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Esfera Pública e Escândalo Político A Face Oculta do Poder

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Esfera Pública e Escândalo Político

A Face Oculta do Poder

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Título: Esfera Pública e Escândalo Político - A Face Oculta do Poder Autor: Hélder Prior

Revisão: Joana Videira

Layout e Design: Susana Duarte | Formalpress

Publicado por: media XXI – Publishing, Research and Consulting Reservados todos os direitos de autor. Esta publicação não pode ser reproduzida, nem transmitida, no todo ou em parte, por qualquer processo electrónico, mecânico, fotocópia, gravação ou outros, sem prévia autorização da Editora e do Autor.

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Rua João das Regras, 150, 5º esq. Traseiras, 4000/291 Porto Telefone: 225 029 137 1.ª Edição 2016

ISBN: 978-989-729-171-5 Depósito legal:

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Índice

Prólogo

Agradecimentos

Lista de figuras

Abreviaturas

Introdução

Capítulo I

Esfera Pública e Escândalo

• Escândalo: notas sobre o conceito

• Entre a Transparência e a Opacidade: uma teoria do desvelamento

• Escândalo e intransparência do Público: Da corrupção e dos poderes ocultos

• Esfera Pública e Cultura do Escândalo

Capítulo II

O segredo e o problema da Esfera Pública

• Da noção de «segredo»: considerações iniciais • Do segredo e da «representação de interesses»:

como a «partidocracia» fomenta os segredos do poder • Kant e a condenação do segredo nos actos do governo:

a publicidade como princípio de mediação entre a moral e a política

• Razão de Estado e arcana imperii: uma perspectiva histórica

• Da «suspensão temporária» do Direito à «suspensão permanente» da norma jurídica: os sistemas de vigilância e espionagem dos Estados

• Entre a razão de Estado e as «razões» do Estado de Direito • O valor social do segredo: a sociologia do segredo

de Georg Simmel 13 17 19 21 23 33 35 41 48 54 61 63 79 93 97 110 119 123

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Capítulo III

Esfera Pública e a política do Escândalo

Aufklärung e publicidade crítica: o auge da Esfera

Pública Liberal

• O declínio da Esfera Pública Liberal: a sociedade de «massas»

• Sobre o conceito de opinião pública

• Opinião Pública e democracia deliberativa: o público e a res publica

• A configuração do debate público

• Uma Esfera Pública abrangente: notas sobre a descentralização dos processos comunicacionais • Uma Esfera Pública Vigiada: notas sobre o panoptismo

Capítulo IV

A política do Escândalo mediático

• Esfera pública e política mediática: a construção do poder • Publicidade política e estratégias de representação • A visibilidade pública como «armadilha»

• A personalização da política e a política do ataque pessoal: dos «rat fuckers» aos spin doctors

• A política do escândalo mediático

• Por detrás do escândalo mediático: instituições e organizações implicadas

Capítulo V

O escândalo político e as Estratégias dos media

• A Anatomia do escândalo político

• Escândalo Político e Máquinas Narrativas: como a arte jornalística reconfigura o acontecimento

O escândalo Face Oculta no contexto político português: Sobre a TVI e sobre o Jornal Nacional de Sexta

• A narrativa do escândalo: das transgressões iniciais às transgressões de segunda ordem

• As transgressões de primeira ordem: O escândalo financeiro • As transgressões de segunda ordem: A politização

do acontecimento 139 141 147 152 164 170 178 187 201 203 208 219 226 234 247 255 257 267 274 279 281 287

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• O atentado contra o Estado de direito

Da mentira na política e da «artefactualidade» do medium • Os Boys partidários e a instrumentalização de

empresas públicas

O fim do Jornal Nacional de Sexta

• O escândalo Taguspark: da tentativa de compra da TVI ao apoio político de Luís Figo

• A perspectiva Funcionalista do escândalo: o ritual de purificação e moralização da vida pública

Capítulo VI

As consequências do Escândalo político

• A privatização da Esfera Pública e a publicitação do espaço privado

• Da conflitualidade entre o poder mediático e o poder judicial: quando os crimes são dos jornalistas

• Esfera Pública e mediatização da Justiça

• Da conflitualidade entre o poder mediático e o poder judicial: o segredo de justiça

Media e Vida privada: os interstícios jurídicos da privacidade

• Jornalismo de Investigação e Escândalo Político: Entre o domínio Público e o âmbito Privado

• A Economia da atenção do Escândalo Político • Escândalo e informação da subjectividade: a

aisthesis informativa

Conclusão

Bibliografia

300 305 319 324 327 331 339 341 344 345 355 360 364 373 379 387 401

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Introdução

«O mais escandaloso dos escândalos é que nos habituamos a eles.»

Simone de Beauvoir

Independentemente do exercício de pensamento acerca da pro-blematização e da actualidade do escândalo político nas sociedades contemporâneas, parece-nos apropriado referir que aquilo que aqui se erige resulta de um exercício pessoal de meditação (meletan), de treino (gymnazein) e de pensamentos que, a partir deste momento, se colocam à disposição do leitor. Esfera Pública e Escândalo Político é, neste contexto, um trabalho de meditação e de conversação com um outro. Exige, portanto, um trabalho de pensamento, um trabalho que vai «da meditação à actividade da escrita», como nos diria Mi-chel Foucault.1 Deve dizer-se, todavia, que este texto está longe de

esgotar todas as significações que o estudo do escândalo pode ad-quirir, correndo, por isso mesmo, o risco de frustrar as expectativas do nosso interlocutor. Ainda assim, convidamo-lo a seguir atenta-mente os movimentos interiores da escrita que aqui apresentamos.

Indagar hoje na significação do conceito de escândalo político equivale a indagar a dimensão política e comunicacional do espaço público contemporâneo. A hipótese fundamental desta investigação parte da ideia de que o escândalo político exige um trabalho labori-oso de reflexão sobre a constituição do espaço público moderno, so-bre as esferas de mediação simbólica, soso-bre a partilha da experiência e das subjectividades, sobre a erosão do público e do privado e so-bre uma cultura política construtivista e em permanente mutação. Deste modo, procuraremos examinar a configuração do escândalo político à luz das transformações da esfera pública contemporânea.

A esfera pública é o «lugar» onde os fenómenos são discutidos e

1 Cf. Michel Foucault, «A escrita de si», in O que é um autor?, S.L, Editora Vega, Passagens,

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interpretados e deve dizer-se que o escândalo político configura um campo semântico ambíguo nas modernas sociedades democráti-cas. Na obra sobre Esfera Pública e Escândalo Político procederemos, também, a uma revisão dos conceitos público e privado, da sua con-ceptualização histórica e da elisão dessa concon-ceptualização. De facto, a investigação a que nos propomos é, também, o estudo de uma enorme transformação do espaço público hodierno.

Porém, existem outras razões que tornam oportuna e actual a nos-sa inquirição. As transformações da esfera política, de uma esfera que tende para o campo da visibilidade pública proporcionada pela esfera dos meios de comunicação, é um tema que particularmen-te nos inparticularmen-teressa. A esfera política passou a configurar-se medianparticularmen-te uma estreita afinidade com a lógica, as estratégias e a gramática do

medium, possibilitando um campo de análise que não poderíamos

negligenciar. Embora seja difícil delinear todos os aspectos e con-tornos da relação entre o campo político e o campo dos media, não deixaremos de descrever os fenómenos que melhor se enquadrem no objecto global desta reflexão.

Na nossa pesquisa, o escândalo não é, somente, um conceito para descrever e compreender. É um conceito que permitirá apreciar cri-ticamente as formas da cultura política contemporânea, a sua evo-lução, descrição e transformação. O nosso objectivo é demonstrar que o fenómeno do escândalo proporciona uma reflexão sobre as práticas da vida colectiva, sobre os valores constitutivos do espa-ço público, sobre a natureza da vida política no mundo moderno, sobre a sua decadência, «refeudalização» ou invasão pela expansão do privado. O trabalho aqui apresentado insere-se na problematiza-ção do escândalo político à luz das modificações da esfera pública, procurando examinar, de forma crítica, os assuntos da política, os aspectos constitutivos da vida colectiva, as tensões e os processos de configuração da opinião.

Assim pois, interessa-nos compreender as dinâmicas do escândalo político para perspectivar a sua condição de possibilidade no mundo actual e analisar a sua disseminação, as suas características, os seus atributos, o seu papel social e comunicacional na esfera pública.

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In-quirir o escândalo político, como fenómeno social e comunicacional, implica assumir a dignidade do objecto de estudo, acreditando que a actualidade do fenómeno merece uma reflexão aprofundada. Este trabalho é, assim, uma contribuição humilde para a compreensão de um fenómeno disruptivo, procurando ter em conta as transfor-mações sociais, comunicacionais e políticas que a nossa sociedade enfrenta. A nosso ver, o fenómeno do escândalo político necessita de uma revisitação, de uma sistematização. Ao mesmo tempo, este trabalho será uma boa oportunidade para avaliar os aspectos nor-mativos de uma política – e de um campo mediático – em perma-nente actualização.

Por conseguinte, interessa-nos aferir a hodierna articulação do campo dos media com o campo da política sem, no entanto, esque-cer os relevos e as diferenças dos ambientes em causa. Devemos sublinhar que, normalmente, o campo dos media tende a investigar e a publicitar factos que o campo da política preferia que permane-cessem resguardados na esfera do segredo. Esta é, de resto, uma das heranças mais importantes do discurso liberal. Aquilo que era visto como sendo, apenas, um meio, configurou-se como instituição social, como um campo autónomo com valores, rotinas e caracterís-ticas próprias. Regido pelo princípio da transparência, o campo dos

media passou a contribuir para a iluminação incessante dos segredos

políticos. Neste sentido, o empreendimento que aqui pretendemos erigir é, também, o lugar de uma grande antinomia: de um lado, a função de transparência própria da lógica da informação; de outro lado, a lógica do poder, lógica de segredo, de interesses e paixões, de zonas ocultas, de «poder invisível». É verdade que as sociedades democráticas generalizaram a ideia de que o campo político tende à transparência e publicidade dos seus actos, esquecendo que – ge-neticamente – a lógica do poder não funciona com a transparência, mas sim através da ocultação das intenções, da impenetrabilidade dos seus interstícios, da «concentração do segredo».

A nossa perspectiva do escândalo permitirá observar a especta-cular mediatização do jogo político, a iluminação da sua opacidade, a modalidade dos simulacros que o caracterizam, a constituição

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fi-gurativa da sua aparência, o projecto dramático-expressivo da es-fera pública hodierna; mas, também, as estratégias esteticizantes do medium, a dimensão logotécnica da comunicação, os dispositivos espectaculares do sistema mediático. Na nossa conceptualização, o escândalo político tem efeitos caleidoscópios imprevisíveis.

Assim, em Esfera Pública e Escândalo Político procuraremos de-monstrar que a relevância do nosso objecto de estudo nas socieda-des actuais apenas se poderá compreender colocando em relação as peculiaridades do campo dos media com as peculiaridades do campo da política, ao mesmo tempo que abordaremos as transformações sociais e políticas que deram forma ao espaço público contempo-râneo. O objectivo é o de inquirir o conceito de escândalo político, tendo em conta a condensação de múltiplos estratos, estratos que dizem respeito às organizações mediáticas, às particularidades dos jogos de poder e à configuração de uma esfera pública que tem na visibilidade e na observação reflexiva da realidade comum as suas características elementares.

Todavia, o estudo do escândalo que desejamos empreender é também o estudo das categorias da publicidade e da privacidade, das figuras do publicus e do privatus, da constituição burguesa da esfera pública, da emergência de uma opinião pública vigilante, da institucionalização da máquina discursiva dos media, da sua con-sequente expansão para as dimensões individualizantes do espaço privado, da iluminação dos recônditos da política, mas também da iluminação dos recônditos da vida doméstica. Há, de facto, relatos de empobrecimento e de esvaziamento do espaço público contem-porâneo. Habermas narrou uma história de «refeudalização»2 da

esfera pública e do consequente esbatimento entre o público e o privado. Hannah Arendt, por seu lado, denunciou a sua decadência pela «irrupção do social»3 e o próprio Richard Sennett sublinhou os

fenómenos crescentes de «privatização» e de «personalização» que

2Cf. Jürgen Habermas, Historia y critica de la opinión pública: La transformación estructural de la vida pública, Gustavo Gili, Barcelona, 2006.

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conduziram às «tiranias da intimidade».4

Do ponto de vista genealógico, na democracia ateniense a esfe-ra do bios politikos podia distinguir-se, perfeitamente, da esfeesfe-ra do

oikos. No espaço da polis, o público não se confundia com a ordem

doméstica, pois as esferas da política e da família eram entidades diferentes e apartadas. O bios politikos era uma espécie de «segunda vida», uma vida para além dos domínios da reprodução e do traba-lho próprios da oikia e da família. É por isso que as esferas pública e privada eram espaços antitéticos e regidos por relações opostas. De um lado, a liberdade que regia a palavra (lexis) e a acção (praxis); do outro lado, as relações de dominação e propriedade exercidas pelo

oikodespotes sobre as mulheres e os escravos. Para os gregos, a

es-fera da ordem doméstica não deveria ser partilhada, precisamente pelo facto de não dizer respeito à comunidade, à esfera do koinos, do visível. As fronteiras entre o domínio público e o domínio privado estavam perfeitamente traçadas e, deve dizer-se, era precisamente a passagem do domínio da necessidade para o domínio da liberdade que permitia que o homem se transformasse num «animal político», num zõo politikon que se apresenta perante os seus pares (inter

ho-mines esse) no espaço público da Hélade.

Por outro lado, um dos aspectos distintivos da constituição do es-paço público moderno diz respeito à demarcação entre o público – aqui entendido como poder estatal, como entidade organizadora do mercantilismo – e o espaço privado do mercado, da sociedade civil e da vida doméstica, enquanto esfera privilegiada da família nuclear como hoje a reconhecemos. A constituição burguesa da publicidade polarizou a distinção entre o espaço da intimidade da vida doméstica e as relações impessoais e instrumentais próprias do mercado e do poder estatal. Acontece que, hodiernamente, as trocas simbólicas sustentam-se na partilha das subjectividades individuais, na revela-ção da personalidade e das identidades. Trata-se de um certo «des-nudamento», de um certo erotismo do espaço privado que também é impulsionado pela dinâmica sedutora e lúdica do campo dos

me-dia. Os assuntos privados passaram a irromper frequentemente nos

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cenários públicos, trivializando os aspectos identitários, pessoais, íntimos, emocionais, idiossincráticos. Este processo de correlativa

publicitação do privado próprio das «sociedades intimistas» é,

tam-bém, visível na política. O âmbito privado invade, quotidianamente, a cena pública, provocando fenómenos de progressiva

personaliza-ção do político e consequente privatizapersonaliza-ção do público. A dificuldade

contemporânea em estabelecer fronteiras entre o mundo público e o mundo privado não poderia ser mais perceptível.

Então, será o escândalo político um fenómeno de transparência generalizada, uma consequência da trivialização da política, um fe-nómeno que enquista a opinião pública esclarecida e que reflecte, de certa forma, um certo desencantamento, uma certa nostalgia e decadência do espaço público? Por outro lado, configurar-se-á o escândalo como mecanismo de sedução do mundo da informação, como um apelo ao regime pulsional do público enquanto objecto de discurso, como uma estratégia de «massagem do medium», como diria Marshall McLuhan?5 Será o escândalo político uma

consequên-cia de um striptease generalizado, de um certo «desnudamento do privado» que parece caracterizar o espaço público hodierno? Como vemos, o nosso desafio pretende configurar-se como uma constru-ção laboriosa que exigirá um trabalho permanente de enquadra-mento, de contextualização e – como se espera das ciências sociais – de especulação.

Frequentemente, o escândalo é visto simplesmente como um as-sunto trivial, como apenas um produto de uma indústria da informa-ção dobrada às leis de mercado e à procura incessante do consumo passivo dos seus artefactos mediáticos. Esta perspectiva, redutora a vários níveis, tem provocado um desinvestimento crítico sobre a compreensão e o alcance do escândalo. Mas será este um qua-dro de análise satisfatório? Na presente obra sobre Esfera Pública e

Escândalo, o objecto de estudo não é meramente encarado como

consequência da degradação do funcionamento democrático das sociedades e progressiva depauperação e desintegração da esfera

5Cf. Marshall McLuhan, «O meio é a massagem», in Compreender-me, Conferencias e Entrev-istas, Lisboa, Relógio D’Água, 2009, pp. 87-107.

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pública. Na nossa perspectiva, o estudo do escândalo político situa-se num domínio de problematização do fenómeno, mas também num domínio de enquadramento. É este o desafio a que nos propomos, sendo certo que o facto de existirem poucas obras académicas so-bre o tema nos coloca algumas dificuldades iniciais. Contudo, pro-curaremos trilhar o nosso próprio caminho, considerando as actuais transformações que a vida pública enfrenta, desprendendo-nos de explicações efémeras e superficiais que apenas revelam a aparência do fenómeno.

Com efeito, acreditamos que o estudo do escândalo político susci-ta questões relativas à lógica e natureza do poder, às estratégias de aquisição do poder simbólico, às transformações da política na actu-al sociedade de informação, à crise da representação, à configuração do debate público, à imediatez das identidades, às formas peculiares da cultura mediática e à banalização da esfera íntima. De resto, só assim poderemos tentar compreender os motivos pelos quais o es-cândalo político se converteu numa característica proeminente do espaço público contemporâneo.

Não obstante, a obra que o leitor tem entre mãos é, decerto, um produto inacabado, pois esta investigação não se consubstancia em soluções definitivas. Procurámos colocar um problema e demonstrar como nos apaixonámos por esse problema, independentemente da obsessão que cada paixão revela. De tudo o que aqui descreveremos, emerge o propósito de analisar a natureza do escândalo político, co-locando em relação o campo dos media e a instituição política sem, todavia, esgotar o objecto de estudo. De facto, ouvimos quotidiana-mente a palavra «escândalo», ainda que não saibamos muito acerca da sua natureza e significação.

Assim, no primeiro capítulo procuraremos enquadrar o conceito, procurar a sua génese etimológica, o seu significado histórico, a sua condição de possibilidade. Posteriormente, esboçamos uma espécie de teoria do desvelamento, intuindo que o escândalo vive da tensão entre luz e sombra, entre transparência e opacidade. Aqui, o exercí-cio teórico tem como objectivo descortinar de que forma a

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dos campos sociais, justamente porque o escândalo não escapa à lógica da publicitação. É, aliás, o ritual de transparência e de visibi-lidade que permite a apropriação do escândalo pelo campo social. Neste ponto, o que está em questão são as relações de visibilidade e apropriação que se estabelecem entre a cultura política e o campo dos media, ainda que não deixemos de sublinhar as novas formas de

instransparência do público.

De seguida, a nossa observação incidirá numa dialéctica peculiar: de um lado a iluminação da realidade societal herdada da filosofia das Luzes; do outro, o obscurecimento natural do político, o campo da astúcia, da simulação e da dissimulação, do engano, dos arcanos do poder. Com efeito, de que forma o escândalo se evidencia peran-te o «tribunal da opinião pública»? Quais são os mecanismos nor-mativos do campo social que permitem a sua disseminação? Como se desenvolveram, historicamente, esses mecanismos? O estudo do escândalo político suscita questões relativas às funções dos meios de comunicação nas sociedades contemporâneas e ao papel desempe-nhado na configuração do debate sobre assuntos que dizem respeito à res publica. Estes são, justamente, os temas em debate no terceiro capítulo deste trabalho.

O quarto capítulo encerra uma tentativa de averiguar de que forma a intersecção entre a esfera da comunicação e da política provocou o surgimento de fenómenos que intensificaram a eclosão e explora-ção de escândalos políticos no conjunto dos locais que configuram o quadro onde se desenrola a vida social. O objectivo aqui é inaugu-rar uma interpretação do escândalo político que tenha em conta os pressupostos da actividade política contemporânea na sua relação com os recursos expressivos do medium. Como as dimensões da po-lítica hodierna solicitam a gramática, os dispositivos e as estratégi-as do campo da comunicação, procuraremos colocar em relação o escândalo com a lógica publicitária da política, com as astúcias de espectacularização, personalização e dramaturgia que caracterizam o theatrum politicum. Analisaremos as principais transformações da política tendo em conta as interacções que se estabelecem entre a comunicação, a política e os respectivos agentes orgânicos dos

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«am-bientes» em análise.

Apesar de Esfera Pública e Escândalo não se configurar mediante uma análise exaustiva de casos empíricos – pois não é esse o nosso interesse nem, tampouco, é essa a dinâmica do nosso esforço con-ceptual – pretendemos, no quinto capítulo, compreender de que forma o escândalo político se converte num acontecimento selecci-onado, enquadrado e divulgado pela «maquinaria» do medium. Ten-do em conta os dispositivos logotécnicos Ten-do munTen-do da informação, procederemos a uma análise das técnicas utilizadas para a percep-ção da realidade do escândalo Face Oculta, tendo em conta certas materialidades que compõem o enunciado jornalístico, os seus actos locutórios e perlocutórios, os seus efeitos de realidade, as suas estra-tégias narrativas, dramáticas e ficcionais. No nosso ponto de vista, a mediatização do escândalo político obedece às lógicas de ruptura,

dramatização, personalização, enquadramento do enredo e recompo-sição, por vezes artificial, do acontecimento. É, precisamente, esta

desconstrução que pretendemos evidenciar, ainda que nos paute-mos por certos critérios especulativos e subjectivos de desconstru-ção hermenêutica.

Quanto às observações que compõem a parte final deste trabalho, deve dizer-se que pretendem versar sobre algumas perturbações do mundo da informação. Veremos como a esfera privada já não se prefigura como um espaço recôndito, mas antes como um espectá-culo que irrompe no espaço público, privatizando-o. Colocamos em evidência algumas consequências ético-jurídicas da intromissão dos

media na vida privada pois, em alguns casos, são as próprias

trans-gressões dos agentes orgânicos do sistema mediático que

escandali-zam. Posteriormente, pretendemos observar como o escândalo

ac-ciona os dispositivos lúdicos do mundo da informação, no sentido de produzir efeitos extáticos no espectador. Trata-se, na nossa análise, de uma espécie de economia da atenção do escândalo político que evidenciará certos critérios de notabilidade do fenómeno. Por fim, faremos uma pequena reflexão acerca da publicitação das subjecti-vidades individuais e de uma certa aisthesis informativa inerente ao pulsar sensual dos escândalos mediáticos.

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