal de professores "carrascos". Teve paciência de me ensinar o que parecia óbvio e se preocupou comigo.

Por fim, e não por acaso, agradeço ao meu marido Guilherme, a pessoa mais especial da minha vida. Meu suporte no sentido de suportar minhas neuras, meus estresses, minhas crises, choros, chatices, mas meu suporte principalmente significando a minha sustentação, meu auxílio, apoio. Todas as palavras do mundo não expressariam meu amor e minha gratidão. Tua presença na minha vida é sinal do amor de Deus comigo. Essa vitória é nossa.

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"Dai pois a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus." (Mateus 22:21)

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RESUMO

O presente trabalho versa sobre o Estado Laico e a Liberdade Religiosa. O objetivo é verificar os limites entre a liberdade religiosa e a laicidade do Estado Democrático de Direito tendo em vista algumas decisões emblemáticas do Supremo Tribunal Federal. A metodologia utilizada é a dedutiva, de natureza qualitativa e o método histórico e monográfico. A técnica de pesquisa utilizada é bibliográfica. O trabalho aborda a presença da religião desde o início da colonização do Brasil, o conceito de laicidade e o Estado laico, bem como as principais religiões presentes no Brasil, a liberdade religiosa e algumas decisões emblemáticas do Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, acerca das questões que envolvem os dois preceitos constitucionais. Verifica-se que o STF media as decisões de forma a considerar o mais correto ao caso concreto, utilizando-se da hermenêutica constitucional, seja pelo Estado laico, liberdade religiosa ou por outro direito fundamental.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 11 2 ESTADO LAICO E CONSTITUCIONALISMO BRASILEIRO... 13

2.1 LAICIDADE ... 13 2.2 ESTADO E IGREJA NO BRASIL: ASPECTOS HISTÓRICOS ANTERIORES A 1988... 15

2.2.1 A Religião No Brasil Colonial ... 15 2.2.2 A Religião No Brasil Imperial E Republicano Até 1988... 17 2.3 O ESTADO LAICO BRASILEIRO NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 ... 2.3.1 Preâmbulo Constitucional... 2.3.2 A Laicidade Do Estado... 22 22 24 3 LIBERDADE E RELIGIÃO ... 26 3.1 RELIGIÃO E CRENÇA ... 26

3.1.1 Matrizes Religiosas Brasileiras...

3.2 LIBERDADE RELIGIOSA...

3.2.1 Liberdade de Consciência e Crença... 3.2.2 Liberdade de Culto... 3.2.3 Liberdade de Organização Religiosa... 4 O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E A MEDIAÇÃO ENTRE ESTADO LAICO E A LIBERDADE RELIGIOSA...

4.1 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL... 4.2 INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL... 4.3 LIBERDADE RELIGIOSA E DECISÕES EMBLEMÁTICAS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL...

4.3.1 STF E Alteração De Data De Prova Por Motivo De Crença... 4.3.2 STF E A Imunidade Tributária De Templos De Qualquer Culto... 4.3.3 STF E A Interrupção De Gravidez De Feto Anencefálico... 4.3.4 STF E A União Homoafetiva... 27 34 36 37 39 42 42 43 49 50 53 55 59

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5 CONCLUSÃO... 63 REFERÊNCIAS... 66

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1 INTRODUÇÃO

A liberdade de crença e de culto religioso é um fundamento constitucional que necessita coexistir com a laicidade do Estado, cada qual respeitando os seus limites. Sendo assim, o Supremo Tribunal Federal deve decidir acerca das questões que envolvem as liberdades previstas no artigo 5º, inciso VI, da Constituição Federal, levando em consideração esses dois preceitos do sistema político-jurídico laico.

O presente trabalho tem por objetivo verificar os limites entre a liberdade religiosa e a laicidade do Estado Democrático de Direito tendo em vista decisões emblemáticas do Supremo Tribunal Federal, a partir da pergunta: Quais os limites e as possibilidades da liberdade religiosa em um sistema político-jurídico laico tomando como referências decisões emblemáticas do STF no período pós 1988?

A motivação deu-se por viver a temática da religião na vida privada e observar as constantes reafirmações do Estado laico na vida acadêmica, deste modo o conflito entre os dois preceitos supracitados sempre foi motivo de interesse. Saber qual dos dois preceitos deve-se levar em consideração em situações conflituosas, quais os limites e as influências que o direito à liberdade religiosa tem sob as decisões judiciais, despertou a curiosidade a respeito do tema.

A liberdade religiosa no sistema político-jurídico laico é um tema pouco debatido na academia e de pouca produção bibliográfica. Há escassez de doutrinas que analisam a liberdade religiosa e o Estado laico de forma a verificar quais são seus limites e suas possibilidades. É sabido que estes preceitos existem e são constitucionais, no entanto há carência de análises profundas a respeito.

Para a realização deste trabalho monográfico foi utilizado o método dedutivo, pois parte de uma abordagem genérica para chegar à síntese do objeto estudado, em que se conceitua primeiramente sobre o Estado Laico e a Liberdade de escolha religiosa (situação genérica), para, em um segundo momento, verificar algumas das decisões do Supremo Tribunal Federal (situação específica).

A natureza é qualitativa, pois é feita uma análise conceitual. No que tange o procedimento, o trabalho adota o método histórico, pois busca fatos que já ocorreram no passado e seus reflexos atuais. Ainda em se tratando de procedimento metodológico, usa-se também o método monográfico, pois são utilizadas fontes de outros autores como referência, no qual enfoca no Estado Laico e na Liberdade de

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escolha religiosa. Em relação às técnicas de pesquisa utilizadas é adotada a pesquisa bibliográfica, pois são utilizadas fontes secundárias, como as doutrinas.

Para isso, o presente trabalho está estruturado em 5 seções com 3 capítulos de conteúdo.

O primeiro capítulo inicia com o conceito de Laicidade e em seguida verifica os aspectos históricos do Brasil no período colonial, republicano e imperial. Busca-se também nesse capítulo apresentar as Constituições anteriores a 1988 e a atual Carta Magna, verificando a laicidade presente.

Na sequência o segundo capítulo aborda a respeito da Liberdade e Religião, apresentando as matrizes religiosas brasileiras existentes e discorrendo também a respeito da liberdade de crença e culto religioso prevista no artigo 5º, inciso VI, da Constituição Federal.

Já no terceiro capítulo é abordado o tema principal do trabalho, verificando decisões emblemáticas do Supremo Tribunal Federal no período pós 1988 em relação ao tema e os limites entre a liberdade de escolha e culto religioso e a laicidade estatal, pois o STF é o guardião da Constituição e, portanto, detém a última palavra sobre interpretação constitucional de direitos fundamentais.

Pesquisar sobre a laicidade do Estado e a liberdade religiosa contribui para a comunidade acadêmica de forma a ampliar o conhecimento a respeito do direito fundamental a que se trata a liberdade religiosa em conflito com o sistema político-jurídico laico.

Além disso, apesar de serem preceitos socialmente aceitos, são pouco conhecidos e debatidos pelo coletivo em sua profundidade, que, por desconhecimento, geram dúvidas e conceitos nem sempre corretos.

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2 ESTADO LAICO E CONSTITUCIONALISMO BRASILEIRO

Desde antes do início do Brasil Colônia nota-se a relação e influência direta da Igreja no processo de colonização. Diante de tal parâmetro, faz-se necessária a verificação dos aspectos históricos atinentes ao Estado Laico e seus reflexos constitucionais, de maneira que o presente capítulo verifica o Estado Laico e Constitucionalismo Brasileiro.

2.1 LAICIDADE

Antes de iniciar os estudos acerca do Estado e da Religião no Brasil, é imprescindível que se considere o que é Laicidade. Sendo assim, verifica-se a seguir tais conceitos.

Com relação ao que é Laico, Diniz (2005, p. 61) entende que, dentre outras definições, laico é aquilo “[...] que é próprio do mundo, aquele que não entende do assunto [...]”

Laicidade é qualidade de laico. (DINIZ, 2005, p. 60). Diniz conceitua o Laicismo como (2005, p. 60):

Laicismo. Ciência Política. 1. Rejeição ao clericalismo, ou seja, da influência do clero na vida pública, interferindo em negócios estatais ou no governo. 2. Teoria do Estado leigo fundada na concepção de que o poder político é autônomo no que atina à religião. 3. Teoria da cultura leita que defenda a emancipação da filosofia e da moral da religião.

Já Silva Neto (2003, p. 51-52) a respeito do laicismo considera que:

O laicismo é doutrina defensora da separação entre a Igreja e o Estado, determinando ainda a destinação a leigos de funções antes exercidas por religiosos, como era o caso da educação. Foi uma das principais reinvindicações da Revolução Burguesa e do Radicalismo Republicano do século XIX.

No entanto, para Tavares (2014, p. 120) a palavra "laicismo" possui conotação ruim. O autor atenta a essa diferença tomando como exemplo a França:

O laicismo significa um juízo de valor negativo, pelo Estado, em relação às posturas de fé. Baseado, historicamente, no racionalismo e cientificismo, é hostil à liberdade de religião plena, às suas práticas amplas. A França, e seus recentes episódios de intolerância religiosa, pode ser aqui lembrada

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como exemplo mais evidente de um Estado que, longe de permitir e consagrar amplamente a liberdade de religião e o não-comprometimento religioso do Estado, compromete-se, ao contrário, com uma postura de desvalorização da religião, tornando o Estado inimigo da religião, seja ela qual for. Já laicidade, como neutralidade, significa a isenção acima referida. Sobre o assunto, Huaco (2008, p. 47) fala que laicismo é uma expressão "[...] que propõe hostilidade ou a indiferença perante o fenômeno religioso coletivo que pode acabar radicalizando a laicidade [...]"

Sandmann (1989, p. 78-79) discorre a respeito da pejoratividade do sufixo "ismo":

[...] -ismo se mostra extraordinariamente produtivo, hoje, nessa função de expressar a pejoratividade. Até quando empregado isoladamente como substantivo ismo expressa desapreço [...] Talvez seja desnecessário chamar a atenção para o fato de que a maior parte dos substantivos em -ismo pejorativos é da área da política. [grifos no original].

Desta forma, nesse trabalho monográfico, utiliza-se o termo "laicidade". A Laicidade do Estado possui dois vieses de proteção: a primeira proteção é a das religiões, para que não haja uma possível intervenção abusiva do Estado com relação às suas doutrinas, seus cultos, organização institucional. A segunda consiste em proteger o Estado de influências religiosas impróprias de forma que impeça confusão entre o poder secular e democrático (SARMENTO, 2009, p. 214).

Sarmento (2009, p. 214) pondera que a laicidade não é a adoção pelo Estado de uma posição ateísta ou contrária à religiosidade, porque o ateísmo também é considerado uma posição religiosa. Sendo assim, o autor discorre que a laicidade define que a posição do Estado seja de neutralidade, proibindo favorecimento de qualquer crença.

Para Leal e Nunes (2014, p. 208) o Estado laico é um Estado oposto à dogmas, mas que respeita as diferentes crenças e religiões (ou ausência delas), permitindo aos indivíduos professar ou não a religião que escolherem.

Desta forma, verifica-se que laicidade é a doutrina que separa Estado e Igreja, adotando uma postura de neutralidade em relação as religiões ou não religiões, sem privilegiar, intervir ou confundir as funções do Estado com a das Igrejas. Sendo assim, permite aos indivíduos pertencentes a este Estado ter ou não a religião que desejarem. Permite também às Igrejas doutrinarem e se organizarem

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sem intervenção estatal e possibilita ao próprio Estado agir de forma separada às religiões.

2.2 ESTADO E IGREJA NO BRASIL: ASPECTOS HISTÓRICOS ANTERIORES A 1988

Com a finalidade de compreender o que une e o que separa a relação Igreja-Estado é necessário verificar os aspectos históricos que nos trouxe à realidade atual. Desta forma, este item verifica o Estado e a Religião desde o início da colonização no Brasil.

2.2.1 A RELIGIÃO NO BRASIL COLONIAL

Embora atualmente o Estado seja laico, a análise da formação do Estado brasileiro demonstra que houve influência direta da Igreja Católica em grandes acontecimentos (GALDINO, 2006, p. 46). Sendo assim, será verificada a seguir a presença da religião na colonização no Brasil.

A presença da Igreja iniciou já em Portugal, país colonizador do Brasil, quando no regime do Padroado era delegado ao monarca a organização da Igreja Católica (FERREIRA, 2014, p. 3).

Para Ferreira (2014, p. 3):

O rei era encarregado de construir igrejas, além de nomear padres e bispos, garantindo ao Estado português uma dimensão religiosa, além de política e administrativa. Portanto, já nas primeiras ações dos conquistadores a relação entre Estado e igreja aparece como um fator determinante.

Portugal e os outros países europeus apresentavam uma missão de levar civilização aos povos desconhecidos, porém os verdadeiros interesses eram de expansão territorial, econômicos e políticos. Desta forma, a propagação do catolicismo era um dos principais elementos da chamada missão (FERREIRA, 2014, p. 4).

Martins (2007, p. 17) discorre acerca do processo de vinda dos europeus para colonizar o Brasil:

No imaginário europeu, a colônia brasileira era palco de uma luta entre Deus e o Diabo, entre o paraíso e o inferno. Numa época em que ouvir valia

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mais do que ver, os relatos de viagens davam espaço a sonhos e fantasias. Imaginário esse fascinado pelas riquezas proporcionadas pela expansão comercial e pelo contato com povos diferentes. Além disso, o processo colonizador trazia no seu bojo o dever de expandir a fé, de conquistar novas terras para o reino de Deus. Missão que comportava inúmeros desafios, pois, para a visão européia, a religião daqueles povos estava repleta de práticas mágicas, bruxaria e superstições.

Sendo assim, observa-se que a vinda de Portugal para colonizar o Brasil, já trazia consigo a participação direta e influente da Igreja Católica, pois o próprio país colonizador tinha total ligação com a igreja.

A primeira sede administrativa da colônia criada em 1549 na cidade de Salvador teve em suas primeiras edificações a Igreja Matriz e o Colégio dos Jesuítas. As cidades brasileiras normalmente eram construídas em torno de igrejas físicas e por isto já se pode observar a presença da Igreja Católica como elemento na organização urbana que se iniciava. (FERREIRA, 2014, p. 4).

No processo de colonização do Brasil, a Igreja e o Estado seguiram de forma atrelada, pois a Igreja possuía um meio de veiculação da ideia de obediência geral e também em relação ao poder do Estado. A Igreja, então, detinha um controle da população, pois estava presente na vida, morte e nos acontecimentos decisivos da vida das pessoas. (MARTINS, 2007, p. 19).

Conforme Fausto (apud Galdino 2006, p.46):

As duas instituições básicas que, por sua natureza, estavam destinadas a organizar a colonização do Brasil foram o Estado e a Igreja Católica. Embora se trate de instituições distintas, naqueles tempos uma estava ligada à outra. Não existia na época, como existe hoje, o conceito de cidadania, de pessoa com direitos e deveres com relação ao Estado, independentemente da religião. A religião do Estado era a católica e os súditos, isto é, os membros da sociedade deviam ser católicos.

O movimento de expansão de terras brasileiras deu-se, principalmente, pela ação das ordens católicas como a dos jesuítas, que saíam em missão e catequizavam as comunidades conquistadas, assumindo o controle sobre essas. (FERREIRA, 2014, p. 4).

Para Martins (2007, p. 21):

Coube afinal à igreja, na formação da nacionalidade, o que se fez em matéria de educação, de cultura, de catequese e de assistencialismo social. Hierarquia, clero secular, ordens religiosas e corporações de leigos, formadas por irmandades e ordens terceiras, forma os responsáveis por inserir os habitantes da colônia na igreja, não somente no campo da exclusiva devoção, como também no da ação social.

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Corrobora com esse pensamento Costa (apud Wolkmer, 2005, p. 21) em que discorre a respeito da importância do colonizador e do jesuíta na fixação da cultura europeia no Brasil:

[...] De um lado, o jesuíta, empenhado [...] na conquista espiritual e o aventureiro disposto à conquista da terra e dos bens materiais. [...] Coube ao aventureiro e ao jesuíta a fixação da cultura europeia em nossa terra. Um abrirá caminhos, construirá aldeias, plantará cidades, o outro, modelará a inteligência brasileira [...] A isso esboça, talvez, uma contradição da nossa história e, também, o antagonismo dos dois aspectos da cultura do Brasil. No entanto, a Igreja e as autoridades portuguesas não estiveram sempre de acordo. Um desses momentos foi nas Guerras Guaraníticas entre 1754 e 1756, conforme diz Ferreira (2014, p. 5):

Reagindo ao tratado territorial assinado em Madri por portugueses e espanhóis, em 1750, clérigos jesuítas, envolvidos na organização de missões na região, conhecida atualmente como a da Tríplice Fronteira, participaram da mobilização de índios em uma revolta armada contra os estados ibéricos. Apesar de não ser uma posição institucional da igreja ou da própria Companhia de Jesus, que não apoiaram oficialmente o movimento, pois não se interessavam em uma ruptura com os Estados católicos de Portugal e Espanha, a presença de jesuítas na revolta aponta para algumas cacofonias na aparente harmonia nas relações entre a Santa Sé e Lisboa.

Embora existiram conflitos, a circunstância entre Estado e Igreja era de harmonia, visto que quando deu-se a independência do Brasil a Igreja Católica Apostólica Romana continuou a ser a religião oficial do império. (FERREIRA, 2014, p. 6).

Deste modo, fica evidente a presença da religião católica desde o momento anterior à colonização, pois já em Portugal a relação Estado e Igreja era demasiadamente forte. Essa ligação permaneceu após a vinda dos colonizadores ao país, nas expedições para catequizar e explorar terras e também no período Imperial em que se teve a primeira Constituição brasileira.

2.2.2 A RELIGIÃO NO BRASIL IMPERIAL E REPUBLICANO ATÉ 1988

A história brasileira tem intrínseca relação com a religião, principalmente a Igreja Católica. Deste modo, desde a primeira Constituição brasileira observou-se em seus artigos esta ligação que a princípio deu-se de modo explícito e nas

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Constituições seguintes tornou-se menos evidente, embora ainda presente, como verifica-se a seguir. Sendo assim, esta seção verifica a religião no Brasil imperial e republicano até 1988, com ênfase nas Constituições.

Segundo Carvalho (2006, p. 411) em 3 de junho de 1822 o Príncipe Regente Dom Pedro convocou a Constituinte brasileira para a elaboração da Constituição. Já nesta primeira Constituinte verifica-se a presença de um bispo.

Devido a desentendimento com D. Pedro I, a Constituinte foi dissolvida em 11 de novembro de 1823 por tropa militar. Com essa dissolução, o Imperador instituiu o Conselho de Estado que elaborou o texto que se converteria na Carta magna. (CARVALHO, 2006, p. 411-412).

Foi outorgada a Constituição Imperial em 25 de março de 1824, na qual pode-se observar a presença dos direitos de liberdade, que são considerados direitos da primeira geração (GALDINO, 2006, p. 21).

Para Elza Galdino (2006, p. 21-22):

Em seus incisos, o artigo garante a liberdade de ação em geral, a liberdade de pensamento e opinião e a liberdade de religião. Esta liberdade de religião, entretanto, estava limitada pelo art. 5º, que definia o catolicismo como religião oficial do Império, a qual não poderia ser desrespeitada. Foi a Constituição do Império a única a estabelecer uma religião oficial para o Brasil, ainda que, aparentemente, esta limitação ainda exista.

Na visão de Ferreira (2014, p. 6), ainda que a religião oficial continuasse a ser a Católica Apostólica Romana, o art. 5º da Constituição garantia a liberdade de culto de forma doméstica ou em locais destinados para as práticas de religiões não católicas. O que ficava proibido nesta Constituição era a tentativa de conversão para outras religiões, “a ostentação das práticas rituais não católicas e o direito a assumir cargos públicos para aqueles que não afirmassem sua fidelidade ao catolicismo.” (FERREIRA, 2014, p. 6).

Em seu artigo 95, a Constituição de 1824 trazia alguns impedimentos àqueles que não professassem a religião oficial do Estado, como por exemplo não poderiam ser eleitores e nem eram considerados aptos a serem deputados. (SILVA; TIFALDI, 2014, p. 350).

Sendo assim, observa-se que a primeira Constituição brasileira era teísta, pois fazia referencia à Santíssima Trindade no preâmbulo e confessional, pois em

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seu art. 5º indicava a fé católica romana como religião oficial do Império. (MARTINS, 2009, p. 103).

Mendonça (2003, p. 145) discorre a respeito da influência de outros países no período republicano brasileiro, refletindo na pluralidade das religiões no Brasil:

Podemos dizer hoje que a expansão do poder político, econômico e cultural dessa República, os Estados Unidos da América do Norte, aliado a interesses de ordem econômica, assim como a ideários de natureza filosófico-política oriundo do ocidente europeu, irá criar, no Império, profundas alterações de ordem religiosa que irão ter reflexos importantes na configuração das relações entre religião e Estado no período republicano. De uma pretensão monolítica da religião no Império, o Brasil passará a ser cenário de experiência para múltiplas religiões durante todo o século XX. Conforme expõe Carvalho (2009, p. 413-414), em 15 de novembro de 1889 foi proclamada a República e o Governo Provisório nomeou uma Comissão para elaborar o anteprojeto de Constituição. Na Constituição de 1891 foi adotada a forma federal de Estado, com a distribuição dos Poderes entre União e Estados.

Para Ferreira (2014, p. 8) “com a Proclamação da República, em 1889, e a Constituição de 1891, chegou ao fim a relação entre o Estado brasileiro e a Igreja Católica como instituições oficialmente ligadas."

Silva e Tifaldi (2014, p. 350) discorrem que a Constituição de 1891 não mencionava Deus em seu preâmbulo:

Sob esta Carta Política, era vedado tanto aos Estados, quanto à União, estabelecer, subvencionar ou embaraçar o exercício de cultos religiosos. E, quanto aos civis, a declaração de direitos assegurava-lhes liberdade que elastecia desde o culto em si, passando pela associação, até a aquisição de bens para este fim.

No parágrafo 3º do artigo 72 da Constituição de 1891, a liberdade de crença aparecia como sendo livre o seu exercício. (GALDINO, 2006, p. 22).

Pilau pondera (apud Galdino, 2006, p. 22):

[...] os cemitérios passaram a ter caráter secular (§ 5º), ou seja, dissociados de qualquer religião; a atuação dos estabelecimentos educacionais públicos foi modificada, passando o ensino a ser leigo (§ 6º), com o que se pode afirmar que esses fatores consolidam um Estado juridicamente leigo.

Para Martins (2009, p. 103), a Constituição de 1891 foi ateísta pois não possuía referência a Deus no preâmbulo, aconfessional e permitia a liberdade religiosa.

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Esta foi, então, a primeira vez em que o Estado Brasileiro foi constitucionalmente laico.

Com a Revolução de 1930, o Governo Provisório nomeou uma comissão para elaborar a nova Constituição, que manteve a divisão de Poderes do federalismo, mas promoveu uma centralização legislativa em favor da União. A nova Constituição trouxe mais mudanças na esfera social, pois previu direitos econômicos e sociais e ampliou o intervencionismo estatal. (CARVALHO, 2006, p. 414-415).

Galdino (2006, p. 49) afirma que "não se circunscreveu ao período da colonização a influência da Igreja Católica no Estado Brasileiro."

Conforme discorre Fausto (apud Galdino, 2006, p. 49):

Uma importante base de apoio do governo foi a Igreja Católica. A colaboração entre a Igreja e o Estado não era nova, datando os anos 20, especialmente a partir da presidência de Artur Bernardes. Agora ela se tornava mais estreita. Marco simbólico da colaboração foi a inauguração da estátua do Cristo Redentor no Corcovado, a 12 de outubro de 1931 - data do descobrimento da América [...] A Igreja levou a massa da população católica a apoiar o novo governo. Este, em troca, tomou medidas importantes a seu favor, destacando-se um decreto, de abril de 1931, que permitiu o ensino da religião nas escolas públicas.

Para Galdino (2006, p. 22-23), a Constituição de 1934 positivou os direitos humanos de primeira e segunda geração, mantendo a liberdade de consciência e de crença.

Segundo relata Silva e Tifaldi (2014, p. 351):

A Carta de 1934 cuidava da liberdade religiosa em suas três formas. Quanto à liberdade de culto, dispõe o artigo 17, II, que ‘é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...); II – estabelecer, subvencionar ou embaraçar o exercício de cultos religiosos [...]

Desta forma, tem-se que a Constituição de 1934 era teísta, pois mencionava Deus no preâmbulo, previa a liberdade religiosa, porém era aconfessional, visto que proibia a União confessar, organizar e estabelecer cultos religiosos. (MARTINS, 2009, p. 103-104).

Já na Constituição de 1937, outorgada por Getúlio Vargas, houve mudanças em relação a teísmo previsto na Constituição anterior, pois foi suprimido o nome de Deus. (CARVALHO, 2006, p. 415-416).

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Alude Galdino (2006, p. 23) que esta Constituição, embora tenha sido criticada como autoritária, regulava direitos e garantias individuais:

Em que pese ter retrocedido em aspectos importantes dos direitos fundamentais – fazendo reaparecer a pena de morte para os crimes políticos e para os homicídios cometidos por motivos fútil e com extremos de perversidade, e limitando o direito de manifestação de pensamento através da censura prévia da imprensa, teatro, cinema, radiodifusão e outros – a liberdade religiosa permaneceu em seu patamar já conquistado. A Constituição dos Estados Unidos do Brasil (1937) trazia em seu Artigo 122, inciso IV, que “todos os indivíduos e confissões religiosas podem exercer públicas e livremente o seu culto, associando-se para esse fim e adquirindo bens, observadas as disposições do direito comum, as exigências da ordem pública e dos bons costumes."

No que tange à separação entre religião e Estado, Martins (2009, p. 104) diz que a Constituição de 1937 manteve-se ateísta, aconfessional, entretanto prevendo a liberdade religiosa.

Na visão de Carvalho (2006, p. 416) a Constituição de 1946 se inspirou no texto de 1934, tendo como um ponto a introdução de título novo referente à família, educação e cultura:

A Constituição de 1946 resulta da redemocratização do Brasil, restaurada pelas eleições diretas para governantes e legisladores em 1945. Promulgada em 18 de setembro de 1946, com 222 artigos, se inspira nas Constituições de 1891 e 1934 e resgata direitos individuais perdidos em 1937. Consagra a liberdade para manifestação de pensamento, a liberdade de crença, de consciência e de cultos religiosos. (GALDINO, 2006, p. 23) Embora resgate direitos individuais da Constituição anterior, a Carta de 1946 volta a ser teísta, pois faz menção a Deus em seu preâmbulo. No entanto, conforme Martins (2009, p. 104) apresenta em sua obra, continua sendo aconfessional.

A Constituição de 1967, anterior à atual, consolidou o movimento militar, havendo um esmagamento das autonomias locais, exacerbação do presidencialismo e diversas alterações no texto constitucional. (CARVALHO, 2006, p. 417-418).

Segundo Galdino (2006, p. 23) a Constituição de 67 “Trata dos direitos e garantias individuais [...] e positiva as liberdades de crença, manifestação de pensamento, de convicção política ou filosófica”, porém com os Atos Institucionais,

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Galdino (2006, p. 23) acredita que houve um retrocesso no campo dos direitos e garantias fundamentais.

Nesta Constituição a separação entre Igreja e Estado foi mantida, não se importando com nenhuma religião, desde que não contrariassem os bons costumes e a ordem pública. (SILVA; TIFALDI, 2014, p. 352).

Na visão de Martins (2009, p. 105) a Carta de 67 era teísta, aconfessional, mas assegurava a liberdade religiosa.

Deste modo, observa-se que as Constituições brasileiras mudaram conforme a situação em que o país se encontrava, porém a questão da liberdade religiosa e a não profissão de uma única religião oficial vem se mantendo desde a Constituição de 1891. O que alterava nas mudanças constitucionais tratava-se do preâmbulo que continha ou não menção a Deus.

2.3 O ESTADO LAICO BRASILEIRO NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

A laicidade do Estado esteve prevista desde a Constituição de 1891, quando o Brasil passou a não ter religião oficial. Na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988) o estado laico se manteve, mas a menção a Deus no preâmbulo ainda é uma questão levantada dentre tantas outras. Por esta razão verifica-se o Estado laico brasileiro no período posterior a 1988.

2.3.1 PREÂMBULO CONSTITUCIONAL

O preâmbulo da CRFB/1988 é questão ainda muito discutida, pois traz em si menção a Deus. Por esta razão, cabe verificar a pertinência das colocações abordadas sobre esta parte do texto Constitucional.

Para entender as questões atinentes ao preâmbulo da Carga Magna de 88, é necessário compreender primeiramente o conceito de preâmbulo.

Alves Jr. (2008) discorre acerca do assunto:

O Preâmbulo é o conjunto de enunciados formulado pelo legislador constituinte originário, situado na parte preliminar do texto constitucional, que veicula a promulgação, a origem, as justificativas, os objetivos, os valores e os ideais de uma Constituição, servindo de vetor interpretativo para a compreensão do significado das suas prescrições normativas e solução dos problemas de natureza constitucional.

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Desta forma, tem-se que o preâmbulo é o conjunto de enunciados que são colocados de forma preliminar à Constituição, exprimindo ideais, valores, objetivos do texto Constitucional o qual introduz.

O preâmbulo da CRFB/1988 expressa o seguinte (BRASIL, 1988):

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Garcia (2009, p. 240-241) discursa que "[...] o Preâmbulo representa um compromisso ético - jurídico, vinculado à Constituição, contendo os valores e tradições da sociedade para a qual se destina o estatuto constitucional - denotando, no caso, a formação preponderantemente cristã da Terra de Santa Cruz."

Já na Assembleia Nacional Constituinte existiram discussões a respeito da inclusão ou não do nome de Deus no preâmbulo da Constituição, pois poderia induzir que o constituinte optava pelo fato de crer. (SILVA NETO, 2013, p. 141).

Desta forma, poderia ser entendido que a menção a Deus no preâmbulo estaria contrariando a laicidade do Estado, porém, conforme discorre Silva Neto a Constituição deve ser interpretada como um todo, não em tiras, utilizando-se o princípio da unidade. (SILVA NETO, 2013, p. 141).

Dias (2014, p. 137) palestra a respeito do assunto quando diz que "conforme já decidido pelo Supremo Tribunal Federal, o preâmbulo da Constituição Federal não possui força normativa, e seu conteúdo deve ser apreciado à luz de todo o contexto constitucional no qual está inserido."

O preâmbulo da Constituição inicia-se com o pronome "nós", personificando, ou seja: esclarecendo que a rogação à proteção divina é ideia de um grupo de pessoas, os legisladores constituintes, não sendo correto vincular isso a uma crença do Estado. (SILVA NETO, 2013, p. 141).

Sendo assim, pode-se concluir que embora o preâmbulo da CRFB/1988 faça menção a Deus, o Estado não deixa de ser laico desde 1891. Apesar disso, a presença da religião, conforme já verificada, é constante nas decisões do Estado

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desde antes do início da colonização do país, dificultando a visualização e o distanciamento dessa linha tênue que separa a religião e o Estado.

2.3.2 A LAICIDADE DO ESTADO

A laicidade nas Constituições brasileiras se mantêm desde a Constituição de 1891, porém faz-se necessária a análise da CRFB/1988, pois é a atual Carta Magna brasileira.

Sarmento (2009, p. 213) assegura que:

Desde a edição do Decreto 119-A, de 07 de janeiro de 1890, o Brasil é um Estado laico. A laicidade, prevista naquele decreto, foi alçada à condição de princípio constitucional pela Constituição de 1891, em seu art. 11, Parágrafo 2º, que desde então vem sendo reproduzido em todos os textos constitucionais do país.

Para Mazzuoli (2009, p. 256) "a laicidade do Estado passou a ser então a forma de convivência social em que as instituições políticas apenas se submetem à soberania popular (eventualmente exercida pelos representados do povo ou, mais raramente, pelo próprio povo de forma direta) e não a uma confissão religiosa."

A separação entre Estado e Igreja foi consagrada expressamente na CRFB/1988 em seu artigo 19, inciso I:

Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;

[...]

Sendo assim, o Estado deve se manter afastado das Igrejas na medida em que não pode intervir na criação de instituições religiosas, não pode fazer com elas alianças, nem pautar suas decisões baseadas em opiniões religiosas. (BERNARDI; SANTOS, 2014, p. 171).

Para Tavares (2014, p. 118), "a separação entre Estado e religião é concebida como um pressuposto à plena liberdade religiosa". O autor ainda declara que a neutralidade do Estado não é essencial para a pluralidade religiosa, porém a

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mesma só é aflorada de forma plena nos Estados em que assumem a postura neutra na questão religiosa. (TAVARES, 2014, p. 118).

Sarmento (2009, p 215) discorre acerca do princípio do Estado laico quando diz:

O princípio do Estado laico pode ser diretamente relacionado a dois direitos fundamentais que gozam de máxima importância na escala dos valores constitucionais: liberdade de religião e igualdade. Em relação ao primeiro, a laicidade caracteriza-se como uma verdadeira garantia institucional da liberdade religiosa individual. Isto porque, a promiscuidade entre os poderes públicos e qualquer credo religioso, por ela interditada, ao sinalizar o endosso estatal de doutrinas de fé, pode representar uma coerção, ainda que de caráter psicológico, sobre os que não professam aquela religião. [...] Por outro lado, a existência de uma relação direta entre o mandamento da laicidade do Estado e o princípio da igualdade é também inequívoca. Em uma sociedade pluralista como a brasileira, em que convivem pessoas das mais variadas crenças e afiliações religiosas, bem como indivíduos que não professam nenhum credo, a laicidade converte-se em instrumento indispensável para possibilitar o tratamento de todos com o mesmo respeito e consideração.

Nesse mesmo sentido, Grimm (apud Rothenburg, 2014, p. 15) afirma que "para poder cumprir a promessa de liberdade e igualdade religiosa, o [Estado] precisa ser neutro do ponto de vista religioso e ideológico."

Huaco (2008, p. 42) discorre a respeito da laicidade:

O conteúdo da laicidade como princípio jurídico - que a distingue das liberdades de pensamento, consciência e religião e a situa em um plano superior a elas -, ao nosso entender, vem conformado pelos seguintes elementos essenciais: a) a separação orgânica e de funções, assim como a autonomia administrativa recíproca entre os agrupamentos religiosos e o Estado, b) o fundamento secular da legitimidade e dos princípios e valores primordiais do Estado e do Governo, c) a inspiração secular das normas legais e políticas públicas estatais, d) a neutralidade, ou imparcialidade frente às diferentes cosmovisões ideológicas, filosóficas e religiosas existentes na sociedade (neutralidade não significa ausência de valores, mas sim imparcialidade perante as diferentes crenças), e e) a omissão do Estado em manifestações de fé ou convicção ideológica junto aos indivíduos.

Sendo assim, observa-se então, que a CRFB/1988 manteve a laicidade presente nas constituintes anteriores, não adotando nenhuma religião como oficial, permanecendo com a postura de neutralidade no que tange a religião e o Estado, porém permitindo, por meio da liberdade religiosa, a livre escolha de religião ou não-religião.

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3 LIBERDADE E RELIGIÃO

Conforme visto anteriormente, a religião esteve presente desde o início da colonização do Brasil, pois Portugal, país colonizador, possuía sua religião oficial: o catolicismo. Deste modo, observa-se que as religiões fizeram parte da história do país e aos poucos, ao longo das Constituições, o país passou a não ter mais religião oficial, permitindo a seu povo o poder de professar ou não professar a religião que desejasse. Esse reconhecimento da Liberdade de crença e culto religioso é verificado nesse capítulo, que apresenta a Liberdade e Religião.

3.1 RELIGIÃO E CRENÇA

Antes de entender o que esta postulado a respeito da Liberdade de escolha religiosa, faz-se necessário verificar o significado de religião e crença.

Barretto (2015, p. 21) afirma que o ser humano é um "ser místico" que sempre procurou respostas às suas indagações, sejam elas no seu interior, na natureza ou nos fatos. Sendo assim, segundo o autor, pode-se definir que a religiosidade já surgiu com o ser humano, independente de qual teoria da origem humana se creia.

Sobre essa questão, Souza (2014, p. 70) traz:

Até mesmo as populações indígenas primitivas que viviam longe da civilização sempre cultuavam um "Deus", que chamavam de "Tupã". As sociedades civilizadas cultuam sempre um ser que seja capaz de promover esperança e tranquilidade, a cujo ser atribuem poderes e bondade capazes de proporcionar as melhores qualidades de vida. A este ser atribuem as mais diversas denominações.

A palavra religião, no conceito trazido por Garcia (2009, p. 235), possui vários significados como a crença em uma força sobrenatural, culto e filiação em um conjunto de pensamentos filosóficos, éticos, etc.

Já Souza (2014, p. 70) afirma que:

Religião pode ser indicada como o sentimento pessoal e complexo que abrange várias vertentes, como o amor, a bondade, o medo, o respeito e a fé, que implica em obrigação aceita pelo religioso com relação a um ser superior, amoroso, soberano, transcendente, onipresente, onisciente e onipotente, qualquer que seja a denominação dada a este ser.

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Souza ainda discorre que a religião é inerente ao ser humano e que mesmo as pessoas que não professam alguma religião específica, manifestam algum temor ou fé, às vezes aparecendo no sentido de "esperança". (SOUZA, 2014, p. 70).

Desse modo, tem-se que a religião é a crença em um ou mais seres superiores e sobrenaturais, que regem e dão sentido à vida daqueles que creem, transmitindo tranquilidade e paz.

Szklarowsky (2009, p. 317) em seu artigo arrazoa que:

Em todos os rincões da Terra pratica-se a religião, mesmo onde ela é proibida, pois esta dá significado à vida, apontando a luz que irá afastá-la da escuridão envolvente. Sem dúvida, nem todos os pensadores admitem esse entendimento. Marx via na religião a forma de enganar o homem, tornando-o imune à miséria, à escravidãtornando-o e à desgraça.

Tiele (apud Barretto 2015, p. 21) diz que "religião significa a relação entre o homem e o poder sobre-humano no qual ele acredita ou do qual se sente dependente. Essa relação se expressa em emoções especiais (confiança, medo), conceitos (crença) e ações (culto e ética)."

Souza (2014, p. 70) discursa que a religião une as mais antigas normas da humanidade, pois as normas religiosas são frutos da consciência humana que passava de gerações os ensinamentos a respeito do bem e do mal, com temor a um ser maior que poderia castigar ou salvar as pessoas conforme seus comportamentos.

Sendo assim, verifica-se que muitos são as conceituações acerca da religião, porém comum a todas elas é o conceito de que religião é a crença pessoal, intrínseca de cada um em um ou mais seres ou forças sobrenaturais, no qual manifesta-se a fé.

3.1.1 MATRIZES RELIGIOSAS BRASILEIRAS

Embora os conceitos de religião verificados anteriormente sejam variados, percebe-se semelhanças e diferenças em cada um deles. Assim também é com as diversas religiões manifestadas no Brasil. Nesta seção verifica-se algumas Matrizes Religiosas Brasileiras e seus aspectos, apresentadas de forma alfabética. Cabe

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salientar aqui que não se pretende esgotar sobre as religiões e sim apresenta-las em um aspecto geral, para verificar a pluralidade existente no Brasil.

A primeira religião a ser tratada será o Budismo. O Budismo, conforme Silva Neto (2013, p. 54) "é uma religião e filosofia desenvolvida a partir do hinduísmo no século VI a.C. por Sidarta Gautama, o Buda [...] defende que o autocontrole conduz um estado que liberta o ser humano do círculo perpétuo do nascimento, sofrimento, morte e renascimento (nirvana)."

Szklarowsky (2009, p. 321) diz que "Buda ensinou aos homens como alcançar a iluminação plena e libertar-se do ciclo da morte e da reencarnação, combinando a moral com normas fundamentais de meditação."

Santana (2015) afirma que:

Buda não desejava converter ninguém, mas sim iluminar as pessoas com seus ensinamentos, frutos de sua própria experiência. Nesta religião conhecimento, sabedoria e intelecto têm um grande destaque e seus seguidores adquirem, com a prática, a tão sonhada paz interior.

De forma diferente de outras religiões, o Budismo não cultua um "Deus" poderoso que possui poderes de salvação, criação e julgamentos, no entanto acredita na existência de seres sobrenaturais. (SANTANA, 2015).

A religião seguinte é o Candomblé, religião afro-brasileira.

O Candomblé inicialmente era o nome da dança, dos instrumentos e a música de culto. Com o passar do tempo o nome foi usado também para designar a própria manifestação religiosa. (SILVA NETO, 2013, p. 54).

Silva Neto (2013, p. 54) discorre que o Candomblé "chegou ao Brasil com os escravos do continente africano e fixou-se principalmente nos Estados da Bahia e de Pernambuco". Pronuncia também que cada terreiro de candomblé é dirigido por um pai ou mãe de santo e que ao seu lado está uma espécie de conselheiro, chamado de Ogan.

Ainda sobre o Candomblé, Gaarder (2002, p. 293) discorre que é uma religião que acredita na pluralidade de deuses e cada um deles tem poderes e funções diferentes. Esses deuses não são deuses moralistas; não punem nem corrigem os seres humanos por fraquezas morais.

A respeito da relação do bem e do mal, certo e errado para os adeptos do candomblé, Gaarder (2002, p. 293-294) discute:

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Não existe pecado no candomblé, porque não existe um código de conduta geral aplicável a todos os seres humanos, nem mesmo a todos os seguidores da religião dos orixás, uma vez que estes são muitos e a distinção entre o bem e o mal depende basicamente da relação entre cada seguidor e seu deus pessoa, o orixá. É na relação entre cada indivíduo e seu "santo" particular que se estabelece o que é certo ou errado. Para um adepto do candomblé, a definição do que é bom e do que é mau nunca é abstrata, mas sempre relativa a uma pessoa concreta com seu orixá.

Segundo Gaarder (2002, p. 294), "os orixás vieram da África com os escravos. Só que, enquanto na África há registro de culto a cerca de quatrocentos orixás, apenas uns vinte deles sobreviveram no Brasil."

Diferente do candomblé é o catolicismo, que segundo Silva Neto (2013, p. 54) é uma religião cristã que tem o papa como chefe espiritual, sendo ele o sucessor do apóstolo Pedro, escolhido por Jesus para fundar a igreja.

Silva Neto (2013, p. 54) menciona a cisão que houve entre a Igreja Católica no século XI, passando a ter duas disposições: a Igreja Católica Ortodoxa e a Igreja Católica Apostólica Romana. Tratar-se-a a respeito da Igreja Católica Apostólica Romana.

A Igreja católica possui quatro características, sendo elas: una, santa, católica e apostólica. (GAARDER 2002, p. 183-184).

Conforme Silva Neto (2013, p. 54) a religião católica "ampara-se em sete Sacramentos: batismo, confirmação, penitência, eucaristia, matrimônio, ordem e unção dos enfermos. A liturgia da Igreja Católica se expressa na Missa."

Gaarder (2002, p. 184-185) alega que o catolicismo possui diversas doutrinas em comum com outras igrejas cristãs, sendo a principal a Bíblia. O autor também traz aspectos em que a Igreja Católica se difere das demais religiões cristãs, como por exemplo a salvação em que, para os católicos, ocorre "por meio da vida de Cristo, com sua obediência a Deus, por meio de sua expiação, seu sacrifício na cruz e ressureição."

Outro elemento que diverge dos católicos aos outros cristãos é a crença e devoção a Maria, mãe de Jesus, e aos santos. A esse respeito, Gaarder (2002, p. 189) discorre:

Os crentes dirigem suas orações pelas almas não só a Cristo, mas também à Virgem Maria e aos santos, já que estes estiveram especialmente próximos a Cristo. Isso explica o importante papel que os santos

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desempenharam na Igreja católica. Os crentes os honram e reverenciam, e oram por sua intercessão, porém não os adoram.

Os católicos acreditam na ressureição e na ideia de céu e inferno, pensamento que diverge da doutrina dos adeptos ao Espiritismo/Kardecismo.

Gaarder (2002, p. 289) em sua obra traz alguns aspectos presentes no espiritismo. Segundo este "o espiritismo kardecista consiste num sistema filosófico-religioso cujo eixo principal é a crença na reencarnação."

O nome "kardecismo" vem do pseudônimo de Allan Kardec, que em sua obra desenvolve a teoria do espiritismo. O atrativo inicial do espiritismo eram os serviços terapêuticos, porém no Brasil a teoria espírita voltou-se mais ao sentido de religião. (GAARDER, 2002, p. 290).

Gaarder ainda discorre sobre a chegada do kardecismo ao Brasil:

O kardecismo foi introduzido no Brasil durante a segunda metade do século XIX. As principais organizações espíritas surgiram por volta de 1870, na Bahia e no Rio de Janeiro. Desde a chegada, o traço distintivo de sua proposta foi a terapia mediúnica por meio de "passes" para combater todos os tipos de enfermidade e desconforto. (GAARDER, 2002, p. 290).

Silva Neto (2013, p. 55) apresenta os elementos da doutrina espírita kardecista da seguinte maneira:

i) existência do mundo amparada em duas realidades - uma visível e encarnada e outra invisível e desencarnada; ii) nega o inferno e a condenação eterna; iii) os espíritos encontram-se em processo contínuo de evolução, que se estende por inúmeras reencarnações - fenômeno da

metempsicose.

Não só de diferenças é feita a doutrina espírita, mas também possui semelhanças. O kardecismo vê Jesus Cristo como a maior entidade já encarnada e tem o amor ao próximo como o maior mandamento deixado por Jesus. Para os kardecistas esse mandamento deve ser cumprido tanto pelos vivos quanto pelos mortos e por essa razão vê-se tanta caridade por parte dos seguidores desta doutrina. (GAARDER, 2002, p. 291).

Diversas são as igrejas e ramificações presentes no Brasil. As Igrejas pentecostais são inúmeras e não cabe aqui esmiuça-las, porém ressalta-se a importância da menção. Porto (2015) traz alguns exemplos: Igreja Universal do

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Reino de Deus, Assembleia de Deus, Igreja Batista Nacional, Igreja Renascer em Cristo.

Gaarder (2002, p. 288), porém, difere as igrejas em pentecostais e neopentecostais quando diz que "recentemente no Brasil passou a se diferenciar em dois tipos, com dois formatos básicos: os pentecostais 'clássicos' e os 'neopentecostais'". Gaarder ainda traz as semelhanças e diferenças entre as duas classificações supracitadas:

As formas de vida religiosa que hoje mais crescem no Brasil são, em primeiro lugar, as igrejas protestantes pentecostais. E, entre as pentecostais, as que mais crescem são aquelas que já se convencionou chamar de neopentecostais. Estas oferecem uma forma de religiosa muito eficiente em termos práticos, pouco exigente em termos éticos e doutrinariamente descomplicada. Os neopentecostais conservam do pentecostalismo clássico o estilo de culto fortemente emocional, voltado para o êxtase, com papel de destaque para a glossolalia, o exorcismo e o milagre, visados sempre como resultados palpáveis a ser experimentados de imediato. (GAARDER, 2002, p. 288). [grifos no original].

Já para Silva Neto (2013, p. 55) as Igrejas Neopentecostais são "segmentos religiosos surgidos no último quartel do século XX e dotados de grande popularidade nos dias atuais."

Essas Igrejas são extremamente importantes quando se trata de Estado Brasileiro, pois são responsáveis pela eleição de inúmeros religiosos para a Câmara dos Deputados e Senado da República. (SILVA NETO, 2013, p. 55).

Jesus Cristo, homem do qual inspirou as religiões denominadas cristãs, dentre elas as pentecostais, era judeu, portanto cabe falar sobre Judaísmo, a religião que influenciou na criação do cristianismo.

Silva Neto (2013, p. 55) discorre sobre o judaísmo:

Judaísmo - A mais antiga das religiões monoteístas, tendo exercido grande influência sobre o Cristianismo e o Islamismo. Considera o mundo como criação de um Deus eterno, e os judeus como seu povo escolhido, de acordo com a Aliança feita entre Deus e Abraão.

Os judeus tem como a Torá como seu livro fundamental. (SZKLAROWSKY, 2009, p. 322).

Gaarder (2002, p. 98) traz em sua obra que "o judaísmo não é apenas uma comunidade religiosa, mas também étnica. Historicamente o termo judeu tem conotações raciais, porém estas são inexatas." [grifos no original].

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Para Gaarder (2002, p. 98-99) uma das características do judaísmo é que essa religião é ligada de forma direta à história.

Por ser a religião que influenciou as religiões cristãs, possui também semelhanças com estas. Segundo Gaarder (2002, p. 104) a Bíblia judaica corresponde ao Antigo Testamento da Bíblia cristã, porém organizada de forma diferente.

Sobre as questões éticas judaicas, Gaarder apresenta:

Os judeus não fazem distinção nítida entre a parte ética e a parte religiosa de sua doutrina. Tudo pertence à Lei de Deus. Existem 248 ordens afirmativas e 365 proibições, totalizando 613 mandamentos. Além desses mandamentos, a vida do judeu é regulada por muitos costumes e práticas que surgiram ao longo da história. Diz-se que um costume judaico é tão obrigatório quanto uma lei. (GAARDER, 2002, p. 111).

Outra religião influenciada pelo judaísmo, pois é cristã, é o Luteranismo. Para Silva Neto (2009, p. 56) discorre que o luteranismo é "doutrina religiosa protestante baseada nos ensinamentos de Martinho Lutero."

Segundo Gaarder (2002, p. 285) o luteranismo, a primeira religião protestante, chegou no Brasil com os imigrantes alemães em 1824. Gaarder ainda traz algumas diferenciações entre os católicos e os luteranos:

Enquanto o fundamento da igreja católica é a Bíblia mais a Tradição, o princípio luterano é que a autoridade deriva apenas da Bíblia. Lutero se revelou contra diversos preceitos na Igreja católica porque sua consciência o forçou a isso. Ele acreditava que sua consciência estava sendo guiada pela Palavra de Deus, isto é, pela Bíblia. (GAARDER, 2002, p. 197). [grifos no original].

Ainda sobre semelhanças e diferenças, Gaarder (2002, p. 198) discorre que a salvação para os luteranos acontece pela justificação, ou seja, o homem por seus pecados merece punição, mas Deus absolve o pecado, quando Cristo toma para si todos os pecados do homem. Sendo assim, Deus está oferecendo a salvação e o homem a aceita pela fé.

Os luteranos reconhecem dois dos sete Sacramentos reconhecidos pelos católicos: o batismo e a sagrada comunhão. (SILVA NETO, 2013, p. 56).

Sobre a sagrada comunhão, também chamada de eucaristia, Gaarder discorre a diferença:

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A visão que a Igreja luterana tem da eucaristia está a meio caminho entre a dos católicos e a de outros protestantes. Ela não adota o ponto de vista cristão de que o pão e o vinho se transformam realmente no corpo e no sangue de Jesus, mas também não aceita a convicção alternativa de que o pão e o vinho são apenas símbolos. Lutero diz que o corpo e o sangue de Cristo estão de fato presentes mas que os elementos da eucaristia são meramente pão e vinho. (GAARDER, 2002, p. 199).

Dentre as religiões que creem na presença de um ou mais deuses, verifica-se a Umbanda.

Conforme Silva Neto (2013, p. 56) a Umbanda é uma religião que surgiu no Brasil na década de 1940, sendo a religião uma combinação de elementos presentes no kardecismo, no candomblé e no catolicismo.

Ao encontro desta mesma ideia, Gaarder (2002, p. 299) discorre:

Nascido no Brasil, a umbanda pode ser chamada de religião brasileira primeiro por esse fato. Mas a umbanda também pode ser dita "religião brasileira" porque é a resultante de um encontro histórico único, que só se deu no Brasil: o encontro cultural de diversas crenças e tradições religiosas africanas com as formas populares de catolicismo, mais o sincretismo hindu-cristão trazido pelo espiritismo kardecista de origem europeia. Eis aí a umbanda, um sincretismo religioso originalmente brasileiro.

Quando a Umbanda surgiu, não se restringiu apenas aos afrodescendentes, mas sim aberta a todos os brasileiros, sendo visivelmente multiétnica. (GAARDER, 2002, p. 298-299).

A respeito das semelhanças e diferenças da umbanda e demais religiões, tem-se que esta religião tem características espíritas bem fortes, pois, além dos orixás, particularidade análoga ao candomblé, na umbanda "baixam" espíritos chamados guias. (GAARDER, 2002, p. 300).

É nessa mistura de várias religiões que formam a umbanda que encerra-se o conjunto das principais religiões crentes em divindades preencerra-sentes no Brasil, porém é necessário verificar e apresentar também as "não religiões", ou seja; aqueles que não creem: agnósticos, ateus e novos ateus.

O agnosticismo é, segundo Silva Neto (2013, p. 49), "corrente filosófica que repugna o conhecimento de qualquer objeto que esteja fora dos limites da ciência."

No site da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (2015) há conceituação dessas duas vertentes. Sobre os agnósticos tem-se que:

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A definição que adotamos reflete a etimologia da palavra. O radical gnosis significa conhecimento; assim, agnosticismo é a afirmação de desconhecimento a respeito da veracidade de uma proposição. Em outras palavras, o agnóstico afirma que a questão da existência de divindades ainda não foi decidida, ou não pode ser decidida. A rigor, o agnosticismo pode se referir a qualquer afirmação, mas em geral a palavra se refere a idéias metafísicas, particularmente à existência de deuses.

A respeito dos ateus, Silva Neto (2013, p. 50) discorre que estes negam a existência de qualquer ser divino.

Para a Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (2015) o ateísmo "é qualquer forma de ausência de teísmo -- ou seja, ateísmo é a ausência de crença em quaisquer divindades."

O ateísmo não possui doutrinas e não prega nada, sendo a única coisa comum a todos os ateus é a não crença em deuses e divindades. (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ATEUS E AGNÓSTICOS, 2015).

Silva Neto (2013, p. 50) apresenta uma nova denominação, chamada de de "Novo Ateísmo". O mesmo discorre que, além da reprovação da existência de Deus, os novos ateus contestam a intromissão da religião na vida das pessoas.

Sobre o assunto, o Silva Neto (2013, p. 50) apresenta:

Os fundamentos do Novo Ateísmo são os seguintes: i) Deus é uma mera hipótese improvável, visto que não é possível a existência de deuses distintos para cada segmento religioso; ii) a origem da fé não está na existência de Deus, mas sim na mera necessidade existencial humana de acreditar em algo transcendental; iii) o mundo sem religião sem bem melhor, visto que não haveria o 11 de setembro, nenhum homem bomba, conflito entre Israel e a Palestina ou na Irlanda do Norte.

Sendo assim, verifica-se a importância do estudo e do entendimento de cada religião ou não religião, pois só assim é possível respeitar e cumprir de forma plena a liberdade religiosa postulada, a qual é tratada na seção seguinte.

3.2 LIBERDADE RELIGIOSA

A liberdade de escolha religiosa é compreendida como a liberdade constitucional que permite, dentre outras coisas, que o indivíduo possa escolher e professar sua religião. Nesse contexto, esta seção verifica a previsão constitucional contida no artigo 5º e suas distinções.

(36)

A liberdade religiosa é um preceito previsto no artigo 5º, VI da CRFB/1988, que traz a seguinte postulação:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;

[...] [grifo nosso]

Por estar prevista no artigo 5º, a liberdade de culto e escolha religiosa está elencada entre os direitos fundamentais previstos da CRFB/1988.

Sobre os direitos fundamentais, Mendes (2004, p. 1) discorre acerca da sua importância:

A Constituição brasileira de 1988 atribuiu significado ímpar aos direitos individuais. Já a colocação do catálogo dos direitos fundamentais no início do texto constitucional denota a intenção do constituinte de emprestar-lhes significado especial. A amplitude conferida ao texto, que se desdobra em setenta e sete incisos e dois parágrafos (art. 5º), reforça a impressão sobre a posição de destaque que o constituinte quis outorgar a esses direitos. A liberdade religiosa foi consagrada na CRFB/1988 como cláusula pétrea no momento em que passa a ser um direito e garantia fundamental prevista no art. 5° e, portanto, um núcleo permanente da Constituição (NISHIYAMA, 2014, p. 280).

Nesse sentido, Mendes (2004, p. 1) arrazoa a respeito do assunto quando diz: "o constituinte reconheceu ainda que os direitos fundamentais são elementos integrantes da identidade e da continuidade da Constituição, considerando, por isso, ilegítima qualquer reforma constitucional tendente a suprimi-los [...]" [grifos no original].

Soriano (2009, p. 175) afirma:

O direito à liberdade religiosa assegurado pela CF/1988 garante ao cidadão o direito de escolher e de prescrever que é inviolável a liberdade de consciência e de crença (art. 5°, inciso VI), a Constituição demonstra sintonia com o próprio liberalismo, uma vez que o Estado admite mais de uma concepção do bem, para usar expressão de John Rawis. Assim sendo, não há dúvidas de que a Constituição de 1988 foi fundada nos princípios da democracia liberal.

(37)

Nalini (2009, p. 46) assevera que "a liberdade religiosa garantida na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 compreende a liberdade de crença, a liberdade de culto e a liberdade de organização religiosa."

Na liberdade religiosa se inclui algumas liberdades, conforme discorre Tavares (2014, p. 117):

Há de se incluir a liberdade: i) de opção em valores transcendentais (ou não); ii) de crença nesse sistema de valores; iii) de seguir dogmas baseados na fé e não na racionalidade estrita, iv) da liturgia (cerimonial), o que pressupõe a dimensão coletiva da liberdade; v) do culto propriamente dito, o que inclui um aspecto individual; vi) dos locais de prática do culto; vii) de não ser o indivíduo inquirido pelo Estado sobre suas convicções; viii) de não ser o indivíduo prejudicado, de qualquer forma, nas suas relações com o Estado, em virtude de sua crença declarada.

Sendo assim, cabe verificar cada uma dessas garantias compreendidas na liberdade religiosa.

3.2.1 LIBERDADE DE CONSCIÊNCIA E CRENÇA

A liberdade de consciência e crença é uma das faces da liberdade de escolha religiosa prevista no art. 5º, VI, da CRFB/1988. Cabe, portanto, compreende-la a fim de verificar o direito fundamental supracitado como um todo.

Bastos (apud Silva e Tifaldi, 2014, p. 348) divide a liberdade de consciência e de crença, com a finalidade de que ambas possam obter proteção:

É esta sem dúvida a melhor técnica, pois a liberdade de consciência não se confunde com a de crença. Em primeiro lugar, porque uma consciência livre pode determinar-se no sentido de não ter crença alguma. Deflui, pois, da liberdade de consciência uma proteção jurídica que inclui os próprios ateus e os agnósticos.

Ao contrário da Constituição de 1967/1969 que não previa expressamente a liberdade de crença, a CRFB/1988 assegura a liberdade de consciência e crença, em seu art. 5º, inciso VI. (NISHIYAMA, 2014, p. 281).

Para Lazari, Schmeiske e Hernandes (2014, p. 330) a liberdade de crença abrange a liberdade do indivíduo de escolher ou não uma religião para professar e, por consequência, agir conforme suas convicções. A liberdade de crença ou descrença estão, portanto, protegidas na CRFB/1988.

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