NOMINALIZAÇÕES DEVERBAIS EM SHIMAKONDE
(GRUPO BANTU) E EM TENETEHÁRA (TUPÍ
-GUARANÍ): UMA ANÁLISE CONTRASTIVA
Quesler Fagundes Camargos (UFMG)
queslerc@yahoo.com.br
Davety Mpiuka (UEM)
davety.mpiuka@gmail.com
Ricardo Campos de Castro (UFMG)
ricardorrico@uol.com.br
III OFICINA DE LINGUÍSTICA DO CENTRO DE ESTUDOS AFRICANOS DA UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE
MAPUTO (MOÇAMBIQUE), 16 E 17 DE DEZEMBRO DE 2014
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NTRODUÇÃO A presente pesquisa “Nominalizações deverbais em Shimakonde (Grupo Bantu) e em Tenetehára (Tupí-Guaraní): uma análise comparativa” foi realizada por Quesler Fagundes Camargos, (aluno de doutorado-UFMG), Davety Mpiuka (aluno de mestrado-UEM) e Ricardo Campos de Castro (aluno de doutorado-UFMG).
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NTRODUÇÃO Esta pesquisa foi possível devido ao Projeto
“Descrição e Documentação de Línguas
Moçambicanas”, coordenado pelo Prof. Dr. Fábio Bonfim Duarte e pelo Prof. Dr. Armindo Ngunga (Projeto financiado pela CAPES/Brasil, por meio do Edital n. 33/2012), o qual permitiu a ida dos alunos brasileiros à UEM e a ida de alunos moçambicanos à UFMG durante o primeiro e segundo semestre de 2014.
Registramos nossos agradecimentos aos
coordenadores desse projeto!
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NTRODUÇÃO A língua Tenetehára, a qual pertence a família linguística Tupí-Guaraní (tronco Tupí), conforme Rodrigues (1985), é falada no estado do Maranhão, no nordeste brasileiro, pelos povos indígenas Guajajára e Tembé.
A língua Shimakonde, de acordo com Guthrie (1967-71), pertence ao Grupo P23. Esta língua é falada maioritariamente em sete distritos da província Cabo Delgado (cf. Ngunga & Faquir 2011).
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NTRODUÇÃO Este trabalho pretende analisar o processo de nominalização nas línguas Tenetehára e Shimakonde. O objetivo é verificar as semelhanças e as diferenças desse processo nessas línguas.
Estamos cientes de que o trabalho que será apresentado ainda é muito incipiente e, que por isso, há muito a ser feito.
Este trabalho está dividido em três partes: Parte 1: Nominalização em Tenetehára
Parte 2: Nominalização em Shimakonde
Parte 3: Semelhanças e diferenças
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ARTE1:
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OMINALIZAÇÕES EMT
ENETEHÁRAN
OMINALIZAÇÃO DE SUJEITO Como veremos a seguir, a língua Tenetehára disponibiliza dois morfemas nominalizadores de sujeito, a saber: os sufixos {-ma’e} e {-har}:
O morfema {-ma’e} afixa-se a verbos intransitivos. O morfema {-har} junta-se a verbos transitivos.
(1a) u-màno awa a’e 3-morrer homem ele
“O homem morreu” (1b) u-màno-ma’e
3-morrer-NOML
N
OMINALIZAÇÃO DE SUJEITO(2a) u-zàn awa a’e 3-correr homem ele “O homem correu”
(2b) u-zàn-ma’e 3-correr-NOML
“O corredor” (=aquele que corre)
(3a) u-zuka awa zapukaz a’e 3-matar homem galinha ele “O homem matou a galinha”
(3b) zapukaz i-zuka-har galinha 3-matar-NOML
N
OMINALIZAÇÃO DE OBJETO Essa língua disponibiliza ainda dois morfemas nominalizadores de objeto, a saber: o prefixo {emi-} e o sufixo {-pyr}:
O morfema {emi-} afixa-se a verbos transitivos (o objeto pode emergir como complemento nominal).
O morfema {-pyr} junta-se a verbos transitivos (o objeto não pode emergir como complemento nominal.
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OMINALIZAÇÃO DE OBJETO(4a) u-zuka awa zàwàruhu a’e 3-matar homem onça ele “O homem matou a onça”
(4b) (awa) h-emi-zuka homem 3-NOML-matar
“O matado do/pelo homem” (4c) (*awa) i-zuka-pyr
homem 3-matar-NOML
“O matado”
Veja que o “agente” só pode emergir quando ocorre a
nominalização com o morfema {emi-}, como (4b).
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OMINALIZAÇÃO DE EVENTO OU DE RESULTADO As nominalizações de evento e de resultado sãorealizadas pelo mesmo morfema em Tenetehára, a saber: o sufixo {-haw}.
(5a) u-zuka awa zàwàruhu a’e 3-matar homem onça ele “O homem matou a onça”
(5b) zàwàruhu i-zuka-haw onça 3-matar-NOML
“A matança da onça” (=eventiva)
“O instrumento de matar onça” (=resultativa) “O lugar de matar onça” (=resultativa)
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ARTE2:
N
OMINALIZAÇÃO EMS
HIMAKONDEN
OMINALIZAÇÃO DE SUJEITO Como veremos a seguir, a língua Shimakonde parece não apresentar morfologicamente um elemento nominalizador, como ocorre em Tenetehára.
Na verdade, a nominalização é indicada pela adição do prefixo de classe nominal, que pode ser da classe 1 ou 2 e da classe 7 ou 8, ao radical verbal (ku+raiz). Isso resultará no seguinte complexo morfológico: [1+ku+raiz+VF].
N
OMINALIZAÇÃO DE SUJEITO(6a) n-nume a-ndi-pel-a
1-homem MS1-PASS-morrer-VF
“O homem morreu” (6b) n-ku-pel-a
1-15-morrer-VF
“O morto” (=aquele que morre) (7a) shuvi shi-ndi-w-a
7.leopardo MS7-PASS-morrer-VF
“O leopardo morreu” (7b) sha-ku-pel-a
7-15-morrer-vf
N
OMINALIZAÇÃO DE SUJEITO(8a) n-nume a-ndi-byay-a ing’uku 1-homem ms1-PAST-matar-VF 9.galinha
“O homem matou a galinha” (8b) n-ku-byay-a ing’uku
1-15-matar-VF 9.galinha
“O matador de galinha” (=aquele que mata galinha) (9a) shuvi shi-ndi-byay-a ing’uku
7.leopardo MS7-PAST-matar-VF 9.galinha
“O leopardo matou a galinha” (9b) sha-ku-byay-a ing’uku
7-15-matar-VF 9.galinha
N
OMINALIZAÇÃO DE“
OBJETO”
Na verdade, o Shimakonde não possui uma nominalização de objeto como o Tenetehára. Para permitir a nominalização de objeto, o verbo transitivo em Shimakonde recebe antes a extensão verbal passiva, de modo que o objeto passe a exercer a função sintática de sujeito. Depois de passivizado, ocorre a nominalização de sujeito, como vimos anteriormente.
N
OMINALIZAÇÃO DE“
OBJETO”
(10a) n-nume a-ndi-byay-igw-a na shuvi 1-homem MS1-PAST-matar-PASS-VF por leopardo
“O homem foi morto pelo leopardo”
(10b) n-ku-byay-igw-a na shuvi 1-15-matar-PASS-VF por leopardo
“O morto pelo leopardo”
(11a) shuvi shi-ndi-byay-igw-a na n-nume 7.leopardo MS7-PAST-matar-PASS-VF por 1-homem
“O leopardo foi morto pelo homem”
(11b) sha-ku-byay-igw-a na n-nume 7-15-matar-PASS-VF por 1-homem
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OMINALIZAÇÃO DE EVENTO OU DE RESULTADO Semelhante ao Tenetehára, a língua Shimakondeapresenta um morfema nominalizador eventivo, a saber: o sufixo {-o}. Além de receber essa
morfologia, a raiz verbal (sem o prefixo ku-) recebe os prefixos de classe nominal 7 ou 8:
(12a) n-nume a-ndi-pel-a
1-homem 1-PASS-morrer-VF
“O homem morreu”
(12b) shi-pel-o sha n-nume
7-morrer-NOML 7.GEN 1-homem
“A morte do homem” (=eventiva)
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OMINALIZAÇÃO DE EVENTO OU DE RESULTADO(13a) n-nume a-ndi-byay-a ing’uku 1-homem 1-PASS-matar-VF 9.galinha
“O homem matou a galinha”
(13b) shi-byay-o sha ing’uku 7-morrer- NOML 7.GEN 9.galinha
“A matança da galinha” (=eventiva)
“A forma / maneira de matar galinha” (=resultativa) (??)
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ARTE3:
S
EMELHANÇAS E DIFERENÇASS
EMELHANÇAS E DIFERENÇAS A primeira grande distinção que há entre o Tenetehára e o Shimakonde é o fato de a primeira língua apresentar um sistema morfológico rico de nominalizações, ao passo que a segunda língua aparentemente utiliza apenas um morfema nominalizador para as nominalizações de evento e de resultado. As nominalizações de agente e de “objeto” são realizadas por um morfema “nulo”.
Apresentamos no seguinte quadro um comparativo desse nominalizadores.
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EMELHANÇAS E DIFERENÇASNominalização de Nominalizador em
Tenetehára
Nominalizador em Shimakonde
Sujeito de intransitivo {-ma’e} {Ø} Sujeito de transitivo {-har} {Ø} Objeto de transitivo {emi-} e {-pyr} {Ø} Evento {-haw} {-o} Resultado {-haw} {-o}
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Note que o Tenetehára possui cinco morfemas nominalizadores, ao passo que o Shimakonde apresenta apenas um morfema fonologicamente realizado.
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EMELHANÇAS E DIFERENÇAS Poder-se-ia ainda hipotetizar que as nominalizações de
sujeito em Shimakonde, na verdade, apresentam um nominalizador {-a}, o qual é homônimo da vogal final. Contudo, a nominalização de verbos “emprestados” de outras línguas, os quais não apresentam a vogal final {-a}, não faz surgir o suposto nominalizador {-a}, como se vê a seguir:
(14a) kukupulu “blasfemar” nkukupulu “blasfemador” *nkukupula
(14b) kushukulu “agradecer” nkushukulu “aquele que agradece” *nkushukula
(14c) kukubali “aceitar” nkukubali “aquele que aceita” *nkukubala
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EMELHANÇAS E DIFERENÇAS Outra diferença é que a língua Tenetehára de fato apresenta uma nominalização de objeto. No Shimakonde, no entanto, para que seja possível a nominalização de objeto, o predicado transitivo precisa ser passivizado. Posteriormente, ocorre a nominalização de sujeito, o qual é o objeto da versão transitiva do verbo.
Note que os nominalizadores {-pyr} e {emi-} juntam-se diretamente ao radical verbal transitivo, juntam-sem a necessidade de que ele seja passivizado, como ocorre em Shimakonde.
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EMELHANÇAS E DIFERENÇAS A primeira semelhança significativa é que, por se tratar de nominalizações, os verbos nominalizados, nas duas línguas, são capazes de exercer funções sintáticas de sujeito e de objeto.
(15a) u-’ar u-zàn-ma’e a’e 3-cair 3-correr- NOML ele
“O corredor caiu”
(15b) n-ku-tukut-a a-ndi-gw-a 1-15-correr-VF 1- PASS-cair-VF
“O corredor caiu”
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EMELHANÇAS E DIFERENÇAS(16a) w-exak kuzà zapukaz i-zuka-haw
3-ver mulher galinha 3-matar-NOML
“A mulher viu a matança da galinha”
(16b) n-kongwe a-ndy-on-a shi-byay-o sha ing’uku 1-mulher 1-PASS-ver-VF 7-matar-NOML 7.GEN 9.galinha
“A mulher viu a forma de matar galinha”
Veja que, nos exemplos em (15), a nominalização exerce a função sintática de sujeito, enquanto, nos exemplos (16), a nominalização exerce a função sintática de objeto.
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ONSIDERAÇÕES FINAIS Por fim, é necessário ressaltar que há ainda inúmeras diferenças e semelhanças entre as duas línguas, quanto ao processo de nominalização. Contudo, devido a limitação de tempo, encerramos por aqui.
Analises futuras deverão ainda verificar se os processos apresentados neste trabalho realmente
se configuram como nominalizações ou
relativizações.