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BRASIL VIRA MANCHETE:
O PAPEL DA IMPRENSA NA FORMAÇÃO DO BRASIL MODERNO*
E
ste trabalho procura refletir sobre opa-pel da im prensa na
form ação da opinião
públi-ca, no Brasil e no Ceará,
num m om ento crucial da
m odernização burguesa,
quando se agudizava a
dis-puta entre a Igreja e
ou-tras instituições, em torno
da ocupação do lugar de
enunciador da V erdade. N a
segunda m etade do século
passado, a estrutura
religi-osa da organização social
está sendo sacudida por
toda a onda de valores que
cercam a edificação do
in-dividualism o hum anista, e
os jornais se fortalecem ,
junto com os livros, com o
agentes da autonom ização
m oral da sociedade e de
form ação do povo com o novo sujeito político.
A cultura política em ergente tem com o
sím bolo a noção de liberdade, a qual não se
afirm ará apenas em relação à Igreja, m as tam
-bém buscará acertar contas com a m onarquia,
com a escravidão e com o Rom antism o. O s
jornais acirrarão os ânim os populares a favor
da A bolição e da República.
Esse novo ideário, que confere
desta-que à D em ocracia, Igualdade e Soberania
Po-pular, recebe a adesão da opinião pública,
que já nasce no Brasil com o opinião publicada.
O jornal concorre agora, com o púlpito e o
CELESTE CORDEIRO" parlam ento, para ser o l o c u s de elaboração do
dis-curso com petente. M as os
representantes do
conjun-to de valores que vai se
tornando atrasado frente
aos novos padrões tam bém
passa a apelar às
estraté-gias de convencim ento por
m eio da im prensa. M esm o
a criticando com o
"inven-ção de Satanás", com o o faz
o tradicionalista cearense
Silva Bezerra, não deixam
os reacionários de im
ple-m entar jornais e escrever
artigos para enfrentar seus
adversários ideológicos.
Progressistas e
reaci-onários, com o verem os,
reconhecem o "novo
po-der", com o é cham ado
pelo jornal OC e a r e n s e , em
27 de m arço de 1885: "o m aior poder atual é
a opinião pública, que há um século ganha
proporções enorm es. H oje, todo hom em de
estado é forçado a contar com este n o v o p o
-d e r , autorizado pela m ultidão, estudado pelos
sábios".
R E S U M O
E s te tr a b a lh o p r o c u r a r e fle tir s o b r e o p a p e l d a im p r e n s a n a fo r m a ç ã o d a o p in iã o p ú b lic a , n o B r a s il e n o C e a r á , n u m m o m e n to c r u c ia l d a m o d e r n iz a ç ã o b u r g u e s a e n tr e n ó s : a s e g u n d a m e ta d e d o s é c u lo p a s s a d o , q u a n d o a e s tr u tu r a r e lig io s a d a o r g a n iz a ç ã o s o c ia l e s tá s e n d o s a c u d id a p o r to d a a o n d a d e v a lo r e s q u e c e r c a m a e d ific a ç ã o d o in d iv id u a lis m o h u m a n is ta , e o s jo r n a is s e fo r ta le c e m , J u n to c o m o s liv r o s , c o m o a g e n te s d a a u to n o m iz a ç ã o m o r a l d a s o c ie d a d e e d e fo r m a ç ã o d o povo c o m o novo s u je ito p o lític o . E s s e novo id e á r io , q u e c o n fe r e d e s ta q u e à D e m o c r a c ia , Ig u a ld a d e e S o
-b e r a n ia P o p u la r , r e c e b e a a d e s ã o d a o p in iã o p ú b lic a , q u e já n a s c e n o B r a s il c o m o o p in iã o p u b lic a d a O jo r -n a l c o -n c o r r e a g o r a , c o m o p ú lp ito e o p a r la m e n to , p a r a s e r o lo c u s d e e la b o r a ç ã o d o d is c u r s o c o m p e te n te . O p r e s e n te a r tig o te n ta r á a r g u m e n ta r n o s e n tid o d e q u e a m o d e r n id a d e , e a e n tr a d a d o povo n a c e n a p o lític a , n o B r a s il, c o m o e m o u tr o s p a ís e s , g u a r d a m a fin id a d e s p r o fu n d a s c o m a im p r e n s a .
O te x to q u e s e s e g u e s e r v iu d e b a s e p a r a c o m u -n ic a ç ã o a p r e s e n ta d a n o X X I C o n g r e s s o L a tin o -a m e r ic -a n o d e S o c io lo g ia , o c o r r id o e m S .P a u lo , e m a g o s to d e 1 9 9 7 .
C e le s te C o r d e ir o , D o u to r a e m S o c io lo g ia , é p r o -fe s s o r a d a U n iv e r s id a d e E s ta d u a l d o C e a r á e c o o r d e n a d o r a d o N ú c le o d e P e s q u is a e m A s s o -c ia tiv is m o e P o lític a s P ú b lic a s .
A m odernidade e a entrada do povo na
cena política guardam afinidades profundas
com a im prensa. Silva Bezerra, adversário
ferrenho do novo estado de coisas, percebe
bem esta sua característica, quando nos diz
que "ao Estado pela graça de D eus se opõe o
verda-deira assinatura, o caráter distintivo do que se
cham a o Estado m oderno (. ..) [que] tem com o
aliado a
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i m p r e n s a c o t i d i a n a , e já dom ina en-tre as classes que se instróem com ela"(1864:33).
São então levantadas duas
característi-cas do "m oderno liberalism o", quais sejam :
"tudo regulam entar por l e i s ' e "falar sem
ces-sar do p o v o e querer fazer tudo em seu nom e" .
D entro desses objetivos surgem "os soberbos
discursos sobre certos direitos particulares,
sobre aqueles principalm ente que servem a
seus desígnios, tais com o a liberdade de im
-prensa e a liberdade de associação"
( i d e m , i b i d e m : 5 9 - g r i fo s m eus). Segundo nos
afirm a este autor, ao criticar a licenciosidade
da im prensa política, "não há representante
da nação que se atreva a soltar da tribuna
um a palavra contra tal licença, por um a
idola-tria estúpida dessa horrível liberdade de im
-prensa (. ..), esse culto m ais que divino ao
ídolo da liberdade de im prensa" ( í b i d . : 9 7 - 9 9 ) .
A inda que num a província distante da
Corte, com o o Ceará, tem os na segunda m
e-tade do século passado periódicos
represen-tativos das várias correntes de pensam ento
que pugnavam então: liberais, conservadores,
m açons, católicos, republicanos ...
Funciona-vam nessa época, apenas em Fortaleza, 7
ti-pografias, e circulavam 6 jornais, dos quais
quatro diários: dois conservadores - P e d r o 1 1
e C o n s t i t u i ç ã o , e dois de extração liberal
-C e a r e n s e e j o r n a l d e F o r t a l e z a . H avia o
se-m anário T r i b u n a C a t ó l i c a , e o jornal m
açôni-co F r a t e r n i d a d e .
Todas as novas idéias ilum inistas
apare-cem nas páginas desses periódicos, assim
com o as propostas políticas afinadas com a
liberalização do Estado. H á tam bém um
es-forço de auto-análise, na tentativa de com
-preender o papel da im prensa. V isto com o
m eio de vulgarização dos princípios
secula-res, cientificistas e dem ocráticos, os
jornalis-tas dem onstram se com preender com o
form adores de consciência política,
principal-m ente no principal-m oprincipal-m ento em que o sistem a
eleito-ral se flexibiliza e destende. Intelectuais
engajados dos dois lados das fronteiras
ideo-lógicas não dispensam a trincheira dos
jor-nais, m eio de com unicação fundam ental que
já se tornara hábito do cotidiano urbano.
Em rom ances escritos à época e que
retratam com fidelidade os costum es
prevale-centes, com o por exem plo A A fi l h a d a , de
O liveira Paiva, que descreve a Fortaleza dos
anos 80, já se nota que a leitura diária dos
jornais constitui com portam ento habitual
en-tre a classe proprietária e a nascente classe
m édia, form ada por funcionários públicos,
com erciantes, profissionais liberais, etc.
Já antes, na década de 70 do passado
século, tem os um a significativa iniciativa de
um grupo de jovens intelectuais defensores
das bandeiras da Ilustração entre nós. Esses
leitores de D arw in, Spencer e Littré,
articulis-tas da folha m açônica, criam um a A cadem ia
que estabelece, entre outras m etas, o ensino
da leitura de jornais ao povo. A lém das
Con-ferências livres realizadas na praça principal
da cidade, abordando Soberania Popular,
Li-berdade Religiosa, Instrução Pública e outros
tem as provo cativos , havia ainda a Escola
Po-pular, que funcionava entre seis e m eia e dez
da noite, dirigi da "aos pobres e operários",
com aulas de leitura dos jornais da terra,
cur-sos de ensino da Constituição do Im pério e
onde se faziam com entários políticos ao
al-cance do grande público (ver M enezes,
1968:45).
IMPRENSA E OPINIÃO PÚBLICA
Pesquisando os jornais cearenses do
pe-ríodo, vê-se, já em 1849, na edição de 26 de
novem bro do jornal liberal O C e a r e n s e ,
elogi-os
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à im prensa e sua relação com a idéia doséculo, o livre-arbítrio, para o qual a inform
ção - com o form adora de opinião - é
funda-m ental: "no estado da civilização atual a im
-prensa é um a necessidade vital para a
sociedade, com o o pensam ento, de que ela é
a expressão, é um a condição do indivíduo
C. .. )
[e] ninguém pode pôr peias aopensa-m ento,
C. .. )
é loucura tentar obstar sua mani-festação" .
Em 1856, ao discorrer sobre o "cam
i-nho da civilização e do progresso", o
editori-al d' O
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C e a r e n s e afirm a a suprem acia da o p i n i ã o sobre "os feitos dos exércitos": "é na verdadeabsurdo que a força seja a m edida do dever,
e a guerra em épocas de espiritualism o é na
verdade um anacronism o". A palavra
proferi-da pela "prim eira potência da Europa" é "o
triunfo da opinião sobre a força, a
necessida-de da paz, e o progresso hum anitário pelo
desenvolvim ento da agricultura, da indústria
e do com ércio. Colocar-nos-em os fora da
li-nha de civilização atual?" (22/01). Com o dirá
o m esm o jornal m ais tarde (lQ de outubro), "a
ação da im prensa pode ser latente e
vagaro-sa; não é por isso m enos real e verdadeira.
aZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
Éa gota d'água que gasta a pedra".
A ladainha sobre as virtualidades dem
o-cráticas da im prensa será constante em todo
esse longo período do Segundo Reinado. N um
salto para 1870, percebem os que os valores
que relacionam im prensa e liberdade já im
-pregnam o im aginário coletivo, a ponto de
lerm os no jornal conservador C o n s t i t u i ç ã o : "A
liberdade não é só o progresso e a m oralidade,
a paz e a civilização, é sobretudo a iniciativa,
o trabalho e a discussão. Instruir e discutir é o
que há de m ais nobre nas sociedades", afirm a
o jornal em 02 de abril, voltando a enfatizar o
valor da educação, em 12 de m aio, quando
justifica: "N os nossos dias as m aiores lutas são
as intelectuais, da im prensa e do parlam ento;
as m aiores vitórias são as das idéias, dos
ta-lentos contra as m ediocridades, da razão
so-bre a revolução, do estudo sobre a ignorância
invejosa ou presum ida".
A r a z ã o e o enfrentam ento i d e o l ó g i c o
são realçados num a realidade que aprende a
conviver com a opinião pública e com a
opi-nião publicada. Em 1874, a presença de um
jornal m açônico entre nós, desde o ano
ante-rior, acirra os ânim os, e a im prensa se torna
veículo das críticas ao tradicionalism o
católi-co. "V ivem os em tem po de análise", diz o
F r a t e r n i d a d e em 24 de novem bro: "credos
religiosos e idéias políticas, para m erecerem
a adesão dos hom ens, têm de ser discutidos e
sujeitar-se à c r í t i c a s e v e r a d a r a z ã o e d o b o m
s e n s o . A polêm ica tornou-se o princípio
do-m inante deste resto de século". E o j o r n a l i s
-m o fez-se a "válvula por onde a hum anidade
civilizada respira e recebe nova seiva para
superar os m il obstáculos que a tradição
ain-da lhe cria a caain-da m om ento" (grifos m eus).
A valorização da im prensa anda a par
com as hom enagens à educação pública e ao
livro. São todos considerados agentes do
Ilum inism o contra o obscurantism o religioso.
O elogio ao l i v r o pode ser visto em 1Q
de m aio de 1874 no jornal m açônico
F r a t e r n i d a d e , que afirm a que, se "a escola
m atou a sacristia, o livro fez calar o púlpito":
"este instrum ento da civilização dem oliu os
claustros; verteu, para percepção do povo, a
linguagem cabalística que Rom a falava há
al-guns séculos; e fez tábua rasa de quanto tinha
erguido a superstição e o fanatism o". N o dia
5 seguinte, o jornal m açônico continua:
D e p o i s d e a l g u m t e m p o d e o b s e r u a ç ã o , o c l e
-r o -r o m a n o r e c o n h e c e u q u e o e n s i n o p ú b l i c o ,
q u e s e o r g a n i z a n o s p a í s e s s u j e i t o s à s u a d o -m i n a ç ã o , r o -m p e u -m p o n t o d a -m a l h a p o r o n d e
s e d e v e i r t o d a a q u e l a o b r a , c u i d a d o s a m e n t e
t e c i d a d u r a n t e m u i t o s s é c u l o s . O livro é d e
u m a afoiteza a d m i r á v e l ; a e s c o l a , u m a c o n s -p i r a ç ã o d e p o r t a s a b e r t a s .
O ainda presente, hoje, desafio da
já aparece. Em 1876 o sistem a representativo
e a liberdade de inform ação recebem a adm
i-ração do jornal conservador
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A C o n s t i t u i ç ã o em 17 de setem bro.aZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
É saudada a "form am onárquica-constitucional-representativa,
sis-tem a m isto que com preende as excelências
de todos os outros sistem as, tendo afinal por
base a soberania nacional (. ..)", em vigor no
país. A lém disso, é salientada a i m p o r t â n c i a
d a i m p r e n s a n u m g o v e r n o l i v r e , quando o
povo pode ser
t o d o s o s d i a s i n fo r m a d o d e t o d a c a s t a d e
e x e m p l o p o l í t i c o , ( . . . ) d o t e o r d a s d i s c u s s õ e s
p o l í t i c a s d e u m s e n a d o o u d e u m a a s s e m
-b l é i a p o p u l a r - d a s d i s p u t a s s o b r e o c a r á t e r
o u s o b r e a a d m i n i s t r a ç ã o d o s m i n i s t r o s , d a s
i n t r i g a s e d a s c o n t e s t a ç õ e s d o s p a r t i d o s ( . . . ) .
E s t e s t ó p i c o s e x c i t a m u m a u n i v e r s a l c u r i o s i
-d a -d e e , h a b i l i t a n d o t o d o m u n d o a p r o d u z i r
a s u a o p i n i ã o , fo r m a m u m g r a n d e c a b e d a l
d e c o n v e r s a ç ã o p ú b l i c a ( . . . ) (grifos m eus).
o
próprio Silva Bezerra, ideólogo m aior do tradicionalism o entre nós e crítico severo daim prensa, não deixa de apontar algum a virtude
em sua função inform ativa: "sem as queixas e
denúncias, sem estes clam ores da oposição pela
im prensa, não pode a Coroa saber qual é a
ação da adm inistração
c. ..),
aquilatar o procedi-m ento dos partidos, e fazer as procedi-m udanças que ascircunstâncias aconselharem " (1864:96).
U m exem plo do serviço cívico que a im
-prensa pode prestar através de denúncias
pú-blicas é dado pelo jornal A C o n s t i t u i ç ã o , de 07
de abril de 1880, quando é descrita a figura do
"plantador" num a localidade rem ota, cercado
por seus "dom ésticos": "Q uando tal plantador
é "esclarecido", "a gente que o serve é feliz";
quando há "abusos da autoridade particular", a
repressão pelo poder público é difícil. "Só a
im prensa, cuja liberdade é absoluta no Brasil,
"em , a longos intervalos, a s s i n a l a r t a i s a b u s o s
à v i n d i t a
pública'
(grifos m eus).A
IMPRENSA E A OPOSIÇÃOA im prensa será, no Brasil, em
perío-dos de norm alidade institucional, um refúgio
para a oposição. N o Ceará provincial, nos
períodos de dom inação conservadora, a im
-prensa liberal se encrespa. Em 1853 a im
-prensa parece ser a única trincheira, afastados
que estão os liberais de todo e qualquer
pos-to de governo:
A i m p r e n s a éa ú n i c a l i b e r d a d e q u e h o j e n o s r e s t a ; e c o m o n o s g o v e r n o s r e p r e s e n t a t i v o s ,
q u a n d o a e l e i ç ã o t e m s u c u m b i d o a u m a i n
-fl u ê n c i a c o r r u p t o r a , o u à v i o l ê n c i a d o p o d e r ,
é e l a q u e s e e n c a r r e g a d e d i v u l g a r o s
i n t e r ê s s e s d o p a í s , d e a p r e s e n t a r s u a s q u e i
-x a s , e d e r e c l a m a r c o n t r a a s i n j u s t i ç a s d o
p o d e r (O Cearense: 10/05).
N o núm ero seguinte desse jornal,
nova-m ente é abordada a 'm archa da política'. São
colocados em relevo os três terrenos em que
a oposição luta com o governo no sistem a
representativo, que são a t r i b u n a , a i m p r e n s a
e a u r n a .
Q u a l q u e r q u e s e j a o c a r á t e r d a o p o s i ç ã o , o u
s e j a s i s t e m á t i c a , r a d i c a l e i n t o l e r a n t e , o u s e j a
m o d e r a d a , p a r c i a l , o u s e j a m e s m o p e s s o a l , é
n a t r i b u n a , n a i m p r e n s a e n a u r n a q u e e l a p õ e
e m a ç ã o t o d o s o s s e u s m e i o s , d e s e n v o l v e t o d o s
o s s e u s r e c u r s o s p a r a c o n s e g u i r o s e u fi m , a
q u e d a d o g o v e r n o . E s t a éa m a r c h a o r d i n á r i a , r e g u l a r , d a p o l í t i c a e m t o d o s o s p a í s e s q u e s ã o
l i v r e m e n t e c o n s t i t u i d o s , e q u e s e r e g e m p e l o s i s
-t e m a r e p r e s e n t a t i v o . S i r v a d e e x e m p l o a m a r
-c h a d o s p a r t i d o s n a I n g l a t e r r a ( 2 3 1 1 2 ) .
A esse respeito, Silva Bezerra raciocina
que "a oposição, fora da tribuna e por
conse-guinte da adm inistração, não é um poder
po-lítico, m as apenas um a força social que se
m anifesta pela im prensa ... " (1864:96).
IMPRENSA E ELEiÇÕES
tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
A expansão do corpo deliberante, com
o sacrifício do exc1usivism o aristocrático e o
estabelecim ento de um novo tipo de
consen-so consen-social, constitui o eixo das propostas
polí-ticas m odernizantes, em torno do qual
cristalizou-se a luta entre antigos e m odernos,
tam bém no Brasil.
aZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
É um a conseqüência doprocesso de laicização da política, o qual vai
im plicar no enfrentam ento com a Igreja e com
toda a cosm o visão tradicionalista e
hierárqui-ca. A afirm ação do princípio da soberania
popular fará da discussão sobre a
representa-ção política um cam po privilegiado de tom
a-da de posição, e a im prensa cum pre o papel
de m assificar o debate, dentro - que fique
claro - das possibilidades presentes à época
em análise. N a década de 70 do século
pas-sado, já assistim os Zacarias de G óes citar Stuart
M ill para afirm ar que a participação política é
o problem a fundam ental da época (ver
Car-valho, 1996: 189), ponto tam bém
insistente-m ente lem brado pelo cearense José de
A lencar.
N o debate sobre soberania e
represen-tação, fica im plícito todo um leque de
ques-tões renovadas. A s novas exigências da
independência política e do capitalism o
in-ternacional obrigam o país a repensar sua
form a de governo, o relacionam ento
interpro-vincial, o uso e regulam entação da força de
trabalho. V ai se produzindo todo um conjunto
de m odificações gradativas nas m aneiras de
pensar a política e de estabelecer norm as e
objetivos para ela, assim com o nas bases de
legitim ação da autoridade e da obediência. A
im prensa cotidiana abordará intensivam ente
todas essas questões, e o problem a das
elei-ções é sem pre visto de m odo apaixonado,
principalm ente se o órgão de im prensa
tra-duz o discurso do partido derrotado.
O s novos significados políticos que a
categoria povo vai tom ando dentro de um a
concepção laica e liberal da política trazem
confusão e desconforto, principalm ente no seio
dos jornais conservadores. Em 05 de julho de
1872, o jornal conservador
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A C o n s t i t u i ç ã o nos dá um exem plo das dificuldades em lidar como conceito m oderno de p o v o :
a p o l í t i c a a n t i g a d i v i d i a u m a n a ç ã o e m t r ê s
c l a s s e s - c l e r o , n o b r e z a e p o o o , a p o l í t i c a
m o d e r n a s ó r e c o n h e c e u m a - op o v o .
Já
s ev ê , p o i s , q u e a p o l í t i c a d e h o j e e l i m i n a o c l e
-r o e a n o b r e z a ( . . . ) . S e a p o l í t i c a m o d e r n a
n ã o e l i m i n a o c l e r o e a n o b r e z a , m a s c o n
-fu n d e t u d o n a s i g n i fi c a ç ã o d o p o v o , éc l a r o q u e a p a l a v r a p o v o n ã o e x p r i m e m a i s o q u e e x p r i m i a o u t r o r a , é u m a p a l a v r a v e l h a c o m
s i g n i fi c a ç ã o n o v a .
Para os jornais de extração dem ocrática,
porém , a confusão é positiva, e eis que surge
em Fortaleza o jornal Z é P o v i n h o , órgão do
"Clube da Rua", com um a afirm ação que
indi-ca as m udanças de m entalidade em vigor: "o
Zé Povinho de hoje é um novo ser, que
en-tende de abstrações e da ciência de governar
Estados... H oje é o Zé Povinho da Soberania
N acional" (28/11/1889 a p u d M ontenegro,
1980:65).
Em 1890, O C e a r e n s e ressalta a im
por-tância do direito de reunião, e de um a im
-prensa política verdadeiram ente livre, para
o sucesso do sufrágio universal (11/04). D iz
ainda que os jornais devem ser baratos "para
penetrarem profundam ente nas m assas
po-pulares", e num erosos, "para representarem
os m atizes diversos da opinião". A veiculação
dos prim eiros program as políticos dos
can-didatos e a defesa, pela im prensa, da tese
de que os candidatos devem se apresentar à
opinião pública, explicando suas opiniões e
posições, com eça a sacudir as bases do
po-der oligárquico, controlado pela m ão de
fer-ro do patriarca, que nunca havia tido
-parado pela posse de grande propriedade,
pelo tráfico de influência política, e pelo uso
privado e ostensivo da polícia.
aZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
" Aapresen-tação prévia dos program as por aqueles que
desejam os sufrágios populares" é novidade
anunciada pelo jornal conservador
edcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
P e d r a 11em 19 de m arço de 1881.
Para Silva Bezerra, a im prensa é, em
toda parte onde há eleições, '· 0 veículo por
onde, em regra, os m ais corrom pidos
dispu-tam e conquistam a representação"; eleitos,
eles "se im põem à Coroa com o a própria
opi-nião pública neles encarnada" 0864:70). Tam
-bém a im prensa política é criticada pelo
príncipe do progressism o cearense à época,
Rocha Lim a, que denuncia o ponto de vista
"exclusivo e anticientífico" da im prensa
polí-tica, a qual, segundo ele, verbera os atos do
governo "não para corrigi-Io m as para
dissolvê-lo" 0968: 321).
D esse m odo, percebe-se que em todo
esse processo de profundas m udanças no
perfil de nossa brasilidade, a Im prensa teve
destaque especial.
O liveira Lim a observa que
a i m p r e n s a fo i og r a n d e v e í c u l o d a s i d é i a s n o
B r a s i l . E m p a r t e a l g u m a é s u a i n fl u ê n c i a m a i s
c a r a c t e r í s t i c a e t e m s i d o m a i s p o d e r o s a . L o g o
q u e s e d e s e n c a d e o u fe z a I n d e p e n d ê n c i a ,
c o m o d e p o i s a a b d i c a ç ã o , a a b o l i ç ã o e p o r
fi m a r e p ú b l i c a , m a i s d o q u e q u a l q u e r o u t r o
fa t o r . S e r v i u d e v á l v u l a ã m a ç o n a r i a e d e p o r
-t a - v o z a o E x é r c i -t o . ( . . . ) A p r i n c í p i o p e s s o a l e
c h o c a r r e i r a , a i m p r e n s a fo i - s e d e p u r a n d o n a
a g i t a ç ã o c r e s c e n t e d a s i d é i a s e d e p r e s s a p a s
-s o u a d i s c u t i r p r i n c í p i o s m a i s d o q u e a t a c a r
r e p u t a ç õ e s , n u m a fo r m a g e r a l m e n t e c o r t ê s ,
s e b e m q u e n e m t o d a p r i m o r o s a . . . (J9 8 6 : 2 1 0 - 2 1 1 ) .
M as foi principalm ente a favor da
Re-pública que a im prensa brasileira se
posicionou: diz O liveira Lim a que "de 1822 a
1889 a m onarquia foi a 'cabeça de turco' dos
publicistas" (ibidem :203). E continua:
o
p a p e l q u e c o u b e à I m p r e n s a e m 1831 d e s a l v a r a M o n a r q u i a b r a s i l e i r a , c o u b e - l h e d e1 8 7 0 a 1889p a r a d e r r u b á - I a . ( . . . ) A s u b s t i
-t u i ç ã o d o g a b i n e -t e l i b e r a l Z a c h a r i a s p e l o g a
-b i n e t e c o n s e r v a d o r I t a b o r a í e m 1868 é p o r
a l g u n s p u b l i c i s t a s c o n s i d e r a d o o i n í c i o d a
ú l t i m a e g r a n d e c a m p a n h a d e m o l i d o r a d o
I m p é r i o e é fa t o q u e o s l i b e r a i s , c o m o s e n a
-d o r N a b u c o à fr e n t e , a e x p l o r a r a m o m a i s
p o s s í v e l . Reform a ou Revolução - fo i o s e u
l e m a , e a r e v o l u ç ã o n ã o v e i o m a i s c e d o p o r
-q u e a q u e s t ã o s e r v i l q u a s e m o n o p o l i z o u a
a t e n ç ã o p ú b l i c a a t é 1888 (ibidem :36).
CAMPANHAS ABOUCIONIST A E REPUBUCANA
O abolicionista]oaquim abuco, sem
dú-vida um a das figuras m ais lúcidas de então a
respeito do problem a da escravidão, evoca
m ais de um a vez o papel da im prensa no
sucesso da cam panha, em sua obra O
A b o l i c i o n i s m o . D iz ele que o advento do
abolicionism o "coincidiu com a eleição
dire-ta, e sobretudo com a aparição de um a força,
a qual se está solidificando em torno da im
-prensa - cuja barateza e distribuição por
to-das as classes é um fator im portante na história
da dem ocratização do país - força que é a
opinião pública" 0938: 14).
D efinindo a im prensa com o "a grande
arm a de com bate contra a escravidão e o
instrum ento da propagação das idéias
no-vas", labuco a elenca entre as "forças de
progresso e transform ação", e afirm a que
"o pensam ento dom inante no jornalism o
todo, do . orte ao Sul, é a em ancipação"
( i b i d e m : 189). ão deixa ainda de fazer
no-tar a "liberdade absoluta da im prensa" na
época, fato constatado por outros inúm eros
estudiosos do período.
D e m aneira sem elhante ao que
aconte-cia quanto à cam panha abolicionista, que
ha-via atravessado todos os partidos e traçado
um a fronteira nítida entre os órgãos da im
-prensa (ainda que ao final todos tenham se
proclam ado abolicionistas), a bandeira da
Re-pública tam bém cinde o cam po da política e
da opinião pública, principalm ente em seus
últim os anos e m eses. M as desde m uito tem
-po essa tese já vinha sendo levantada pelos
grupos na oposição, por vezes apenas com o
m étodo para assustar o Im perador.
Em 1851, O
edcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
C e a r e n s e de 06 de m aio já faz um levantam ento das três principaisposições políticas, e já se fala no 'partido
republicano': os s a q u a r e m a s , o partido da
'ordem ', "um conjunto forçado de m uitos
interêsses egoísticos, de m uitas pretensões
indignas, de m uitas am bições infam es", não
chega nem a ser analisado, é apenas
insul-tado. O partido l i b e r a l r e a l i s t a é "sincero,
honesto e anim ado por verdadeiro am or da
pátria, m as vítim a de um êrro funestíssim o";
seu êrro é querer o "im possível dos im
pos-síveis": "achar a verdade do regim e
repre-sentativo sob a repugnante e negativa
com binação das fórm ulas m onárquicas".
"En-tretanto, leitor, ainda aí tendes
C .. )
umter-ceiro grupo - é o honrado e generoso
partido republicano
aZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
C .. ), que é "pela rem is-são do povo, pelo triunfo infalível dade-m ocracia, pela inauguração pacífica e
gloriosa da república no Brasil".
A catilinária republicana prossegue. 'A
República perante D eus e a Escritura
Sagra-da" é o título de artigo em 16 de m aio, que
tem o seguinte destaque inicial: "Q uando o
Senhor D eus quis castigar os pecados e a
in-gratidão dos hom ens, m andou-lhes um rei para
os governar, porque um rei é o flagelo das
nações".
A palavra R e p ú b l i c a já não espanta
no-m eia uno-m longo artigo de 27 de no-m aio, eno-m
con-tinuação ao tem a republicano, onde o princípio
do direito divino é considerado derrotado: "a
época dos privilégios, e das castas, a do
san-gue azul, e do sansan-gue verm elho, e do s a n g u e
r e a l , a dos nobres e a dos plebeus, a dos
senhores e dos escravos, j á l á s e
foi
p a r a n ã om a i s v o l t a r . a hum anidade não recua - avança".
Com o exem plo das tendências
protela-tórias de nossas elites, a questão republicana
será discutida por décadas até sua solução.
Com o a questão da A bolição, que se
intensifi-ca em 1850, com a lei de proibição do
tráfi-co, m as só foi ser resolvida quase m eio século
depois. N esses longos intervalos, m ais ou
m enos intensam ente, continuam presentes nos
jornais, com cada lado da trincheira
brandin-do suas palavras-de-ordem .
Em 1887, por exem plo, o conservador
P e d r o 1 1 ,de 04 de setem bro, denuncia o com
-portam ento de "certos órgãos da im prensa
brasileira": "são jornais tidos e havidos com o
órgãos republicanos, que C .. ) procuram de-sacreditar, desm oralizar e solapar as nossas
instituições". E por que os "publicistas
repu-blicanos
C ..)
aconselham a m udança dasitu-ação?" O editorial responde: "porque o partido
conservador não quer transigir com a
desor-dem , com a anarquia que eles visam prom
o-ver para levar água a seu m oinho
C ..),
fazerprosélitos e engrossarem as fileiras
republi-canas" .
Proselitism o, é bem disso que se trata
num a época em que a neutralidade ainda não
era considerada um a virtude da im prensa. Para
os jornais m onarquistas, a República é "um
m onstro", "um b i c h o d e s e t e c a b e ç a s ' , para o
qual im porta "nada m enos que o sacrifício de
nossa religião, de nossas pessoas, fam ílias e
bens", segundo critica o liberal O C e a r e n s e .
Já para este, a República im plica na
"igualda-de "igualda-de todos perante a lei, sem distinção entre
ricos e pobres, nem entre nobres e
popula-res" (05/03/1852). Tem os aí um a boa
ilustra-ção da guerra ideológica na im prensa e sua
Em 1889, duas sem anas depois da
pro-clam ação da República, O
edcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
C e a r e n s e se en-trega à nova tarefa que estabeleceu para si .. o editorial intitulado P a r a o P o v o ,
desen-volve "considerações sobre a república em
geral, com o fim de fazer conhecer ao povo
o que é o regim e republicano e quais os
resultados que tem produzido em diversos
países". As considerações são feitas a partir
do 'Catecism o Republicano', de C. Vieira e
Teixeira Bastos. Sabidam ente, o jornal já
anuncia a m udança de lem a para "órgão
de-m ocrático" .
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