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Obstáculos à prevenção da violência associada ao futebol por parte das forças de segurança: o caso da polícia de segurança pública

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Academic year: 2021

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Fábio André de Assunção Carreto

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F

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EGURANÇA

O CASO DA POLÍCIA DE SEGURANÇA PÚBLICA

Orientadora:

Professora Doutora

Maria Salomé Fernandes Martins Marivoet

(2)

Estabelecimento de Ensino Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna

Curso Mestrado Integrado em Ciências Policiais

Orientadora Professora Doutora Maria Salomé Fernandes Martins Marivoet

Título Obstáculos à Prevenção da Violência Associada ao Futebol por Parte das Forças de Segurança - O Caso da Polícia de Segurança Pública

Autor Fábio André de Assunção Carreto

Local de edição Lisboa

(3)

I

EPÍGRAFE

Algumas pessoas acreditam que o futebol é uma questão de vida ou morte, eu estou muito decepcionado com essa atitude.

Posso assegurar-vos que é muito, muito mais importante do que isso.

(4)

II

AGRADECIMENTOS

Com a presente Dissertação finaliza-se um longo e sinuoso caminho percorrido com trabalho árduo e dedicação extrema. Ao debruçar-me sobre as minhas memórias recordo-me com saudade de um caminho intenso em que partilhei lágrimas e sorrisos, nuns momentos, de felicidade, e noutros, de consolação. Neste momento de reflexão sinto-me feliz pois vejo que nunca caminhei sozinho e por essa razão quero aqui expressar os meus agradecimentos a todos os que caminharam comigo.

À Sra. Professora Doutora Salomé Marivoet, pela orientação metódica, dedicação, disponibilidade, paciência e apoio prestado na elaboração do presente trabalho expresso aqui o meu profundo agradecimento

Ao Sr. Comissário João Pestana, ao Sr. Subcomissário Sérgio Soares, ao Sr. Chefe Paulo Almeida e aos restantes elementos policiais pertencentes à UMID e à bolsa de spotters do COMETLIS da PSP por todo o apoio e colaboração prestados quer aquando da observação dos jogos, quer na resposta aos inquéritos o meu agradecimento sincero.

Ao Sr. Subintendente Luís Guerra e ao Sr. Subintendente Francisco Costa Ramos pela disponibilidade e pelo valioso contributo que deram a este trabalho com as entrevistas que concederam o meu muito obrigado.

Ao Sr. Comissário Ângelo Sousa da Divisão de Policiamento e Ordem Pública do Departamento de Operações da Direcção Nacional da PSP pela celeridade e prontidão demonstrada na disponibilização dos documentos necessários à elaboração deste trabalho o meu obrigado.

Ao XXIII CFOP um grande abraço de amizade e estima por estes cinco anos vividos intensamente que jamais se apagarão das nossas vidas e que se reflectem no nosso lema: Entrámos como desconhecidos, saímos como irmãos.

ÀPSP, Instituição à qual pertenço orgulhosamente e ao ISCPSI, a Casa que me formou e que me deu as condições imprescindíveis para que a realização do presente trabalho se tornasse possível. Por ambas demonstro aqui o meu apreço.

Ao Carlos Godinho e à Ana Godinho pela amizade, estima e preocupação demonstradas ao longo destes anos o meu indelével obrigado.

Ao Joaquim Leitão e à Maria José Leitão pela amizade e apoio incondicional dados ao longo da minha vida os quais não esqueço e agradeço humildemente.

À Zélia e ao Nuno pela presença e apoio constante em todos os momentos da minha vida, o meu muito obrigado.

À Ana Filipa por tudo. Pelo apoio, pelo carinho e pela força, pela palavra meiga e de esperança nos momentos menos bons. Pela compreensão e paciência demonstradas

(5)

III em todos estes anos. Pelo sorriso ao final do dia e pelo amor demonstrado o meu imenso agradecimento.

Aos meus grandes pais que sempre me acompanharam e apoiaram em toda a minha vida. Nestes cinco anos, muitos foram os momentos complicados pelos quais passámos e em alguns dos quais não pude estar fisicamente presente. Só o vosso apoio e compreensão permitiram que eu conseguisse concentrar-me para alcançar um objectivo muito ambicionado, não só por mim, mas também por todos aqueles que gostam de mim: Concluir este curso e tornar-me Oficial da PSP.

Por último, agradeço a todos aqueles que directa ou indirectamente participaram e contribuíram para a minha formação enquanto Homem e enquanto Polícia.

Sem Vós, este sonho não se tornaria realidade!

(6)

IV

RESUMO

Nas últimas décadas o fenómeno da violência associada ao futebol tem vindo a ganhar cada vez mais relevância em diversos países, incluindo Portugal.

No presente estudo, verificámos que a violência associada ao futebol tem aumentado nos últimos anos. Para este aumento contribuem um conjunto de obstáculos e dificuldades que não permitem que as forças de segurança, e em particular a PSP, consiga prevenir a ocorrência de acções violentas por parte dos adeptos de futebol.

Através deste estudo, são apontados como os cinco principais obstáculos, a inexistência de ordens de interdição de adeptos com antecedentes de violência, o comportamento dos adeptos das claques não legalizadas, o comportamento dos adeptos dos GOA, a dificuldade em detectar os autores dos ilícitos no interior dos estádios e as deficiências nas revistas de prevenção e segurança efectuadas à entrada dos estádios.

PALAVRAS-CHAVE:VIOLÊNCIA, FUTEBOL, FORÇAS DE SEGURANÇA, PREVENÇÃO, OBSTÁCULOS

ABSTRACT

On the last decades, the phenomenon of violence associated to football has been gaining more relevance in several countries, including in Portugal.

In this study, it was possible to verify that violence associated to football has increased in the last years. This increase is due to a set of obstacles and difficulties that do not allow the security forces and in particular the PSP to prevent the occurrence of violent actions by football fans.

Through this study, the five major obstacles are the inexistence of banning orders to supporters with history of violence, the behavior of the members of non-legalized sides (claques), the behavior of the organized groups of supporters, the difficulty in detecting the authors of illicit crimes inside the stadiums and the problems of the searches for prevention and safety that take place in the entrance of the stadium.

(7)

V

LISTA DE SIGLAS AAC – Associação Académica de Coimbra

ARD – Assistente de Recinto Desportivo AN – Associação Naval

CCTV – Closed Circuit of Television CDB – Comando Distrital de Braga CDC – Comando Distrital de Coimbra CDF – Comando Distrital de Faro CDL – Comando Distrital de Leiria CDN – Clube Desportivo Nacional CDS – Comando Distrital de Setúbal CFB – Clube de Futebol “Os Belenenses”

CFOP – Curso de Formação de Oficiais de Polícia CESD – Conselho para a Ética e Segurança no Desporto CNCF – Comissão Nacional de Coordenação e Fiscalização CNVD – Conselho Nacional Contra a Violência no Desporto COMETLIS – Comando Metropolitano de Lisboa

COMETPOR – Comando Metropolitano do Porto CRM – Comando Regional da Madeira

CRP – Constituição da República Portuguesa CSM – Clube Sport Marítimo

FCP – Futebol Clube do Porto

FCPF – Futebol Clube Passos de Ferreira

(8)

VI

FPF – Federação Portuguesa de Futebol GNR – Guarda Nacional Republicana GOA – Grupo Organizado de Adeptos IDP – Instituto do Desporto de Portugal

ISCPSI – Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna LPFP – Liga Portuguesa de Futebol Profissional

LSC – Leixões Sport Clube

MAI – Ministério da Administração Interna NEP – Norma de Execução Permanente PSP – Polícia de Segurança Pública RAFC – Rio Ave Futebol Clube SCB – Sporting Clube de Braga SCP – Sporting Clube de Portugal SCO – Sporting Clube Olhanense

SEI – Sistema Estratégico de Informação e Gestão Operacional SLB – Sport Lisboa e Benfica

UDL – União Desportiva de Leiria

UEFA –Union of European Football Associations

UMID – Unidade Metropolitana de Informações Desportivas VFC – Vitória Futebol Clube

(9)

VII

ÍNDICE

INTRODUÇÃO ... IX

CAPÍTULOI–ENQUADRAMENTOTEÓRICO ... 4

1.1–SURGIMENTO DA VIOLÊNCIA ASSOCIADA AO FUTEBOL ... 4

1.2– O PODER ECONÓMICO, OS MEDIA E A MASCULINIDADE ... 6

1.3–SUBCULTURAS DE ADEPTOS –HOOLIGANS/CASUALS E ULTRAS ... 8

1.3.1–SUBCULTURA HOOLIGAN/CASUAL ... 9

1.3.2–SUBCULTURA ULTRA ...10

1.4–OBSTÁCULOS À PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA ASSOCIADA AO FUTEBOL ...10

1.4.1–OS MEDIA ...10

1.4.2–OS ADEPTOS E AS CLAQUES ...12

1.4.3–OS CLUBES E SEUS DIRIGENTES ...13

1.4.4–A LEGISLAÇÃO E OS REGULAMENTOS ...13

1.4.5–AS EMOÇÕES DO JOGO ...15

1.4.6–PROBLEMÁTICA DE INVESTIGAÇÃO, OBJECTO E HIPÓTESES DE TRABALHO ...16

CAPÍTULOII–ESTRATÉGIADEINVESTIGAÇÃO ...18

2.1–METODOLOGIA OU MODELO DE ANÁLISE ...18

2.2–MÉTODOS E TÉCNICAS DE INVESTIGAÇÃO ...20

2.3–UNIVERSO DE ANÁLISE ...21

CAPITULOIII–ENQUADRAMENTOLEGAL ...23

3.1–NOTA INTRODUTÓRIA ...23

3.2– A EVOLUÇÃO DA LEGISLAÇÃO NACIONAL DE PREVENÇÃO E SEGURANÇA DA VIOLÊNCIA NO DESPORTO ...24

3.3–ALEI N.º 39/2009, DE 30 DE JULHO ...33

CAPITULOIV–ANÁLISEEDISCUSSÃODERESULTADOS ...38

4.1 – EVOLUÇÃO DA VIOLÊNCIA ASSOCIADA AO FUTEBOL ENTRE AS ÉPOCAS DESPORTIVAS 2004/2005 E 2009/2010 ...38 4.1.1–ÉPOCA DESPORTIVA 2004/2005 ...38 4.1.2–ÉPOCA DESPORTIVA 2005/2006 ...40 4.1.3–ÉPOCA DESPORTIVA 2006/2007 ...40 4.1.4–ÉPOCA DESPORTIVA 2007/2008 ...41 4.1.5–ÉPOCA DESPORTIVA 2008/2009 ...41 4.1.6–ÉPOCA DESPORTIVA 2009/2010 ...42 CONCLUSÃO PARCELAR ...42

(10)

VIII

CONCLUSÃO PARCELAR ...45

4.3–RESULTADOS DOS INQUÉRITOS EFECTUADOS AOS SPOTTERS ...46

4.3.2–OS ADEPTOS E AS CLAQUES ...48

4.3.3– OS CLUBES E OS SEUS DIRIGENTES ...49

4.3.4 –A LEGISLAÇÃO E OS REGULAMENTOS ...49

4.3.5 –AS EMOÇÕES RESULTANTES DO PRÓPRIO JOGO ...51

CONCLUSÃO PARCELAR ...51

4.3.6–OUTROS OBSTÁCULOS VERIFICADOS ...52

4.3.6.1–SEGURANÇA DAS INFRA-ESTRUTURAS DESPORTIVAS ...52

4.3.6.2– REVISTAS DE PREVENÇÃO E SEGURANÇA ...53

4.3.6.3–BILHÉTICA ...54

4.3.6.4–COMUNICAÇÃO E TROCA DE INFORMAÇÕES ...54

4.3.6.5–CONTROLO DE ADEPTOS NO EXTERIOR DO RECINTO DESPORTIVO ...55

4.3.6.6– INTERDIÇÕES DE ACESSO AO RECINTO DESPORTIVO ...55

4.3.6.7– MAIORES OBSTÁCULOS PARA OS SPOTTERS ...55

4.3.6.8–OBSTÁCULOS MAIS FREQUENTES PARA OS SPOTTERS ...56

4.3.6.9–MEDIDAS PARA ULTRAPASSAR OS OBSTÁCULOS ...56

CONCLUSÃO PARCELAR ...56

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...59

BIBLIOGRAFIA ...63

ANEXOS ...69

ÍNDICE DE DOCUMENTAÇÃO ANEXA ANEXO A-RELATÓRIOS DE OBSERVAÇÃO DOS JOGOS

ANEXOB -INQUÉRITO SOBRE OS OBSTÁCULOS À PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA ASSOCIADA AO FUTEBOL POR PARTE DAS FORÇAS DE SEGURANÇA

ANEXOB1-RESULTADOS DOS INQUÉRITOS

ANEXOB2-RESPOSTAS ÀS QUESTÕES ABERTAS

ANEXOC-ENTREVISTAS

ANEXOD-TIPOS DE ILÍCITOS POR ÉPOCA DESPORTIVA

ANEXOE–GRELHA DE ANÁLISE DOS ACTOS VIOLENTOS OCORRIDOS NA LIGA ZON SAGRES –

(11)

IX

LISTADEFIGURAS

GRÁFICO 1–EVOLUÇÃO DOS INCIDENTES REGISTADOS POR ÉPOCA DESPORTIVA ...39

GRÁFICO 2–EVOLUÇÃO DO TIPO DE INCIDENTES (2004/2005–2009/2010) ...43

GRÁFICO 3–GRAU DOS OBSTÁCULOS À PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA ASSOCIADA AO FUTEBOL 47

LISTADEQUADROS

(12)

1

INTRODUÇÃO

O futebol em Portugal tem ao longo dos anos suscitado um interesse tremendo em grande parte da população, abrangendo todos os estratos sociais, desde os de menores posses, até às mais altas individualidades do nosso país.

Actualmente, a popularidade do futebol no nosso país é inegável, servindo a sua existência para acesas discussões, quer seja numa simples mesa de café, quer seja num estúdio de televisão.

Tal popularidade tem vindo a despertar, cada vez mais frequentemente, o interesse dos media, não só pela elevada quantidade de adeptos que seguem a par e passo os seus clubes, mas também pelos episódios menos positivos que vão manchando a imagem desta modalidade desportiva, quer dentro, quer fora dos recintos desportivos.

A ocorrência crescente e sistemática destes episódios de violência em torno do futebol, tão divulgados pelos media, veio alertar todas as entidades com responsabilidades, quer no âmbito desportivo, quer no âmbito da garantia da segurança das populações e da manutenção da ordem e tranquilidade públicas para um fenómeno que tem, ano após ano, ganho proporções preocupantes no nosso país, obrigando actualmente a um extraordinário empenhamento de meios materiais e de recursos humanos por parte das forças de segurança, nomeadamente da PSP.

Encontra-se consagrado no Artigo 272.º da CRP, que as forças de segurança têm a obrigação de “defender a legalidade democrática e garantir a segurança interna e os direitos dos cidadãos”.

Nesta senda, o Artigo 3º, alínea l) da Lei n.º53/2007, de 31 de Agosto, estatui que a PSP tem a missão de “garantir a segurança nos espectáculos, incluindo os desportivos, (…), nos termos da lei”.

Com base nestas atribuições legais, cabe à PSP, nas áreas em que seja a força territorialmente competente, desenvolver esforços e procurar soluções que, em consonância com a legislação vigente respeitante a esta matéria, permitam prevenir a existência de incivilidades e de ilícitos criminais por parte dos adeptos.

Como refere Gomes (514:2005):

(…) num espaço de liberdade, segurança e justiça, em que o futebol representa talvez a mais importante actividade desportiva, atraindo grandes multidões de adeptos e envolvendo regularmente deslocações de massas de adeptos (…) é essencial que as autoridades policiais (…), assim como os organizadores das competições desportivas, assegurem aos espectadores um ambiente de espectáculo seguro e livre de actos violentos ou de medo da violência.

(13)

2 Pela evolução do fenómeno, parece-nos, que tanto os esforços, como as soluções apresentadas, não têm surtido o efeito desejado, dado que o objectivo está longe de ser alcançado, ou seja, erradicar a violência dos espectáculos de futebol e devolver a imagem sã e salutar que deve ser a essência dos espectáculos desportivos.

Posto isto, questionamo-nos acerca de quem será a culpa deste insucesso? Será da FPF? Da LPFP? Dos clubes promotores e dos seus dirigentes? Dos media? Dos adeptos? Da legislação existente? Ou será, em última instância, das forças de segurança? Existirá um só culpado?

Crentes na premissa de que o método científico é o mais credível e viável na procura e obtenção de soluções sólidas e duradouras que têm como última ratio a resolução dos problemas do presente, de modo, a que os mesmos não persistam no futuro, propomo-nos neste trabalho, estudar quais as dificuldades com que os elementos policiais pertencentes às forças de segurança, e em especial à PSP, se deparam aquando da realização de um jogo de futebol. Assim, pretendemos identificar os obstáculos que não têm permitido evitar a efectivação de actos de violência por parte dos adeptos de futebol, com especial relevo para os adeptos pertencentes às claques ou aos Grupos Organizados de Adeptos.

Para tal, efectuaremos no Capítulo I, intitulado Enquadramento Teórico, uma retrospectiva histórica da evolução da violência associada ao futebol, abordaremos as subculturas de adeptos existentes, o seu surgimento, as suas características, filosofias e formas de actuação, e de seguida, uma identificação exaustiva dos obstáculos mencionados em diversa bibliografia sobre esta temática.

Na metodologia do presente trabalho, como veremos no Capitulo II, intitulado Estratégia de Investigação, efectuámos também um conjunto de observações de diversos jogos, aplicámos inquéritos, analisámos diversa documentação, e realizámos entrevistas informais e formais de modo a identificar os inúmeros obstáculos que a verificarem-se representam uma dificuldade acrescida para os elementos policiais no terreno.

No Capítulo III (Enquadramento Legal), levaremos também a cabo uma análise acerca da evolução da legislação em geral e em especifico dos aspectos que mais controvérsia e embaraço causam, quer às forças de segurança, quer às Autoridades Judiciárias e Administrativas com competências nesta matéria.

Por fim, na Análise e Discussão de Resultados, Capítulo IV, realizaremos em simultâneo uma análise da evolução da violência associada ao futebol na principal liga de futebol em Portugal entre as épocas desportivas 2004/2005 e 2009/2010,a fim de verificar de que forma este fenómeno tem estado a evoluir, e quais os actos ilícitos que são praticados com maior regularidade.

(14)

3 Por último, após identificarmos os obstáculos, tentaremos no presente estudo encontrar um conjunto de soluções que se possam revelar úteis na forma como as forças de segurança previnem e actuam relativamente ao fenómeno da violência associada ao futebol.

(15)

4

CAPÍTULO I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

1.1–SURGIMENTO DA VIOLÊNCIA ASSOCIADA AO FUTEBOL

A construção da identidade cultural dos diferentes povos tem-se desenvolvido ao longo de séculos através de longas batalhas e disputas sangrentas onde a violência assumiu, desde sempre, uma presença constante. Verificamos portanto que a violência é algo indissociável da condição humana, revelando-se nas mais diversas formas e contextos da vida social, independentemente das condições de tempo e de lugar. Deste modo, o desporto, e o futebol em concreto, sendo marcas da identidade cultural dos povos, constituem-se como meios privilegiados tanto para a afirmação destas identidades, como para a execução de actos de violência. Segundo Marivoet (2007:511),o futebol:

(…) apresenta-se como um espaço potenciador da afirmação de identidades socioculturais, que tanto se têm vindo a exprimir em torno da galvanização dos sentidos de afiliação de comunidades locais, regionais ou nacionais, como na afirmação de subculturas de adeptos que incorporam de forma exacerbada os seus sentidos identitários.

Esta constatação é igualmente apontada por outros autores (Elias e Dunning, 1986; Lassalle, 1997; Dunning, 1999; Giulianotti, 2000, 2002; Armstrong e Giulianotti, 2001; Giulianotti e Finn, 2000; Dunning et al., 2002).

Inicialmente, o futebol surgiu como qualquer outra modalidade desportiva tendo por objectivo a prática de exercício físico conjugada com um convívio salutar entre os seus praticantes onde imperavam as regras de boa conduta desportiva (fair play). Com o aparecimento de factores exteriores ao jogo como as tensões raciais e nacionais, as pressões dos media, dos dirigentes, dos treinadores e dos adeptos gerou-se nos praticantes da modalidade uma obrigação de ganhar a todo o custo, quer fosse através de formas ilícitas contrárias às regras vigentes, quer fosse utilizando a violência como meio intimidatório do adversário.

Com o aparecimento desta competitividade associada a uma conflitualidade e emotividade, muitas vezes exacerbadas e doentias, foram-se criando e cimentando ligações estreitas entre o futebol e a violência, das quais resultaram, como veremos a seguir, actos de violência graves e nefastos.

Actualmente o futebol é o desporto mais praticado e admirado em todo o mundo. Kitchin afirmava que “o futebol é o único idioma global para além da ciência” (Kitchin,

(16)

5 1966; Ap. Dunning et al.,1994:5), tal era a dimensão que esta modalidade tinha já nessa altura, à escala planetária. Segundo Pereira (2007:2)1:

(…) a violência associada ao desporto, e, particularmente ao futebol, é, por definição, uma forma específica de comportamento anti-social. Ela tem a particularidade de ocorrer no contexto de competições, que, pela forte carga emotiva que geram, acabam por servir, com frequência de pretexto ou oportunidade situacional para comportamento desviantes. Desde o surgimento do futebol tal como hoje o conhecemos, em 1863, (Dunning et al.,1994:7) em Inglaterra, que esta modalidade desportiva tem sido assolada por alguns dos mais violentos incidentes na história do desporto, alguns dos quais sobejamente conhecidos, como a tragédia ocorrida no estádio de Heysel Park durante a final da Liga dos Campeões entre o Liverpool e a Juventus, a 29 de Maio de 1985, em Bruxelas, na Bélgica. Esta foi a primeira grande tragédia ocorrida no seio desta modalidade e veio alertar os Governos, assim como todas as instâncias reguladoras da actividade futebolística, para a necessidade de se implementarem medidas de controlo e prevenção deste tipo de incidentes.

Segundo Dunning et al. (2002:5), “Heysel and the overall reaction to it also represented a peak in the politicization of the English hooligan problem”.

A tragédia de Heysel Park não teve apenas repercussões a nível nacional e no campo político, mas também a nível europeu e na área policial. Segundo Gomes (513:2005), “a cooperação policial na segurança de eventos desportivos formalizou-se pela primeira vez, no âmbito do Conselho da Europa, na sequência da tragédia do estádio de Heysel, em 1985”.

Faleceram naquele fatídico dia 39 pessoas e resultaram inúmeros feridos. Como descreve Marivoet (2007:454):

(...) inicialmente as desordens e os tumultos deram-se nas bancadas. De seguida, os ingleses entraram numa área „neutra‟ com forte presença de italianos, agredindo-os e empurrando-os contra uma parede que se veio a desmoronar, após terem sido lançados foguetes e petardos na bancada onde se concentravam os adeptos da Juventus. Ao desabamento da parede, que provocou a morte dos adeptos por esmagamento e asfixia, na sua maioria italianos (32 dos 39), seguiu-se a onda de violência e o estabelecimento do pânico geral.

Quatro anos mais tarde, a 15 de Abril de 1989, aquando do jogo entre o Liverpool e o Notthingham Forest, no estádio de Hillsborough, em Sheffield, ocorreu outra grande tragédia estando os adeptos do Liverpool novamente envolvidos. Marivoet (2007:454) refere ainda que os incidentes foram tão graves que:

1

http:// www.eu2007-pt/NR/rdonlyres/0CF505CA-20B9-4379-A0C8-97AF672E5494/0/20071129DiscursodoMAIviolencianodesporto.pdf

(17)

6 (…) a polícia viu-se obrigada a abrir os portões de uma das entradas no estádio, devido a fortes tumultos no seu exterior, o que levou ao desabamento da arquibancada do sector, por excesso de lotação, provocando 170 feridos e 95 mortes.

Como resultado destes incidentes foram tomadas algumas medidas, umas delas punitivas, como a proibição imposta aos clubes ingleses de participarem em qualquer competição europeia desde a data dos factos até ao ano de 1989 e outras preventivas e relacionadas com a adopção de medidas de segurança, como, por exemplo, a instalação de assentos em todos os estádios ingleses, evitando assim, as sobrelotações das bancadas. Estas medidas de segurança e prevenção resultaram de um relatório elaborado pelo Juiz conselheiro Taylor.

Desde essa altura, outros incidentes aconteceram, contudo, de menor gravidade, fruto da sucessiva produção legislativa e regulamentar direccionada para a implementação e execução de medidas e procedimentos desde o controlo e condução de adeptos aquando das deslocações realizadas por estes, às revistas de prevenção e segurança, impedindo que os adeptos acedam ao interior dos estádios com objectos que possam servir para a prática de actos ilícitos que ponham em causa a vida ou a integridade física, quer de outros adeptos, quer dos agentes desportivos, passando pela melhoria das condições infra-estruturais dos estádios em matéria de segurança, à implementação de circuitos fechados de televisão como medida dissuasora e de identificação de possíveis autores de actos proibidos no interior dos estádios, à utilização de assistentes de recinto desportivo (Stewards) e, em última análise, à forma de actuação das forças de segurança, quer na sua vertente preventiva, quer repressiva.

Apesar da implementação e execução de todas estas medidas os actos de violência associados ao futebol parecem ocorrer cada vez em maior número – o que é preocupante – contudo, até hoje não se verificaram incidentes de tamanha gravidade como os ocorridos no jogo entre o Liverpool e a Juventus no estádio de Heysel Park, em Bruxelas ou em Sheffield, no estádio de Hillsborough, aquando do encontro entre o Liverpool e o Notthingham Forest.

1.2–O PODER ECONÓMICO, OS MEDIA E A MASCULINIDADE

O futebol enquanto modalidade desportiva dominante no panorama mundial reúne três ingredientes fundamentais que levam a que esta modalidade esteja numa posição privilegiada para ser palco de actos de violência. O primeiro prende-se com a dimensão económica deste desporto que permite a realização de algumas excentricidades por parte

(18)

7 dos clubes, como por exemplo, a realização de transferências milionárias2, a atribuição de salários astronómicos3 a alguns jogadores e a construção de infra-estruturas imponentes4 que servem de suporte a esta modalidade, tais como os estádios, as academias ou os centros de treino e formação onde são investidos largos milhões de euros. Perante esta situação, é possível verificar que os clubes de futebol que outrora não passavam de associações desportivas, nos últimos anos têm vindo a ganhar uma importância e notoriedade, tanto a nível social, como a nível económico que faz com que hoje em dia contribuam para o que correntemente se tem vindo a designar de uma indústria ‒ a grande indústria do futebol ‒, que através das academias dos clubes transforma "matéria-prima", ou seja, jovens com talento, num produto final, que são os jogadores profissionais. Assim, depois de transformada, esta "matéria-prima" pode ser comercializada, gerando receitas para os clubes.

Os clubes têm também a trabalhar para si em a tempo inteiro um conjunto de funcionários especializados, como os treinadores, preparadores físicos, directores desportivos, directores de marketing, directores financeiros, entre outros, que contribuem activamente para a saúde económico-financeira do clube, para a melhoria e aperfeiçoamento dos seus jogadores de futebol, e para a “boa imagem” dos clubes que as cenas de violência praticadas pelos adeptos dos mesmos muitas vezes vêm denegrir. Como vemos, estamos perante autênticas empresas, muitas delas, cotadas na bolsa, que movimentam milhões e milhões de Euros e que alimentam toda esta "grande indústria" em que se tornou o futebol.

Esta excentricidade económica associada ao facto desta modalidade ser uma modalidade apaixonante, quer pela sua simplicidade5, quer pelo conjunto de emoções e sentimentos que a mesma desperta nos seus adeptos, levou ao surgimento do interesse dos media6,dando estes cada vez maior ênfase a todos os acontecimentos que ocorrem no âmbito do futebol, onde se inserem naturalmente os actos de violência praticados pelos adeptos desta modalidade. Dados que comprovam esta importância são, a título de exemplo, as exorbitantes quantias pagas pelos media para terem a exclusividade dos direitos de transmissão7 dos jogos ou os inúmeros jornais e espaços informativos que dedicam a sua actividade a esta temática, quer através da difusão dos jogos, quer

2

Segundo o futebolfinance.com, na época desportiva 2009/2010 as 10 maiores transferências mundiais envolveram valores na ordem dos 437.900.000 Euros.

3

Os 10 jogadores mais bem pagos do mundo totalizaram um ordenado mensal de 7.998.000 Euros.

4

A construção e remodelação dos estádios para a realização do FIFA World Cup 2014 no Brasil irá custar 806.500.000 Euros.

5

Inicialmente o futebol começou por ter apenas 14 regras básicas enquanto o râguebi tinha 59, o que facilitava a compreensão e aprendizagem desta modalidade.

6

Roger Ingham refere o poder económico e os media como dois factores determinantes para a existência de violência no futebol (Vieira, 2003:18).

7

Segundo o site futebolfinance.com, o valor proveniente da venda colectiva dos direitos de transmissão televisiva de Liga Inglesa na época desportiva 2009/2010 atingiu um total de 893 milhões de Euros.

(19)

8 através do debate, da discussão e análise dos mesmos. Inúmeras vezes as aberturas dos espaços noticiosos, como os telejornais, são feitas com notícias relacionadas com o futebol, tal é a importância que este desporto reveste para os media.

Por último, temos os protagonistas da maioria dos actos de violência associados ao futebol, ou seja, os adeptos. Tendo como referência o estudo realizado por Nogueira (2007:121), os protagonistas dos actos de violência eram 96% do sexo masculino e 4% eram do sexo feminino. Esta constatação leva-nos a aceitar o facto de que esta modalidade desportiva é maioritariamente apreciada por indivíduos do sexo masculino. Deste modo, podemos afirmar que associada ao futebol está uma ideia de masculinidade e segundo Murphy et al. (1994:6), “a persistente e continuada definição do futebol como sendo um jogo de homens pode muito bem estar na origem de muitos dos seus actuais problemas”.

Esta ideia de masculinidade é bastante visível nas claques dos clubes de futebol. Segundo Marivoet (2007:550):

(…) os seus membros[das claques]transportam uma forte incorporação dos valores tradicionais masculinos, que impelem ao resgate da honra, quando esta é ameaçada, encontrando-se assim os ingredientes para a confrontação violenta entre as partes, já que, assumidamente, provocam e ao mesmo tempo se sentem impelidos a ripostar as afrontas que recebe.

Como referem estes autores, os valores tradicionais masculinos ligados ao futebol, sobretudo, através das claques são elementos geradores de actos de violência. Este facto ajuda-nos a compreender as subculturas de adeptos, onde, como vários autores têm vindo a salientar, os comportamentos esperados se encontram associados à masculinidade como factor gerador de violência.

1.3–SUBCULTURAS DE ADEPTOS –HOOLIGANS/CASUALS E ULTRAS

As subculturas de adeptos existentes têm estado desde sempre ligadas a actos de violência. Para este facto contribuem um conjunto de características comuns às subculturas de adeptos existentes, nomeadamente, um forte envolvimento emocional, uma forte identificação e afiliação com os seus clubes e uma incorporação de valores da cultura tradicional masculina ocidental, nomeadamente a associação da força física à virilidade e superioridade e a reprodução de um código de honra que constrange à vingança quando esta é afrontada (Williams, Dunning e Murphy, 1984; Williams, 1992; Murphy, Williams e Dunning, 1994; Comeron, 1997; Dunning, 1999; Finn e Giulianotti, 2000; Armstrong e Giulianotti, 2001; Dunning et al., 2002; Marivoet, 2007:512).

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9 sociais, todavia, no caso da subcultura Hooligan ainda se verifica uma predominância das classes sociais com menores recursos. Quanto à idade dos seus membros, inicialmente as subculturas de adeptos estavam associadas às franjas mais jovens da população, contudo, actualmente, são constituídas por membros de quase todas as classes etárias. São ainda comuns às duas subculturas a existência de membros que perfilham ideais de extrema-direita, o nacionalismo extremo, a xenofobia e o racismo, todavia, existem pequenas diferenças de país para país dependendo dos contextos culturais e históricos de cada um. Estas subculturas de adeptos diferem ao nível da organização. Enquanto a subcultura Hooligan é constituída por gangs pouco estruturados em que os actos de violência são premeditados, a subcultura Ultra constitui-se por organizações que possuem uma direcção definida com um líder formal e encontram-se inseridas no associativismo desportivo.

1.3.1–SUBCULTURA HOOLIGAN/CASUAL

A subcultura de adeptos Hooligan surgiu na década de 60 em Inglaterra. Esta subcultura surgiu na periferia das cidades inglesas, dado que estas zonas eram zonas onde habitavam pessoas mais desfavorecidas quer a nível social, quer economicamente (Dunning, Murphy e Williams, 1988; Murphy, Williams e Dunning, 1994). Como refere Marivoet (2007: 511), a subcultura foi "criada por gangs de skinheads que viviam em zonas urbanas desfavorecidas onde imperava a street culture associada à rixa e à confrontação entre bairros rivais".

Posteriormente, os ideais desta subcultura alastraram-se a outros países do Norte da Europa, nomeadamente, Bélgica, Holanda e Alemanha. Este alastramento da subcultura Hooligan a outros países, segundo Van Limbergen, "constituiu uma forma de resistência ao comportamento desafiador dos Hooligans ingleses, aquando das deslocações ao continente, por ocasião das competições internacionais" (Limbergen, 1997; Ap. Marivoet, 2007:511).

Mais tarde, na década de 80, destacou-se desta subcultura uma nova subcultura, a designada subcultura Casual. Os membros desta subcultura caracterizam-se por serem portadores de um comportamento discreto em público, observando com distanciamento e premeditando estrategicamente os seus actos. Utilizam as novas tecnologias tais como as mensagens escritas através do telemóvel e os emails para marcarem as acções de confrontação. Estas acções de confrontação normalmente passam pela luta corpo a corpo. Outra das características dos Casuals é o facto de vestirem roupas de determinadas marcas, nomeadamente, Armani, Stone Island, Burberrys, Ralph Lauren e Lacoste (Marivoet, 2006:72).

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10

1.3.2–SUBCULTURA ULTRA

A subcultura Ultra surgiu um pouco mais tarde, em Itália, na década de 70 num contexto de luta e critica social (Marivoet, 2007:511). Inicialmente, como refere a autora, encontrava-se associada a membros de extrema-esquerda que se envolviam em lutas urbanas. Mais tarde, agregaram-se a esta subcultura membros da extrema-direita. Esta subcultura nascida em Itália como já referimos, estendeu-se aos países do Sul da Europa, nomeadamente a Portugal. Apenas na década de 90 começaram a surgir em Portugal as primeiras claques identificadas com a subcultura Ultra (Marivoet, 2007:519).

Esta subcultura caracteriza-se por uma forte coesão entre os seus membros, por um forte apoio ao clube, quer através de cânticos, quer através de bandeiras e cachecóis contendo as insígnias da subcultura Ultra. Durante os jogos apresentam uma imagem dura revelada através de mosh’s, rebentamento de artefactos pirotécnicos e de efeitos sonoros. Marivoet (2007:550) refere a este propósito que:

(...) a mentalidade Ultra, caracteriza-se (…) por valores de identidade exacerbados, de entrega total ao colectivo clubístico, de defesa das cores do clube até às últimas consequências e de uma atitude provocatória demonstrada através de cânticos e mensagens.

As formas de violência utilizadas pelos membros da subcultura Ultra são difusas e podem passar pelo arremesso de objectos e pelos actos de vandalismo.

Em Portugal, algumas das claques seguidoras desta subcultura são a Juve leo e a Torcida Verde, ambas do SCP, os Super Dragões, do FCP, os White Angels, do VSC e os No Name Boys e os Diabos Vermelhos, ambas do SLB.

1.4–OBSTÁCULOS À PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA ASSOCIADA AO FUTEBOL

Embora haja por parte das forças de segurança um esforço constante de aperfeiçoamento e melhoria das medidas policiais de prevenção e de combate ao fenómeno da violência associada ao futebol, parecem existir um conjunto de obstáculos que dificultam a efectivação de uma prevenção eficaz por parte destas. De seguida iremos abordar um conjunto de factores que parecem contribuir para dificultar a erradicação da violência associada aos espectáculos de futebol.

1.4.1–OS MEDIA

O mediatismo de que o futebol é alvo, tal como referimos anteriormente, é um dos elementos que pode levar à existência de actos de violência. Pretendemos agora, de uma

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11 forma mais profunda, analisar de que forma os media contribuem para a existência desses actos de violência.

Em primeiro lugar gostaríamos de referir a atenção dada pelos media aos actos de violência perpetrados pelos adeptos de futebol. Neste âmbito, constatamos que:

(...) the intense media searchlight led to large numbers of incidents being regularly

observed and reported, amplifying the problem in two senses: first perceptually, by making it appear that more (and more serious) incidents were occurring than was objectively the case; and secondly by providing the oxygen of anonymous publicity which so many Hooligans crave, in that way helping to sustain and even to increase the frequency of their Hooligan involvements. (Dunning et al., 2002:5)

Como vemos, a dimensão que os media atribuem aos actos de violência executados pelos adeptos faz com que, por um lado, esses actos pareçam ser mais graves do que são na realidade e, por outro, motiva e leva os adeptos violentos a executarem novos actos de violência.

Cohen refere também que "no campeonato do mundo de 1966 a imprensa popular começou a enviar jornalistas aos jogos com a exclusiva finalidade de relatarem o comportamento dos espectadores e não o jogo em si" (Murphy et al.,1994:117).

Já Clark (1978) refere que:

(…) os jornais prosperam, não simplesmente porque imprimem as histórias mais interessantes em relação às notícias, mas porque põem em evidência o aspecto mais cativante de uma história através das notícias. Há, por isso, uma tendência progressiva em tratar as notícias de forma a isolar e identificar a perspectiva mais dramática. (Ap. Vieira, 2003:20)

Esta publicidade constante feita ao longo dos anos pelos media dos incidentes de violência perpetrados pelos adeptos, em geral, e pelas claques, em particular, acaba por “atrair” delinquentes para o seio das mesmas. Segundo Seabra (2009:302), a difusão:

(...) de algumas notícias sensacionalistas atraíram para as claques alguns jovens já com carreiras de delinquência no seu quotidiano e que perspectivaram a pertença a estes grupos como uma oportunidade para continuarem tais actividades, sendo estas facilitadas pela percepção de um certo anonimato e desresponsabilização decorrente da inserção num grupo numeroso.

Como observamos, este “recrutamento” involuntário de delinquentes feito pelas claques é fruto do contributo dado pelos media no que concerne à “publicidade” dos actos de violência associados ao futebol. Este facto tem vindo a desvirtuar a finalidade das claques, ou seja, apoiar o clube de forma entusiástica e constante. Deste modo, a actividade de alguns media ajudou a transformar as claques que até então se dedicavam a apoiar o clube, em grupos com um número considerável de delinquentes na sua

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12 estrutura, que têm como objectivo fundamental, não apoiar o clube, mas sim praticar actos de violência encobertos pela restante multidão pertencente à claque. Este encobrimento dos membros da claque faz com que os delinquentes inseridos na mesma pratiquem os actos ilícitos e raramente sejam descobertos ou identificados pelas forças policiais. Tal facto traduz-se num sentimento de impunidade por parte dos prevaricadores, levando-os a continuar a sua actividade e a agravar a natureza dos actos praticados.

Outro contributo dos media para a existência de actos de violência encontra-se relacionado com a difusão das mensagens que os presidentes dos clubes emanam e cujo conteúdo das mesmas poderá levar à execução de actos menos correctos por parte dos adeptos. Exemplo desta situação é o recente arremesso de maçãs no jogo que opôs o SCP ao FCP e que se deu devido ao facto do Presidente do SCP ter dito aquando da transferência de um jogador deste clube para o FCP que o mesmo era uma “maçã podre”.

1.4.2–OS ADEPTOS E AS CLAQUES

O anonimato e o sentimento de impunidade de que falámos anteriormente associados a uma forte coesão existente nas claques levam a que os indivíduos pertencentes às mesmas possam praticar actos ilícitos e dificilmente serem detectados e identificados pelas forças de segurança, resultando este facto das designadas solidariedades mecânicas8. Como refere Marivoet (2007:552):

(...) o reforço da coesão no seio das claques foi-se, também, manifestando quer de forma simbólica, quer nas acções de violência. Os rituais de mobilização das claques comportam, regra geral, manifestações de demarcação provocatória e de hostilidade, accionando solidariedades mecânicas que garantem a coesão dos colectivos para o apoio, a afronta, ou a luta.

Como forma de combater a violência resultante do anonimato e sentimento de impunidade vivido no seio das claques foram recentemente introduzidas no quadro legal algumas medidas de detecção dos elementos prevaricadores pertencentes às mesmas. Exemplo destas medidas são o “incremento da vigilância nos estádios através de CCTV, a introdução de elementos policiais à civil (spotters) no seio dos adeptos e a existência de um maior controlo na identificação dos membros das claques” (Marivoet, 2009:292).

Por último, outra das dificuldades com que as forças de segurança se deparam, resulta da presença das claques junto dos adeptos. A polícia é vista como um inimigo e a sua presença junto dos adeptos pode por si só potenciar a ocorrência de actos de

8

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13 violência, daí o surgimento dos spotters, elementos à civil, embora identificados, pouco ostensivos que fazem um controlo e um contacto eficaz com os adeptos.

1.4.3–OS CLUBES E SEUS DIRIGENTES

Os dirigentes dos clubes em determinadas ocasiões constituem também um obstáculo à prevenção de actos violentos para as forças de segurança dado que por diversas ocasiões assistimos os dirigentes de alguns clubes a incitarem numa fase inicial, quer directamente, quer indirectamente os seus sócios, adeptos e claques a desencadearem comportamentos violentos como meio de reacção a um sentimento de injustiça. Assistimos também a uma atitude antagónica e contraditória por parte dos dirigentes dos clubes, que relativamente a um mesmo acto praticado pela claque do seu clube e pela claque do clube adversário tendem a desvalorizar os danos causados pela sua claque e a enfatizar os danos causados pela claque adversária. Juntamos a isto a conivência de algumas direcções ao facilitarem, por exemplo, a introdução de objectos proibidos no interior do recinto desportivo. Como refere Marivoet (2009:290):

(...) os factos sugerem que as relações de hostilidade foram sendo empreendidas pelos respectivos elencos directivos dos clubes, tendo as claques vindo a corporalizá-los de forma autónoma e violenta, sem que daí tivesse resultado qualquer agravamento das mesmas. A este propósito são elucidativas as posições que foram tomadas pelos dirigentes desportivos, principalmente na segunda metade dos anos noventa, em que, apesar de condenarem e de se demarcarem das práticas de violência das claques, terão desvalorizado os incidentes provocados pelas mesmas afectas aos seus clubes, em detrimento da sobrevalorização dos cometidos pelos clubes rivais, aproveitando-os regra geral, como argumento de acusação.

Tal como referimos anteriormente, as palavras dos dirigentes só surtem efeito devido à ampla divulgação das mesmas por parte dos media.

Um segundo e último contributo dos dirigentes dos clubes para a existência de actos de violência encontra-se relacionado com o contributo activo para o aumento do sentimento de injustiça e desconfiança em relação à verdade desportiva, o que desperta nos adeptos uma vontade de fazer justiça pelas próprias mãos. Esta justiça acaba invariavelmente em actos de violência contra os adeptos de um clube adversário, contra a equipa adversária, contra os agentes desportivos e, em última instância, contra as forças policiais.

1.4.4–A LEGISLAÇÃO E OS REGULAMENTOS

Com o decorrer dos anos e com o aumento dos actos e violência no interior dos recintos desportivos tornou-se imperativo legislar sobre esta matéria, contudo,

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14 constatamos, que a legislação vigente apresenta em certos aspectos limitações à actuação das forças de segurança e parece ser ineficaz em outros aspectos.

Vejamos neste âmbito, as revistas de prevenção e segurança realizadas pelos assistentes de recinto desportivo. Ao abrigo do Artigo 25.º, n.º4 da Lei n.º 39/2009, de 30 de Julho, as revistas de prevenção e segurança só são obrigatórias para os GOA, logo se existir uma claque que não esteja registada como GOA, os clubes não têm obrigação legal de providenciar para que os membros dessa claque sejam sujeitos a essa revista, cabendo nesses casos às forças de segurança providenciar nesse sentido, se assim entenderem.

O facto das claques não se encontrarem registadas constitui também um obstáculo, pois dificulta o trabalho preventivo das forças de segurança, pois não estando registadas não há a obrigatoriedade de terem um corpo directivo e, por consequência, um líder formal identificado, que aquando da realização dos jogos seria o elo de ligação entre o GOA e os elementos policiais. Verificando-se nas claques, especialmente nas pertencentes à subcultura Ultra, uma determinada hierarquia, torna-se mais fácil para as forças de segurança controlarem os líderes dessas claques, e por consequência os restantes elementos da claque, o que permite prevenir e dissipar a ocorrência de actos de violência perpetrados pelas mesmas.

Outro aspecto a ter em conta, no que à legislação diz respeito, está ligado à aplicação efectiva de medidas punitivas para quem tenha uma conduta que incite à execução de actos de violência, especialmente os dirigentes desportivos. Embora estejam previstas no Artigo 14.º, n.º4 e n.º6 da Lei n.º 39/2009, de 30 de Julho, penas para os comportamentos de incitamento e apoio à violência por parte dos corpos directivos dos clubes, a verdade é que não se assiste a uma aplicação efectiva dessas penas, em Portugal.

Por último, outro dos principais problemas que se tem vindo a alastrar tem a ver com a deslocação dos incidentes do interior do estádio para o exterior e para os percursos dos adeptos. De acordo com vários autores, esta realidade deve-se ao aumento da regulamentação e implementação de medidas preventivas no acesso e interior dos mesmos (Stott et al., 2001; Adang e Cuvelier, 2001; Dunning et al., 2002; Marivoet, 2006). Segundo Marivoet (2007:553), esta tendência tem vindo a abrir:

(…) espaço ao surgimento de práticas de violência mais difusas e pouco previsíveis, por vezes assumindo formas de retaliação, suscitando pânicos e sentimentos de insegurança, a par do aumento dos confrontos com as próprias forças policiais (…) Esta realidade (…) é resultado de processos dinâmicos, em articulação com as medidas de segurança e estratégias policiais.

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15 Estes factos deram lugar às designadas “esperas” que consistem numa barricada feita aos elementos da equipa e adeptos adversários na sua deslocação para o estádio.

Não existindo uma delimitação geográfica da possibilidade de ocorrerem actos de violência, torna-se muito complicado para as forças de segurança conseguir evitar que estas situações aconteçam.

1.4.5–AS EMOÇÕES DO JOGO

O futebol caracteriza-se por ser um desporto que mexe com a nossa personalidade (Dunning et al., 1994:6), pois dele advêm um conjunto de emoções e sentimentos tanto para quem o pratica, como para o público que assiste à prática desta modalidade. Para Hopcraft, "há algo no futebol que desperta as paixões" (Hopcraft; Ap. Dunning et al., 1994:7).

Como referimos anteriormente, as emoções fazem parte do desporto em geral, e do futebol em particular. Tudo o que envolve emotividade representa uma dificuldade acrescida para as forças de segurança, dado que um individuo quando se encontra exaltado encontra-se simultaneamente predisposto para praticar actos de violência, e tende também a desobedecer ou não acatar as ordens dos elementos policiais. Isto faz com que as forças de segurança tenham de fazer uso da força física, o que por si só já é considerado um acto de violência. Como sabemos, violência gera mais violência, o que dificulta o trabalho das forças de segurança, pois com a sua atitude repressiva com recurso ao emprego da violência geram mais violência.

Pelas razões referidas anteriormente podemos então afirmar que a sociedade vê no futebol uma forma de catarse social, ou seja, uma descarga emocional de agressividade muito grande. Esta característica imputada ao futebol faz com que a sociedade seja uma das principais culpadas da violência associada ao futebol, porque tem vindo a reconhecer neste desporto uma grande conflitualidade. Também, quanto mais a sociedade permitir ou tolerar o uso da força física, mais violência ocorrerá nas diferentes esferas da vida social, sendo que o futebol é uma delas.

Outro facto que pode desencadear actos de violência tem a ver com as decisões do árbitro no decorrer do encontro, ou seja, se houver uma decisão mal acolhida pelos adeptos pode levar a um sentimento de revolta por parte destes, levando-os a reagir com actos de violência, que podem passar pelo arremesso de objectos para o campo de jogo ou invasão do mesmo. Esta realidade coloca em evidência a importância da percepção do sentido de justiça na prevenção do uso da força física por parte dos indivíduos, sendo que, quando as desconfianças são grandes, como não raras vezes acontece no futebol, e sobretudo quando estas são alimentadas pelos dirigentes e pelos media como acima

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16 referimos, os adeptos tendem a sentir-se legitimados para agirem em defesa dos seus clubes, através de actos de violência que pretendem fazer "justiça pelas próprias mãos", o que cria enormes obstáculos à acção preventiva das forças de segurança no terreno.

1.4.6–PROBLEMÁTICA DE INVESTIGAÇÃO, OBJECTO E HIPÓTESES DE TRABALHO

A violência associada aos espectáculos de futebol parece aumentar ano após ano, o que faz com que haja uma preocupação crescente não só para as instâncias reguladoras desta modalidade, mas também para os adeptos e para a sociedade em geral. Com a realização do presente trabalho pretende-se saber quais os obstáculos à prevenção da violência associada ao futebol por parte da PSP.

Da análise bibliográfica que efectuamos no presente capítulo podemos constatar de forma resumida um conjunto de obstáculos.

Relativamente aos media verificamos que a difusão, muitas vezes exagerada e repetitiva dos actos de violência praticados pelos adeptos e pelas claques no âmbito das competições de futebol, captam a atenção de delinquentes que vêem nas claques o sitio ideal para praticarem ilícitos criminais sem serem identificados e levados à justiça (Seabra, 2009:302). Também as mensagens dos dirigentes dos clubes que são amplamente difundidas pelos media em determinadas ocasiões, incitam à violência por parte dos seus associados e adeptos, tendo sempre por base um sentimento de injustiça desportiva (Marivoet, 2007:553) que permite, segundo eles, que se utilizem formas de protesto violentas para pôr cobro a essas supostas situações de injustiça para com os seus clubes, revelando-se assim como um factor gerador de violência.

No que diz respeito aos adeptos e claques, verificamos que a forte coesão existente no seio dos adeptos, principalmente os pertencentes às claques, e a visualização das forças de segurança como inimigas os impele à afronta, à luta e ao resgate da honra quando esta é ameaçada, transmitindo uma sensação de impunidade (Marivoet, 2007:552) que dificulta o trabalho de detecção e identificação dos autores dos ilícitos por parte das forças de segurança, constituindo, por essa razão, um obstáculo à prevenção de actos de violência.

Relativamente à legislação e aos regulamentos desportivos, constatamos, que a obrigatoriedade de revista de prevenção e segurança apenas para os GOA faz com que os clubes não tenham obrigatoriedade de providenciar, no sentido de que sejam efectuadas revistas de prevenção e segurança para as claques não registadas como GOA, cabendo então às forças de segurança providenciar nesse sentido. A falta de registo das claques como GOA dificulta a comunicação entre as forças policiais e essas mesmas claques, dado não existir um líder formal, nem uma direcção que dirija os

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17 membros da claque. Outro obstáculo que verificamos foi a falta de efectivação de medidas punitivas quer para os dirigentes, quer para as claques e adeptos, isto é, a legislação prevê a punição dos autores de determinados comportamentos, contudo, não há uma aplicação efectiva de nenhuma punição para os mesmos.

Verificámos também que a produção legislativa e regulamentar em torno dos espectáculos desportivos, em especial do futebol, veio provocar uma deslocalização dos actos ilícitos do interior para o exterior dos estádios (Marivoet, 2007:553) resultando isto num novo obstáculo à prevenção da violência por parte das forças de segurança.

Por último, verificamos na bibliografia consultada, que o futebol é um desporto que desperta paixões (Dunning et al., 1994:6). Deste modo, o conjunto de emoções que se vivem em torno de uma partida de futebol fazem com que muitos adeptos se exaltem caso o jogo não esteja a correr de forma positiva para a sua equipa. Esta exaltação, associada ao facto das pessoas reconhecerem no futebol uma forma de catarse social e associada também a uma decisão menos correcta do árbitro pode, em certas ocasiões, levar à consumação de actos de violência graves e nefastos por parte dos adeptos, quer no interior, quer no exterior do estádio. Este facto, pela sua imprevisibilidade, torna-o em algo muito difícil de ser controlado e prevenido pelas forças de segurança.

Posto isto, de forma a darmos resposta à nossa pergunta de partida, e tendo por base as contribuições dos autores referenciados neste capítulo, definimos como objecto de estudo da presente investigação, identificar e aprofundar os obstáculos com que as forças de segurança se deparam aquando da realização de um jogo de futebol, e em particular, os que colocam mais dificuldades à eficácia da prevenção.

Para podermos analisar melhor o nosso objecto de estudo levantamos as seguintes hipóteses:

Continua a verificar-se uma tendência para o aumento dos actos de violência associados ao futebol (Hipótese I). Os obstáculos identificados na análise bibliográfica e mencionados neste capítulo apenas se constituem em parte como obstáculos na prática. (Hipótese II).Na operacionalização prática das medidas de segurança estabelecidas legalmente, existirão a saber, obstáculos que não se encontram abordados na bibliografia existente (Hipótese III).

Por fim, após identificarmos os obstáculos no terreno, tentaremos encontrar soluções, se possível, para superá-los de modo a reduzir a ocorrência de actos de violência associados ao futebol. Assim, com a presente investigação pretendemos identificar quais os obstáculos que se colocam no terreno à acção preventiva das forças de segurança.

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18

CAPÍTULO II – ESTRATÉGIA DE INVESTIGAÇÃO

Neste capítulo será apresentada toda a metodologia a utilizar no desenvolvimento do presente estudo. Serão expostos os procedimentos utilizados na concepção do modelo de análise, que operacionaliza as hipóteses, de modo a aprofundar o objecto em estudo, os métodos e técnicas de investigação e a caracterização do universo de análise.

2.1–METODOLOGIA OU MODELO DE ANÁLISE

Para o estudo do presente tema mostrou-se pertinente levantar um conjunto de hipóteses que nos permitissem aferir em que medida a violência associada aos espectáculos de futebol está a evoluir, se os obstáculos já inúmeras e repetidas vezes mencionados por diversos autores se verificam efectivamente, quer seja na sua totalidade ou em parte, e por último, se houve um surgimento de novos obstáculos ou se existem obstáculos que têm sido ignorados pelos diversos autores nos estudos realizados em torno deste fenómeno.

Tendo em vista o estudo e verificação das hipóteses, mostrou-se necessário consultar um conjunto de documentação de natureza estatística, assim como, criar um conjunto de mecanismos de análise que permitissem, não só qualificar, mas principalmente quantificar, de forma sistemática, a incidência com que ocorrem determinados factos que dificultam em grande medida o trabalho de prevenção da violência levada a cabo pela PSP, no âmbito dos espectáculos de natureza desportiva, mais concretamente, dos espectáculos de futebol.

Tendo por base o que foi acima descrito, de seguida, serão mencionadas as hipóteses em investigação, e o modo como as mesmas irão ser operacionalizadas no terreno. Assim, na verificação da primeira hipótese, que pressupunha que continuaria a verificar-se uma tendência para o aumento dos actos de violência associados ao futebol (Hipótese I), analisaremos de que forma a violência associada aos espectáculos de futebol tem evoluído, e ainda a variação que os tipos de incidentes considerados nos relatórios oficiais da PSP a seguir descritos, têm tido ao longo das últimas épocas desportivas:

 Invasão de campo;

 Agressões/injúrias às forças de segurança;  Posse/uso de artefactos pirotécnicos;  Arremesso de objectos;

 Vandalismo;

 Posse/consumo de estupefacientes;  Adeptos alcoolizados;

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19  Desordem entre adeptos;

 Colocação de faixas ofensivas;  Roubo/furto a adeptos;

 Furto em estabelecimentos; e,  Outros.

No presente trabalho levantámos também a hipótese de que os obstáculos identificados na análise bibliográfica apenas se constituem em parte como obstáculos na prática (Hipótese II). Da análise bibliográfica levada a cabo no capítulo I deste trabalho, verificaram-se os seguintes obstáculos:

A actuação dos media;

 A actuação dos adeptos e das claques;  A actuação dos clubes e dos seus dirigentes;  A legislação e os regulamentos;

 As emoções do jogo.

De modo a verificarmos a veracidade desta hipótese, serão feitas observações no terreno, quer numa perspectiva policial, quer numa perspectiva do adepto. Será também efectuada uma análise sistemática de todos os relatórios de policiamento desportivo elaborados pela PSP em que existiram incidentes, de modo a verificar se, de facto, os obstáculos mencionados no Capítulo I se corroboram, na totalidade ou em parte no terreno, e de que forma se manifestam.

Em terceiro e último lugar, considerámos que na operacionalização prática das medidas de segurança estabelecidas legalmente, existirão a saber, obstáculos que não se encontram abordados na bibliografia existente (Hipótese III). Para aferir a existência e veracidade desta hipótese far-se-á, mais uma vez, uma análise sistemática aos relatórios de policiamento desportivo elaborados pela PSP, e ter-se-á em consideração as observações dos jogos, as entrevistas informais feitas no terreno aos elementos policiais e os inquéritos feitos aos spotters pertencentes à UMID do COMETLIS da PSP, de modo a verificar se existem outros obstáculos que não os mencionados no Capítulo I do presente trabalho.

Tendo por base as fontes de informação, tais como os relatórios de policiamento desportivo, observações dos jogos e entrevistas informais, foi-nos possível identificar os seguintes obstáculos à prevenção da violência associada ao futebol por parte das forças de segurança:

 Problemas/deficiências ao nível das infra-estruturas e equipamentos;  Falta de comunicação entre o IDP e as forças de segurança;

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20  Comunicação ineficaz antes do inicio dos jogos entre os diversos responsáveis

pela segurança do evento;

 Inexistência de tampões de segurança ou zonas limpas de separação dos adeptos;  Existência de barreiras ténues entre os GOA e os restantes adeptos;

 Deficiências nas revistas de prevenção e segurança à entrada dos estádios;  Deficiências nos sistemas de videovigilância dos estádios;

 Dificuldade em detectar os infractores/prevaricadores;

 Dificuldade no controlo de grupos de adeptos violentos autores de actos de vandalismo no exterior dos estádios;

 Difícil identificação dos autores de arremesso de objectos e de engenhos pirotécnicos tanto no exterior como no interior dos recintos desportivos.

Decorrentemente, pretendemos indagar em que medida estes obstáculos se constituem ameaças à prevenção policial dos incidentes de violência nos jogos de futebol, recorrendo para o efeito a técnicas de investigação como veremos de seguida.

2.2–MÉTODOS E TÉCNICAS DE INVESTIGAÇÃO

No presente estudo, como já foi referido anteriormente, serão usados alguns métodos e técnicas de análise, nomeadamente, a recolha documental, que consistirá:

i) Análise de bibliografia e documentação, nomeadamente de 72 relatórios de policiamento desportivo em que ocorreram incidentes na época desportiva transacta, de modo a identificar possíveis obstáculos ao desempenho eficaz das forças de segurança na prevenção da violência associada aos espectáculos de futebol.

ii) Análise dos dados estatísticos oficiais da PSP que nos permitiu analisar qual a evolução deste fenómeno na sua área de actuação, e quais os tipos de incidentes que mais frequentemente ocorrem aquando da realização de um jogo de futebol. Esta análise estatística foi feita com base nos dados disponibilizados pelo SEI, sistema informático da PSP. Os dados recolhidos são relativos ao expediente elaborado pelos elementos policiais aquando dos jogos de futebol.

iii) Observação participante que consistiu no acompanhamento dos spotters da UMID do COMETLIS da PSP, em todas as suas vertentes, desde o acompanhamento e controlo de adeptos, ao acompanhamento das equipas nas suas deslocações, à comunicação com os elementos responsáveis pelas claques e pelos clubes, à participação em reuniões em parte destinadas à discussão dos problemas relacionados com safety e security no decorrer dos jogos, entre outras tarefas. A observação participante foi realizada do ponto de vista do adepto, ou seja, acompanhando os jogos no seio da massa adepta de modo a visualizar obstáculos que não seria possível vislumbrar estando identificado como polícia. Por último, esta observação foi levada a

(32)

21 cabo na perspectiva do Comandante do policiamento desportivo, tendo em conta a recolha de possíveis dificuldades que o mesmo tenha na prevenção de actos de violência aquando da realização de um jogo de futebol. Para esta observação foi elaborado um protocolo de observação para cada jogo (ver Anexo A).

iv) Entrevistas informais aos elementos policiais que estão no terreno, de modo a identificar possíveis obstáculos que tenham vivido ou constatado através da sua própria experiência. Estas entrevistas informais, permitiram-nos também, a construção do questionário referido no ponto seguinte.

v) Foram aplicados por via informática, inquéritos por questionário (ver Anexo B, B1 e B2) aos spotters pertencentes à UMID do COMETLIS da PSP. Escolhemos os spotters deste Comando, por serem os que em nossa opinião têm maior experiência relativamente ao fenómeno em estudo. O inquérito foi aplicado a todos os 99spottersactualmente em actividade, tendo sido recebidos 50 inquéritos após várias insistências. Ainda assim, podemos considerar a nossa amostra representativa numa margem de erro médio de 4,9, numa margem de [2,94; 6,8] para intervalos de confiança de 95% (Bosscher e Claeys, 1986; Ap. Marivoet, 2001: 177)9. Estes questionários destinam-se à identificação de obstáculos com que os elementos policiais se deparam no desempenho da sua missão, e que dificultam a actuação policial no sentido de prevenir actos de violência, quer no exterior, quer no interior dos estádios de futebol.

vi) Por último, realizámos entrevistas em profundidade (ver Anexo C) a interlocutores privilegiados do comando policial.

2.3–UNIVERSO DE ANÁLISE

O universo de análise do presente estudo incide sobre a violência associada aos espectáculos de futebol policiados pela PSP. No estudo deste fenómeno procedeu-se a uma análise da evolução da violência associada aos jogos de futebol profissional da primeira liga (na presente época desportiva designada de Liga Zon Sagres), desde a época desportiva 2004/2005 até à época desportiva 2009/2010 (ver Anexo D). 9 √ Sendo: N= Universo da população n= Tamanho da Amostra

P= Probabilidade de ser escolhido (50) Q= Probabilidade de não ser escolhido (50)

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22 se também a uma análise dos relatórios de policiamento desportivo elaborados pela PSP nos jogos da Liga Zon Sagres na época desportiva 2009/2010 em que ocorreram incidentes (ver Anexo E).

Por último foram objecto de observação participante (ver Anexo F), no período compreendido entre 27 de Novembro de 2010 e 02 de Março de 2011, os seguintes jogos da Liga Zon Sagres, da Taça de Portugal, da Taça da Liga, da Liga dos Campeões e da Liga Europa:

Sporting Clube de Portugal (SCP) vs. Futebol Clube do Porto (FCP) - Liga Zon Sagres;

 Sporting Clube de Portugal (SCP) vs. LOSC Lille – Liga Europa;  Sport Lisboa e Benfica (SLB) vs. Schalke 04 – Liga dos Campeões;

 Sport Lisboa e Benfica (SLB) vs. Sporting Clube de Braga (SCB) – Taça de Portugal;

 Sport Lisboa e Benfica (SLB) vs. Sport Clube Olhanense (SCO) – Taça de Portugal;

Sport Lisboa e Benfica (SLB) vs. Clube Desportivo Nacional (CDN) - Liga Zon Sagres;

 Futebol Clube do Porto (FCP) vs. Sport Lisboa e Benfica (SLB) – Taça de Portugal;  Sporting Clube de Portugal (SCP) vs. Associação Naval 1º de Maio (AN 1º de

Maio) - Liga Zon Sagres;

Vitória Futebol Clube (VFC) vs. Sport Lisboa e Benfica (SLB) - Liga Zon Sagres; Sport Lisboa e Benfica (SLB) vs. Vitória Sport Clube (VSC) - Liga Zon Sagres;  Sport Lisboa e Benfica (SLB) vs. Estugarda – Liga Europa;

Sporting Clube de Portugal (SCP) vs. Sport Lisboa e Benfica (SLB) - Liga Zon Sagres;

 Sport Lisboa e Benfica (SLB) vs. Sporting Clube de Portugal (SCP) – Taça da Liga.

Através da estratégia de investigação acima delineada, tentaremos verificar em que medida os obstáculos mencionados anteriormente ocorrem no terreno.

Referências

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