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Mapas da Geografia e cartografia temática

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Academic year: 2021

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Quando se fala em mapas, imediatamente se faz associação à Geografia. É um aspecto eminentemente cultural. Os mapas, portanto, representariam a Geografia, tudo o que é geográfico. Tais construtos seriam a própria Geografia, portanto, sinônimos.

Nesse sentido, pode-se verificar que o mapa sempre surge como representação simbólica da Geografia, o que parece se con-firmar mais na atualidade. Organizações geográficas, eventos de Geografia, instituições científicas ligadas à Geografia, até mesmo empresas que lidam com várias partes do mundo e operadoras de turismo marcam sua presença mediante tal símbolo nos seus logotipos. Tudo o que é Geografia, em geral, tem como logotipo básico um planisfério ou globo terrestre, mesmo que não se reflita ou discuta nada sobre mapas, nem acerca de seu conteúdo político, ideológico, temático.

Ademais, a Geografia sempre se confundiu com o mapa. Na verdade, fazer geografia consistia em fazer mapas. Isso ficou bem claro antes do final do século xix, antes de a Geografia se esta-belecer como discurso escolar ou universitário (Lacoste, 1976).

Nos albores de sua existência, o homem gravou em pedra ou em argila, pintou em pele de animais ou armou em estruturas diversas o seu lugar, o seu ambiente, suas atividades, seus sen-timentos e suas percepções. Ao fazer isso não só representava a prática de suas relações espaciais, em terra ou mar, como também expunha o conteúdo das relações sociais de sua comunidade (Kish, 1980; Jacob, 1992; Wood, 1992; Thrower, 1996).

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Os desenhos ou estruturas apresentavam desde então uma forma original de interpretação acerca de seus territórios ou do-mínios em mares, sempre servindo para satisfazer necessidades que foram surgindo nas condições do trabalho humano, para demarcar vias de comunicação, definir lugares de ação e outros (Salichtchev, 1979).

Entretanto, a finalidade mais marcante em toda a história dos mapas, desde o seu início, teria sido a de estarem sempre volta-dos à prática, principalmente a serviço da dominação, do poder. Sempre registraram o que mais interessava a uma minoria, fato este que acabou estimulando o incessante aperfeiçoamento deles.

A apreensão do espaço e a elaboração de estruturas abstra-tas para representá-lo sempre marcaram a vida dos homens em sociedade. Este afã constante acompanhou o empenho humano em satisfazer também necessidades que foram surgindo nas con-dições de trabalho.

Os mapas, junto a qualquer cultura, sempre foram, são e se-rão formas de saber socialmente construído; portanto, uma forma manipulada do saber. São imagens carregadas de julgamentos de valor. Não há nada de inerte e passivo em seus registros (Harley, 1988, 1991; Jacob, 1992; Wood, 1992; Thrower, 1996).

Como linguagem, conjugam-se com a prática histórica, po-dendo revelar diferentes visões de mundo. Carregam, outrossim, um simbolismo que pode estar associado ao conteúdo neles representado. Constituem um saber que é produto social, fican-do atrelafican-dos ao processo de poder, vinculafican-dos ao exercício da propaganda, da vigilância, detendo influência política sobre a sociedade (Harley, 1988, 1991; Gould e Bailly, 1995).

Pelo menos para o pensamento ocidental, o grande avanço da cartografia teria se dado centrado na Europa, estando relacionado ao Renascimento (séculos xv e xvi), época em que começaram a surgir relações capitalistas. Com a intensificação do comércio entre Oriente e Ocidente, o que exigiu o desenvolvimento da navegação, houve grande ímpeto na confecção de mapas, bem

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como a criação de meios para a respectiva orientação, como a bússola, provinda do extremo oriente. Confirmavam-se os por-tulanos, mapas para navegar. Foram estabelecidos desde o fim da Idade Média – porém, agora, muito mais corretos –, tendo em vez dos atuais paralelos e meridianos uma rede de rosas dos ventos entrelaçadas.

A invenção da imprensa foi um marco cultural do século xv que teve grande influência no progresso da cartografia, por-quanto possibilitou a fácil reprodução de mapas, barateando seu custo unitário e permitindo maior difusão. Foi possível perceber, assim, a passagem do mapa-registro, do mapa-memória, para o mapa-mercadoria. Por outro lado, o fato de reproduzir mapas por impressão, reduzindo os erros dos copistas, desencadeou uma marcante revolução nessa atividade. Estabeleceu-se, assim, a cartografia como ofício, dando-lhe nova definição: exposição gráfica da informação geográfica (Kish, 1980; Wood, 1992).

Outro importante impulso à cartografia foi dado pelos grandes descobrimentos (séculos xv e xvi). Os interesses pela expansão do mercantilismo europeu engendraram enorme revo-lução espacial. As novas rotas marítimas acabaram por motivar uma articulação entre as várias partes do mundo de então. Dessa feita, povos de outros continentes tornaram-se submissos ao modo de produção da burguesia europeia. Navegantes, colonizadores e comerciantes exigiam mapas cada vez mais corretos. A busca crescente por mapas para registrar o mundo inteiro, bem como a procura de novos tipos de representações para questões específi-cas, forçou a entrada da cartografia na manufatura, passo decisivo para que ela integrasse o processo capitalista de produção. Os mapas confirmaram-se como armas do imperialismo, promovendo a política colonial.

Em sequência, mais um significativo avanço na cartografia foi dado no século xviii, com a instituição de academias científi-cas, marcando o início da ciência cartográfica moderna. Grandes inovações foram propostas pelo astrônomo francês Cesar-François

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Cassini de Thury (1714, 1784), que elaborou a primeira série sistemática de mapas topográficos para a França (Libault, 1960).

Entretanto, a maior investida relacionada aos mapeamentos, como apoio aos novos conhecimentos, se deu com o aditamento do imperialismo, no fim do século xix. Cada potência necessitaria de um inventário cartográfico preciso para as novas incursões exploratórias, incorporando, portanto, também essa ciência às suas investidas espoliativas nas áreas de dominação (Palsky, 1984, 1996).

Contribuíram também para isso o florescimento e sistemati-zação dos diferentes ramos de estudos operados com a divisão do trabalho científico no fim do século xviii e início do século xix. Isso fez com que fosse desenvolvido, mediante acréscimos sucessivos, outro tipo de cartografia: a cartografia temática, área de estudos atinentes aos mapas temáticos (Robinson, 1982; Robinson et al., 1985; Alegre, 1964; Bord e Baudel, 2004).

Atualmente, está-se em plena era da informação. Com a aplicação de procedimentos automáticos à informação, por meio de computador, desenvolveu-se a informática.

Na cartografia, a automação introduziu-se pelas fases mais matemáticas do processo cartográfico, graças ao aparecimento dos computadores por volta de 1946. As primeiras aplicações foram feitas aos cálculos astronômicos e geodésicos, ao estabelecimento das projeções e, mais tarde, aos tratamentos estatísticos de dados. Mas foi a partir da década de 1960 que se passou a considerar uma cartografia assistida por computador, a qual se tornou operacional em todas as etapas da elaboração dos mapas. Na cartografia temá-tica, em particular, houve grande avanço em função do sensível progresso da geografia quantitativa, que se iniciara desde a metade da década de 1950. Os processos computacionais foram almejados em virtude da crescente necessidade de se trabalhar uma grande massa de dados, bem como uma boa variedade de parâmetros específicos para uma análise matemática e estatística consciente, além do fato de se entrever uma síntese (Joly, 1990; Lacoste, 2007).

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No mundo de hoje, com a globalização da tecnologia, tendo destaque na informática e nas telecomunicações, a cartografia conta com inúmeras contribuições consistentes para seu efetivo desenvolvimento.

É patente a ampla difusão de mapas e de possibilidades para sua elaboração por parte do grande público, mesmo não havendo um adequado preparo.

Tendo-se decidido por assumir, dentre outras, a postura da cartografia como linguagem, a proposta deste livro sobre os mapas da Geografia nasceu da necessidade de se trabalhar, de forma acurada, com o ramo temático da ciência dos mapas. Assim, consoante tal imperativo, a laboração dirigiu-se aos alunos dos cursos de graduação em Geografia, oferecendo-lhes uma base metodológica consistente capaz de lhes assegurar resultados frutos de um raciocínio crítico consciente.

O aprendizado e a experiência adquirida com os mestres Bertin, Bochicchio, Bonin, De Biasi, Gimeno, Libault, Petrone, e Rimbert levaram a uma reflexão sobre o significado dos mapas diante do saber geográfico e a respectiva posição deles na estrutura curricular desse setor do ensino superior.

Assim, este livro destina-se a, além dos estudantes da gradua-ção em Geografia, licenciatura e bacharelado, também aqueles do mestrado, doutorado e pós-doutorado, interessados nesta temática. É também oportuno para graduandos, pós-graduandos, pesquisadores e profissionais de outros campos científicos, na medida em que vislumbrarem o mapa temático como um meio de registro, de pesquisa e de visualização dos resultados obtidos em seus estudos a caminho do conhecimento da realidade,1 e não

apenas como mera ilustração.

Primeiro, introduz-se o interessado no mundo dos mapas, mediante uma incursão em um domínio da comunicação visual e, portanto, social deveras específico, que é o da linguagem dos mapas, colocando ao leitor os fundamentos da cartografia temá-tica em bases semiológicas e instruindo-o sobre a organização

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dos dados e o preparo da base cartográfica. Depois, passa-se a tratar a metodologia da cartografia temática preocupada com a representação da realidade geográfica que se apresenta, tida como um passo a caminho desse saber.

O conteúdo deste livro está organizado em capítulos; uni-dades de estudo para as quais se leva em conta um embasamento metodológico e crítico. Nos últimos capítulos, são retomadas considerações mais detalhadas sobre paradigmas da cartografia a serem adiante anunciados e que foram de maior impacto em tempos mais recentes.

É preciso lembrar, também, que as considerações metodoló-gicas da cartografia temática são tratadas em base a procedimentos analógicos, tal como foi sistematizada em seu desenvolvimento histórico. É evidente que hoje, a multiplicidade de softwares que se dedicam à cartografia temática proporciona grande apoio, com soluções ágeis e sofisticadas. Entretanto, é impossível desvinculá-los de uma boa e acurada avaliação crítica, impra-ticável de ser levada a efeito sem um consistente embasamento metodológico.

Considera-se tal empreendimento uma proposta à altura de esclarecer e encaminhar corretamente o raciocínio de quem pretende elaborar uma cartografia temática para uma Geografia atuante. O mapa nunca deverá resultar como uma ilustração de texto geográfico, mas, ao contrário, deverá comparecer como um meio capaz de revelar o conteúdo da informação, proporcionando, dessa feita, a compreensão, a qual norteará os discursos científi-cos, permitindo ao leitor uma reflexão crítica sobre o assunto e promovendo o conhecimento.

Nota

1 Será oportuno colocar esclarecimentos sobre real e realidade. Real é tudo o que existe

fora da mente. É aquilo que se toma como real. Realidade é propriedade do que é real. Cada pessoa vê o real como lhe convém, e chama de realidade tudo o que corresponde às suas concepções subjetivas (Duarte Júnior, 2004).

Referências

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