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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LINGUÍSTICA MESTRADO EM LINGUÍSTICA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LINGUÍSTICA

MESTRADO EM LINGUÍSTICA

LUCIENE BARBOSA DE SOUZA

PROCESSAMENTO DA MORFOLOGIA DERIVACIONAL DO

PORTUGUÊS BRASILEIRO (PB) POR CRIANÇAS COM

DIFICULDADES DE LEITURA

JOÃO PESSOA/PB 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LINGUÍSTICA

MESTRADO EM LINGUÍSTICA

LUCIENE BARBOSA DE SOUZA

PROCESSAMENTO DA MORFOLOGIA DERIVACIONAL

DO PORTUGUÊS BRASILEIRO (PB) POR CRIANÇAS COM

DIFICULDADES DE LEITURA

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Linguística (PROLING) da Universidade Federal da Paraíba, dirigido à área de concentração Aquisição da Linguagem e Processamento Linguístico, como requisito para obtenção do título de mestre em Linguística.

Orientador:

Prof. Dr. José Ferrari Neto

JOÃO PESSOA/PB 2013

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LUCIENE BARBOSA DE SOUZA

PROCESSAMENTO DA MORFOLOGIA DERIVACIONAL DO

PORTUGUÊS BRASILEIRO (PB) POR CRIANÇAS COM

DIFICULDADES DE LEITURA

APROVADA EM: ____/____/____

BANCA EXAMINADORA:

______________________________________________________________________ Prof. Dr. José Ferrari Neto – UFPB

(Orientador)

______________________________________________________________________ Prof. Dr. Márcio Martins Leitão – UFPB

______________________________________________________________________ Prof.ª Dr.ª Carla Alexandra da Silva Moita Minervino – UFPB

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DEDICATÓRIA

Dedico essa conquista a minha família pela sustentação diante das dificuldades e pelo amor

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pela certeza da Sua presença em minha vida, pois nos momentos de medo fostes a minha coragem e nos momentos de fraqueza fostes a minha força.

Ao meu orientador José Ferrari Neto, pela confiança, sábios ensinamentos e motivação constante, que, com simplicidade, irreverência, e comprometimento me inseriu no universo das pesquisas linguísticas.

Aos meus co-orientadores Carla Moita e Márcio Leitão pelas discussões, sugestões e disponibilidade.

Aos professores do Programa de Pós-graduação em Linguística da UFPB, pelos ensinamentos.

Aos membros do LAPROL pelas discussões e companheirismo, especialmente a amiga Gitanna Brito, pelos inesquecíveis momentos de estudo, discussão, incentivo, descontração e alegria que juntas passamos no decorrer deste curso.

A direção, professores e demais funcionários da Escola Municipal Belizário por permitirem a aplicação dos meus experimentos nessa instituição e pela torcida que sempre mantiveram por mim e aos amigos da Escola Santa cruz que contribuíram e torceram por esta conquista. A minha mãe, Lúcia Barbosa e ao meu padrasto José Eldes, tesouros sublimes da minha vida. Ao meu irmão Jadyeldes Barbosa pelo apoio incondicional em todos os momentos desse curso.

Ao meu filho, Tiago Luiz, amor da minha vida.

Aos meus amigos e familiares, especialmente a Ceiça Xavier, Joana D’Arc Beserra, Klaudia, Selma, Dora Barbosa, Vanice Barbosa, Ênio Barbosa, Edilberto Nascimento, Antonieta Inácio, Alexandrina Inácio, Edimilson e João Inácio pelas orações e o aconchego.

A Simone e a Tatyara pela companhia, pelo carinho e cuidados com meu filho, durante este curso.

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Nunca um acontecimento, um fato, um feito, um gesto de raiva ou de amor, um poema, uma tela, uma canção, um livro tem por trás de si uma única razão. Um acontecimento, um fato, um feito, uma canção, um gesto, um poema, um livro se acham sempre envolvidos em densas tramas, tocados por múltiplas razões de ser de que algumas estão mais próximas do ocorrido ou do criado, de que outras são mais visíveis enquanto razão de ser. Por isso é que a mim me interessou sempre muito mais a compreensão do processo em que e como as coisas se dão do que o produto em si.

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RESUMO

Este estudo investiga o processamento da morfologia derivacional do Português Brasileiro (PB) por crianças com e sem dificuldades de leitura. A literatura tem sugerido uma dificuldade das crianças com transtornos de leitura em processar palavras morfologicamente complexas, o que remete ao modo como palavras derivadas são representadas no léxico mental dos portadores desse transtorno e por eles processadas. Outra explicação cabível seria a de que esse tipo de criança apresenta problemas na passagem do reconhecimento da forma gráfica sublexical da palavra para a forma fônica lexical correspondente. Em qualquer dos casos, esse transtorno se reflete tanto nas habilidades de leitura de palavras morfologicamente complexas quanto na aquisição das regras subjacentes aos processos derivacionais de formação de palavras em PB. A fim de prover mais evidências sobre essa questão, realizou-se um experimento, valendo-se da Técnica de Decisão Morfossemântica (BESSE; VIDIGAL DE PAULA; GOMBERT, 2005), numa adaptação da que foi usada por Mota (2008). Foram testadas 25 crianças sem dificuldade de leitura, divididas em dois grupos etários, crianças com idade de 7 a 8 anos e 9 a 10 anos as quais serviram como controle, e 16 crianças com dificuldades de leitura, também divididas em dois grupos etários e também, com idade de 7 a 8 anos e 9 a 10 anos. Os resultados indicam que as crianças com transtorno de leitura que adquirem PB têm maior dificuldade em ler e processar as palavras morfologicamente complexas, em relação às crianças sem essa dificuldade que adquirem essa mesma língua.

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ABSTRACT

This study investigates the processing of derivational morphology in Brazilian Portuguese (BP) by children with and without reading difficulties. The literature has suggested a difficulty of children with reading disorders in processing morphologically complex words, which refers to how derived words are represented in the mental lexicon of the carriers of this disorder and they processed. Another possible explanation could be that such a child has problems in acknowledgment passage graphically sublexical word for lexical corresponding phonic form. In both of these cases, this disorder is reflected on the reading competence as well as on the acquisition of rules underlying the derivational processes of word formation in BP. In order to gain more evidences about this question, an experimental task was conducted, using the Morphosemantical Decision Paradigm (BESSE; VIDIGAL DE PAULA; GOMBERT, 2005), an adaptation of which was used by Mota (2008). It were tested 25 children without reading difficulties, divided into two age groups, children aged 7-8 years and 9-10 years, the which served as controls, and 16 children with reading difficulties, also divided into two age groups and also aged 7-8 years and 9-10 years. The results indicate that children with reading disorder that acquire BP have greater difficulty reading and processing morphologically complex words, compared to children without this difficulty acquiring this language.

Keywords: morphology, language, processing, reading, reading difficulties

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 11

2 REVISÃO DA LITERATURA ... 16

2.1 Leitura e Processamento da Leitura... 16

2.2 Dificuldades de Leitura ... 18

2.2.1 Definições da Dislexia ... 19

2.2.3 Aspectos Históricos ... 22

2.2.4 Características e Diagnóstico... 26

2.2.5 Classificação da Dislexia ... 30

2.3 Estudos de Processamento da Morfologia nas Dificuldades de Leitura ... 34

2.4 Aspectos da Morfologia na Teoria Psicolinguística ... 39

2.5 Aspectos da Morfologia na Teoria Linguística ... 43

3 METODOLOGIA E CONJUNTO EXPERIMENTAL ... 47

3.1 Caracterização e Local da Pesquisa ... 47

3.2 Critérios de Inclusão e Exclusão ... 47

3.3 Técnicas para Coletas dos Dados ... 48

3.4 Experimento 1 - Tarefa de Decisão Morfossemântica ... 49

3.5 Resultados e Discussão ... 51

4 CONCLUSÕES ... 56

5 REFERÊNCIAS ... 57

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LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1: Tempo médio de resposta comparando crianças com e sem dificuldades de leitura nas condições prefixo, sufixo e raiz – Faixa etária de 7 a 8 anos...45

GRÁFICO 2: Tempo médio de resposta comparando crianças com e sem dificuldades de leitura nas condições prefixo, sufixo e raiz – Faixa etária de 9 a 10 anos...46

GRÁFICO 3: Percentual de acertos comparando crianças com e sem dificuldades de leitura nas condições prefixo, sufixo e raiz – Faixa etária 7 a 8 anos...47

GRÁFICO 4: Percentual de acertos comparando crianças com e sem dificuldades de leitura nas condições prefixo, sufixo e raiz – Faixa etária 9 a 10 anos...47

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1: Componentes da leitura...25

FIGURA 2: Modelo Dual de leitura de palavras...30

FIGURA 3: Exemplos de estruturas morfológicas em Português PB - I...32

FIGURA 4: Exemplos de estruturas morfológicas em Português PB – II ...33

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1 INTRODUÇÃO

Este estudo propõe uma investigação acerca do processamento da morfologia derivacional do Português Brasileiro (PB) por crianças com dificuldades de leitura. As abordagens da Psicologia Cognitiva, no que refere aos modelos cognitivos de processamento da leitura normal e de leitura deficiente, e da teoria linguística gerativa e da teoria psicolinguística experimental, no que concerne aos estudos sobre processamento morfológico, configuram-se como bases relevantes para a proposta desta dissertação. Apesar dos modelos de processamento morfológico e de representação/acesso lexical propostos no âmbito da Psicolinguística serem guiados em grande parte dissociados de considerações sobre o modo como ocorrem as derivações linguísticas sugerido pela Linguística, e os modelos de léxico e descrição da organização e funcionamento da componente morfológica da gramática serem formulados em um nível de abstração em que não se consideram questões relacionadas à sua interface com sistemas perceptuais e de memória, assume-se aqui a possibilidade de uma interação entre esses dois campos da ciência da linguagem.

A articulação entre essas duas vertentes, teoria linguística e teoria psicolinguística encontra-se em franca ascensão no Brasil, e vem sendo buscada, por exemplo, no tratamento de questões ligadas ao processamento, aquisição e déficit de linguagem (CORRÊA, 2005, 2006); através de evidências empíricas por meio de estudos do mapeamento da atividade cerebral (FRANÇA, ET AL. 2008) e nas pesquisas sobre aquisição e processamento de palavras morfologicamente complexas (FERRARI-NETO, 2010, 2011). Vários centros de pesquisa também estão atuando em direção à integração entre esses dois campos de estudo da linguagem. Nessa perspectiva, podem-se citar os estudos sobre a interface Linguística/Neurolinguística realizados no ACESIN – UFRJ, a construção de um modelo integrado da aquisição, produção e processamento linguístico do LAPAL – PUC/RJ, as pesquisas sobre processamento de frases feitas no LAPEX – UFRJ e as investigações sobre o processamento e a aquisição da linguagem e processamento lexical no LAPROL – UFPB, grupo de pesquisa a que esta dissertação está vinculada.

No que tange a morfologia, observa-se que, nas últimas décadas, ela vem se consolidando como um campo de interesse crescente para a Linguística e a Psicolinguística. Na Linguística, com a proposta da Hipótese Lexicalista (Chomsky, 1970), segundo a qual as formas nominais passam a fazer parte do léxico, as abordagens da teoria gerativa começam a

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12 tomar novos rumos. A morfologia ganha autonomia em relação à sintaxe dentro dessa teoria, e consequentemente, fez surgir à necessidade da criação de um modelo teórico que descrevesse e explicasse a competência lexical do falante. Na Teoria Psicolinguística, as principais questões giram em torno do acesso direto ou indireto, da necessidade da decomposição morfológica para o acesso lexical e da existência de representações de acesso e de representações centrais. Outra questão a ser elucidada é saber qual a unidade básica de representação: se é o morfema, a palavra ou ambos.

De um modo geral, o conhecimento que um falante possui sobre o léxico1, isto é a competência lexical, pode ser caracterizada pela habilidade para formação de novos itens, a rejeição de formações lexicais agramaticais, bem como o conhecimento de uma lista de itens

lexicais, das relações entre eles e o conhecimento da estrutura interna desses itens. Já o estudo do léxico mental2 pode ser caracterizado como a descrição do modo como as unidades lexicais estão armazenadas e do modo como são acessadas.

Por sua vez, modelos cognitivos de processamento da leitura têm servido de base para a formulação e testagem de hipóteses relativas ao modo como a atividade da leitura é implementada em nível mental, a partir das características e propriedades dos meios cerebrais e anatômico-funcionais que lhe subjazem. A partir daí, pode-se elaborar modelos teóricos que permitam o estabelecimento de previsões não apenas acerca do comportamento dos falantes de uma língua no tocante à leitura, mas também a respeito do comportamento de indivíduos que apresentam queixa de leitura. Nesse sentido, o estudo cognitivo das dificuldades de leitura apresenta-se como altamente relevante, na medida em que torna possível, por meio da análise do comportamento atípico, a construção de explicações teóricas sobre o funcionamento não desviante da leitura em pontos que limitações de ordem ético-metodológicas impediriam a investigação experimental.

1 Léxico é o componente da gramática que contém todas as informações – fonológicas, morfológicas, semânticas e sintáticas – que os falantes sabem sobre palavras simples e/ou morfemas.

2 De acordo com a Teoria Psicolinguística é denominado léxico mental e corresponde a um repositório de conhecimentos declarativos sobre as palavras de uma língua. Estes conhecimentos podem ser de natureza fonológica, semântica, morfológica e sintática, podendo também haver conhecimentos pragmáticos e estilísticos sobre os itens lexicais. Do ponto de vista linguístico, o léxico é uma lista de elementos que são usados na formulação de sentenças. Consiste num conjunto de informações acerca dos itens lexicais que são acessados e manipulados pela gramática.

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Mediante essas discussões, a hipótese de trabalho que norteia esta pesquisa é a de que as crianças com dificuldades de leitura possuem déficits de processamento grafo fonológico, o que pode induzir falhas de processamento morfológico. Isto ocorreria porque problemas de decodificação da leitura, quais sejam, erros no reconhecimento da forma gráfica sublexical3 dos morfemas, acarretam equívocos na recuperação das suas formas fônicas correspondentes no léxico central, sobrecarregando a memória de trabalho e aumentando o tempo de leitura da palavra, o que acarreta prejuízos à identificação dos elementos mórficos constituintes da palavra durante o processamento da leitura. Daí haver uma dificuldade no reconhecimento da estrutura morfológica das palavras, quando essas são expostas sob forma de input escrito, uma vez que, sendo os morfemas devidamente estocados tanto no léxico central, quanto nas representações de acesso, o problema estaria concentrado na passagem entre a forma gráfica dos morfemas, visualmente processadas, e a sua representação abstrata no léxico mental, o que leva a uma lentidão no reconhecimento do modo como estão morfologicamente estruturadas as palavras, em especial, as polimorfêmicas.

A relação entre o processamento grafo fonológico, o morfológico e a memória de trabalho parece ir além da segmentação da linguagem e utilização desta segmentação para o reconhecimento dos morfemas constituintes da palavra, visto que o sujeito precisa processar e armazenar informações no léxico e no léxico mental para poder atuar, de forma eficaz, tanto com a linguagem falada quanto com a linguagem escrita. Pesquisas têm sugerido que, para as crianças com dificuldades de leitura, a recuperação destes itens lexicais, quando exibidos sob forma de input escrito, geralmente acontece à custa de muito esforço, especificamente quando se trata de palavras com estrutura morfológica complexa, uma vez que é preciso reconhecer cada um dos elementos mórficos constituintes da palavra para depois recombiná-los. Esse armazenamento e recuperação dos itens lexicais afiguram-se como dependentes tanto da estrutura morfológica quanto da frequência da palavra. Palavras de estrutura morfológica complexa parecem ter afixos e bases estocados e recuperados separadamente e depois recombinados. Já a frequência parece determinar a lentidão ou a rapidez com que os itens são reconhecidos e recuperados na memória de trabalho.

Partindo desses pressupostos, esta dissertação tem como objetivo geral, analisar o processamento morfológico em crianças com dificuldades de leitura, observando se essas

3 Por sublexical entenda-se armazenado em léxicos de acesso, os quais são acessados previamente à recuperação de um item no léxico mental central. Esses léxicos de acesso estocam representações gráficas ou fônicas correlacionadas a itens lexicais. Modelos de léxico mental que postulam a existência de representações lexicais de acesso são chamados modelos de acesso indireto, opostos aos modelos de acesso direto.

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14 dificuldades prejudicam o reconhecimento de palavras com estrutura morfológica complexa, comparativamente a crianças sem dificuldades de leitura. Como objetivos específicos propõem-se: observar o acesso lexical às palavras morfologicamente complexas, tentando compreender de que maneira essas palavras são processadas e representadas no léxico e no léxico mental de crianças com dificuldades de leitura e investigar se déficits de processamento grafo fonológico podem ocasionar erros de natureza morfológica em tarefas de leitura.

Estudos de abordagem linguística e psicolinguística estão contribuindo na apresentação e análise do processamento morfológico, mas são poucos os estudos nacionais que investigam o processamento da morfologia derivacional, o que justifica a necessidade de empreender pesquisas focadas em uma teoria linguística e psicolinguística que possam contribuir para compreensão de aspectos cognitivos atuantes na representação e acesso de itens lexicais do PB por sujeitos com dificuldades de leitura. Se, conforme sugerido neste trabalho, às dificuldades de leitura afetam aspectos específicos do processamento linguístico, no que concerne ao reconhecimento da palavra escrita, a adoção de um modelo psicolinguístico de processamento lexical, a partir da palavra escrita, pode contribuir para um melhor entendimento das dificuldades de leitura, ao mesmo tempo em que dados de sujeitos com essas dificuldades, obtidos experimentalmente, podem contribuir para a formulação de modelos teóricos de léxico. E ambas podem ainda se articular com a Psicologia Cognitiva no que tange aos modelos cognitivos das dificuldades de leitura. Assim, é lícito admitir a viabilidade de um tratamento integrado entre teoria linguística, teoria psicolinguística e teorias da cognição no estudo das dificuldades de leitura, em especial no que se refere ao processamento de módulos gramaticais de uma língua, neste caso, o do módulo morfológico.

A dissertação está organizada em capítulos que versam sobre questões de cunho teórico, metodológico e de análise dos resultados. Esse capítulo introdutório que busca resumir a proposta da pesquisa. O segundo capítulo que faz uma revisão da literatura, abordando a leitura e o seu processamento, as dificuldades de leitura, em especial a dislexia do desenvolvimento, seus conceitos, características, diagnóstico e aspectos históricos, apresentam-se também aspectos da morfologia e da morfologia derivacional do PB e em seguida discute-se sobre a morfologia no âmbito da teoria psicolinguística, modelos de acesso direto e modelos de acesso indireto ao léxico mental e o processamento morfológico e sobre a morfologia no âmbito da teoria linguística, Hipótese Lexicalista, Modelos de Léxico Linguístico e a abordagem da Morfologia Distribuída. O terceiro capítulo, de cunho metodológico, traz os procedimentos adotados para realização da pesquisa e a descrição do

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15 experimento psicolinguístico aplicado e por fim, discutem-se os resultados obtidos experimentalmente.

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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.1 Leitura e Processamento da Leitura

A leitura é uma invenção recente da raça humana, é uma habilidade que se adquire, que não está construída em nossos genes. A leitura é uma habilidade difícil e um extenso aprendizado é necessário para que seja completamente dominada (ELLIS, 1995, p. 16). Diferentemente, a linguagem falada (verbal) é inata, instintiva, gerativa, não precisa ser ensinada (CHOMSKY, 1965, 1980, 1995, 1997; PINKER, 1991, 1994).

Ainda que seja possível elencar outras diferenças significativas entre esses dois fenômenos, é relevante mencionar que tanto a fala quanto a leitura dependem da mesma partícula, o fonema. Para a linguagem verbal o fonema já se apresenta pronto, mas para a leitura o acesso ao fonema parece ser possível à custa de um esforço considerável do leitor iniciante.

Para conseguir ler, o leitor precisa tirar vantagem do que a natureza oferece: o módulo biológico para a linguagem (SHAYWITZ, 2006). Nesse sentido, presume-se que o leitor precisa aprender a converter o que lê em um código que seja reconhecido e aceito pelo sistema de linguagem, o código fonológico. No entanto, diferentemente das partículas da linguagem verbal, as letras do alfabeto não têm nenhum sentido linguístico inerente. De modo geral, essas letras não passam de um amontoado de riscos e círculos destituídos totalmente de conotação linguística.

Para que as letras passem a ter sentido e transformem-se em linguagem é necessário que o ser humano se conscientize da natureza segmentada da linguagem verbal, reconhecendo os elementos básicos – as partículas da linguagem verbal, fonemas e sons – aos quais pode relacionar as letras adequadas, de modo que, traduzidas em código fonético, as palavras impressas possam ser aceitas pelos circuitos já preparados para processar a linguagem verbal (CAPPELINI; CIASCA, 1999 e SHAYWITZ, 2006). Em síntese, para tornar-se leitor, é imprescindível o desenvolvimento da consciência fonêmica, isto é, a compreensão de que as palavras verbalizadas são constituídas de unidades menores de som. Essa descoberta extraordinária sobre o processamento da leitura só foi possível porque avanços tecnológicos estão possibilitando estudos sofisticados feitos com imagens do cérebro no ato da leitura, permitindo aos pesquisadores observar e rastrear o registro da palavra impressa,

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17 primeiramente como símbolo visual, em seguida transformada em sons da linguagem e simultaneamente quando ativa seu significado.

Nesse processo de desenvolvimento para tornar-se leitor há, segundo Capovilla e Capovilla (2000), três etapas de aquisição da leitura: a global, a analítica e a decodificada. Estas etapas de desenvolvimento da leitura são apresentadas por Frith (1985) nos estágios:

logográfico (leitura como representação pictográfica), alfabético (correspondências grafemas

e fonemas) e ortográfico (significação é descoberto via sistema semântico verbal).

No primeiro estágio, o logográfico, a criança desenvolve estratégias de reconhecimento visuais e globais das palavras, através de esquemas idiossincráticos, sendo necessário o uso de pistas não alfabéticas. Logo, a palavra pode ser reconhecida pela forma como é escrita, por meio da combinação de cores, formato, tamanho das letras, isto é, há um contexto espaço-visual, sendo a palavra reconhecida como uma figura. Nesta etapa, a aprendizagem ocorre por associação, por exemplo, a palavra Nescau pode ser lida por uma criança, se esta aparecer no formato do logotipo, com suas cores e formas, uma vez que neste estágio há uma associação entre o desenho das letras e o referido objeto. A leitura nessa fase é visual. Consoante Pereira (2008), a manutenção dessa estratégia logográfica até o final da alfabetização, sobrecarregaria a memória de trabalho, tornando inviável o arquivo de tantas informações visuais.

O segundo estágio, o alfabético, é caracterizado inicialmente pela capacidade que a criança tem em converter uma sequência de letras em fonemas, embora não seja ainda capaz de compreender o que está sendo lido. Assim sendo, as crianças precisam aprender e conhecer a correspondência entre som e letra. Nesta fase, os processos de decodificação e codificação são lentos e podem causar erros de leitura, o que é aceitável, diante das irregularidades da língua; contudo, atividades de leitura podem proporcionar progressivamente a fluência e minimizar esses erros, à medida que palavras aumentam em frequência de ocorrência.

O terceiro e último estágio é o ortográfico, no qual se postula que a criança é capaz de reconhecer as unidades morfômicas da palavra, bem como compreender o que está sendo lido via sistema semântico. Isto é, ela é capaz de associar a forma gráfica a um som e isso a um sentido. Após a aprendizagem das regras de correspondências grafêmica, a criança está habilitada para apreender as exceções às regras, isto é, as palavras irregulares e as palavras pouco frequentes. Além do que, a partir deste momento, o sistema de leitura e reconhecimento visual da criança encontra-se preparado para leitura de qualquer palavra. Assim, o processo de decodificação do sinal gráfico pode se dar ou pela via fonológica, para leitura de palavras

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18 pouco frequentes (que necessitam ser analisadas pelas regras de correspondência grafêmica) ou pela via lexical (que processa a palavra visual por inteiro, acessando diretamente uma representação abstrata dessa palavra no léxico ortográfico), em se tratando de palavras mais frequentes. Isso é o que é previsto pelo Modelo de Dupla Rota (ver mais sobre o desenvolvimento dessas vias de recuperação e acesso lexical no tópico 2.2.5).

Ressalta-se que a transição entre estes estágios não tem uma marcação especificamente cronológica, o que possibilita a aprendizagem da leitura como utilização de estratégias que podem alternar-se, misturar-se, sobrepor-se. Além disso, por não serem processos que se apagam cognitivamente, pode-se, por exemplo, utilizar-se dessas estratégias até a vida adulta. No entanto, é importante salientar que um número significativo de crianças, passa por sérias dificuldades de leitura. No tópico a seguir serão apresentados os conceitos, características, classificação e outros aspectos relativos às dificuldades de leitura, buscando compreender as razões pelas quais, muitas crianças, não conseguem adquirir uma habilidade leitora.

2.2 Dificuldades de Leitura

Os transtornos da leitura compreendem uma inabilidade especificamente de leitura em indivíduos que apresentam resultados abaixo do esperado para seu nível de escolaridade, desenvolvimento e capacidade intelectual. Na atualidade, a descrição destes transtornos é encontrada em manuais internacionais de diagnóstico de doenças, como a CID – 10 - Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde em sua 10ª edição, e o DSM – IV - Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais. De modo geral, esses dois manuais caracterizam transtorno da leitura por uma dificuldade específica em compreender palavras escritas, em que foram eliminadas todas as outras causas: circunstâncias culturais, sociais e qualquer outro comprometimento mental, visual, auditivo.

A característica essencial do Transtorno da Leitura consiste em um rendimento da leitura (isto é, correção, velocidade ou compreensão da leitura, medidas por testes padronizados administrados individualmente) substancialmente inferior ao esperado para a idade cronológica, a inteligência medida e a escolaridade do indivíduo (Critério A).

A perturbação da leitura interfere significativamente no rendimento escolar ou em atividades da vida cotidiana que exigem habilidades de leitura (Critério B).

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19 Na presença de um déficit sensorial, as dificuldades de leitura excedem aquelas habitualmente a este associadas (Critério C).

Caso estejam presentes uma condição neurológica, outra condição médica geral ou outro déficit sensorial, estes devem ser codificados no Eixo III. “Em indivíduos com Transtorno da Leitura (também chamado “dislexia”), a leitura oral caracteriza-se por distorções, substituições ou omissões; tanto a leitura em voz alta quanto a silenciosa caracterizam-se por lentidão e erros na compreensão”.

(TRANSTORNO DA LEITURA – DSM – IV – TR, 4º edição, 1994).

Nesse contexto, encontram-se crianças com transtornos residentes no domínio das operações envolvidas no reconhecimento das palavras, isto é, alunos que cometem erros ou que são lentos ao operar a via lexical, a via fonológica ou ambas. Em geral, esse grupo é chamado de disléxico. Desta maneira, defende-se que é uma questão da maior importância identificar tão cedo quanto possível a verdadeira natureza dos transtornos de leitura, pois isso poderá impedir e/ou minimizar o sofrimento da criança e de seus familiares. Quanto mais cedo se identifica a natureza do transtorno, maiores são as chances de a criança aprender a ler.

Os subtópicos que seguem apresentarão uma descrição detalhada sobre o transtorno específico da aprendizagem da leitura, denominado dislexia. Apesar dos participantes da presente pesquisa não terem concluído o diagnóstico de dislexia, o resultado geral dos testes aplicados sugerem que essas crianças são propensas à dislexia (ver capítulo 3).

2.2.1 Definições da Dislexia

Entender o porquê de muitas pessoas inteligentes não conseguirem ler ou ler fluentemente é um desafio que a ciência vem paulatinamente deslindando. Consequentemente, esse intuito de compreender essa dificuldade específica de leitura, denominada de “dislexia”, gerou a necessidade de esclarecer as definições sobre esse transtorno. Assim, a World Federation of Neurology (Federação Mundial de Neurologia) em 1968 chegou a seguinte definição: “A dislexia é um distúrbio manifestado pela dificuldade em

aprender a ler, independentemente da instrução convencional, da inteligência adequada e da oportunidade sociocultural”. (CRITCHLEY, 1970).

No entanto, esse conceito, além de utilizar termos de definição subjetiva e/ou de difícil definição, não apresenta critérios para o seu diagnóstico positivo, exceto ao afirmar que é uma dificuldade de leitura, podendo ser classificada como uma definição por exclusão. Com a

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20 ausência de critérios e objetivos que pudessem contribuir para diagnosticar uma pessoa com dislexia, essa definição caiu em desuso. Esse modelo médico da dislexia, não muito aceito também por educadores, deu lugar aos estudos epidemiológicos, que são estudos de amostras amplas de crianças.

Esses estudos introduziram uma distinção entre crianças que apresentam dificuldades específicas na leitura (retardamento específico da leitura) e aquelas que têm dificuldades no contexto de problemas mais gerais de aprendizagem de leitura (atraso na leitura) (RUTTER e YULE, 1975). A classificação desses leitores deficientes tem seu ponto inicial na relação entre a habilidade na leitura e a inteligência na população normal. Mediante esta relação, é possível utilizar uma abordagem conhecida como regressão, a qual prevê para qualquer criança a idade esperada de leitura, observados sua idade e seu QI. Nesse contexto, considera-se que uma criança tem dificuldades específicas de leitura quando o considera-seu deconsidera-sempenho considera-se encontra abaixo do previsto para a sua habilidade cognitiva; neste caso, a criança mostra uma discrepância entre o desempenho esperado e o desempenho real, sendo nesta situação que o termo dislexia deve ser aplicado. Por outro lado, crianças com dificuldades mais gerais de leitura são consideradas maus leitores, quando a idade de leitura está abaixo de sua faixa etária e seu QI também é relativamente baixo. Entretanto, ao mesmo tempo em que as pesquisas sobre dislexia foram evidenciando a relação das semelhanças entre os leitores definidos pela discrepância e os maus leitores, a abordagem da regressão começava a cair em desuso. A dependência da estrutura do QI na definição da dislexia foi apontada como uma das razões para o desuso da abordagem da regressão (SIEGEL, 1988 e STANOVICH, 1991). Essas questões relativas ao uso do QI para o diagnóstico da dislexia fizeram a Orton Dyslexia Society of USA (Orton Sociedade Americana de Dislexia, hoje denominada Internacional Dyslexia Association – Associação Internacional de Dislexia) postular a seguinte definição (1994):

A dislexia é uma das diversas incapacidades distintas na aprendizagem. É um distúrbio específico baseado na linguagem, de origem constitucional, caracterizado por dificuldades na decodificação de palavras isoladas, que geralmente refletem habilidades insuficientes de processamento fonológico. Essas dificuldades na decodificação de palavras individuais são frequentemente inesperadas em relação à idade ou a outras capacidades cognitivas; elas não são resultantes de uma incapacidade de desenvolvimento ou de um comprometimento sensorial. A dislexia se manifesta por uma dificuldade variável em diferentes formas de linguagem, incluindo, além de um problema na leitura, um problema conspícuo na aquisição de proficiência na escrita e no soletrar. (ORTON DYSLEXIA SOCIETY, 1994).

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21 Apesar dessa definição apresentar diversos pontos importantes que contribuíram para esclarecer a dislexia, enfatizando, entre outros aspectos, problemas de decodificação da palavra e o reconhecimento da importância das dificuldades do processamento fonológico, ela é ainda uma definição vaga, pois, assim como outros métodos comumente usados para definir as dificuldades de leitura, essa definição também pode negligenciar algumas crianças, cujos problemas, teria a finalidade de identificar.

Diante do exposto, observa-se que algumas das dificuldades encontradas para definir a dislexia surgem da confusão em relação à sua função, neste caso, o ponto de debate é se a função da dislexia é explicar ou descrever as dificuldades específicas de leitura. No modelo médico, a função da dislexia parece estar relacionada à descrição de uma síndrome de origem neurológica, já a definição da discrepância concentra-se em explicar a correlação entre o QI e o desempenho na leitura. Na tentativa de minimizar esta confusão, pesquisas estão considerando a dislexia como um distúrbio que envolve níveis diferentes de descrições e, por isso, pode apresentar características que irão mudar com o envelhecimento (BISHOP, 1997; SNOWLING, 2004).

A busca relutante de pesquisadores de áreas relacionadas ao campo da educação e da saúde para entender o que é dislexia resultou em inúmeras definições e denominações para essa dificuldade específica de leitura. Diante dessa abordagem, uma definição que melhor condiz com as evidências acumuladas ao longo das pesquisas sobre esse assunto e que está de acordo com a proposta desta dissertação, é a definição sugerida pela CID – 10.

De acordo com a CID – 10 a dislexia é descrita como um transtorno específico de leitura, no qual a característica essencial é um comprometimento específico e significativo do desenvolvimento das habilidades da leitura, não atribuível exclusivamente a idade mental, a transtornos de acuidade visual ou escolarização inadequada. Podem estar comprometidas: a capacidade de compreensão leitora, o reconhecimento de palavras, a leitura oral e o desempenho em tarefas que exijam a leitura. Em síntese, uma criança pode ser considerada disléxica, quando há um comprometimento na sua habilidade de decodificação e soletração o que pode consequentemente afetar sua capacidade de compreensão.

(23)

22 2.2.3 Aspectos Históricos

Para entender um pouco mais sobre a dislexia faz-se necessário uma apresentação da trajetória dos estudos científicos e das teorias que foram criadas para melhor estudá-la. Desse modo, ressalta-se que os primeiros relatos de crianças brilhantes e motivadas, mas com dificuldades de leitura, foram publicados por médicos ingleses e escoceses no final do século XIX e início do século XX. O clínico geral Pringle-Morgan publicou, em 1896, no British Medical Journal, a descrição de um jovem de 14 anos, de inteligência normal e com incapacidade de ler. A descrição desse mesmo sujeito foi feita posteriormente pelo oftalmologista Hinshelwood, em 1917. A ideia central corroborada por esses médicos é que essas dificuldades na leitura eram provavelmente devidas a uma forma de “cegueira congênita específica à palavra”.

Contudo, nos séculos anteriores, relatos sobre dificuldades de leitura, já haviam sido feitos em adultos que sofreram alguma lesão cerebral, os casos da chamada “cegueira verbal adquirida”. Presume-se que, por ser adquirida, a mudança na capacidade de ler é repentina, drástica, e por isso foi percebida antes dos casos congênitos. Ao contrário, a “cegueira verbal congênita” está presente desde o nascimento, mas por ser sutil, pode passar despercebida por alguns anos até a criança se deparar com dificuldades na leitura.

As descrições de pacientes de clínicos gerais e de oftalmologistas marcaram o primeiro período de descobertas sobre esse transtorno. Casos de “cegueira verbal” eram constantemente encaminhados a oftalmologistas para análise de olhos e visão, visto que os relatos postulavam a ideia de uma visão aparentemente perfeita, mas que não se conseguia ver as palavras escritas quando se queria ler, no entanto, se podia ver e ler números (SHAYWITZ, 2006).

Entre os oftalmologistas, Hinshelwood merece destaque, por sua dedicação na compreensão e conceituação desse transtorno e pela divulgação do problema. Embora, inicialmente tenha feito descrições sobre a “cegueira verbal adquirida” posteriormente passou a se dedicar a forma congênita. Na busca incessante por compreender esse transtorno, Hinshelwood e colegas médicos, ao fazer registros e observações de suas descobertas, estavam preocupados com a duração, frequência, grupos de risco e o melhor tratamento para essa doença, além disso, defendiam a necessidade da identificação precoce das crianças com “cegueira verbal congênita” (HINSHELWOOD, 1902). Mediante esses estudos,

(24)

23 Hinshelwood concluiu que a causa mais provável desse transtorno era um defeito congênito em uma determinada área do cérebro que afetava a memória visual de palavras e de letras. Para minimizar esse problema, esse médico sugeriu que crianças com esse transtorno tivessem aulas particulares de leitura, com lições curtas e que fossem repetidas frequentemente, com vista a fortalecer as impressões visuais.

Posteriormente, Orton (1937), dedicando-se aos estudos dos transtornos de aprendizagem, chama a atenção para a importância dos fatores da linguagem na determinação desses transtornos. Ao observar que crianças com dificuldades na leitura faziam inversões de imagens espelhadas de letras e palavras, esse autor reforça a teoria acima citada por Hinshelwood ao referir-se ao fato de que crianças que escreviam em espelhos apresentavam mais lateralidade mal estabelecida do que os leitores normais. Orton propôs que esse fenômeno era provocado por uma anomalia do equilíbrio inter-hemisférico, o que não permitiria ao hemisfério esquerdo garantir uma dominância sobre o direito: a esta condição denominou “estrefossimbolia”. Após um período de dez anos de estudo dos transtornos de linguagem e leitura e tendo acesso a famílias com as características supracitadas, ele chama a atenção também para o aspecto genético, isto é para a história familiar das dificuldades de leitura.

No entanto, a publicação de um estudo clínico e genético das dificuldades de aprendizagem de leitura só acontece em 1950, por Hallgério, que denominou este transtorno de “dislexia específica” em substituição à expressão “cegueira verbal congênita”. (ROTA et al, 2006). Da década de 50 a 80, além das teorias sobre a origem hereditária dos transtornos de leitura, destacaram-se teorias relativas ao atraso de maturação cerebral, a estrutura e a função cerebral e sobre os déficits instrumentais.

De maneira geral, houve nesse período, a tentativa de classificar as crianças em diferentes subtópicos, através da utilização das Escalas de Inteligência de Wechsler. Houve a tentativa de mostrar anormalidades cerebrais entre leitores disléxicos e leitores normais, através de estudos post-mortem de cérebros disléxicos utilizando exames microscópicos (GALABURDA e KEMPER, 1978). Posteriormente, Galaburda et al, (1985) mostraram, através de estudos post mortem com cérebros de disléxicos que a perda da assimetria hemisférica normal, no nível do planum temporale, podia constituir uma característica desse grupo. Esses estudos, ainda, revelaram que as distorções da arquitetura cortical (displasias) aparecem provavelmente no período de gênese e de migração neuronal que ocorre do quinto

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24 ao sétimo mês de gestação, e sua localização afeta, geralmente, as regiões cerebrais que participam do sistema neurolinguístico.

Quanto aos déficits instrumentais, estes se dividem em déficits visuais e motores. O primeiro refere-se às dificuldades na discriminação visual e em habilidades espaciais e o segundo refere-se às dificuldades neuromotores. Os déficits visuais que foram mais explorados são os déficits viso espaciais e os déficits de acompanhamento visual. Em relação às capacidades viso espaciais dos disléxicos, pesquisas evidenciam que esse grupo tem um desempenho compatível com as crianças de boa leitura (VELLUTINO, 1979; BRYANT e BRADLEY, 1985). Quanto aos déficits de acompanhamento visual, Pirozzolo e Rayner (1978) mencionam que apenas determinados tipos de disléxicos apresentam uma anomalia dos movimentos oculares, enquanto Pavlidis (1986) afirma que as crianças disléxicas teriam um comportamento ocular específico. Pesquisas relativas a déficits motores mostram que os disléxicos apresentam dificuldades na coordenação bimanual, nos movimentos alterados dos dedos, além de fraqueza na dexteridade grafomotora (WOLF et al. 1985). De maneira geral, no quadro dos déficits instrumentais as pesquisas exploram setores do desenvolvimento referentes à percepção visual, a organização têmporo-espacial, a lateralização e a neuromotricidade, setores que atingem a linguagem oral.

Esses modelos organicistas, hereditários, funcionais que acompanharam a descoberta da dislexia não desapareceram. Com o desenvolvimento das ciências e das técnicas, e, especificamente, os avanços na área da psicologia cognitiva e das ciências da linguagem e da neuropsicologia da criança, as teorias genéticas e neurológicas ganharam novos enfoques, possibilitando uma compreensão mais consistente dos transtornos específicos da linguagem oral.

A década de 90 foi um período em que as pesquisas com foco em aspectos genéticos progrediram substancialmente, e as dificuldades fonológicas começaram a ser apontadas como indicadores significativos da dislexia na infância. Além disso, nas duas últimas décadas, estudos com imagens funcionais tornaram possível à observação dos sistemas neurais em funcionamento quando estes transformam letras em sons. Através dessas imagens foi possível apresentar a evidência neurobiológica – física – das dificuldades que os leitores disléxicos têm em transformar o código escrito em um código linguístico, que é fundamental para leitura (SHAYWITZ, 2006). Essa descoberta foi um passo muito grande na compreensão e tratamento da dislexia, pois aponta quais redes neurais estão envolvidas na leitura. Pesquisas mostram que leitores deficientes têm de fato dificuldades significativas em nomear as letras,

(26)

25 chamando o b de d ou lendo saw como se fosse was, de ler palavras longas, soletrar, memorizar palavras e articulá-las, desmistificando que a dislexia não é um problema de deficiência geral na inteligência ou de deficiência no sistema visual, mas sim um problema de natureza linguística, uma deficiência inerente a um componente específico do sistema de linguagem: o módulo fonológico (SHAYWITZ, 2006). Essas pesquisas sugerem que a dislexia envolve uma disfunção do sistema da linguagem, especificamente no nível do módulo fonológico, além disso, constataram que o modelo fonológico pode apresentar uma explicação convincente sobre a razão de pessoas inteligentes terem dificuldades de leitura.

No processo da leitura, parte-se da palavra inteira impressa, que é formada por letras organizadas corretamente e que representam fonemas. Neste caso, o trabalho do leitor é converter as letras em sons. A dificuldade do disléxico parece estar justamente na transformação de letras em sons, isto é, o disléxico parece ter dificuldade em acessar o léxico mental, ordenar os fonemas adequados a cada letra para construir ou pronunciar as palavras.

Ainda de acordo com as pesquisas mencionadas acima, o modelo fonológico mostra quais as medidas exatas que se deve adotar para que uma criança passe de um estágio em que vê as letras como uma confusão de formas rabiscadas a um estágio em que reconheça e identifique essas mesmas formas como palavras. Além disso, a criança deve perceber que as letras impressas que vê representa, ou mapeiam, os sons que ouve quando a palavra é pronunciada. Esse processo segue uma sequência lógica ordenada, na qual, inicialmente, a criança deve perceber que as palavras que ouve não são apenas blocos sonoros inteiros. O leitor iniciante começa a notar que as palavras são feitas por pequenos segmentos que representam sons. Em seguida deve começar a relacionar as letras que vê ao que ouve na linguagem falada, para finalmente compreender que tanto a palavra escrita quanto à palavra falada podem ser construídas e reconstruídas com bases nos mesmos sons e que na palavra escrita as letras representam tais sons, realizada essa conexão a criança terá dominado o que se chama de princípio alfabético, estando apta para ler (SHAYWITZ, 2006).

A autora supracitada ainda mostra que a não dominância do princípio alfabético pode decorrer de falhas do sistema de linguagem, no nível fonológico, o que pode prejudicar a

consciência fonêmica e consequentemente a capacidade de segmentar a palavra verbalizada

em seus sons subjacentes. Como resultado desse problema, a criança pode ter dificuldades para descobrir/dominar o código de leitura. Considerando o sistema de linguagem e os componentes de leitura ( Figura 1) uma deficiência no módulo fonológico pode prejudicar na decodificação, mas as capacidades superiores necessárias à compreensão permanecem

(27)

26 intactas. De acordo com a hipótese fonológica, os módulos de níveis superiores continuam intactos; no entanto, eles podem não ser ativados, uma vez que a deficiência fonológica, ao bloquear a decodificação, pode impedir que o leitor disléxico aplique suas habilidades de nível superior na compreensão do significado da palavra. A hipótese fonológica vem sendo um dos fatores mais apontados na literatura como causa da dislexia (GALABURDA, 1990; FRITH, 1995; PAULESU et al., 1996; GOMBERT, 2003; ALVES et al., 2011).

Figura 1. Componentes da leitura

Discurso

Sintaxe

Semântica

Fonologia

No entanto, ainda que as dificuldades fonológicas sejam os indicadores mais significativos da dislexia na infância, como mostram as pesquisas acima citadas, dificuldades morfológicas também podem estar envolvidas neste transtorno. Estudos reportados por Caplan (1998) sugerem que sujeitos disléxicos podem ter deficiências seletivas de processamento morfológico, visto que essas deficiências podem afetar tanto o processamento de entrada quanto o de saída em qualquer das modalidades auditivo-oral ou escrita. No tópico 2.3 será abordado sobre a relação da dislexia e o processamento morfológico, apresentando pesquisas que sugerem que os disléxicos têm dificuldades em processar palavras morfologicamente complexas.

2.2.4 Características e Diagnóstico

O entrelaçamento de descobertas sobre a dislexia ao longo dos anos possibilitou afirmar que esse transtorno envolve níveis diferentes de descrição: o biológico, o cognitivo e o comportamental e, por ser um transtorno do desenvolvimento, pode-se esperar que

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27 apresente características comportamentais que irão sofrer mudanças com a idade e o nível educacional. Além disso, o progresso científico tornou possível a identificação de sinais precoces nos primeiros anos de vida. Shaywitz (2006) diz que, como regra geral, as crianças pronunciam suas primeiras palavras por volta de 1 ano e as primeiras frases por volta de 1 ano e 6 meses a 2 anos, e as crianças vulneráveis à dislexia talvez não comecem a pronunciar as primeiras palavras antes de cerca de 1 ano e 3 meses de vida e talvez não pronunciem frases antes de completar 2 anos. Embora esse atraso ao falar possa ser hereditário, isto é, de ordem genética, a dislexia também o é. A hipótese genética baseia-se em estudos da história familiar de dificuldades de leitura. Estudos nessa área acumularam evidências que possibilitaram estimar o risco de dislexia para um indivíduo, a partir da história familiar de seus parentes. Por exemplo, o risco de um homem disléxico ter um filho com o mesmo transtorno é de 40% (GIBER, PENNINGTON e DEFRIES, 1991).

Apesar desses sinais precoces de dificuldades de leitura serem insuficientes para determinar a ocorrência ou não da dislexia, medidas de intervenções podem ser adotadas, com vista a melhorar o possível diagnóstico. Entre essas medidas de intervenção estão, segundo Alegria (2011), a execução de tarefas metafonológicas em conexão com a aprendizagem e prática da correspondência grafo-fonológica. Esse tipo de intervenção, elaborada por professores, psicólogos escolares, entre outros, contém exercícios de caráter lúdico que ajudam progressivamente a criança a analisar a fala em unidades silábicas e fonêmicas e assim preparar-se para enfrentar o código alfabético.

Como o diagnóstico só pode ser dado após o processo de letramento, que se completa no período de dois anos após a exposição da criança a aprendizagem formal para leitura e escrita, isto é, a partir da segunda série ou terceiro ano do Ensino Fundamental no Brasil, a identificação de sinais precoces para dislexia, juntamente com as medidas de intervenção, podem evitar muito sofrimento a essa tipo de criança. Os disléxicos estão atrasados na leitura e na escrita, com relação aos seus pares, em dois anos no mínimo (PAVLIDIS, 1990). Entretanto, tal fato, não os impede de ter uma vida escolar, profissional e acadêmica normal, mas exige além de medidas de intervenção um considerável esforço próprio.

Os sinais específicos da dislexia foram reunidos por Shaywitz, (2006) em três fases: a infância, da pré-escola à 1ª série ou 2º ano aqui no Brasil; a 2ª série ou 3º ano em diante e finalmente, em jovens e adultos. Nesta dissertação apresentam-se os sinais da dislexia nas duas primeiras fases, por contemplar os sujeitos participantes desta pesquisa.

(29)

28 Pré-escola e 1ª série (2º ano)

Deficiência em entender que as palavras podem ser divididas em partes; por exemplo, que a palavra batboy pode ser dividida em duas partes, bat e boy, e depois de que a palavra bat pode ser subdividida em três sons: /b/, /a/ e /t/.

Incapacidade de aprender a associar letras e sons, tais como ser incapaz de conectar a letra b com o som /b/.

Erros de leitura que não demonstram conexão alguma dos sons com as letras; por exemplo, ler a palavra big como goat.

Incapacidade de ler palavras simples de uma só sílaba ou de pronunciar mesmo as palavras mais simples, como mat, cat, hop, nap.

Reclamações sobre o quanto é difícil ler; correr e esconder-se quando é hora de ler. Histórico de problemas de leitura presente nos pais e/ou irmãos.

Sinais de Dislexia a partir da 2ª série (3º ano) (segundo SHAYWITZ, 2006)

Problemas na fala

Discurso não fluente – pausas ou hesitações frequentes, muitos “hummm” durante a fala, pouca loquacidade.

Uso de linguagem imprecisa, tais como a utilização da palavra coisa ou negócio em vez da utilização do nome correto do objeto.

Não ser capaz de encontrar a palavra correta, confundindo palavras que tenham sonoridade semelhante.

Necessidade de tempo para elaborar uma resposta oral ou incapacidade de dar uma resposta verbal rápida quando é questionado.

Dificuldade de lembrar partes isoladas de informação verbal (memória imediata) problema ao lembrar datas, nomes, números de telefones, listas aleatórias.

Problema de leitura

Progresso muito lento na aquisição das habilidades de leitura. Falta de estratégia para a leitura de palavras novas.

(30)

29 Problemas ao ler palavras desconhecidas (novas, não familiares) que devem ser pronunciadas em voz alta; tentativa de adivinhar a palavra ao lê-la; falhas na organização dos sons das palavras quando pronunciadas.

Inabilidade para ler palavras funcionais como that, na, in.

Tropeços ao ler palavras polissilábicas, ou deficiência ao ter de pronunciar a palavra inteira.

Omissão de partes de palavra ao ler; deficiência na decodificação das partes que compõem uma palavra.

Medo acentuado de ler em voz alta; evitar ler em voz alta.

A leitura em voz alta é contaminada por substituições, omissões e palavras mal pronunciadas.

A leitura em voz alta é entrecortada e trabalhosa, não é fluente nem suave.

A leitura em voz alta não tem inflexão e parece a leitura de uma língua estrangeira. Dependência do contexto para a compreensão do que lê.

Melhor capacidade de entender palavras no contexto do que ler palavras isoladas. Desempenho desproporcionalmente fraco em testes de múltipla escolha.

Incapacidade de finalizar os testes no horário estabelecido.

Substituição de palavras de mesmo significado quando não consegue pronunciar, tais como car no lugar de automobile.

Ortografia desastrosa, em que as palavras não são sequer parecidas com a palavra original.

Problemas na leitura dos enunciados de matemática. Leitura muito lenta e cansativa.

Extrema dificuldade para aprender uma língua estrangeira.

Falta de entusiasmo em relação à leitura; evita ler livros ou mesmo uma frase. Evita a leitura recreativa, que lhe parece exaustiva.

Leitura cuja precisão aumenta com o tempo, embora permaneça sem fluência e seja trabalhosa.

Autoestima em declínio, presença de sofrimentos nem sempre visíveis.

Histórico familiar de problemas de leitura, ortografia e aprendizagem de língua estrangeira.

A persistência de alguns desses sinais, durante um período prolongado pode representar a probabilidade de que haja dislexia. Dessa forma, quanto mais cedo se fizer o

(31)

30 diagnóstico, mais provavelmente problemas decorrentes que atingem a autoestima poderão ser evitados. Diante disso, visualiza-se a importância do professor e dos pais na identificação precoce desses sinais para evitar anos de sofrimento e dificuldades para os disléxicos.

O diagnóstico deve ser dado por uma equipe multidisciplinar, o que abarca a atuação de fonoaudiólogo, psicopedagogo, neurologista, entre outros possíveis profissionais. Esse diagnóstico deve ter como base uma síntese ponderada de informações – do histórico escolar da criança, das observações relativas à sua fala e leitura e dos testes específicos de leitura com palavras e/ou pseudopalavras (precisão, fluência e compreensão), ortografia, linguagem e teste de processamento fonológico SHAYWITZ, (2006). É importante mencionar que, com o desenvolvimento das pesquisas sobre a compreensão da base fonológica da leitura e da dislexia, a utilização dos testes de QI no diagnóstico desse transtorno diminuiu substancialmente. De fato, as pesquisas têm revelado que não há um teste único que garanta o diagnóstico da dislexia, mas um quadro geral que pode determinar a existência ou não desse transtorno.

2.2.5 Classificação da Dislexia

Há várias classificações relativas ao delineamento da população pesquisada e ao tipo de dislexia. Tendo como referência o Modelo Dual de leitura de palavras, o qual propõe a existência de duas rotas de recuperação e acesso lexical (rota lexical, que seria uma via direta entre a forma visual da palavra, a pronúncia e o significado na memória lexical; e a rota

fonológica, que consistiria em uma via indireta de acesso à palavra, por recodificação

fonológica que envolve regras de conversão letra-som), abordaremos o modelo de classificação proposto por Ellis (1995), o qual foi revisto posteriormente por Cisca (2000) e Capellini (2003). Esses autores corroboraram a ideia de que a dislexia do desenvolvimento poderia ser classificada como um déficit em ambas as rotas de leitura ou apenas em uma delas. A figura 2 mostra o Modelo Dual, em que se pode observar o percurso das rotas lexical e fonológica de forma objetiva:

(32)

31 Figura 2: O Modelo de Dupla Rota

Em princípio, a dependência em uma das rotas sinaliza pouca destreza leitora, o que poderá ou não fazer parte de um quadro de dislexia, enquanto um leitor experiente e fluente deve utilizar independentemente as duas vias (ROTTA, 2006). A partir desse modelo a dislexia pode ser classificada em três tipos:

1. Dislexia Fonológica (Sublexical ou Disfonética): caracterizada por uma dificuldade seletiva para operar a rota fonológica, com problemas que residem na conversão letra- som e/ou no momento de unir os sons parciais em uma palavra completa, na leitura de todos os tipos de palavras, sendo mais intensa na leitura de palavras não familiares e pseudopalavras. Esse tipo de dislexia pode apresentar

Palavra Escrita Análise Visual Léxico de entrada ortográfica Sistema Semântico Léxico de saída fonológica Rota Semântica Lexical Nível fonológico Fala

Rota Lexical não semântica

Conversão Grafo - fonológica

(33)

32 muitos casos de lexicalização, de neologismos com componentes lexicais, de paralexias visuais e morfológicas (PEREIRA, 2008). A concentração despendida que esse tipo de disléxicos faz para reconhecer as palavras e consequentemente para manter a informação na memória de trabalho dificulta a compreensão do que foi lido.

2. Dislexia Lexical (de Superfície): Neste tipo, as dificuldades residem na operação da rota lexical, afetando intensamente a leitura de palavras irregulares. Nesses casos, os disléxicos, além de lerem lentamente, cometem habitualmente erros de silabação, repetição e retificações, podendo ainda cometer erros de substituições, lexicalizações e situar incorretamente o acento prosódico das palavras.

3. Dislexia Mista: Neste caso, os problemas residem na operação das duas vias de acesso ao léxico: a rota fonológica e a rota lexical.

De modo geral, essas teorias postulam que a unidade mínima de representação no léxico é a palavra, o que faz com que todos os problemas de decodificação por meio da leitura acima descritos sejam caracterizados em termos de palavra inteira, a qual estaria armazenada no léxico e possuiria representações abstratas sublexicais que mediariam o seu acesso no léxico mental. No entanto, estudos na área da Linguística vêm evidenciando que essa unidade mínima, em realidade, é o morfema, definido como a menor unidade fônica significativa formadora das palavras. Tais unidades estariam compostas no interior da palavra, de forma a constituir uma estruturação interna, a partir da combinação hierárquica desses morfemas constituintes. No momento em que ocorre uma computação linguística que gera uma palavra, os morfemas são combinados, de acordo com suas propriedades morfossintáticas, do que resulta uma palavra morfologicamente estruturada, conforme ilustra os exemplos a seguir:

Figura 3: Exemplos de Estruturas Morfológicas em PB

ligeiro radical índice temático ligeir - - o cravo radical índice temático crav - - o ligar

radical vogal desinência temática infinitivo

(34)

33 Figura 4: Exemplos de Estruturas Morfológicas em PB

A pesquisa em processamento de palavras (acesso e representação lexical) também tem evidenciado que há um mecanismo de reconhecimento dos morfemas como elementos formadores da palavra. Isso significa que uma palavra, uma vez captada no input, seja ele auditivo ou visual, deverá ser analisada de forma a permitir o reconhecimento de seus morfemas constituintes. Daí que a decodificação de uma palavra por meio da leitura implica não apenas o reconhecimento da palavra como um todo, mas sim de seus elementos estruturais. Daí que as caracterizações dos transtornos de leitura, em termos de recuperação de formas estocadas no léxico por meio das rotas acima descritas devem, de fato, serem feitas assumindo-se o morfema como forma a ser recuperada do léxico mental central, isto é, devem ser reconhecidas as formas gráficas dos morfemas, ao invés da palavra como um todo. Em um dado momento desse processo, haverá o concurso de operações morfológicas de estruturação lexical, para posterior conversão em representações lexicais abstratas. Por isso, é importante estudar aspectos da morfologia do PB, a fim de delimitar as unidades mínimas de armazenamento lexical, bem como suas propriedades gramaticais e modelos de léxico mental para poder melhor caracterizar as dificuldades específicas de leitura. No tópico seguinte discorreremos sobre aspectos da morfologia do PB, especificamente os processos derivacionais, foco da nossa investigação.

[[[[CONVERS]A]NCION]NAL]A a n v a a [- al] n [cão] v [-ar] n [- a]

(35)

34 2.3 Estudos de Processamento da Morfologia nas Dificuldades de Leitura

A morfologia é o estudo dos elementos e dos processos que subjazem à estrutura interna das palavras de uma língua, e compreende a depreensão das unidades atômicas significativas (morfemas) a partir das quais são construídos os vocábulos, bem como a determinação das regras e operações que atuam sobre elas, nos processos de produção e de compreensão das palavras (FERRARI-NETO, 2012). Em síntese, esse campo da gramática abarca a compreensão da formação das palavras, ponto indispensável para o conhecimento integral do desenvolvimento linguístico. Desse modo, pode influenciar nos processos de leitura e revelar dados importantes na compreensão dos transtornos de leitura.

Tradicionalmente a morfologia está dividida em duas grandes subáreas: a Morfologia Flexional e a Morfologia Derivacional. A primeira refere-se aos processos pelos quais a forma das palavras se altera a fim de expressar as categorias gramaticais relevantes na estrutura da língua, isto é, refere-se à relação de concordância entre as palavras em contexto sintático apropriado, enquanto a segunda compreende as operações que constroem novas palavras, seja pela combinação de duas ou mais palavras, seja através dos elementos afixais. Existem muitas diferenças entre esses dois processos, dentre os quais se podem citar o fato da flexão ser

paradigmática e a derivação ser aparadigmática, isto é, a flexão obedece a padrões mais

regulares que a derivação. Outra questão de grande importância é a previsibilidade semântica, a qual remete ao fato das marcas flexionais formais carregarem sempre o mesmo significado, o que não acontece nos processos derivacionais, uma vez que um afixo como “des” pode gerar tanto palavras de sentido oposto como o par obedecer-desobedecer quanto de sentido similar, como cair-descair. E por fim, a flexão é um processo sintaticamente motivado, uma vez que as formas flexionais refletem uma profunda relação entre a estrutura das palavras e a estrutura das sentenças, já a derivação parece ser isenta de questões sintáticas, isto é independe da posição sintática em que seu produto ocorre (FERRARI-NETO, 2012).

A Morfologia Derivacional caracteriza-se pela junção de um afixo (sufixo ou prefixo) a uma base para a formação de uma palavra e pelo processo de composição (justaposição e aglutinação). No primeiro caso junta-se ao final da base um elemento mórfico chamado sufixo e/ou acrescenta-se ao início da base um elemento mórfico chamado prefixo.

O sufixo assume uma função morfológica, pois, em geral, altera a categoria gramatical do radical de que sai o derivado (real adj. __ realidade s., embora também possa não lhe alterar a categoria, como feio adj. __ feioso adj.) e relaciona a palavra a que se agrega aos nomes aumentativos ou diminutivos,

Referências

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