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A prisão preventiva no direito Processual penal Brasileiro.

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Academic year: 2021

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FORENSE

A presente monografia final, intitulada "PRISÃO PREVENTIV A"

elaborada por _ FABIO AMABILE PATRÃO

e aprovada pela banca examidora composta pelos professores abaixo assinados, obteve aprovação com nota 9,5 LNove, virgula cinco), sendo julgada adequada para o cumprimento do requisito legal previsto no artigo 9" da Portaria nO 1. 886/94fMEC, regulamentado na UFSC pela Resolução nO 003/95/CEPE.

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I '" J ' , " ; Florianópolis (SC), 13 de dezembro de 1996

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PROF.

VAL~OBORINI

ORIENTADOR

-~L;JoAbES

MEMBRO

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a/J40,

PROFa. MONlfl

Ett~NTRES

MEMBRO

(2)

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

DEPARTAMENTO DE DIREITO PROCESSUAL E PRÁTICA FORENSE - DPP

A PRISÃO PREVENTIVA NO DIREITO

PROCESSUAL PENAL BRASILEIRO

Florianópolis (SC) 1996

FABIO AMABILE PATRÃO Acadêmico PROFO VALDEMIRO BORINI Orientador

(3)

FABIO AMABILE PATRÃO

A PRISÃO PREVENTIVA NO DIREITO

PROCESSUAL PENAL BRASILEIRO

Monografia apresentada ao Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Santa Catarina como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: PrafO Valdemiro Borini

Florianópolis 1996

(4)

"Nada, de fato, abate mais o homem de bem que o encarceramento, mesmo que não dure muito. Ainda quando a vítima da coação legal seja despronunciada ou absolvida, sairá da prisão diminuída. Aos olhos da família, dos amigos, daqueles com quem convive, da sociedade, enfim. Sua alma sofrerá sempre, seu conceito dificilmente se lavará desta mácula, que lhe será lançada ao rosto amanhã, deturpada, agravada, ou à face de seus descendentes, por algum perverso caluniador." (Anais do 1° Congresso Nacional do Ministério Público, v.

(5)

AGRADECIMENTO

Minha manifesta gratidão ao meu pai pelo apoio material e cultural prestado a mim durante a elaboração deste trabalho.

(6)

INTRODUÇÃO 2

CAPíTULO l-A PRISÃO COMO CAUTELA 7

CAPíTULO 11 - DA LEGITIMIDADE DA CAUTELA NO PROCESSO PENAL 12

2.1 Garantias Individuais 15

2.2 CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 1988 20

CAPíTULO 111- PRISÃO PREVENTIVA 28

3.1 -Requisitos J4

3.1.1 - Prova da existência do crime 35

3.1.2 -Indícios da autoria 36

3.2 -Finalidades da prisão preventiva 38

3.2.1 -Garantia da ordem pública .J I

3.2.2 - Conveniência da instrução criminal .J8

3.2.3 -Aplicação da lei penal 50

3.3 Ato judicial e fundamentação do despacho 52

CONSIDERAÇÕES FINAIS 57

(7)

INTRODUÇÃO

Ao analisarmos a evolução do pensamento jurídico-penal através dos séculos, desde o surgimento, nos primórdios da civilização, das primeiras formas de agrupamento entre seres humanos, até os dias atuais, com a consolidação da forma societária, nota-se que a pena foi o meio de exteriorização e materialização do pensamento jurídico-penal dominante à sua época.

Como nos ensina Odete Maria de OLIVEIRA, citando Emile DURKHEIM:

Observa-se do estudo evolutivo da pena, que em todas as épocas, com suas

diferentes civilizações, sempre houve uma grande variedade de punições e

uma diversidade abundante de instrumentos para executá-Ias. As mais elementares formas de punição eram sempre cruéis, selvagens e

desumanas e de incrível ferocidade, refletindo os costumes punitivos de

cada oTganização social e a formação cultural de cada povo. 1

Atualmente busca-se a função terapêutica e ressocializadora da pena, fazendo com que ela deixe de ser uma simples forma de vingar os delitos - uma punição através do castigo corporal, da dor física e da retirada do indivíduo da convivência com as outras pessoas, abandonando-o e deixando-o apodrecer esquecido em uma prisão - para se transformar no meio mais adequado de proporcionar a esse indivíduo a oportunidade de retorno ao convívio em sociedade, sendo aceito por esta e também aceitando-a com suas regras estabelecidas.

1 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão : um paradoxo social. Florianópolis: Ed. da UFSC I

(8)

É através da aplicação da pena, nas suas mais variadas formas, que os povos demonstram o pensamento jurídico-penal predominante em suas culturas.

Por esta razão, faz-se necessário um breve esboço da evolução das penas e do processo penal, assim como das garantias individuais, de modo a demonstrar a incompatibilidade entre os princípios individuais assegurados na Constituição, e o instituto da prisão preventiva.

o

presente trabalho não se propõe a criticar o referido instituto; visa apenas a alertar para os perigos do uso indevido da prisão preventiva, que, por vezes, acaba submetendo inocentes ao cárcere, desnecessariamente.

Beccaria, precursor do humanismo na Ciência Penal, com a publicação de sua brilhante obra, "dos delitos e das penas", no ano de 1764, conseguiu chamar a atenção de diversos especialistas no assunto, denunciando as condições injustas a que eram submetidos os acusados em geral, em um processo penal.

Para o referido autor, adepto da teoria contratualista, não era justo que o indivíduo, por ceder apenas uma pequena parcela de sua liberdade, podendo assim usufruir das vantagens de se viver em uma sociedade, tivesse que se sujeitar às normas de direito e de processo penal que vigoravam à época, excessivamente intervencionistas e destituídas de equivalência entre acusação e defesa, o que consequentemente aniquilava a segurança do administrado.

(9)

A evolução da pena acompanhou a evolução das sociedades e do pensamento da humanidade, sofrendo sua influência direta. A cultura dominante em cada época determinou qual a finalidade da aplicação da pena, ou seus objetivos.

Estes variavam conforme as transformações culturais das sociedades, o mesmo ocorrendo com os métodos utilizados na forma de apurar e de punir os delitos, ou seja, o processo e suas providências, cautelares ou não.

No início da convivência civilizada entre as pessoas, o homem viu-se diante da necessidade de aplicar penalidades aos indivíduos que praticassem condutas consideradas prejudiciais aos demais, primeiramente fazendo-o como forma de garantir a conservação de sua espécie, de sua moral e integridade.

Posteriormente, com o passar dos anos e a conseqüente evolução da sociedade, modificou-se a finalidade da pena, que passou a ser vista como forma de punição, de vingança das vítimas para com aquele que as vitimou, para isto utilizando-se do Estado e suas leis cruéis, de processos sem quaisquer garantias de defesa para o acusado, e aplicação de suplícios jamais imagináveis a um ser de nossa espécie.

Após séculos e séculos de barbáries cometidas pelas sociedades ditas civilizadas, foi sentida a necessidade de se buscar novas formas de punição, mais eficazes para o Estado e menos cruéis para os indivíduos, pois mesmo o pior dos delinqüentes deveria ser tratado como um ser humano, quando cumprindo a sua pena.

(10)

Em decorrência dessa necessidade, tem início um grande movimento na Europa, onde os reformadores pretenderam, além de abrandar as penas, com o desaparecimento dos castigos aflitivos e infamantes, também atacar a corrupção que dominava a justiça, ainda lacunosa, irregular e contraditória, onde instâncias múltiplas a denegriam e a submetiam ao superpoder monárquico.2

Foi a partir da segunda metade do séc. XVIII que vários reformadores construíram e divulgaram as suas teorias, com o intuito de tornar o direito e o processo penal um meio menos cruel do Estado promover a justiça.

Os reformadores intentavam não só uma nova teoria da justiça da pena, mas também que ela fosse melhor distribuída, não ficando à mercê do soberano ou favorecendo os privilegiados, ao ser exercida de forma justa e universal, e não por instâncias incapazes, confusas e antagônicas.3

Para tanto, o novo direito deveria deslocar-se da vingança suprema do soberano e estender-se à defesa da sociedade, abandonar seu caráter retributivo e caracterizar-se pela intimidação, atenuação da punição, codificação nítida dos crimes e sanções e formar um consenso a respeito da necessidade da prevenção do delito, pois o passado não retorna, mas o futuro será certo, e é para ele que o castigo deve ter função exemplar. 4

A conseqüência imediata de tais reformas foi a substituição das penas corpóreas impostas ao condenado, pela pena de reclusão, onde o criminoso não

2 OLIVEIRA , op. cit., p.24 3 OLIVEIRA, idem, ibidem, p. 25 4 OLIVEIRA, idem, ibdem, p. 26

(11)

mais era submetido aos terríveis castigos que lhe eram aplicados sobre o corpo, mas sim submetido ao encarceramento, sendo retirado do convívio social para que pudesse, solitariamente, pensar nos atos praticados e repensar sua conduta futura.

Assim, a aplicação da pena não tinha mais como objeto o corpo e a dor física do indivíduo. Passou-se a punir o criminoso através de um bem, de um direito muito mais valioso do que qualquer outro, que é o seu direito à liberdade.

Ocorre que, nessa época, o Estado não possuia mecanismos capazes de assegurar a aplicação das penalidades impostas ao delinqüentes, de modo que muitos deles refugiavam-se em lugares distantes da comunidade em que viviam, frustrando a atuação do jus puniendi .

O recolhimento provisório do indivíduo - retirando-se-Ihe a liberdade de locomoção até que fosse provada a sua inocência ou que se cumprisse as sanções que lhe eram atribuídas - foi o procedimento adotado como forma do Estado garantir a aplicação da pena, surgindo desde então, as chamadas prisões preventivas.

É importante frisar que a utilização da prisão preventiva deve estar em consonância com os princípios que regem o processo penal moderno, que em seu conjunto formam as garantias individuais, pois é através da segurança jurídica do processo, preservando a incolumidade física do indivíduo, que este atinge às suas finalidades.

(12)

CAPíTULO I - A PRISÃO COMO CAUTELA

MIRABETE define a prisão, em sentido jurídico, como "a privação da

liberdade de locomoção, ou seja, do direito de ir e vir, por motivo ilícito ou por ordem legal" 5 , distinguindo-as no direito brasileiro em várias espécies, cada qual com as suas particularidades e regras próprias, mas que de qualquer forma sempre irão acarretar na privação da liberdade do indivíduo.

Se analisarmos sob o ponto de vista do surgimento das mais variadas formas de punição, a pena de prisão é considerada uma criação recente do homem.

No início da civilização, a punição não era encarada de maneira individual, mas sim coletiva, sendo a pena imposta a todos os membros do grupo, tribo ou clã como forma de vingar o mal causado por um indivíduo dessa comunidade.

Com a evolução das sociedades primitivas, cresceram as coletividades, trazendo um conseqüente aumento de responsabilidade, tornada individual,6 em contraposição à responsabilidade coletiva predominante nos primórdios da civilização. Logo, não era mais o grupo que respondia pelos atos de seus integrantes, mas sim cada um, individualmente, responsabilizava-se por sua própria conduta.

5 MIRABETE, Júlio Fabrini. Processo penal. São Paulo: Atlas, 38 ed., 1994, p. 345

(13)

Foi a partir daí, com a individualização das penas, que surgiu a necessidade de um mecanismo que evitasse a fuga do acusado, enquanto este aguardava o julgamento definitivo e a conseqüente aplicação da pena.

Surge, então, a prisão preventiva, primeiro cumprida nos palácios reais, nas dependências dos templos e nas muralhas que cercavam as cidades, e em seguida, com a evolução do sistema prisional, nos presídios e delegacias.

Com o passar dos anos, essas prisões, inicialmente revestidas de caráter apenas preventivo, se transformaram em uma forma definitiva de aplicação da pena. A prisão preventiva, antes regra, passou a ser exceção, tornando-se uma medida excepcional, somente cabível em casos de necessidade, quando o total preenchimento dos requisitos elencados em lei conduz à sua decretação por parte do juiz.

Segundo nos ensina Magalhães GOMES FILHO:

a custódia do acusado para assegurar a aplicação de sanções punitivas antecede historicamente à própria pena de liberdade, visto que esta, introduzida pelo direito eclesiástico como forma de penitência, somente adquiriu importáncia nos ordenamentos leigos a partir dos fins do século XVI, pois através de um processo eminentemente inquisitório, fundado especialmente na 'rainha das provas', ou seja, na confissão por parte do acusado da prática do delito que lhe era imputado, a restrição à sua liberdade constituia condição indispensável para a tortura e demais métodos de obtenção desta confissão. 7

7 GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Editora Saraiva, 1991, p. 58

(14)

Diversa da prisão penal propriamente dita, a prisão cautelar, denominada por alguns autores de "prisão processual" 8, não tem por escopo a punição do infrator,

mas sim o de servir de instrumento para a realização do processo ou para a garantia de seus resultados.

A doutrina atribui múltiplas funções ao instituto das prisões cautelares em matéria de direito penal e processual penal. De um lado elencam os objetivos instrumentais desta, como o de assegurar a presença do acusado nos atos do processo ou até mesmo para uma futura execução da pena. Por outro lado, a custódia preventiva também atende a finalidades sociológicas, como a imediata reação ao delito, na prevenção de novos crimes que possam vir a ser praticados pelo réu, relacionados ou não com a primeira infração.

Para GOMES FILHO, "a prisão cautelar constitui na verdade, um poderoso instrumento a serviço do aparato punitivo-estatal, refletindo quase sempre uma opção deliberada do legislador pelo emprego de instrumentos processuais com finalidades intimidat6rias

e

repressivas". 9

Pelo fato das prisões provisórias possuirem caráter excepcional, as normas que as regulam devem ser interpretadas de maneira restritiva, a fim de evitar-se a possibilidade do recolhimento, mesmo provisório, de um inocente.

8 Ao contrário, portanto, da pnsao como pena, que é retributiva, que se baseia na responsabilidade do acusado, que é injusta para o inocente, a prisão provisória é acautelatória, fundando-se na necessidade de chegar a uma solução correta e é justa desde que o bem comum a exija.

(15)

PEDROSO por sua vez entende que a prisão:

pressupõe, via de regra, como é óbvio, tenha sido formulado contra o

recolhido um juízo de culpabilidade - latu sensu - sobre o cometimento de determinado delito. Constitui esse juízo, portanto, o prius ou antecedente necessário da prisão. De tal arte, tem ela -em princípio - feição executória ou de medida tendente ao cumprimento da pena, fulcrada que é em precedente condenação do réu. Por isso, recebe denominação de prisão ad poenam .10

Ocorre, porém, que a Constituição de 1988 prevê no art. 5°, LXI,11 a possibilidade da prisão de um acusado, antes de seu julgamento definitivo ou mesmo na ausência de um processo criminal estabelecido para apurar a responsabilidade deste perante um delito.

Tal autorização fundamenta-se na Justiça Legal, esta que "obriga o indivíduo,

enquanto membro da comunidade, a se submeter a perdas e sacrifícios em decorrência da necessidade de medidas que possibilitem ao Estado prover

o

bem comum, sua última e principal finalidade". 12

Para PEDROSO,

o recolhimento provisório, rotulado de prisão ad custodiam, tem por desiderato evitar as consequências do 'periculum in mora', visando impedir a

reiteração criminosa do delinqüente obstinado, e a garantia a execução ulterior da pena e o cumprimento de futura sentença condenatória. Assenta-se, por conseguinte, num juízo de probabilidade: se houver probabilidade de condenação, e o requerer o interesse social, a providência cautelar é

decretada antecipadamente.13

10 PEDROSO, Fernando de Almeida. Processo penal, o direito de defesa: repercussão, amplitude e limites. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1994, p. 86.

11 Art. 5°, LXI, da CF/88: "ninguém será preso em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente ... "

12 MIRABETE, op., cil. p. 346 13 PEDROSO, op., cil. p. 86

(16)

Nota-se, então, a existência de duas espécies de prisão em nosso ordenamento jurídico: a primeira, como medida de aplicação da pena imposta ao condenado, que o faz pagar por sua conduta repelida pelo direito; e a segunda, de cunho cautelar, que visa tão somente garantir a conservação de um estado de fato e de direito, com o objetivo de tornar efetiva a realização executiva do jus puniendi do Estado.

Neste caso, a prisão cautelar, também denominada de "prisão processual" ou "prisão provisória", constitui o instrumento para a realização do processo e para a garantia de seus resultados, não devendo, portanto, ser confundida com a prisão propriamente dita, aquela que é determinada em razão de uma sentença emanada da autoridade judicial e que se constitui em uma forma de aplicação da pena.

Para BECCARIA, a prisão preventiva surgiu como resposta pronta e imediata ao delito, tornando-se mais efetiva que a própria prisão definitiva, devido ao longo lapso temporal que esta levava para se consolidar, ao passo que aquela, imediata, era vista pelo povo enquanto a prática delituosa e suas conseqüências ainda permaneciam presentes na sua memória.14

Porém, essa alegada efetividade da prisão preventiva, demonstrando a eficiência do aparelho punitivo do Estado através da aparente solução rápida do delito não deve, de maneira alguma, sobrepor-se aos interesses individuais do cidadão, salvo nos casos em que sua imposição é necessária e imprescindível.

14 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo Hemus, trad. Torrieri Guimarães.

(17)

CAPíTULO 11 - DA LEGITIMIDADE DA CAUTELA NO PROCESSO PENAL

Durante grande parte da segunda metade do século passado, vários autores discutiram a legitimidade da prisão provisória, por esta operar-se antes de haver sido formulado um juízo de culpa definitivo, isto é, sem a existência de uma pena; e o que é pior, sem que se saiba, com certeza, se o suspeito sobre o qual recai tal medida é realmente o culpado pela prática do delito que lhe é atribuido.

Vários foram os autores que condenaram a decretação de medidas preventivas em processo penal, especialmente pelo fato delas privarem o indivíduo de sua liberdade, um bem que, com a evolução das sociedades e consequentemente do Direito penal e processual penal, adquiriu um elevado 'status' no final do século XVIII. Tais condenações não foram fruto de pensamentos destemperados por parte desses escritores,15 mas conseqüência das péssimas condições a que eram, e são até os dias atuais, submetidos os indivíduos recolhidos ao cárcere.

A privação da liberdade atinge um indivíduo, durante o período em que ele permanece encarcerado, além do aspecto físico, também a sua mente, a sua família e o seu nome, que fica 'marcado' pelo restante da sociedade, mesmo que posteriormente fique comprovada a sua inocência.

15 Criticaram abertamente a privação da liberdade do indivíduo antes de sua condenação escritores famosos como Carrara, Beccaria, Filangiere entre outros, sem contudo deixarem de enxergá-Ia como "um mal necessário· as civilizações.

(18)

o

problema está no fato de se considerar ou não a prisão provisória uma medida justa, visto que a priori, ela nos aparenta ser uma medida um tanto quanto injusta quando ao final do processo conclui-se que o réu é inocente.

Alguns autores e juristas afirmam que a prisão provisória, mesmo sendo injusta, deve ser aceita pelo fato de ser necessária, constituindo-se em uma "injustiça necessária" 16 , sendo considerada por esses autores como uma forma de antecipação da pena a ser imposta ao indivíduo.

Para TORNAGHI, em entendimento oposto, a prisão provisória nada tem a ver com a pena, não possuindo caráter retributivo. Funda-se tal medida no direito que possui o Estado de exigir do indivíduo determinados sacrifícios para o bem comum, de modo que este, para que possa viver em sociedade, deva ceder uma pequena parcela de sua liberdade. 17

Quando o bem comum exigir deste indivíduo a sua segregação, a fim de se poder apurar um fato e fazer justiça, não pode ser taxada de injusta tal segregação, acrescentando ainda que, "a prisão provisória assenta na justiça legal, que obriga o indivíduo, enquanto membro da comunidade, a lhe ministrar (à comunidade) elementos para que ela possa prover ao bem comum".18

177

16 TORNAGHI, Hélio Bastos. Instituições de processo penal. São Paulo: Saraiva, 1978, p.

17 TORNAGHI, H.,i dem, ibidem, p.177

(19)

Daí a necessidade de cercar-se o instituto das maiores seguranças possíveis, restringindo-o aos casos de estrita necessidade, para evitar que o uso indiscriminado da medida cautelar inviabilize seu verdadeiro escopo social.

É de se ponderar, a respeito, qual a finalidade precípua do Direito penal, do processo penal e, consequentemente, da pena. Qual é o critério orientador: a defesa social ou a finalidade emendativa do infrator?

Aos que consideram o primeiro critério, é evidente que a prisão preventiva se apresenta como legítima e necessária. Quanto ao segundo critério, o instituto da prisão preventiva constitui-se em um fator inversor da ordem buscada, por já fazer pesar sobre o imputado (ainda não condenado), entre outras coisas, o estigma do recolhimento, submetendo-o à convivência com elementos de altíssima periculosidade, e ao que hoje se chama de processo de "prisonização".

No entanto, o interesse e a proteção sociais, e não a antecipação de uma condenação, se constituem em fundamento exponencial da custódia provisória. Daí a necessidade, em casos especiais e como medida de exceção, de sua decretação. 19

Garofalo e Carelli entendem que a prisão preventiva não é somente uma necessidade social, é ato de justiça, pois, assim como no campo do direito civil o particular pode requerer, para tutela de seus direitos, o sequestro e os interditos

(20)

possessórios, assim também a polícia judiciária deve ter meios idôneos para a tutela dos direitos sociais. 20

Tal posição é corroborada pelos nossos Tribunais, assentando-se que "se o

réu, por causa de sua personalidade violenta, poderá perturbar a ordem pública e,

pela mesma

razão

como, também, por seus maus antecedentes, poderá perverter

a

instrução criminal e, ainda mais, foragir-se, comprometendo, assim, a aplicação da lei, se assim ele se apresenta no processo,

é

aconselhável a cautela de mantê-lo preso, visto que poderá abusar do jus liberta tis [. .. ]". (RT 518/443)21

Todavia, a necessária legitimidade para que o Estado atinja suas finalidades, através do processo penal, deve ser alcançada fundando-se em garantias asseguradas aos indivíduos, de modo que estes possam, com segurança, privar-se de parte dos seus direitos, em benefício do bem estar da comunidade.

2.1 Garantias Individuais

Diante da intensificação da responsabilidade individual,22 com a introdução do pensamento jurídico-penal tendente ao humanismo, surgiu a necessidade de um aprimoramento das garantias individuais, de modo que os indivíduos tivessem assegurados para si direitos pré-determinados, não ficando sujeitos ao livre arbítrio

20 PEDROSO, op. cit., p. 90

21 SZNICK, Valdir. Liberdade, prisão cautelar e temporária. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito ltda., 1994, p. 454

(21)

do Estado no desenvolvimento de um processo criminal, bem como na aplicação das sanções decorrentes deste.

o

aumento da criminal idade nas sociedades modernas demonstrou que a política criminal utilizada à época, baseada fundamentalmente no uso da força como forma de punição aos delitos, não mais conseguia com eficácia atingir os seus objetivos, ficando clara a necessidade de uma reestruturação em todo o sistema jurídico vigente com o objetivo de fazer da punição uma função regular.23

Com a necessidade de reformulação e reestruturação do sistema penal, buscou-se, com base nas teorias iluministas, que revelavam uma preocupação humanística com os direitos do homem, uma maneira mais eficaz e menos odiosa de punir.

Chegou-se a conclusão de que ao processo criminal são submetidos tanto culpados como inocentes, de maneira que é preferivel a absolvição de um culpado à

condenação de um inocente.

Essa idéia, que, em princípio, aparenta trazer mais insegurança à sociedade diante da possibilidade de uma possível ocorrência de crimes sem punição, na realidade se revela em uma segurança para todos aqueles que, mesmo não tendo praticado nenhuma conduta desregrada, careciam de qualquer garantia frente ao aparelho repressor e punitivo do Estado, portanto sujeitos ao livre arbítrio deste.

(22)

Como decorrência da reestruturação da justiça criminal, as garantias individuais adquiriram grande importância frente ao poderio repressor estatal. O acusado deixou de ser visto como um culpado que necessitaria provar, de maneira indubitável, sua inocência, sob pena de responder pelas chamadas penas extraordinárias ou penas de suspeito.24

Mas, ao contrário do que muitos imaginavam, os novos princípios relativos à persecução penal, amplamente divulgados e defendidos pelos reformadores do séc. XVIII, não se tornaram absolutos.

Com o passar dos anos, o que se viu foi o enfraquecimento das novas conquistas liberais, devido à crescente exigência da sociedade pela punição mais rigorosa dos delitos, aliada às dificuldades práticas na aplicação dos novos preceitos.

Apesar da escassa repercussão das reformas no plano da legislação positiva, a presunção de inocência constituiu dogma fundamental na elaboração doutrinária do direito repressivo, realizada no século XIX.

Tal princípio constituiu-se em um dos pilares fundamentais da reforma do sistema penal repressivo iniciada em meados do séc. XVIII, sendo explicitamente consagrado no art.go da "Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão", de 1789, que assim determinava "Tout homme étant présumé innocent, s'il est jugé

24 A estas penas eram submetidos aqueles que, não conseguindo provar de maneira inequívoca sua inocência, recebiam pena mais branda da que seria imposta caso ficasse provada a sua culpabilidade.

(23)

indispensable de I' arreter, toute rigueur qui ne serait pas necessaire pour s' assurer de sa personne doit être sévérement reprimée par la loi"

A conseqüência imediata da aplicação desse princípio, nos vários ordenamentos jurídicos elaborados à luz das reformas, foi a inversão do ônus da prova, não mais cabendo ao indivíduo provar a sua inocência, visto que esta era previamente presumida.

Segundo o princípio, cabe à acusação provar a culpabilidade do acusado, com as provas colhidas no decorrer da instrução criminal sendo absolutas ao atribuir ao acusado a pratica do delito, pois, em caso de dúvida, o indivíduo deverá ser considerado inocente.

Do enunciado contido no art. 9° da "Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão", retira-se um duplo significado: de um lado, regra processual, segundo a qual o acusado não está obrigado a fornecer provas de sua inocência, pois esta é de antemão presumida; de outro lado, o princípio que restringe a adoção de medidas restritivas à liberdade pessoal do acusado, antes do reconhecimento de sua culpabilidade, aos casos de absoluta necessidade.

Conforme nos ensina Antonio Magalhães GOMES FILHO:

o apelo à presunção de inocência assumia, assim, importante valor emblemático no quadro de uma reforma penal e processual-penal que postulava a estrita legalidade das punições e a substituição do sistema inquisitório e secreto, característico do ancien regime por um processo acusatório, público, oral e estruturado para assegurar a igualdade entre a acusação e a defesa.25

(24)

Como conseqüência do desastre que significou para a humanidade a experiência de duas guerras mundiais em menos de meio século, houve a conscientização por parte das nações, da necessidade de se afirmar, em documento supranacional, os valores fundamentais de respeito à pessoa humana, como pressuposto para a convivência harmônica entre as nações.26

Diversas propostas foram apresentadas, e no ano de 1948, a Assembléia Geral da Organização da Nações Unidas (ONU) aprovou, em votação quase unânime, a Declaração Universal dos Direitos do Homem.

Tal declaração siginificou o início da desejada positivação das garantias individuais, pleiteadas pelos reformadores desde meados do século XVIII, contendo, dentre os vários direitos afirmados, diversas disposições relativas às garantias do justo processo, como é o caso do seu art. 11, I, ao estabelecer que "toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se prove sua culpabilidade, conforme a lei e em juízo público no qual sejam asseguradas todas as garantias necessárias à defesa".

Seguindo essa tendência mundial de afirmação das garantias individuais, no ano de 1966 foi aprovado pela Assembléia Geral da ONU o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, documento que reafirma o direito à presunção de inocência, estabelecendo, de forma explícita, garantias mínimas, no decorrer do processo criminal, em favor de toda pessoa acusada da prática de um delito.

(25)

É bem verdade que essa enumeração minuciosa e praticamente exaustiva das garantias de um processo penal justo não dispõe, no plano prático, de mecanismos eficientes para a sua aplicação, pois a ONU não possui uma corte internacional com poderes de fazer respeitar efetivamente esses direitos declarados, resumindo-se sua tutela em recomendações da Comissão de Direitos Humanos, cujo valor é meramente político.

Na América Latina, busca-se uma uniformização das normas processuais penais através da elaboração de um Código de Processo Penal-Tip027, que servirá

de base para a elaboração das leis penais e processuais-penais de cada País, de modo que essas estejam em conformidade com o moderno pensamento jurídico-penal, assegurando-se aos cidadãos as garantias individuais necessárias ao correto e justo desenvolvimento do processo penal.

2.2 CONSTITUiÇÃO FEDERAL de 1988

Com a promulgação da Constituição da República no ano de 1988, vários princípios foram enaltecidos por nossos legisladores, o que ocasionou uma alteração na estrutura do processo penal até então vigente em nosso País, principalmente no que se refere à interpretação das normas contidas no Código de Processo Penal de 1941 , elaborado sob um regime autoritário, criando a necessidade de adaptação aos princípios acolhidos na nova Carta Magna.

27 Projeto de Código de Processo Penal-Tipo, discutido nas XI Jornadas Ibero Americanas de Direito Processual, 22 a 27 de maio de 1988, Rio de Janeiro.

(26)

Entre os princípios que demonstram a valorização do indivíduo frente ao poder Estatal, e que foram elencados no texto constitucional de maneira expressa, com a finalidade de dar maior garantia de sua aplicabilidade, estão os princípios da Dignidade (art. 5°, 111), Princípio da Isonomia (art. 5°, I e LXXIV), Princípio da Inviolabilidade do Domicílio (art. 0, XI), Princípio do Sigilo das Correspondências e das Comunicações (art. 5°, XII e LVI), Princípio do Juiz Natural (art. 0, XXXVII e L111), Princípio do Júri (art. 5°, XXXVIII), Princípio do Devido Processo Legal (art. 5°, L1V), Princípio do Contraditório e Ampla Defesa (art. 5°, LV), e o Princípio da Presunção de Inocência (art. 5°, LVII).

A redação definitiva, consagrada pelo art. 5.°, LVII, do texto de 5 de outubro de 1988, estabelece que: "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".

A redação foi inspirada na disposição italiana de 1948, permitindo uma interpretação mais abrangente da garantia, em relação à fonte peninsular, na medida em que não restringe ao acusado, e, portanto, à esfera do procedimento penal propriamente dito, reportando-se a todos os estágios da repressão penal, inclusive às atividades policiais ditas preventivas e investigatórias.

Assim, o referido princípio parte do devido processo legal, irradiando-se por todo o sistema da intervenção estatal de natureza penal sobre a liberdade da pessoa.28

(27)

Nos dizeres de Magalhães GOMES:

descontada a carga emocional que a expressão traz em si, a denominada presunção de inocência constitui o princípio informador de todo o processo penal, concebido como instrumento de aplicação de sanções punitivas em um sistema jurídico no qual sejam respeitados, fundamentalmente, os valores inerentes à dignidade da pessoa humana; como tal, deve servir de pressuposto e parâmetro de todas as atividades estatais concernentes à

repressão criminal", prosseguindo o autor: "a garantia constitucional não se revela somente no momento da decisão, como expressão da máxima 'in dubio pro reo', mas se impõe igualmente como regra de tratamento do suspeito, indiciado ou acusado, que antes da condenação não pode sofrer qualquer equiparação ao culpado; e, sobretudo, indica a necessidade de se assegurar, no âmbito da justiça criminal, a igualdade do cidadão no confronto com o poder punitivo, através de um processo Justo'. 29

Como decorrência desse princípio constitucional, toda prisão cautelar deve se basear em um critério de necessidade, pois enquanto não tiver transitado em julgado sua condenação, o acusado continuará inocente.3O

Deve-se assegurar ao suspeito todas as garantias constitucionais estendidas a qualquer cidadão que esteja no pleno gozo de sua liberdade, do modo que jamais poderá ser alguém encarcerado sem que seja feito um claro juízo de necessidade da medida.31

No caso de não se vislumbrar a necessidade da prisão de um suspeito, não deve ser ela decretada, pois isto significaria dar peso a uma decisão não definitiva, impondo uma pena antecipada a alguém, sem a certeza de que ela tenha cometido um delito.32

29 GOMES FILHO, op. cit., p. 37

30 CINTRA JR., op. cit. p. 264

31 CINTRA JR., idem, ibidem, p. 264

(28)

Alguns autores, como Maria Lúcia KARAM, criticam a tendência ao uso desenfreado da prisão provisória, afirmando que:

o

encarceramento anterior

ao

julgamento é medida, mais do que qualquer outra, de caráter excepcional. A legalidade processual remete tal medida

a

critérios evidenciadores de que

a

permanência do indiciado ou processado em liberdade constituiria ameaça para o normal desenvolvimento do processo ou para eventual aplicação futura da pena, nada tendo

a

ver, portanto, com a natureza do delito atribuído, cuja efetiva ocorrência só

poderá passar do terreno das hipóteses para

o

plano do concreto, 1iuando da cognição definitiva do mérito, a ser feita no momento da sentença.

Para Dirceu AGUIAR no mesmo sentido:

o constrangimento à liberdade, embora posssível, há que ser feito por critério de necessidade fundamentada, relacionada

ao

desenvolvimento do processo (instrumental) ou à sua finalidade (final), com rigorosa cautela na apreciação dos fatos, tanto que, como se disse, a presunção não é

apenas de não culpabilidade ou do estado de inocência,

e

sim de inocência do acusado.34

Contudo, na prática, diante da falta de elementos objetivos de fundamentação, os juízes, ao decretarem prisões preventivas, guiam-se por critérios de "sensibilidade"35, introduzindo na atividade jurisdicional dados de subjetividade e valores pessoais, demonstrando grande incompatibilidade com o Estado Democrático de Direito, bem como ofendendo diretamente o texto contido na Constituição da República.

Para Dirceu AGUIAR, isto se dá, evidentemente, porque os setores do judiciário encarregados da questão incorporam a ideologia da Lei e Ordem, que orquestra a exploração da onda de criminalidade, em benefício de setores

33 CINTRA JR., op. cit, p. 265 34 CINTRA JR., idem, ibidem, p. 268 35 CINTRA JR., op. cit. p. 269

(29)

preponderantes da sociedade, aos quais não interessa demonstrar a real natureza dos conflitos socias, sua relação com a má distribuição de riquezas e com a ineficiência do Estado em minorar essa desigualdade.36

Há campanhas explícitas que, manipulando o sentimento de insatisfação e insegurança da população, querem inculcar fórmulas mágicas contra a criminalidade e o recrudescimento do sistema punitivo, com base na prevenção geral, sem atacar as verdadeiras causas da violência e da criminal idade. 37

Deve ser salientado que a referida presunção não se confunde com a supressão de qualquer suspeita, o que impediria até a instauração de inquérito policial para investigações preliminares.

A presunção de inocência unicamente assegura a não inclusão do nome do réu no rol dos culpados até trânsito em julgado da sentença condenatória.

PEDROSO conclui que "a não se entender desse modo, outra conclusão não

há de defluir - irrefragável - senão

a

de abrigar nossa Carta Magna disposições contraditórias, colidentes

e

conflitantes, geradoras de desconchavo

e

paradoxos na égide legal, em detrimento da harmonia, coesão e equilíbrio do Direito, de que ela, in primo loco, deveria assumir-se como guardiã". 38

As primeiras manifestações doutrinárias e jurisprudenciais a respeito do novo texto constitucional já permitem entrever, contudo, que as restrições à aceitação do

36 CINTRA JR., op. cit, p. 269 37 CINTRA JR., idem, ibidem, p.271 38 PEDROSO, op. cit., p. 87

(30)

princípio permanecem inabaladas, revelando profundas e insuperáveis divergências entre duas concepções opostas de processo penal. 39

Damásio de JESUS ponderou que "o princípío deve ser empregado com critério e equilíbrio, buscando-se uma justa posição entre o direito de punir do Estado e o direito penal público subjetivo de liberdade do cidadão ", ressaltando que o preceito não impede que sejam determinadas medidas contra o réu antes da sentença condenatória transitada em julgado, como aquelas resultantes de "necessidade abstrata", quando o próprio legislador, em face da natureza do delito, de circunstâncias sociais, etc., as entenda convenientes a priori. 40

Em face do princípio da presunção de inocência (art. 5°, XVII, da Constituição da República), toda prisão cautelar deve ser decorrência de decisão judicial fundamentada na necessidade (art 5°, LXI e I da Constituição da República), não podendo jamais se transformar em antecipação de reprimenda ou execução provisória de sentença ainda pendente de trânsito em julgado.41

Afinal, através da motivação que as partes concluem se houve ou não por parte do magistrado, uma perfeita análise do material probatório existente nos autos do processo, ou do inquérito policial.

Por ela é que, conforme nos ensina CINTRA JR, "se entrevê se a ordem foi o

resultado de uma reflexão do juiz, ou se foi um simples ato discricionário e

39 Cf. p. 11 deste trabalho.

40 JESUS, Damásio .... Apud : GOMES FILHO, op. cit., p. 22

(31)

caprichoso, fruto de uma vontade autoritária. Ao magistrado é defeso cometer excessos, com erro de apreciação ou falha nos processos reflexivos". 42

Em qualquer hipótese, porém, inexiste prisão sine judicio, sem prévio controle

jurisdicional, ressalvado o caso da prisão em flagrante, em que esse controle realiza-se a posteriori, com a comunicação da detenção. 43

A própria Constituição da República, no art. 5°, LlV, determina que "ninguém

será privado da liberdade ou de seus bens sem

o

devido processo legal".

AGUIAR, no mesmo sentido, entende que "A atividade jurisdicional do Estado

não foge a esta regra da estrita legalidade". 44

o

poder geral de cautela, aquele em que o juiz pode determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, previsto no art. 798 do CPC, não se impõe em um processo de cunho penal. Para MACHADO "Em tema de restrição à liberdade individual faz-se mister uma observância rigorosa do princípio da legalidade,

e

no caso da prisão preventiva é condição indispensável

a

sua previsão legal". 45

Apesar de não se permitir o uso do poder geral de cautela pelo magistrado em um processo penal, o juiz, ao agir de ofício decretando a prisão preventiva de um acusado, inobstante o requerimento dos demais legitimados (Ministério Público e querelado), age através de um requerimento dotado de natureza e forma de

p.54

42 CINTRA JR, op. cit , p. 271

43 PEDROSO, op. cit., p. 88 44 CINTRA JR., op. cit. p. 263

(32)

autêntica ação penal cautelar, agindo nessas situações de maneira muito semelhante àquela do magistrado que faz uso do poder geral de cautela no processo civil. 46

Porém, neste caso, a atividade do juiz restringe-se à discricionariedade que este possui para apreciar e decidir sobre a conveniência e oportunidade da custódia provisória, devendo permanecer tal apreciação atada às regras estabelecidas em lei. 47

MACHADO ressalta ainda a impossibilidade do magistrado dispor, em matéria de cautelaridade penal do poder geral de cautela, o que o impede de criar novas medidas restritivas de liberdade, além daquelas já previamente estabelecidas em lei.48

46 MACHADO, op. cit , p. 54

47 MACHADO, idem, ibidem, p. 54 48 MACHADO, idem, ibidem, p. 55

(33)

CAPíTULO 111- PRISÃO PREVENTIVA

Antes de estudarmos em mais detalhes o instituto da prisão preventiva, faz-se necessária uma breve exposição acerca das medidas cautelares, o modo como essas medidas estão inseridas em nosso ordenamento jurídico-penal e processual penal, bem como mostrar as regras e princípios que devem orientar o magistrado em geral (entenda-se em todos os níveis de jurisdição), no uso de tal instrumento posto à sua disposição.

Todo o provimento jurisdicional de natureza cautelar, seja ele civil ou penal, tem como objetivo assegurar a conservação de um estado de fato e de direito, tendo em vista a realização executiva de um direito postulado.

Deve ser observado, para cada caso em concreto, as condições gerais da

ação49 , bem como a necessária verificação de razoáveis probabilidades do direito

invocado, através de uma cognição não aprofundada (fumus bonis juris) , como

também, se há o perigo de que o direito invocado se fruste em decorrência da demora do provimento definitivo (periculum in mora) no devido processo legal. 50

Segundo nos ensina Hélio TORNAGHI, "o que realmente caracteriza as

providéncias acautelatórias e as distingue das demais é o fato de elas serem

provisórias e instrumentais". Provisórias, pois se destinam a vigorar enquanto não

49 A ação cautelar penal, assim como a ação cautelar cível, está submetida às condições gerais da ação, quais sejam; possibilidade jurídica do pedido, interesse processual e legitimidade das ~rtes.

(34)

se tomaram as definitivas, e instrumentais, devido as providências cautelares não serem um fim em si, mas um meio de assegurar a execução das definitivas. 51

Assim sendo, as providências assecuratórias se destinam a prevenir, com a necessária urgência, o dano que resultaria na demora da providência definitiva.

No processo penal, há a necessidade de se observar com uma maior atenção a aplicação de medidas cautelares, pois nessa esfera jurídica são trabalhados bens jurídicos de suma relevância, na medida em que quanto maior for a interferência do Estado na liberdade do indivíduo, maior será o preço para se alcançar uma ordem constitucional efetivamente democrática.

o

processo penal, ao contrário do processo civil, onde há o nítido conflito entre duas partes antagônicas (Autor e Réu), se caracteriza pelo conflito de interesses que, na realidade, abrange mais do que o aparente litígio entre o Estado, de um lado, e o cidadão, do outro.

Também se caracteriza pela existência de um conflito dentro do próprio Estado que, de um lado, age no interesse de impor medidas que visem assegurar o êxito do processo principal, mas que por outro não deixa de ter o interesse na manutenção do jus liberlatis do cidadão, assegurado em vários princípios fundamentais inseridos na Constituição da República.52

51 TORNAGUI H., op. cit., p. 05

(35)

Ao contrário do que muitos equivocadamente pensam, o processo não visa instrumentalizar o Estado para aplicação da sanção penal, mas sim limitar o poder repressivo desse Estado, de maneira que os Códigos que disciplinam o desenvolvimento do devido processo legal, não o façam atendendo aos interesses repressores do Estado, mas sim, sobretudo, no interesse do acusado, para a preservação dos seus direitos individuais.

A prisão preventiva é uma das espécies de prisões cautelares previstas no nosso diploma processual penal, sendo definida por SZNICK, como "[. . .]uma

modalidade de prisão cautelar, cujo nome vem de cavere, do latim, ter cuidado,

prevenir-se. Cautela significa tutela, defesa, proteção. É

a

prisão preventiva uma garantia, uma proteção da sociedade e que acaba por atingir, isoladamente, um ou

vários cidadãos". 53

A prisão preventiva está prevista em nosso ordenamento jurídico nos artigos 311 a 316 do Código de Processo Penal, constituindo, portanto, um dos casos determinados em lei, no qual ocorre a prevalência do poder de polícia por parte do Estado frente às garantias individuais de liberdade asseguradas aos cidadãos na Constituição de 1988.

É importante salientar que a expressão "prisão preventiva,,54 possui dois sentidos em nosso ordenamento jurídico: um sentido amplo, que compreende a

53 SZNIC, Valdir, op. cit., p. 434.

54 A expressão "prisão preventiva" possui duas acepções, uma lata e outra restrita. No sentido amplo, o enclausuramento preventivo é o gênero, de que seriam espécies a em flagrante delito, a preventiva stricfu sensu e a decorrente de pronúncia. Dessa forma, lato sensu, a

expressão custódia preventiva abrangeria todas as demais referentes à prisão provisória, compreendendo, assim, toda e qualquer segregação ocorrida antes do julgamento irrecorrível. Em

(36)

chamada prisão provisória a que se refere o art. 42 do Código Penal, abrangendo a prisão em flagrante, a prisão decorrente da pronúncia, a prisão resultante da sentença condenatória não transitada em julgado e a prisão temporária; e um sentido estrito, a prisão preventiva propriamente dita, que é uma espécie do gênero prisão provisória, e que será estudada de forma mais detalhada no decorrer deste trabalho.

Segundo MIRABETE, a prisão preventiva em seu sentido estrito ué uma

medida cautelar, constituída da privação de liberdade do indigitado autor do crime

e

decretada pelo juiz durante o inquérito ou instrução criminal face a existência de pressupostos legais, para resguardar os interesses sociais de segurança". 55

Nota-se, a partir da definição elaborada pelo renomado mestre, que essa espécie de prisão, de cunho cautelar, apresenta-se em nossa sociedade como uma maneira de privar o indivíduo de sua liberdade, sem que tenha ocorrido o trânsito em julgado da sentença condenatória, ou até mesmo antes do início da persecutio

criminis in judicio.

Por essas razões é que o instituto da prisão preventiva tem recebido - mais acentuadamente nos tempos atuais, com o avanço das garantias individuais no direito penal e processual penal, principalmente no que se refere ao princípio da presunção de inocência - duras e crescentes críticas de estudiosos e profissionais

sentido restrito, entretanto, consistiria na privação da liberdade determinada pelo Juiz com base em interesse social, durante o inquérito ou no tramitar da instrução criminal.

(37)

ligados à questão, sendo considerada por muitos como uma forma de abuso do poder de polícia estatal, diante das garantias asseguradas por nossa Constituição.

A prisão preventiva, por ser decretada antes do julgamento definitivo, constituindo-se assim numa medida de exceção, é sempre odiosa, e mesmo sendo considerada um mal necessário no combate à criminalidade, representa um afronte aos princípios e garantias individuais de liberdade e presunção de inocência estatuídos em nossa Carta Magna.

Por isso a necessidade de serem analisados os motivos ensejadores da custódia cautelar, previstos nos no art. 312 do Código de Processo Penal, sob interpretação restritiva, devendo sempre haver o predomínio do interesse do homem à liberdade. 56

Reflexo desta onda de ataque aos abusos do Estado perante os indivíduos submetidos às suas regras, a prisão preventiva sofreu modificações ao longo da sua existência no Código de 1941, deixando de ter a sua decretação obrigatória em determinados casos, conforme estabelecido pela legislação anterior, para tomar-se medida de exceção facultativa e aplicável somente em algumas hipóteses, em que haja a necessidade de sua decretação e desde que esta esteja de acordo com os requisitos estabelecidos em lei.

A prisão preventiva surgiu no Direito Processual Penal Brasileiro, no sistema original do Código de Processo Penal de 1941, como uma das formas de prisão

(38)

cautelar previstas no diploma, distinguindo-se em duas espécies: a primeira, chamada de compulsória ou obrigatória, era imposta em determinados casos previstos em lei, quando preenchidos os requisitos estabelecidos nesta. A segunda, chamada de prisão facultativa, afirmava a faculdade da aplicação de tal instituto para os demais casos onde não fosse obrigatória a decretação.

o

Código de Processo Penal de 1941, tendo nascido sob o Estado Novo, foi inspirado no Código de Processo Penal Italiano de 1930 (elaborado durante o regime fascista na Itália), caracterizando-se no seu original, como um código de inspirações autoritárias, desprezando a liberdade individual como direito proeminente, para considerar esta apenas uma concessão por parte do Estado, atendendo ao interesse da coletividade.

Uma clara demonstração da compatibilidade de idéias entre os regimes políticos autoritários que vigoravam no Brasil e na Itália é observada na Exposição de Motivos do Código de 1941, quando afirma que lia prisão preventiva, por sua vez, desprende-se dos limites estreitos até agora traçados à sua admissibilidade".57

Para GOMES FILHO, "a prisão preventiva, decretada pelo juiz de oficio, a requerimento do Ministério Público, ou do querelante, ou mediante representação da autoridade policial, era obrigatória nos crimes a que fosse cominada pena de

57 Na Exposição de motivos do Código de Processo Penal de 1941 (DECRETO-LEI N.o 3.689, DE 3-10-1941), tem-se claro esse entendimento, mesmo ao se afirmar na parte que trata do Espríto do Código que este operar-se-á visando estabelecer o equilíbrio entre o direito de punir do Estado e as garantias individuais que este deve assegurar aos seus cidadãos.

(39)

reclusão por tempo, no máximo, igualou superior

a

dez anos, desde que houvesse prova da existência do crime

e

indícios suficientes de autoria (art.312, CPP)". 58

Esse sistema veio a sofrer algumas mudanças nas últimas décadas, alterações introduzidas com o advento da lei nO 5.349 de 3 de novembro de 1967, que aboliu a prisão preventiva obrigatória, prevista no art. 311 do Código de Processo Penal, por contrariar as idéias liberais então existentes.

A promulgação da referida lei reformadora de nosso Código veio atender aos constantes e crescentes reclamos por parte de grande parte da doutrina, objetivando a abolição da prisão preventiva compulsória de nosso ordenamento jurídico, propiciando uma significativa alteração nos artigos 311 e 312 do Código de Processo Penal de 1941, que assim ficaram redigidos:

Art. 311. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá prisão preventiva decretada pelo Juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, ou do querelante, ou mediante representação da autoridade policial.

Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia de ordem pública, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime

e

indícios suficientes da autoria.

3.1 -Requisitos

Além da existência de um dos três fins que justificam a prisão preventiva (garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal e asseguramento da

(40)

aplicação da lei penal), que serão analisados mais adiante, é necessário ainda, que estejam presentes a prova da existência do crime, os indícios suficientes de autoria e que o despacho que determina o recolhimento ao cárcere seja fundamentado.

Assim, como elementos objetivos indeclináveis de decretação da custódia preventiva, acrescem-se, intrinsicamente, a prova do crime e os indícios de sua autoria.

3.1.1 -Prova da existência do crime

A exigência da prova da materialidade delitiva é um dos requisitos necessários para autorizar o juiz a decretar a prisão provisória de algum suspeito.

É o que se deduz da leitura do art. 312 do CPP, que determina que a prova da existência material do crime, no processo ou no inquérito, é um dos pressupostos fundamentais para a imposição da prisão preventiva, não bastando para a decretação de tal medida cautelar, meros indícios ou presunções acerca da ocorrência do fato delituoso, exigindo a lei absoluta segurança quanto a ocorrência material deste.59

MACHADO citando Borges da ROSA conclui que "pode-se não saber, com

inteira segurança, se o indiciado

é

o seu autor, mas a demonstração de que existe um fato delituoso, perfeitamente enquadrável na lei penal, é indeclináve/".60

59 MACHADO, op. cit., p. 55

(41)

o

delito precisa estar "provado" e a autoria necessita ser pelo menos "provável", bastando para tanto a suspeita razoável dessa autoria.61

Quando o Código de Processo Penal, no seu art.311, exige, para o efeito da prisão preventiva, prova da existência do crime e indícios suficientes da autoria, quer significar, sem dúvida alguma, que, se para a imputação da autoria bastam indícios capazes de gerar, não plena certeza, mas fundada ou razoável suspeita, é indispensável, quanto à existência do crime, a

presença de elementos fJrobatórios que excluam qualquer hipótese plausível de inexistência do crime. 62

Sendo a prova da existência do crime um dos dados ensejadores da custódia preventiva, na falta de um dos elementos que lhe compõe a estrutura (a tipicidade, a antijuricidade e a culpabilidade, embora esta última seja tida por alguns penalistas como mero pressuposto de aplicação da pena)63, não haverá a materialidade do crime, de modo que estará impedido o juiz de autorizar o recolhimento provisório do acusado ou indiciado.64

3.1.2 -Indícios da autoria

o

artigo 239 do Código de Processo Penal estabelece que : "Considera-se indício a circunst~ncia conhecida e provada que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se

a

existência de outra ou outras circunstâncias".

Trata-se então, nas palavras de Antonio Alberto MACHADO, "de um

raciocínio indutivo, através do qual se podem estabelecer liames entre

61 PEDROSO, op. cit., p. 98

62 HUNGRIA, Nélson, "HC 32.940- STF". Apud : PEDROSO, op. cit., p. 99.

63 PEDROSO, op. cit., p. 100 64 PEDROSO, idem, ibidem, p. 99

(42)

circunstâncias ou fatos conhecidos e aquelas circunstâncias ou fatos que se

pretende conhecer

e

demonstrar". 65

A legislação anterior exigia, para a decretação da custódia preventiva, indícios veementes da autoria, o que dava, em contraposição a atual expressão utilizada em nosso ordenamento jurídico - existência de indícios suficientes da autoria - uma maior intensidade dos elementos indicativos da autoria imputada ao acusado.

Romeu Campos Pires BARROS assinala que "na verdade a expressão

'indícios suficientes' significa probabilidade certa da autoria

e

não simples possibilidade" 66, visto que o juiz, ao analisar tais indícios, o fará por meio de uma

somatória de circunstâncias que possibilitem levá-lo a uma certeza razoável quanto

à autoria do fato, tipificado na lei penal objetiva, acrescentando que "se a existência

do crime exige prova plena, já a autoria admite temperamentos". 67

É importante salientar que a avaliação de tais indícios deverá ser feita segundo critérios gerais de convicção, normalmente empregados na avaliação do

meritum causae, e norteada sempre pelo princípio da livre apreciação da prova,

assentado no art. 157, do Código de Processo Penal. 68

65 MACHADO, op. cit., p. 57

66 BARROS, Romeu Pires de Campos. Processo Penal Cautelar. Rio de Janeiro : Editora Forense, 1982, p. 194

67 BARROS, idem, ibidem, p. 191 68 MACHADO, op. cit, p. 57

(43)

3.2 - Finalidades da prisão preventiva

Conforme dito anteriormente, a finalidade da prisão preventiva é cautelar, procurando-se evitar que um crime fique impune, ou pelo prejuízo causado à apuração deste delito, ou pela fuga do indivíduo a quem será atribuída a pena decorrente da prática delituosa.

Galdino SIQUEIRA entende que a prisão preventiva de três maneiras:

se manifesta como medida de segurança, como garantia de execução da pena, e como meio de instrução. Como medida de segurança, evita a cautela, que o autor do fato punível venha a praticar novos ilícitos, bem como lhe resguarda de eventual vingança. Como garantia da execução, evita que se frustre o castigo a que vier a ser condenado, bem como de se submeter à reparação do dano emergente do ilícito. Como meio de instrução vem a mesma evitar que o agente venha a influir na apuração do delito, evitando também que o delinqüente faça desaparecer os vestígios do crime, que subome testemunhas, que se concerte com cúmplices para o plano de evitar a descoberta da verdade. 69

BARROS entende que "o periculum in mora é indispensável para a imposição

da prisão preventiva e a lei tipifica as situações em que, havendo probabilidade de perigo, estará justificada a medida". 70

PINTO analisando os limites de aplicação da prisão preventiva assinala:

outra característica desse instituto é que possui limites impostos pela natureza da infração penal

e

pela própria pena aplicável, vez que, atualmente, só se aplica aos crimes dolosos, punidos com reclusão ou, aos crimes dolosos punidOS com detenção, quando

o

acusado for vadio ou houver dúvidas sobre sua identidade

e

ele não fornecer esclarecimentos sobre ela ou, então, se o réu tiver sido condenado em

69 SIQUEIRA, Galdino. Curso de processo criminal. 28 ed., Editora Milheiro, p. 129. Apud :

NEVES, Antônio Felipe da Silva. Da prova indiciária no processo penal. Rio de Janeiro: Editora Liber Juris, 1986, pág. 96.

(44)

outro crime doloso em sentença imutável, ressalvando o disposto no parágrafo único do art. 46 do Código Penal. 71

o

enunciado do art. 312 do CPC, compreende as finalidades a que se presta tal medida provisória: a) garantia da ordem pública; b) garantia da ordem econômica; c) conveniência da instrução criminal; d) assegurar a aplicação da lei; bem como os requisitos sem os quais não há autorização para a sua decretação e que são: a prova da existência do crime e a existência de indícios suficientes de autoria.

Ocorre que, na prática, não se chegou a um critério de quais indícios seriam suficientes para, com base neles, o juiz decretar a prisão preventiva.

Muitas e várias são as opiniões da doutrina e da jurisprudência, umas mais rígidas quanto aos indícios capazes de determinar a custódia do acusado, outras mais condescendentes no tocante à necessidade da imposição de tal medida.

Isto ocorre porque, para uns, basta para a prisão que os indícios sejam leves; alguns afirmam que somente basta haver suspeita; para uns outros, basta a fama e a publicidade do delito; alguns outros insistem que, só com querela e acusação oferecida em juízo, basta para se determinar a prisão do acusado, quando o crime tenha sangue; enquanto outros mais radicais dizem que basta qualquer informação. 72

71 PINTO, Antonio José Azevedo. A prisão cautelar no Brasil; aspectos constitucionais e processuais penais. São Paulo: Editora Saraiva, 1982, p. 109.

(45)

Concluindo, quatro são as finalidades da prisão preventiva previstas em nosso sistema processual penal: a) garantia da ordem pública; b) conveniência da instrução criminal; c) certeza da aplicação da lei penal; e d) garantia da ordem econômica, finalidade esta introduzida recentemente no artigo 312 do CPP pela lei nO 8.884/94.

Exatamente pelo fato de ter sido recentemente introduzida em nosso sistema jurídico, pouco tem-se escrito ou até mesmo julgado acerca da prisão preventiva como garantia da ordem econômica.

Contudo, se observarmos os recentes escândalos financeiros ocorridos em nosso País, nos quais não houve nenhuma decretação de custódia preventiva para garantia da ordem econômica, é facil concluir-se que a finalidade introduzida pela lei nO 8.884/94, dificilmente sairá do papel para ser posta em prática na defesa dos interesses econômicos e sociais do País.

Isto ocorre em decorrência da mentalidade dos operadores jurídicos que geralmente se apresentam cautelosos na aplicação de medidas inovadoras em nosso ordenamento jurídico, assim como pela forte influência política e econômica exercida por aqueles que possam vir a ter sua liberdade tolhida com a aplicação da custódia preventiva fundada na garantia da ordem econômica.

Deve ser ressaltado que a enumeração legal dos fins a que se destina a prisão preventiva, elencadas no art. 312 do CPP, é composta de maneira exaustiva, não se admitindo, portanto, interpretações extensivas a outros casos que não os

(46)

expressamente previstos em lei, mesmo que dotados de grande semelhança com esses.

Isso é decorrência do abandono do poder geral de cautela do juiz no processo penal, o que o impossibilita de, ao seu livre arbítrio e simplesmente por achar tal medida necessária, determinar a custódia preventiva do indiciado.

3.2.1 -Garantia da ordem pública

A garantia da ordem pública é um dos escopos colimados pelo processo penal, visto que este tem como finalidade restabelecer a situação de equilíbrio social e de ordem, rompidos com a prática do crime, suas conseqüências e repercussões. Assim sendo, justifica-se a prisão do indiciado ou réu, com o intuito de garantir a efetividade do processo, quando a demora da marcha processual colocar em risco a realização daquele objetivo.73

Diversas são as formas com que a ameaça à ordem pública se apresenta em nossa sociedade, seja através do encarceramento do autor de um delito tentado, com a finalidade de impedir que este venha a consumar tal delito, ou quando estando o réu em liberdade, continuar na prática de um delito já iniciado ou de outros conexos a este, como também poderá, ao permanecer livre, o réu, representar uma verdadeira ameaça à ordem pública em razão da grande repercussão social provocada pelo delito.74

73 MACHADO, op. cit., p. 59

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