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XVI Encontro Nacional da ABET. 3 a 6/9/2018, UFBA, Salvador (BA) GT 09 Trabalho e Saúde

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XVI Encontro Nacional da ABET

3 a 6/9/2018, UFBA, Salvador (BA)

GT 09 – Trabalho e Saúde

Fontes de estresse ocupacional em professores moçambicanos do ensino primário

Gildo Aliante – UFRGS

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RESUMO

A profissão docente é considerada altamente estressante. Este estudo objetivou explorar as fontes de estresse ocupacional em professores moçambicanos do ensino primário. A pesquisa é exploratória, transversal e de natureza quantitativa. A coleta de dados foi por meio de dois questionários autoaplicáveis: questionário sobre dados sociodemográficos e laborais, e questionário de fontes de estresse. O questionário de dados sociodemográficos levantou informações pessoais e laborais nomeadamente: idade, sexo, estado civil, tempo de serviço, carreira/categoria, nível de escolarização, número de alunos e carga horária semanal. O questionário de fontes de estresse foi elaborado com base na revisão de literatura e experiência profissional dos autores. Este instrumento é composto por 41 aspectos relacionados à organização e ambiente do trabalho docente, relacionamento interpessoal e de vida social e familiar que podem interferir negativamente na execução das atividades e tarefas do professor. O questionário de fontes de estresse é um instrumento do tipo Likert com 5 pontos, numa escala de 0 a 4. A cada participante foi solicitado a avaliar cada aspecto apresentado no questionário em 0-não estressante, 1-pouco estressante, 2-estressante, 3- muito estressante e 4-altamente estressante. Na parte final do questionário foi formulada uma questão aberta que solicitava aos participantes para relatar outros aspectos do trabalho docente não mencionados no instrumento aplicado que consideravam de estressantes. A pesquisa foi desenvolvida em algumas escolas do ensino primário localizadas na cidade de Nampula, em Moçambique. A análise estatística de dados revelou, em ordem decrescente de frequência as seguintes principais fontes de estresse dos professores: falta de oportunidades para continuação de estudo, salários baixos, limitadas oportunidades de desenvolvimento profissional, atribuição de culpa pelo fracasso dos alunos, falta de recursos materiais para o trabalho, falta de apoio social, carência de planos de benefícios sociais, mudanças ou atualizações regulares dos currículos, quantidade de alunos por turma, oscilação de datas de pagamento de salários, distância a percorrer entre escola-casa e vice-versa, e precárias condições físicas de trabalho. Estes resultados evidenciam que diversos aspectos do ambiente de trabalho dos professores originam o sofrimento psíquico, e se persistentes podem causar o desenvolvimento da Síndrome de Burnout. Uma parte dos aspectos identificados neste estudo, têm sido relatados em várias pesquisas como potenciais estressores no trabalho docente de diversos níveis, especialmente para o ensino básico em diferentes países. Afigura-se necessário a melhoria dos aspectos percebidos como estressantes, através da reestruturação das formas de organização do trabalho, de modo a transformá-lo em saudável, digno e prazeroso.

Palavras-chave: Estresse do professor. Saúde mental. Trabalho docente. Bem-estar psicológico.

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1 INTRODUÇÃO

Desde que Moçambique tornou-se independente do colonialismo português a 25 de junho de 1975 até então, o sistema educacional moçambicano tem sido alvo de diversas transformações e mudanças. Entre as mudanças operadas destacam-se a reformulação da estrutura e organização do Sistema Nacional de Educação [SNE], introdução de diversos modelos de formação de professores e mudança e/ou atualização de currículos escolares. A partir do ano de 2004 implementou-se o novo currículo do ensino básico em todas as escolas da rede pública em Moçambique e o ensino primário gratuito.

Ao nível da reforma curricular do ensino básico, as mudanças introduzidas incluem: ciclos de aprendizagem; o ensino básico integrado; a distribuição de professores para cada classe do ensino primário do segundo grau; a progressão por ciclos de aprendizagem, as línguas moçambicanas, as disciplinas de Inglês, Ofícios, Educação Moral e Cívica, Educação Musical e integração de conteúdos locais (MINED [Ministério da Educação de Moçambique] /INDE [Instituto de Desenvolvimento da Educação], 2003).

As mudanças incrementadas repercutiram na organização do trabalho docente, isto é, no aumento qualitativo e quantitativo da carga horária do professor do ensino primário do primeiro grau [EP1], que passou de três para oito disciplinas na 1ª e 2ª classe, quatro para oito na 3ª classe, cinco para nove na 4ª e 5ª classe respectivamente, bem como o aumento do número de semanas de aulas por semestre de 11 para 13 semanas. O aumento da carga horária não se registrou apenas para professores do EP1, como também para os do ensino primário do segundo grau [EP2], ou seja, os que lecionam de 6ª e 7ª classes, pois houve uma redução de número de professores para cada classe de sete para três ou quatro professores.

O Ministério da Educação de Moçambique [MINED] justifica nos seguintes termos: A redução do número de docentes por turma no ensino primário do segundo grau (EP2), de sete, para três, tem, como pano de fundo, a organização do currículo em áreas disciplinares. A presente opção tem em vista uma rápida expansão da rede do EP2, a nível nacional, visto que o sistema de três professores para o EP2 se afigura menos dispendioso (MINED, 2003, p. 28). A introdução do ensino gratuito gerou novas exigências quer por parte das escolas como dos professores, caracterizada pela crescente demanda à educação formal que é não proporcional a oferta das condições físicas e materiais, como é o caso de salas de aulas. Além disso, constata-se que as mudanças curriculares implementadas nas escolas ensino básico em Moçambique, nem sempre foram acompanhas pela adequada preparação profissional e didática dos professores, pela provisão de recursos materiais e físicos apropriados, de modo que estes profissionais possam responder efetivamente com as novas exigências curriculares

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e lidarem eficazmente com a reforma. Estes aspectos, somados ao crescimento acelerado de efetivos escolares que estão desfasados da construção de infraestruturas escolares e da contratação de professores em quantidade e qualidade para o sistema, causa elevadas proporções de alunos/professor e aluno/turma (MINED, 2015), o que coloca os professores moçambicanos do ensino primário sob pressão no trabalho.

Em consonância com isso, Cruz, Lemos, Welter e Guisso (2010) anotam que a atividade docente tem sido marcada por desafios significativos, reflexos das constantes transformações relacionadas ao mundo do trabalho na atualidade. Contudo, as condições de trabalho e as múltiplas exigências feitas ao papel do professor, têm sido cada vez mais associadas aos problemas de saúde física e mental, nomeadamente: fadiga psicológica, o estresse e Burnout. A prova disso, estudos realizados em diferentes países apontam a existência de uma significativa porcentagem de professores que experiencia moderados ou elevados níveis de estresse no trabalho (e.g., AQUINO et al., 2014; GOULART JUNIOR; LIPP, 2008; POCINHO; CAPELO, 2009; REISA, GOMES; SIMÃES, 2018; SILVA, 2017), e sugerem igualmente, a natureza crônica do estresse nos professores (MELO; GOMES; CRUZ, 1997), caso não sejam tomadas de prevenção e/ou intervenção.

O termo estresse conquistou grande popularidade nos últimos anos e existem diversos conceitos da palavra, e inúmeros significados se agregam a ele, tornando-se assim uma expressão polissémica (ABACAR; ROAZZI; BUENO, 2017). Na perspectiva de Seyle (1956) a qual tem sido frequentemente adoptada, o estresse constitui o estado manifestado por uma síndrome específica, constituída por todas as alterações não específicas produzidas num sistema biológico.

Selye (1976) propôs o eustress como sendo euphoria + stress, daí eu-stress que significa o estresse saudável, agradável e curativo. A palavra distress contém o prefixo latino dis, que significa “mau ou ruim” e refere-se a resposta ao estresse traduzida em resultados patológicos, negativos, destrutivos de eventos estressantes. O estresse tanto pode ajudar o homem a vencer desafios, aumentar sua criatividade e adaptabilidade ao seu meio - eustress, quanto a debilitar seu organismo, favorecendo o aparecimento de diversas patologias - distress (SELYE, 1976), como se tratasse de duas faces da mesma moeda.

Por outras palavras, nem sempre a experiência de estresse é em si danosa, pois em doses moderadas fornece motivação e aumento da produtividade, mas em doses excessivas resulta em destruição e desequilíbrio orgânico, prejudicando a qualidade de vida do indivíduo, atingindo as áreas social, da saúde e profissional (LIPP, 2004). Nesta perspectiva, se uma situação profissional encarada como exigente for bem sucedida, o estresse possibilita a adaptação e a confiança, o estresse positivo (eustress). Ao contrário, pode haver aumento do estresse, ligado à percepção de dificuldade na adaptação às exigências, o que acarreta consequências graves no funcionamento do organismo, o estresse negativo (distress). Para

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fins deste trabalho, o termo estresse é tratado como sinónimo de distress, ou seja, o estresse negativo.

O estresse ocupacional ou profissional resulta da incapacidade do indivíduo em lidar com as fontes de pressão no trabalho, tendo como consequências problemas de saúde física e mental, afetando o indivíduo e as organizações (COOPER, 1998). Assim, o estresse ocupacional é entendido como o resultado da interação entre condições laborais e individuais, de modo que as exigências do trabalho ultrapassam a capacidade de lidar com elas. De uma forma geral, o estresse ocupacional ocorre quando existe uma incompatibilidade entre o indivíduo e o meio laboral, isto é, quando o indivíduo avalia e percepciona as exigências do meio laboral (ou estressores no trabalho) como excedendo a sua capacidade e recursos disponíveis para poder controlá-los, superá-los ou cooperar com eles (ALMEIDA et al., 2016). Portanto, o estresse ocupacional configura-se quando a origem dos agentes estressores é eminentemente proveniente do espaço do trabalho ou decorrente das atividades realizadas naquele ambiente (MARRAS; VELOSO, 2012).

O estresse do professor pode ser definido como uma resposta de afeto negativo (como a raiva ou depressão) geralmente acompanhado por alterações fisiológicas e bioquímicas (como aumento da frequência cardíaca ou libertação de hormonas adrenocorticotróficas na corrente sanguínea) resultantes de aspectos do trabalho do professor e mediada pela percepção de que as exigências feitas sobre o mesmo constitui uma ameaça à sua autoestima ou ao bem-estar e ao lidar mecanismos ativados para reduzir a ameaça percebida (KYRIACOU, 2001).

Lipp (2016) aponta quatro fases de estresse: alarme, resistência, quase-exaustão e exaustão. Inicialmente a pessoa entra no processo de estresse pela fase de alerta (alarme) que não é prejudicial para o organismo. O indivíduo produz adrenalina e fica com energia e vigor pronto para lidar com emergências. As manifestações desta fase incluem: tensão ou dor muscular, azia, problemas de pele, irritabilidade sem causa aparente, nervosismo, sensibilidade excessiva, ansiedade e inquietação. Se a causa de estresse desaparecer a pessoa sai desta situação sem sequelas, porém se o estressor continua ou se algo mais acontece para desafia-la entra na fase da resistência.

A fase de resistência corre se a fase de alerta persistir, mediante substituição da reação do alarme, ou seja, se o estressor perdura ou se ele é de longa duração e intensidade excessiva. Dois sintomas mais importantes surgem na fase de resistência: dificuldades com a memória e muito cansaço. Através do uso de uma variedade de estratégias de enfrentamento do estresse, o organismo procura restaurar o equilíbrio. Se o esforço for suficiente para lidar com a situação, o estresse é eliminado. Se isto não ocorre, ou seja, se a pessoa não consegue resistir ou se adaptar, o organismo começa a sofrer um colapso gradual e entra na fase de quase exaustão.

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A fase quase exaustão é caracterizada pelo enfraquecimento do organismo e início do processo da doença. Precisa-se, então, de ajuda tanto médica para tratar o problema físico que já surgiu, como psicológica para aprender a lidar com a causa do estresse. Devido ao enfraquecimento do organismo, doenças que permaneciam latentes são desencadeadas. Caso o estressor permaneça presente e a pessoa não aprenda a lidar com ele, ocorrerá a fase de exaustão.

Poucas pessoas chegam ao estágio de exaustão, onde o organismo já se encontra debilitado. Nesta fase, doenças graves ocorrem e a pessoa não consegue mais se recuperar sozinha, não consegue se concentrar, pensar direito, rir, ter gosto pela vida, entra em depressão e várias doenças físicas graves aparecem. Isto resulta quando o estresse é prolongado, que afeta diretamente o sistema imunológico reduzindo a resistência da pessoa e tornando-a vulnerável ao desenvolvimento de infecções e doenças contagiosas.

São várias as causas do estresse relacionadas com o trabalho. Ivancevich e Matteson (1987) categorizam as causas de estresse ocupacional em a) fatores pessoais (personalidade Tipo A versus Tipo B; mudanças na vida da pessoa e atributos demográficos), b) fatores interpessoais (ciúme, inveja, assédio moral no trabalho, namoro no local de trabalho), e c) fatores organizacionais: responsabilidade por outros, condições de trabalho, esforço emocional, conflito de papéis, ambiguidade de papéis, sobrecarga de funções, trabalho em turnos.

Uma outra categorização das fontes de estresse foi proposta por Cooper e Marshall (1982). Esses autores agrupam as fontes de estresse em duas categorias: a) fontes de estresse no trabalho - i) Fontes intrínsecas ao trabalho (condições físicas de trabalho, longas horas de trabalho, novas tecnologias, perigo físico, sobrecarga de trabalho e horários apertados); ii) Papel na organização (ambiguidade do papéis, conflito de papéis e responsabilidades por pessoas); iii) Relações interpessoais no local de trabalho (relação com o superior, relação com os subordinados, relação com os colegas e dificuldade em delegar responsabilidades); iv) Desenvolvimento na carreira (sobrepromoção, subpromoção, segurança no emprego, ambições frustradas e avaliação de desempenho); v) Clima e estrutura organizacionais (grau de participação na tomada de decisões, falta de consulta efetiva, política do escritório, restrições no comportamento e sentido de pertença); e b) fontes extra organizacionais (problemas familiares, crise na vida, dificuldades financeiras e interface trabalho-família e vice-versa, ou seja, interferência do trabalho na família ou da família no trabalho).

Por sua vez Leka, Griffiths e Cox (2004), apresentam duas categorias de estressores ocupacionais: a primeira, relacionada ao conteúdo e características do cargo (e.g., monotonia, falta de significado, realização de tarefas desagradáveis e aversivas, sobrecarga de horas e tarefas, trabalho sob pressão, falta de participação e controle, dentre outras) e, a segunda,

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relacionada aos aspectos contextuais e organizacionais (e.g., pouca possibilidade de ascensão na carreira, baixa remuneração, conflito nas relações interpessoais, elevada responsabilidade por terceiros, conflito de papéis, problemas de comunicação, dificuldades de relacionamento com a liderança, conflito na interação trabalho-família e família-trabalho, dentre outras).

Este trabalho centra-se na identificação de fatores organizacionais e extra organizacionais causadores de estresse na perspectiva do modelo de Cooper e Marshall (1982), pois acredita-se que as causas de esgotamento físico e emocional localizam-se mais no ambiente do trabalho que no indivíduo (MASLACH; SCHAUFELI; LEITER, 2001).

Estudos realizados com amostras de professores em diferentes países evidenciam a existência de diversos aspectos que geram o estresse e outros problemas de saúde física e mental nessa classe profissional. Kyriacou (2001) verificou que os principais estressores na atividade do professor em Taiwan são: alunos com atitudes negativas, falta de motivação de alunos em relação ao trabalho escolar, indisciplina dos alunos, mudanças rápidas nas exigências curriculares e organizacionais, condições de trabalho negativas, pressões de tempo e excesso de trabalho, conflitos com colegas e desvalorização pela sociedade.

Gasparini, Barreto e Assunção (2006) investigaram a prevalência de transtornos mentais em professores brasileiros, tendo verificado que estes foram significativamente associados à experiência com a violência e piores condições ambientais, ambiente físico e conforto no trabalho, e organizacionais, margem de autonomia, de criatividade e tempo no preparo das aulas. Os resultados apontam para uma situação grave relativamente à saúde da população pesquisada e fornecem elementos consistentes para a proposição de medidas com vistas à melhoria das condições de trabalho docente.

Uma investigação de Zurlo, Pes e Cooper (2007) identificou pouco suporte profissional, excesso de trabalho, salas superlotadas, falta de apoio dos pais dos alunos, comportamento agressivo dos alunos e falta de suporte social como as fontes de estresse em professores italianos. Um estudo de Olaitan (2009) com amostra de professores nigerianos, revelou as seguintes causas de estresse: o relacionamento com os colegas, o currículo, pais, alunos, autoridades escolares, a sociedade, o ensino/supervisão, ambiente de ensino e salários baixos.

A partir da análise de 28 estudos empíricos, Aliante e Abacar (2018) mapearam as causas de estresse em professores moçambicanos, brasileiros e portugueses. Os resultados identificaram como principais fontes de estresse nos professores: a sobrecarga no trabalho, o mau comportamento de alunos, os salários baixos e as condições inadequadas de trabalho. Também Abacar (2015) verificaram que o baixo salário, a falta de benefícios, as precárias condições de trabalho, o mau comportamento dos alunos, a fraca aprendizagem dos alunos, a desvalorização docente, a sobrecarga de trabalho, as relações interpessoais desfavoráveis,

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a fraca participação dos pais e encarregados de educação e limitadas oportunidades de desenvolvimento de carreira, como situações que conduzem ao estresse em professores moçambicanos. Asimeng-Boahene (2003) observou que as classes numerosas, o fraco apoio administrativo, a preparação inadequada, a falta de matérias instrucionais, a sobrecarga de trabalho, a atividades extracurriculares, a política profissional inadequada, poucas oportunidades de desenvolvimento profissional são os fatores que levam os professores, em África, a se sentirem impotentes e frustrados, o que pode favorecer elevados níveis do Burnout.

Embora os estudos apresentados mostrem o estresse ser uma realidade preocupante na classe docente, ainda são escassas as pesquisas sobre o constructo em professores moçambicanos. O levantamento de informações específicas sobre situações causadoras de estresse em professores moçambicanos não só pode fortalecer a necessidade de investir em pesquisas nessa temática, como também pode orientar os tutelares do setor de educação moçambicano a prestarem maior atenção aos aspectos desfavoráveis à saúde física e psíquica do professor, de modo a transformar o ambiente e trabalho docente como promotor de saúde e bem-estar da população-alvo estudada.

Com base no referencial teórico apresentado, eis a questão central desta pesquisa: que aspectos relacionados ao trabalho docente são percebidos como fontes de estresse pelos professores moçambicanos do ensino primário que laboram em escolas públicas na cidade de Nampula? O objetivo deste estudo foi explorar as fontes de estresse ocupacional em professores moçambicanos do ensino primário.

2 METODOLOGIA

2.1 Instrumento

Esta pesquisa de natureza exploratória, transversal e quantitativa foi executada com recurso a dois instrumentos autoaplicáveis de coleta de dados: questionário sobre dados sociodemográficos e laborais; e de fontes de estresse elaborado pelos autores para fins deste estudo. O questionário de dados sociodemográficos levantou informações pessoais e laborais nomeadamente: idade, sexo, estado civil, tempo de serviço, carreira/categoria, nível de escolarização, número de alunos e carga horária semanal.

O questionário de fontes de estresse foi elaborado com base na revisão de literatura e experiência profissional dos autores do trabalho. Este instrumento foi composto por 41 aspectos relacionados à organização do trabalho, condições do trabalho docente, relacionamento interpessoal e, vida social e familiar que podem interferir positiva ou negativamente na saúde e execução de tarefas do professor. O questionário de fontes de estresse é um instrumento do tipo Likert com 5 pontos, numa escala de 0 a 4. A cada

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participante foi solicitado a avaliar cada aspecto apresentado no questionário em 0-não estressante, 1-pouco estressante, 2- estressante, 3- muito estressante e 4-altamente estressante, tendo como corte no ponto 2. Na parte final do questionário foi formulada uma questão aberta que solicitava a cada participante para relatar outro(s) aspecto(s) do trabalho docente não mencionados no instrumento aplicado que considerava como estressante(s).

2.2 Procedimento

Esta pesquisa foi desenvolvida em algumas escolas do ensino primário localizadas na cidade de Nampula, em Moçambique. A coleta de dados foi realizada nos meses de fevereiro a junho de 2018. Primeiramente, foram efetuados contatos com o Serviço Distrital de Educação, Juventude e Tecnologia de Nampula (SDEJTN) por meio de uma carta que apresentava o objetivo da investigação e solicitava autorização para a sua realização. Após a autorização (N/Ref. nº 254/SDEJTN/SG/010.2/2018, datada em 28 de fevereiro de 2018), foi passada a credencial para o acesso livre as escolas.

Posteriormente, foram contatadas as direções das escolas e os professores. Previamente foi apresentado o objetivo do estudo e os professores responderam individualmente os questionários de pesquisa, mediante instruções dadas pelo primeiro autor do trabalho. Alguns questionários foram aplicados nas salas de aulas da Universidade Pedagógica (UP) - Delegação de Nampula, atual Universidade Rovuma (UniRovuma), onde estuda uma parte de professores que lecionam em diversas escolas localizadas na cidade de Nampula. A aplicação dos questionários naquela Instituição de Ensino Superior foi mediante a autorização verbal da chefe do Departamento de Ciências de Educação e Psicologia. A participação dos professores na pesquisa foi de livre e espontânea vontade dos mesmos, tendo-se garantido e mantido o anonimato dos participantes.

A análise de dados foi realizada por meio de Statistical Package for Social Sciences (SPSS versão 22.0). Foram feitas análises estatísticas descritivas de frequências absolutas e relativas porcentuais, para o levantamento dos dados do questionário sociodemográfico e laboral, bem como, das fontes de estresse no trabalho docente.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Perfil dos participantes

Participaram da pesquisa 263 professores, dos quais 115 (43.7%) são do sexo masculino e 148 (56.3%) do sexo feminino. A idade média dos participantes é de 33 anos (DP = 6.7). Em relação ao estado civil, 198 (75.3%) dos participantes são casados e/ou união de fato, 55 (20.9%) são solteiros e 6 (2.3%) vivem separados e os restantes 4 (1.5%) são viúvos.

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O nível de escolaridade dos professores varia entre o básico, 23 (8.8%); médio, 216 (81.1%) e superior completo 24 (9.1%).

No que se refere às variáveis laborais, 239 (90.9%) participantes têm vínculo laboral estável (nomeados) e 24 (9.1%) trabalham em regime contratual. Em termos da categorial profissional, 105 (39.9%) são docentes do nível quatro (DN4), isto é, nível básico; 147 (55.9%) do nível três (DN3), ou seja, nível médio profissional, e 11 (4.2%) são do nível superior. A média dos alunos para cada professor é de 87 (DP=66.8). Quanto aos anos de experiência profissional como docente, a média é de 10 (DP=5.5) e a carga horária semanal média por professor é de aproximadamente igual a 25 aulas (DP=3.4).

3.1 Fontes de estresse no trabalho dos professores

Para explorar os aspectos de trabalho percebidos pelos professores como estressantes foi aplicado o questionário de fontes de estresse, descrito no item instrumento. Os resultados constam na tabela 1.

Tabela 1 - Fontes de estresse ocupacional percepcionados pelos professores (N=263)

Ord. Itens

Estressante Não

estressante n (%) n (%)

1 Número de disciplinas lecionadas 95 (36.1) 168 (63.9)

2 Quantidade de unidades temáticas de cada programa de ensino 110 (41.8) 153 (58.2)

3 Horário de trabalho 67 (25.5) 196 (74.5)

4 Quantidade de alunos por turma 157 (59.7) 106 (40.3)

5 Carga diária/semanal de trabalho 98 (37.3) 165 (62.7)

6 Salário que recebe 199 (75.7) 64 (24.3)

7 Diversidade de atividades diárias 88 (33.5) 175 (66.5)

8 Multiplicidade de papeis a desempenhar 83 (31.6) 180 (68.4) 9 Realização de atividades burocráticas 81 (30.8) 182 (69.2)

10 Ambiente/clima social de trabalho 71 (27.0) 192 (73.0)

11 Relacionamento interpessoal com colegas 43 (16.3) 220 (83.7) 12 Relação interpessoal com membros de direção 59 (22.4) 204 (77.6)

13 Relação interpessoal com alunos 41 (15.6) 222 (84.4)

14 Relação com pais e/ou encarregados de educação dos alunos 42 (16.0) 221 (84.0) 15 Atender as expectativas de pais/responsáveis e sociedade 47 (17.9) 216 (82.1) 16 Participação dos pais e encarregados na educação dos filhos 109 (41.4) 154 (58.6) 17 Sua participação nas decisões institucionais 65 (24.7) 198 (75.3) 18 Condições físicas de trabalho da escola 141 (53.6) 122 (46.4) 19 Reconhecimento social da profissão docente 122 (46.4) 141 (53.6)

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21 Oportunidade de desenvolvimento/crescimento profissional 121(46.0) 142(54.0) 22 Promoções, progressões e mudanças de carreira 198 (75.3) 65 (24.7) 23 Atribuição de bolsas para continuação dos estudos 209 (79.5) 54 (20.5) 24 Oportunidades de continuação de estudos 174 (66.2) 89 (33.8) 25 Premiação dos funcionários/professores da escola 155 (58.9) 108 (41.1)

26 Planos de benefícios sociais 161 (61.2) 102 (38.8)

27 Distância a percorrer entre escola-casa e vice-versa 143 (54.4) 120 (45.6) 28 Falta de recursos materiais para o trabalho 172 (65.4) 91 (34.6) 29 Organização/forma com que seu trabalho é realizado 109 (41.4) 154 (58.6) 30 Mudanças ou atualizações regulares de curriculares e livros 160 (60.8) 103 (39.2) 31 Atribuição da culpa pelos fracassos do sistema educacional 183 (69.6) 80 (30.4) 32 Contínua necessidade de atualização 137 (52.1) 126 (47.9)

33 Conciliar trabalho e família 112 (42.6) 151 (57.4)

34 Conciliar trabalho e lazer 95 (36.1) 168 (63.9)

35 Viver longe da família 171 (65.0) 92 (35.0)

36 Perca de valor social da profissão docente 157 (59.7) 106 (40.3)

37 Comportamento dos alunos 115 (43.7) 148 (56.3)

38 Motivação e interesse de alunos 112 (42.6) 151 (57.4)

39 Desempenho e aprendizagem dos alunos 128 (48.7) 135 (51.3)

40 Falta de apoio psicossocial 162 (61.6) 101 (38.4)

41 Pagamento de salários em datas não fixas 153 (58.2) 110 (41.8)

Conforme a tabela 1, os aspectos majoritariamente considerados como fonte de estresse no trabalho docente pelos participantes são: a falta de atribuição de bolsas para continuação de estudos (79.5%), seguido de baixos salários(75.7%); limitadas oportunidades de crescimento e desenvolvimento - promoções, progressões e mudanças de carreira (75.3%); atribuição da culpa pelos fracassos do sistema educacional (69.6%); carência de oportunidades de continuação de estudos (66.2%); falta de recursos materiais para o trabalho (65.5%); viver longe da família (65.0%); falta de apoio social (61.6%); planos de benefícios sociais (61.2%) entendidos como inexistentes; mudanças ou atualizações regulares de curriculares e livros (60.8%); quantidade de alunos por turma(60.7%).

Outros fatores relevantes mais apontados são: premiação dos funcionários/professores da escola (58.9%); pagamento de salários em datas não fixas (58.2%); distância a percorrer entre escola-casa e vice-versa (54.4%); precárias condições físicas de trabalho (53.6%) e contínua necessidade de atualização (52.1%). Alguns fatores obtiveram pontuações intermédias tais como: desempenho e aprendizagem dos alunos (48.7%); reconhecimento social da profissão docente (46.4%); comportamento dos alunos (43.7%); motivação e interesse de alunos, conciliar trabalho-família com (42.6%) e organização/realização de trabalho (41.4%).

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Para além dos fatores previstos no questionário aplicado, em resposta à pergunta aberta formulada no final do instrumento os participantes apontaram os seguintes fatores de estresse no trabalho: oscilação nas datas de pagamento de salários; ausência de coordenação entre a direção da escola e os professores; falta de consulta e participação na elaboração de políticas educativas e currículos; afetação inadequada dos professores em suas áreas de formação; injustiça nas promoções para cargos de chefias que obedecem o critério de confiança e não pela competência e; falta de transporte do serviço destinado aos professores.

Em seguida foram tabulados os aspectos mais estressantes, aqueles cujas frequências foram superiores a 50%. A tabela 2 ilustra os resultados obtidos.

Tabela 2 - Ranking das fontes de estresse ocupacional nos professores (N=263)

Item n %

Atribuição de bolsas para continuação dos estudos Salário que recebe

Promoções, progressões e mudanças de carreira

Atribuição da culpa pelos fracassos do sistema educacional Oportunidades de continuação de estudos

Falta de recursos materiais para o trabalho Viver longe da família

Falta de apoio social

Planos de benefícios sociais

Mudanças ou atualizações regulares de curriculares e livros Perca de valor social da profissão docente

Quantidade de alunos por turma

Premiação dos funcionários/professores da escola Pagamento de salários em datas não fixas

Distância a percorrer entre escola-casa e vice-versa

209 199 198 183 174 172 171 162 161 160 157 157 155 153 143 79.5 75.7 75.3 69.6 66.2 65.4 65.0 61.6 61.2 60.8 59.7 59.7 58.9 58.2 54.4 Condições físicas de trabalho da escola

Contínua necessidade de atualização

141 137

53.6 52.1 n – frequência absoluta (%) – frequência percentual

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Em ordem decrescente de frequência, as principais fontes de estresse ocupacional nos professores pesquisados são: a) a falta de oportunidades para continuação de estudo, b) baixos salários e remunerações, c) limitadas oportunidades de desenvolvimento profissional (promoções, progressões e mudanças de carreira), d) atribuição da culpa aos professores pelo fracasso dos alunos, e) falta de recursos materiais, f) viver longe da família, g) falta de apoio social, h) falta de planos de benefícios sociais, i) mudanças ou atualizações regulares de curriculares e livros, j) quantidade de alunos por turma, k) oscilação de datas de pagamento de salários, e l) precárias condições físicas de trabalho (falta de carteiras em salas de aulas, insuficiência de ventilação, salas pequenas em relação ao número ou quantidade de alunos que compõe cada turma, insuficiência de salas de aulas, ensino debaixo de árvores, falta de banheiro e água potável).

Os resultados deste estudo são mais amplos que aos encontrados em outras pesquisas feitas com professores moçambicanos do ensino primário (e.g., ABACAR, 2015; ABACAR et al., 2017). O estudo de Abacar et al. (2017) por exemplo, identificou baixo salário, precárias condições de trabalho e problemas de aprendizagem dos alunos como fatores mais estressantes de professores moçambicanos e brasileiros.

No contexto das políticas do governo moçambicano, alguns aspectos merecem ser explicados à luz dos achados apresentados. A nível da região da África Austral, Moçambique é um dos países que paga “salários mais baixos”1 aos seus funcionários públicos (Correio da Manhã, 2013, 19 de dezembro) e em comparação com outras áreas profissionais, a classe docente é uma das mais afetadas por essa situação. Este fenômeno agravou-se nos últimos cinco anos, em que os professores conheceram um aumento salarial mais baixo que variou entre 5 a 10% (Decreto 39/2019 de 20 de maio). Trata-se de um período marcado por maior inflação, “depreciação da moeda nacional”2 (o metical) e perca do poder de compra da população moçambicana, devido à crise financeira e econômica que vem assolando a nível nacional, como efeito do corte de apoio financeiro por parte do Fundo Monetário Internacional e outros parceiros de cooperação, devido à dívida "secreta" ou "oculta" de Moçambique, contraída no último mandato do presidente Armando Emilio Guebuza (2009-2014).

Além do mais, no ano de 2018 o Governo moçambicano tomou medidas de contenção da despesa pública, regulado pelo decreto 49/2018 de 23 de maio que congela os atos administrativos de crescimento e desenvolvimento na carreira (progressão e mudança de

1 O salário mínimo para professores de nível cinco é de 5,272 meticais equivalente a 83,49 dólares norte-americanos e 7,115 meticais que corresponde a 112,68 dólares para os professores do nível (Decreto 39/2019 de 20 de maio de 2019). Estes valores foram calculados mediante a taxa de câmbio do dia 24 de maio de 2019.

2 Em 2016 1 dólar norte americano chegou a custar 100 meticais contra 35 meticais anteriores. Atualmente, 1 dólar equivale a 63.14 meticais (Taxa de câmbio do Banco Internacional de Moçambique [BIM], do dia 24 de maio de 2019).

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carreira), bolsas de estudos, reduz a taxa de bônus especiais de 30% para 20% para o pessoal enquadrado na carreira de técnico profissional, de 50% para 40% para bacharéis, 60% para 50% para licenciados, 75% para 65% para professores universitários, licenciados em medicina e cirurgia e médicos especialistas e fixa 15% do subsidio de localização para todos os funcionários e agentes do Estado. Também vale mencionar que as turmas nas escolas do ensino primário em Nampula chegam a ser constituídas por mais de 80 alunos, o que contraria o estipulado no regulamento geral das escolas do ensino básico que é de 50 alunos/turma (Ministério da Educação e Cultura de Moçambique [MEC], 2008).

Uma parte dos aspectos identificados neste estudo têm sido relatados em várias pesquisas a nível internacional como potenciais estressores no trabalho docente, especialmente para o ensino básico. O estudo realizado em Taiwan por Kyriacou e Chien (2004) concluiu que a política variável da educação, a atitude pública e o mal-entendido sobre a carga de trabalho dos professores primários, os trabalhos administrativos complementares, a supervisão escolar (colegas, professores-estudantes, tutores de faculdade ou pais), ter alunos com necessidades especiais na turma e o mau comportamento dos alunos foram as principais fontes de estresse.

Jackson e Rothmann (2006) reportaram que a segurança no trabalho, a sobrecarga, as características do trabalho, as relações de trabalho, a remuneração e benefícios, o equilíbrio entre trabalho e vida, a falta de oportunidades para o desenvolvimento profissional contínuo, a participação em atividades extramuros como prováveis estressores percepcionados pelos professores sul africanos. Também Samad, Hashim, Moin e Abdullah (2010) revelaram como principais fontes de estresse em professores malaios, o mau comportamento dos alunos, o relacionamento interpessoal desfavorável, a escassez de tempo, a carga de trabalho e a falta de reconhecimento.

No Brasil, Bastos (2009) identificou as seguintes fontes de estresse na docência: sobrecarga de trabalho, condições de trabalho existentes na escola, intensificação das funções e das atividades docentes, novas formas de regulação do trabalho escolar, avaliação sistêmica do desempenho dos alunos, mudanças no processo ensino-aprendizagem, aumento do número de alunos por sala, ausência de efetiva participação da família na escolaridade dos filhos, dificuldades de relacionamento interpessoal na escolar e problemas na gestão escolar. Por sua vez, Zille e Cremonezi (2013) observaram que as fontes de estresse do professor mais significativas foram: conviver com a indisciplina dos alunos, baixo nível de remuneração percebida, levar a vida muito corrida em função do trabalho, trabalhar aos sábados, ter pouco tempo livre para as questões pessoais e realizar várias atividades ao mesmo tempo com alto nível de cobrança.

De forma idêntica, Costa e Rocha (2013) constaram que a falta de interesse dos alunos, a indisciplina dos alunos, a falta de estrutura administrativa, a falta de diálogo e o

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autoritarismo da coordenação e direção da escola, o individualismo por parte de alguns professores e os baixos salários foram os aspectos mais estressantes. Achados similares foram encontrados por Weber, Leite, Stasiak, Santos e Forteski (2015) ao constatarem que, a indisciplina e motivação dos alunos, o maior número de alunos atendidos por professor, a inexistência de auxilio mutuo entre colegas se associam ao estresse.

Uma investigação recentemente publicada cuja amostra são professores brasileiros da rede municipal identificou cinco estressores de natureza psicossocial: relação professor-alunos; falta de apoio de familiares de professor-alunos; sobrecarga de papel; conciliar trabalho-família e conciliar trabalho-vida pessoal (CARLOTTO et al., 2018).

Os fatores de estresse encontrados neste estudo são frequentemente referenciados como causas associadas à Síndrome de Burnout entre professores do ensino básico e médio. Uma notável revisão de literatura de Yong e Yue (2007) sistematizou 5 causas de Burnout relatado em professores chineses. Nesse estudo foram encontrados fatores de ocorrência do Burnout do professor, que também são referenciados por diversos pesquisadores da área em diversos países: 1) Fatores do aluno: a) problemas de indisciplina dos alunos, b) falta de motivação para os estudos e c) pressão em entrar no nível seguinte de educação; 2) Fatores de trabalho: a) salários excessivamente baixos, b) falta de autoridade e status social e, c) classes numerosas; 3) Fatores organizacionais da escola: a) tensas relações interpessoais, b) sobrecarga de trabalho e demais responsabilidades não educativas, c) falta de apoio e de reconhecimento da liderança e dos colegas, d) pressão de tempo, e) ineficácia das reformas educacionais, confusão e conflito de papéis, f) mau clima escolar e de classe, g) pressão dos supervisores e inspetores e, h) más condições de trabalho; 4) Fatores pessoais: a) altas expectativas pessoais, b) incapacidade e c) exigências de trabalho; 5) Fatores extraescolares: a) pressão da sociedade e dos pais e b) redução de pessoal.

Tal como Yong e Yue (2007), Mesquita, Gomes, Lobato, Gondim e Souza (2013) apontaram a indisciplina, a violência, o desinteresse dos alunos, a superlotação das turmas, condições precárias da escola, falta de participação da família dos alunos no processo de aprendizagem dos alunos, a falta de recursos pedagógicos e material didático e os baixos salários como os principais fatores associados à doença. Resultados similares forma achados em outra revisão sistemática sobre as causas associadas ao Burnout em professores feita por Melo et al. (2015), ao constatarem que baixos salários, escassos recursos materiais e didáticos, classes superlotadas, tensão na relação com alunos, excesso de carga horária, inexpressiva participação nas políticas e no planejamento institucional são potenciais estressores. Recentemente, a falta de autonomia, conflito de papel, ambiguidade de papel, sobrecarga, suporte social e conflitos interpessoais foram consideradas variáveis preditoras das dimensões de Burnout em professores brasileiros do ensino básico (CARLOTTO; CÂMARA, 2019).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo teve por objetivo explorar as fontes de estresse ocupacional em professores moçambicanos do ensino primário. Os resultados indicam que certos aspectos do ambiente laboral, de natureza estrutural, podem estar na origem do estresse profissional, podendo afetar a saúde e bem-estar psicológico dos professores.

A compreensão de fatores de estresse em professores fornece perspectivas de prevenção e intervenção específicas para essa população (GENOUD; BRODARD; REICHERTS, 2009). E uma vez que a persistência dos aspectos psicossociais apontados pode desencadear certos agravos à saúde mental, por exemplo o Burnout, os resultados deste estudo sugerem aos órgãos do sistema educacional (Ministério e Direções Provinciais de Educação e Desenvolvimento Humano, Serviços Distritais de Educação, Juventude e Tecnologia, a comunidade escolar) a desenhar programas preventivos, de modo a capacitar e treinar os professores na gestão de estresse, objetivando promover a saúde mental destes profissionais da educação.

Este estudo apresenta algumas limitações que merecem ser apontadas. A pesquisa não envolveu amostra probabilística de professores moçambicanos do ensino primário, o que não permite a generalização dos resultados para toda a população docente deste subsistema de ensino. Também os resultados encontrados não fornecem qualquer prova de causalidade. Investigações futuras baseadas em amostras probabilísticas, envolvendo análises correlacionais entre níveis de estresse e fatores organizacionais e situacionais são necessárias para estudar o fenómeno de estresse e sugerir formas de prevenção e intervenção. A realização dessas investigações poderá ser útil para aprimorar o conhecimento dos fatores de trabalho adversos à saúde mental dos professores, bem como no delineamento de estratégias de coping mais eficazes, o que pode propiciar a melhoria da qualidade de vida no trabalho docente.

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