• Nenhum resultado encontrado

Variação linguística na língua brasileira de sinais: um estudo a partir de narrativas autobiográficas surdas

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Variação linguística na língua brasileira de sinais: um estudo a partir de narrativas autobiográficas surdas"

Copied!
167
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LINGUÍSTICA

FRANCINEI ROCHA COSTA

VARIAÇÃO LINGUÍSTICA NA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS

- UM ESTUDO A PARTIR DE NARRATIVAS AUTOBIOGRÁFICAS SURDAS -

Florianópolis - SC 2018

(2)

FRANCINEI ROCHA COSTA

VARIAÇÃO LINGUÍSTICA NA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS - UM ESTUDO A PARTIR DE NARRATIVAS AUTOBIOGRÁFICAS

SURDAS -

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal de Santa Catarina (PPGLg/UFSC), como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Linguística.

Orientadora: Professora: Dra. Audrei Gesser

Florianópolis - SC 2018

(3)

Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor através do Programa de Geração Automática da Biblioteca Universitária da UFSC.

Costa, Francinei Rocha

Variação linguística na Língua Brasileira de Sinais – Um estudo a partir de narrativas autobiográficas surdas – / Francinei Rocha Costa; orientadora, Audrei Gesser; Florianópolis, SC, 2018.

167 p.

Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão. Programa de Pós-Gradução em Linguística.

Incluir referências

1. Linguística Aplicada. 2. Sociolinguística. 3. Narrativas Autobiográficas Surda. 4. Variação Linguística em Libras. I. Gesser, Audrei. II. Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-Graduação em Linguística. III. Título.

(4)

Francinei Rocha Costa

VARIAÇÃO LINGUÍSTICA NA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS

– UM ESTUDO A PARTIR DE NARRATIVAS AUTOBIOGRÁFICAS SURDAS –

Esta Dissertação foi julgada adequada para obtenção do Título de “MESTRE”, e aprovada em sua forma final pelo Programa de Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal de Santa Catarina.

Florianópolis, 29 de junho de 2018. ________________________________________

Profº Dr. Marco Antonio Martins

Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Linguística

Banca Examinadora:

________________________________________ Profº Dra. Audrei Gesser – UFSC

Orientadora e Presidente da banca

________________________________________ Profª Dra. Janine Soares de Oliveira – UFSC

Membro

________________________________________ Profº Dra. Aline Lemos Pizzio – UFSC (PGL)

Membro

________________________________________ Profª Dra. Lodenir Becher Karnopp – UFRGS

(5)

“A riqueza da libras não está na arte de responder, mas sim, na arte de perguntar!” (Francinei Rocha Costa, 2018)

(6)

AGRADECIMENTOS

À Professora Dra. Audrei Gesser, minha orientadora, pela oportunidade de reflexão oferecidas para meu desenvolvimento intelectual, pelas revisões, sugestões e aprimoramento na discplina de Linguística Aplicada, no acompanhamento ao longo do mestrado até a conclusão deste trabalho.

Às professores Mariane Rossi e Rachel Louise Sutton Spence, membros da banca, pelas críticas construtivas e as sugestões propiciadas na qualificação e defesa.

À minha colega Stephanie Carolina Alves Vasconcelos, pelo apoio e carinho na elaboração dos documentos enviados ao Comitê de Ética, a Mariam Royer, pelo auxílio na elaboração do Elan e a Daniele Miki Fujikawa Bózoli, pelo auxílio no registro da escrita de sinais. Obrigado por fazer parte da minha vida!

Ao amigo Daltro Roque Carvalho da Silva Junior, pela parceria em todos os momentos da minha caminhada.

Ao meu grande amigo e irmão de coração Rodrigo Custódio da Silva, por ser minha dupla nas discussões e dúvidas, me desafiando a refletir com suas perguntas e me dando confiança em seguir o caminho da pesquisa.

À querida intérprete e amiga Cristine Pereira pelo apoio e carinho na tradução da dissertação.

À todos os amigos da Associação de Pais e Amigos dos Surdos de Passo Fundo (APAS) e Associação dos Surdos de Passo Fundo, por terem me dado a oportunidade de aprendizado, crescimento e experiência profissional.

Aos meus pais, Nei Costa e Ieda Fátima, à minha irmã Franciele Costa Rizzatti e minha filha Maria Luiza pelo amor e carinho de sempre. Obrigado por compreender minha ausência e a ter paciência quando esta me faltava durante o estudo e trabalho.

Agradeço também as minhas avós, tias (os) e primos que sempre me apoiaram e torceram por mim.

Aos demais familiares, em especial aos tios Wladimir e Neiva Omiechuk, pelo apoio nos estudos e confiança depositada no meu crescimento, que me fizeram chegar até aqui.

Por fim, à minha esposa Fabiane Lima Cigognini pela paciência, pela confiança, pelo amor, pelo apoio, carinho e companheirismo nesses últimos dois anos.

(7)

RESUMO

A pesquisa trata de investigar o fenômeno de variação linguística a partir de algumas narrativas autobiográficas surdas. Para isso, foram selecionados oito sujeitos de duas regiões do país (sul e nordeste), que utilizam a Libras – língua brasileira de sinais. Após, foram realizadas entrevistas com os participantes para a constituição de um corpus. Este corpus foi analisado com o suporte do programa Elan (EUDICO – Linguistic Annotator) – utilizado nesta pesquisa para identificar os sinais coletados via vídeo-registro, considerando as variações linguísticas. Esse sistema de transcrição nos possibilitou a identificação de ocorrências de variações linguísticas geográficas, com foco nas interferências, empréstimos, sobreposição e alternância de línguas nas narrativas autobiográficas surdas, pois como toda a língua natural a Libras também está sujeita a ser afetada por esses fenômenos. Além disso, fragmentos de situações de tensão/conflito decorrentes do fenômeno de variação, experienciadas pelos sujeitos surdos em suas comunidades, foram observados e descritos. Alguns autores contribuiram para a construção desse trabalho, como Quadros (2014) na compreensão da elaboração, aplicação, transcrição e análise dos dados do ELAN, Machado (2016) e Diniz (2010) na análise dos fenômenos de interferências na Libras e preconceito linguístico, e Schmitt (2013) sobre variações e narrativas surdas. Os resultados dessa pesquisa rmostou que é possível identificar variações e interferências linguísticas nas narrativas de todos os entrevistados, e que há ainda o preconceito linguístico em decorrência dessas variações nas relações sociais desses sujeitos. Conclui-se esse trabalho afirmando que há necessidade de aprofundamento dos estudos nessa área, para o fortalecimento e enriquecimento dos estudos linguísticos relacionados as línguas de sinais, sobretudo à Libras, fato que torna esse estudo relevante e que possibilita importantes contribuições para a comunidade surda, linguístas, docentes e interessados por esse tema.

Palavras-chave: Linguística Aplicada; Sociolinguística; Narrativas Autobiográficas Surdas; Variação Linguística em Libras.

(8)

ABSTRACT

The research tries to investigate the phenomenon of linguistic variation from the narrative of some deaf autobiographical individuals. In order to do that, eight subjects from two regions of the country (south and northeast) were selected, using Libras (Brazilian Sign Language). After, interviews were conducted with the participants to form a corpus. This corpus was analyzed with the support of the Elan program (EUDICO - Linguistic Annotator) – used in this research to identify the signals collected through video-recording, considering the linguistic variations. This transcription system enabled us to identify occurrences of geographic linguistic variations, focusing on interference, borrowing, overlap and code alternation in deaf autobiographical narratives, because as any natural language Libras is also subject of being affected by these phenomena. In addition, fragments of tension/conflict situations arising from the phenomenon of variation experienced by the deaf individuals in their communities were observed and described. Some authors have contributed to the construction of thisresearch, such as Quadros (2014) in the comprehension of the elaboration, application, transcription and analysis of ELAN, Machado (2016) and Diniz (2010) in the analysis of the phenomena of interferences in Libras and linguistic prejudice, and Schmitt (2013) on variations and narratives o deaf subjects. The results of this research showed that it is possible to identify variations and linguistic interferences in the narratives of all the interviewees, and that there is still linguistic prejudice as a result of these variations in the social relations of these subjects. It is concluded in this research that there is a need to deepen the studies in this area, in order to strengthen and enrich linguistic studies related to sign languages, especially Libras, a fact that makes this study relevant and that makes important contributions to the deaf community, linguists, teachers and those interested in this subject. Keywords: Applied Linguistics; Sociolinguistics; Autobiographic Narratives of Deaf subjets; Linguistic Variation Libras.

(9)

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Conceitualização do sinal Autobiografia.………..……..…...16 Figura 2 – Apresentação do sinal Autobiografia em SIGNWRITING (Escrita de Sinais)………..……….16 Figura 3 – Sinal Autobiografia de perfil………..…....17 Figura 4 – Sinal Biografia………....….………..18 Figura 5 – Apresentação do sinal Biografia em SIGNWRITING (Escrita de Sinais)…………...……….………19 Figura 6 – Conceitualização do sinal “Biografia” de perfil……..……...19 Figura 7 – Sinal da palavra [PAI] no Sul do Brasil………….….….…...25 Figura 8 – Sinal da palavra [PAI] em São Paulo………...…..…….25 Figura 9 – Sinal da palavra [NOT] em ASL sinalizado pelo pesquisador……….26 Figura 10 – Desenho do sinal [NOT] em ASL………...…..…27 Figura 11 – Sinal da palavra [NÃO] em LIBRAS sinalizado pelo pesquisador.….………...28 Figura 12 – Desenho do sinal [NÃO] em LIBRAS…………..……..…..28 Figura 13 – Sinal da palavra [PRAÇA] em LIBRAS………..………...31 Figura 14 – Variação linguística do sinal da palavra [PRAÇA] em LIBRAS………….……….31 Figura 15 – Exemplos de empréstimos de línguas estrangeiras….……..57 Figura 16 – Exemplos de empréstimo externo….………..……..…..…..57 Figura 17 – Esquema elaborado por Grosjean (1982) sobre CODE-SWITCHING……….…….63 Figura 18 – Ilustração do procedimento da captura das imagens com uma câmera……….………....72 Figura 19 – Ilustração do procedimento da captura das imagens com o auxilio de duas câmeras.………....……….……….73 Figura 20 – Adicionar Trilha………....…………...75 Figura 21 – Anotações e ocorrências da glosa [MÃE]…...………..…....76 Figura 22 – Inserção de anotação no ELAN na modalidade presencial...76 Figura 23 – Parâmetros fonológicos da Língua de Sinais (baseado em Ferreira-Brito 1990, p. 23)……….…….81 Figura 24 – Página inicial do site do Núcleo de Aquisição de Língua de Sinais – NALS.……….……...82 Figura 25 – Página de busca de Configurações de Mão e localização do Núcleo de Aquisição de Língua de Sinais – NALS.…...……..………...82 Figura 26 – Sinal do item lexical [CONCURSO].……..………..……102 Figura 27 – Variante do item lexical [CONCURSO]…………....……102

(10)

Figura 28 – Identificação de ocorrências e anotações do Fenômeno

Alternância de Código -FS………...……….………108

Figura 29 – Identificação de ocorrências e anotações do fenômeno alternância de código………...…..………..……….…113

Figura 30 – Item identificado no ELAN – soletração manual [ICES]....117

Figura 31 – Soletração manual do entrevistado [ICES]…..…………...117

Figura 32 – Ocorrências de palavras Soletradas [FS]……….…...117

Figura 33 – Lista de palavras Identificadas………...118

Figura 34 – Sinal da palavra [NUNCA]………..………..….119

Figura 35 – Sinal da palavra [CLARO]……….…………....119

Figura 36 – Sinal da palavra [DIA]………..…………..119

Figura 37 – Sinal da palavra [VAI]………..……..……120

Figura 38 – Sinais das palavras [IMPORTANTE], [POLÍTICA], [PEDAGOGIA]………120

Figura 39 – Sinal das palavras [VESTIBULAR], [RESPEITO]……..120

Figura 40 – Sinal da palavra [COORDENADOR]………..….121

Figura 41 – Sinal da palavra ASL [UNIVERSIDADE]………...121

Figura 42 – Sinal da palavra ASL [DIFERENTE]………...……122

Figura 43 – Sinal da palavra ASL [SIM]………...122

Figura 44 – Sinal da palavra ASL [LINGUÍSTICA]……….122

Figura 45 – Sinal da palavra [DESAFIO 1]………...129

Figura 46 – Sinal da palavra [DESAFIO 2]………...129

Figura 47 – Sinal da palavra [DESAFIO 3]………...130

Figura 48 – Sinal da palavra [VERDE] – C.M: 5 E [VERDE] - C.M: V………...132

Figura 49 – Sinal da Configuração da Mão [C + O]………...…134

Figura 50 – Sinal da Configuração da Mão [3 + 6]……….…...134

Figura 51 – Sinal utilizado no Rio Grande do Sul [IDIOTA] e no Norte [PREGUIÇA]………...136 Figura 52 – Sinal utilizado no Rio Grande do Sul [PREGUIÇA]….…137

(11)

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Variedade Geolinguística……….………...….….51

Tabela 2 – Resultado obtido quanto ao estado, sexo e duração dos vídeos analisados………...74

Tabela 3 – Quantitativo de produção das palavras identificados.………78

Tabela 4 – Região dos entrevistados onde os itens lexicais foram identificados………...79

Tabela 5 – Sinal do item lexical [IDIOTA] e [PREGUIÇA]………84

Tabela 6 – Sinal do item lexical [CONFUSÃO] e [COMPLICAR]...….85

Tabela 7 – Sinal do item lexical [COMPLICAR] e [DIFÍCIL]……...85

Tabela 8 – Sinal do item lexical [OFICIAL/ORIGINAL], [VERDADE] e [EFETIVO]…….……….………86

Tabela 9 – Sinal do item lexical [CONCURSO] e [REDAÇÃO]……....87

Tabela 10 – Sinal do item lexical [MÃE]………....87

Tabela 11 – Sinal do item lexical [REDAÇÃO]……….….88

Tabela 12 – Sinal do item lexical [POLÍTICA]……….….89

Tabela 13 – Sinal do item lexical [CHATO]………...89

Tabela 14 – Sinal do item lexical [PALAVRA]……….….90

Tabela 15 – Sinal do item lexical [FEDERAL]………..90

Tabela 16 – Sinal do item lexical [TREINAR]………..…..91

Tabela 17 – Sinal do item lexical [COMUNIDADE]………..…91

Tabela 18 – Sinal do item lexical [REUNIÃO]……….…………..……92

Tabela 19 – Sinal do item lexical [HORRÍVEL]……….…92

Tabela 20 – Sinal do item lexical [REFORÇAR]……….….……..93

Tabela 21 – Sinal do item lexical [SEMINÁRIO]………….….…...…..93

Tabela 22 – Sinal do item lexical [DEPENDE]……….………..………94

Tabela 23 – Sinal do item lexical [EDITAL]………..……….95

Tabela 24 – Sinal do item lexical [FAMÍLIA]……….…………...95

Tabela 25 – Sinal do item lexical [PROVA]……….…………..96

Tabela 26 – Parâmetros que diferenciam o item [PROVA]……….…...97

Tabela 27 – Sinal do item lexical [PROFISSIONAL]……….………...97

Tabela 28 – Sinal do item lexical [PALESTRA]………...…..…………98

Tabela 29 – Sinal do item lexical [VESTIBULAR]………….………..99

Tabela 30 – Sinal do item lexical [VICIADO]……….…..99

Tabela 31 – Sinal do item lexical [DIRETOR]……….…..99

Tabela 32 – Sinal do item lexical [PAI]……….100

Tabela 33 – Sinal do item lexical [CONCURSO]………..101

Tabela 34 – Sinal do item lexical [COORDENADOR]………….……103

Tabela 35 – Sinal do item lexical [FACULDADE]……….……..104

(12)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AM – Alfabeto Manual

ASL – American Sign Language (Língua de Sinais Americana) CL – Classificadores

CM – Configuração de Mão EF – Expressões Faciais

ELAN – EUDICO – Linguistic Annotator ENM – Expressões Não-Manuais ES – Espaço de Sinalização

FENEIS – Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos INES – Instituto Nacional de Educação dos Surdos

ISL – International Sign Language (Língua de Sinais Internacional) K&O – Koch e Oesterreicher (autores do modelo de análise sobre a proximidade e o distanciamento)

Libras – Língua Brasileira de Sinais (termo é usado nacionalmente e legalmente)

LSB – Língua de Sinais Brasileira (termo é usado nacionalmente e internacionalmente)

M – Movimento

MC – Movimento Corporal

MDFE – Mão e Dedo(s) Fora de Enquadramento NALS – Núcleo de Aquisição de Língua de Sinais Or – Orientação da mão

PA – Ponto de Articulação

PTA – Parâmetros Totalmente Articulados SM – Soletrações Manuais

SOMND – Sinais com Omissão de Mão Não-Dominante TA – Tradutor-ator

UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina VR-Libras – Vídeo Registro em Libras

(13)

SUMÁRIO ABSTRACT...……8 NOTA INTRODUTÓRIA...…...15 1 INTRODUÇÃO………...21 1.1 JUSTIFICATIVA DA PESQUISA………...29 1.2 OBJETIVO GERAL…………...……….…….34 1.3 OBJETIVOS ESPECÍFICOS………34 2 REVISÃO DE LITERATURA…...…….………...35

2.1 NARRATIVAS ENQUANTO HERANÇA CULTURAL DOS SURDOS....………...…..39

2.1.1 NARRATIVAS AUTOBIOGRÁFICAS….…..……….…..…42

2.2 VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: DEFINIÇÃO DE CONCEITOS………47

2.3 DEFINIÇÃO DE INTERFERÊNCIA LINGUÍSTICA...…...54

2.3.1 DEFINIÇÃO DE EMPRÉSTIMO LINGUÍSTICO...…….…..56

2.3.2 DEFINIÇÃO DE ALTERNÂNCIA DE LÍNGUAS..…….…..61

3 ABORDAGEM METODOLÓGICA QUALITATIVA…...66

3.1 MÉTODO E PROCEDIMENTOS ..………..……...……...67

3.2 NARRATIVAS AUTOBIOGRÁFICAS DOS ENTREVISTADOS SURDOS……….70

3.3 ELAN: DA TRANSCRIÇÃO À SEGMENTAÇÃO DOS DADOS……….71

3.4 IDENTIFICAÇÃO DAS VARIAÇÕES LINGUÍSTICAS UTILIZANDO O PROGRAMA ELAN...……...75

4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS………...78

4.1 VARIAÇÃO REGIONAL NAS NARRATIVAS………….…80

4.1.1 VARIAÇÃO REGIONAL – SINAIS IDÊNTICOS...…...84

4.1.2 VARIAÇÃO REGIONAL – ITEM LEXICAL COM DUAS VARIANTES………...……….87

4.1.3 VARIAÇÃO REGIONAL – ITEM LEXICAL COM MAIS DE DUAS VARIANTES………...…..…99

4.1.4 CONCLUSÃO SOBRE AS VARIAÇÕES LINGUÍSTICAS NA LIBRAS………..105

4.2 INTERFERÊNCIA NAS NARRATIVAS...…...….107

(14)

4.2.2 SOBREPOSIÇÃO DE LÍNGUAS (CODE-BLENDING)…..113 4.2.3 EMPRÉSTIMOS LINGUÍSTICOS...115

4.3 CONCLUSÃO SOBRE AS OCORRÊNCIAS DE

ALTERNÂNCIA, SOBREPOSIÇÃO E EMPRÉSTIMOS LINGUÍSTICOS………..………...……123

5 TENSÃO E CONFLITO RESULTANTES DAS

VARIAÇÕES VIVENCIADAS E RELATADAS PELO PARTICIPANTES………..…………..…126 5.1 SITUAÇÃO DE TENSÃO/CONFLITO: “VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E LÍNGUA PADRÃO”………127 5.2 SITUAÇÃO DE TENSÃO/CONFLITO: “VARIAÇÃO DE

SINAIS REGIONAIS E PRECONCEITO LINGUÍSTICO”..131

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS………...………141

REFERÊNCIAS...……….………...……145 APÊNDICE...……….……..………152

(15)

NOTA INTRODUTÓRIA

CONCEITUALIZAÇÃO DA CRIAÇÃO DOS SINAIS

AUTOBIOGRAFIA E BIOGRAFIA

Ao abordar o gênero autobiografia como objeto de observação do discurso sobre os entrevistados participantes da pesquisa, procurei aprofundar-me, entre outros conceitos, no significado da memória através da recriação de histórias de vida.

Após a definição de pesquisa, constatou-se a necessidade de criar um sinal específico para os léxicos autobiografia e biografia, visto que se apresentavam de forma recorrente e não havia a representação na Libras. Para isso, dedicou-se aos estudos linguístico para descrição das propriedades físicas e articulatórias do sinal, com o cuidado para serem elaborados com o máximo de precisão, visualmente, na representação que trazem, e conceitualmente, para uma plena compreeensão quando passam pela tradução.

A criação de novos sinais são de extrema importância para a comunidade surda, pois quando damos aos conceitos a representação na Libras contribuímos para a compreensão dos sujeitos surdos sobre esses sinais/termos e no processo de interpretação.

A autobiografia e a biografia são gêneros que, ao abordar histórias de vida pela narrativa, podem promover a reflexão de quem se propõe a organizar essas história através de seu olhar sobre as experiências. No caso desta pesquisa, procuramos fragmentos de situações de conflito e/ou tensão vivenciadas pelos oito participantes surdos motivadas pelo uso das variações linguísticas no contato com outros sinalizantes. Acreditamos que o que transparece nas autobiografias ou nas narrativas de vida consiste no domínio sobre o próprio passado e em elucidar o que ficou do vivido.

Conceitualização do sinal “AUTOBIOGRAFIA”:

A autobiografia é uma narração pessoal, na qual o indivíduo narra história da sua vida, ela consiste na narração da experiência vivencial do indivíduo, levada a cabo por ele próprio ou escrita com a ajuda de outro escritor. De acordo Queiroz (1988) nela foi o próprio narrador quem se dispôs a narrar sua vida, deu a ela o encaminhamento

(16)

que melhor lhe pareceu e deteve o controle sobre os meios de registro. A autobiografia pode ter diferentes formatos, tais como: as memórias, diários, relatos, confissões, e outros.

O sinal apresentado “AUTOBIOGRAFIA e BIOGRAFIA” foram criados pelo pesquisador com base nos estudos linguísticos e conceitual realizados neste estudo.

Figura 1 – Sinal AUTOBIOGRAFIA.

Fonte: Elaborada pelo Autor.

Figura 2 – Apresentação do sinal AUTOBIOGRAFIA em SignWriting (Escrita de Sinais)¹.

Fonte: Elaborado por Daniele Miki F. Bózoli

1 2 3

6 5

(17)

Figura 3 – Sinal AUTOBIOGRAFIA de perfil

Fonte: Elaborado pelo Autor Descrição do sinal

Sinal realizado próximo ao peito.

Mão dominante com a palma virada para baixo, dedos separados e

curvados na configuração .

Mão passiva na horizontal, palma da mão virada para a direita, na

configuração .

Movimento: iniciando o movimento com a ponta dedos unidas, mão dominante acima da mão passiva, com os dedos dentro do C esquerdo, mover a mão dominante para cima e fazer um arco, trazendo a mão para fora.

Conceitualização do sinal “BIOGRAFIA”:

1 2 3

(18)

É quando o autor narra a história da vida de uma pessoa ou de várias pessoas. As biografias contam a vida de alguém. De acordo com Pereira (1999) a biografia “define como a história de um indivíduo redigida por outro”. Elas revelem suas opiniões, valores, crenças e atitudes.

Figura 4 – Sinal BIOGRAFIA.

Fonte: Elaborada pelo Autor.

2 3

(19)

Figura 5 – Apresentação do sinal BIOGRAFIA em SignWriting (Escrita de Sinais).

Fonte: Elaborado por Daniele Miki F. Bózoli Figura 6 – Sinal “BIOGRAFIA” de perfil

Fonte: Elaborada pelo Autor.

Sinal realizado no espaço neutro.

Mão direita com a plama virada para baixo, dedos separados e

curvados na configuração ;.

1 2 3

6 5

(20)

Mão esquerda na horizontal, palma da mão virada para a direita,

na configuração .

Movimento: iniciando o movimento com a ponta dedos unidas, mão dominante acima da mão passiva, com os dedos dentro do C esquerdo, mover a mão dominante para cima e fazer um arco, trazendo a mão para fora.

(21)

1 INTRODUÇÃO

A comunidade surda constitui-se de pessoas de várias classes sociais e diferentes níveis de conhecimento linguístico. Essas comunidades lutam pelos mesmos interesses e dão suporte para a transmissão cultural, política, esportiva, etc. Esses processos de transmissão cultural ocorrem nas organizações, associações e federações de surdos, através da interação entre surdos de diferentes idades, principalmente pelos mais velhos, que transmitem suas experiências de vida, seus valores e crenças, mostrando suas lutas de resistência e força na defesa das comunidades surdas. Portanto, entende-se comunidade surda como um espaço de trocas simbólicas em que as línguas de sinais, a experiência visual e os artefatos culturais1 surdos são partilhados entre

indivíduos surdos e ouvintes que reúnem interesses comuns e projetos coletivos (STROBEL, 2008).

De acordo com Wilcox (2005, p. 78): “embora o termo cultura surda seja usado frequentemente, isso não significa que todas as pessoas surdas do mundo compartilhem a mesma cultura”. Existe uma grande diversidade de comunidades surdas, pois cada grupo é organizado de forma diferente e distinta, ou seja, lutam pelos mesmos objetivos, mas possuem diferentes experiências, as quais constituem sua identidade.

[...] As identidades surdas são construídas dentro das representações possíveis da cultura surda, elas moldam-se de acordo com o maior ou menor receptividade cultural assumida pelo sujeito. E dentro dessa receptividade cultural, também surge aquela luta política ou consciência oposicional pela qual o indivíduo representa a si mesmo, se defende da homogeneização, dos aspectos que o tornam corpo menos habitável, da sensação de invalidez, de inclusão entre os deficientes de menos-valia social. (PERLIN, 2004, p. 77-78).

1 A autora apresenta oito artefatos culturais que podem caracterizar a cultura surda, e que são entendidos como as ilustrações da cultura, como aquilo que vai além do material, constituindo o sujeito e as formas de ver, entender e transformar o mundo. (STROBEL, 2016, p. 44).

(22)

As identidades surdas são bastante complexas e diversificadas. Podemos observar as diversas identidades surdas, quando convivemos com surdos filhos de pais surdos; surdos que não têm nenhum contato com outro surdo; surdos que ficaram surdos após o nascimento; surdos que tiveram contato com língua de sinais tardiamente, etc. As identidades surdas assumem formas multifacetadas e se constituem na proximidade com o outro igual e no contato com o processo de transmissão cultural. (PERLIN, 1998; ROSA, 2012).

Mas como ocorre esse processo de transmissão cultural? Segundo STROBEL (2013, p. 3) “muitas vezes o processo de transmissão cultural de surdos ocorre com muitos surdos somente na idade mais avançada, já adultos, porque a maioria deles tem famílias de ouvintes, ou porque, pela imposição ouvintista, nem frequentaram as escolas de surdos e ficam sem contato por muito tempo com a comunidade surda”. Isso vai interferir significativamente na aquisição da língua, e isso influenciará na compreensão do mundo, no desenvolvimento e no processo escolar.

A língua está à disposição das pessoas que compõem uma comunidade e entender a língua como fator social significa compreender uma comunidade tanto linguística como social. Mas apesar das línguas de sinais – LS ser objeto de estudo de vários pesquisadores, por instigá-los devido a sua modalidade visual-espacial e por ser reconhecida como principal artefato da cultura surda, alguns surdos desconhecem sua real importância.

Muitos surdos brasileiros escolarizados, apresentam um desconhecimento sobre o seu uso e funcionamento da língua de sinais. Talvez um dos fatores seja a falta de políticas educacionais que garantam a aquisição da sua língua natural – língua de sinais – como L1. Além da apropriação da língua de sinais ser indispensável para a vida dos surdos, é também necessário compreender com ela funciona, como se constitui, quais os fenômenos linguísticos e interferências estão presentes. Muito se tem pesquisado sobre as estruturas da língua de sinais e seu uso, mas ainda há muito a se pesquisar.

Com a intenção de aprofundar os estudos sobre a língua de sinais, fui buscar nas aulas de mestrado algumas respostas e ao iniciar as pesquisas na área fiquei motivado pelas indagações acerca dos fatos linguísticos que vivencio na comunidade surda e que presenciei ao longo da minha vida. O interesse por pesquisar as variações linguísticas de Libras foi tomando forma.

Naturalmente, imergi nos conteúdos envolvidos nas disciplinas de sociolinguística e dialetologia, entre outras, percebi a profunda relação com a proposta inicial da pesquisa e para a qual ainda faltavam elementos

(23)

que esclarecessem o objeto de estudo. Diferentes leituras elucidaram o foco dessa pesquisa, e logo de início percebi que independente da modalidade linguística é possível identificar mudanças e variações.

O ponto de partida foi conhecer a Teoria da Variação e Mudança Linguística ou Laboviana, de que trata o autor William Labov (2007) nos postulados teóricos da sociolinguística variacionista das Comunidades de Fala – CF, reconhecendo o uso da língua como o mais importante elemento da cultura e da vida em sociedade, constituinte essencial na consolidação da cidadania e do convívio democrático. Como para a educação o reconhecimento da variação linguística implica na forma heterogenia de padrões usados em sala de aula, a Teoria Laboviana trata a língua enquanto função social, sob essa ótica é que estarei analisando os dados coletados.

Em conversa com minha orientadora, começamos a afinar possibilidades de investigação a partir de autores que tratam das línguas de sinais neste sentido. Dentre eles, encontramos a excelente contribuição teórica de Heloise Gripp Diniz (2010) que pesquisou sobre a evolução da Libras e as variações linguísticas antes e depois de ter sido oficializada pela legislação brasileira. Assim, estaremos dialogando com a autora sobre o conceito de mudança linguística, situação sociolinguística da Libras, interferência linguística na língua de sinais e, principalmente, as interferências lexicais, sendo que esta é a mais frequente no encontro de duas línguas e alvo da minha pesquisa.

Já, o pesquisador Dionísio Schimitt (2013) contribuiu para compreender melhor sobre os contextos sócios históricos e sociolinguísticos de surdos ao identificar as variações e mudanças linguísticas ocorridas na Língua Brasileira de Sinais. A análise detalhada de narrativas surdas, apresentada por Schimitt, configurou-se como um importante arsenal de informações imprescindíveis para um enfrentamento analítico com as coletadas para essa pesquisa. O autor possibilita também o diálogo com os postulados sobre influências das línguas, empréstimo linguístico, preconceito linguístico, o qual se aproxima de minha análise sobre “conflitos/tensão” identificado nas narrativas.

Por último, Leland McCleary que com suas premissas contribuiu significativamente para o embasamento dessa pesquisa no que se refere à sociolinguística que trata da relação entre as línguas e a sociedade. Apresenta em seus escritos uma abordagem didática simples e direta, que favorece a compreensão da complexidade das mudanças linguísticas e da identificação de fenômenos recorrentes de suas variações. Assim sendo, esses autores formam um alicerce sólido e rico em informações teóricas,

(24)

que me possibilita embarcar com muita determinação no estudo aqui apresentado.

Nesse processo surgiram as seguintes hipóteses: É possível identificar e fazer comparações sobre as variações linguísticas, analisando os sinais retirados de narrativas de surdos usuários da Libras do Sul e do Nordeste do Brasil? E se essas pessoas de alguma forma já vivenciaram situação de conflito devido o uso dessas variações? Tais análises possibilitarão verificar quais ocorrências de variação geográfica estão presentes nas narrativas autobiográficas dos surdos entrevistados? É possível identificar fenômenos de interferência, empréstimo linguístico e alternância de línguas?

Essas indagações surgiram a partir de fatos que vivenciei e que me marcaram profundamente nas interações com diferentes comunidades surdas, despertando meu desejo por querer entender as implicações cotidianas das variações linguísticas e se as situações de conflito/tensão ocorrem quando há a presença destas na fala dos usuários de Libras.

Para início, considero como ponto de partida dessa pesquisa, minha própria experiência de desenvolvimento linguístico na condição de usuário da Libras, surdo desde os dois anos de idade estive imerso ao insumo linguístico local, sou natural do norte do estado do Rio Grande do Sul, aprendi Libras com os usuários da comunidade surda. No entanto, quando em contato com outras comunidades da região e de outros estados detectava léxicos diferentes dos que eu usava, como, por exemplo, a palavra [PAI] em Libras no estado de São Paulo era sinalizada com o uso da datilologia “p”, “a”, “i” próximo da boca (Figura 8), percebendo-se uma forte influência da Língua Portuguesa. Isso intrigava-me muito, pois na região sul do Brasil já havia sido adotado um sinal, como mostra a figura 7, e essas experiências causavam e causam um embate, ou linguisticamente falando, geram tensão e conflito na comunicação, apesar de que em ambos os casos o uso desse (Figura 7) ou daquele sinal (Figura 8) são arbitrários2.

2 Um aspecto que se sobressai no contraste entre as modalidades vísuo -espacial e oral-auditiva é a questão da arbitrariedade do signo lingüístico. Es- se conceito estabelece que, na constituição do signo linguístico, a relação entre o significante (imagem acústica/fônica) e o significado é arbitrária, isto é, não existe nada na forma do significante que seja motivado pelas propriedades da substância do conteúdo (significado). Uma característica das línguas de sinais é que, diferentemente das línguas orais, muitos sinais têm forte motivação icônica. Não é difícil supor que esse contraste se explique pela natureza do canal perceptual: na modalidade

(25)

O uso das variantes de um mesmo item lexical pode ser identificado e categorizado e podemos testar hipóteses de que os usos de tais variáveis lexicais podem contribuir para momentos de conflito, tensão e de preconceito linguístico.

Vejamos alguns exemplos de variações geográficas utilizadas por comunidades surdas distintas trazidas por Simone Gonçalves de Lima da Silva (2014):

Figura 7 – Sinal da palavra [PAI] no Sul do Brasil

Fonte: http://e-revista.unioeste.br/index.php/linguaseletras/article/view/ 10554/8195

Figura 8 – Sinal da palavra [PAI] em São Paulo

vísuo-espacial, a articulação das unidades da substância gestual (significante) permite a representação icônica de traços semânticos do referente (significado), o que explica que muitos sinais reproduzam imagens do referente; na modalidade oral-auditiva, a articulação das unidades da substância sonora (significante) produz sequências que em nada evocam os traços semânticos do referente (significado), o que explica o caráter imotivado ou arbitrário do signo linguístico nas línguas orais (SALLES, 2004, p. 83)

(26)

Fonte:

http://e-revista.unioeste.br/index.php/linguaseletras/article/view/10554/8195

Outra experiência muito interessante que vivenciei e que de fato merece uma análise a parte, foi conversando com uma amiga surda brasileira que num dado momento sinalizou a palavra [NÃO] da Língua Americana de Sinais – ASL (Figura 9). Sabemos que o que ocorre aqui não se trata de empréstimo linguístisto, pois a Libras tem sinais de negação para diferentes usos. Minha atenção nesse fato é para situação que levou minha amiga a produzir uma variação linguística na sua fala: ela queria ser discreta, ter uma comunicação privada comigo e ao responder minha pergunta usou um sinal da ASL e não um sinal da Libras ao fazer referência a palavra [NÃO]. Assim, no momento de sua fala, vivenciei um conflito/tensão, pois me causou estranheza aquela variação linguística e interferência no entendimento de sua resposta. Passamos a conversar sobre isso, foi quando me explicou que utiliza o sinal [NOT] da ASL para que outros usuários da Libras não o identifique. Ainda não é possível afirmar se é apenas um uso isolado ou se esse léxico virá a se tornar uma possibilidade lexical de negação utilizada correntemente entre falantes da Libras na comunidade surda.

(27)

Fonte: http://www.signmedia.com/doc/masl_unit1fng.pdf Figura 10 – Desenho do sinal [NOT] em ASL

Fonte: http://www.signmedia.com/doc/masl_unit1fng.pdf

Ainda assim, fiquei bastante curioso e num primeiro momento pensei que ela estaria adotando esse sinal aqui no Brasil como forma de “status” que o estrangeirismo3 tem, assim como acontece com o uso de

palavras em Língua Inglesa na língua Portuguesa e que exercem uma enorme influência, tanto que as pessoas usam várias palavras em Inglês diariamente na comunicação em Português. Mas a justificativa que ela me

3 “Estrangeirismo é o emprego, na língua de uma comunidade, de elementos oriundos de outras línguas. No caso brasileiro, posto simplesmente, seria o uso de palavras e expressões estrangeiras no português. Trata-se de fenômeno constante no contato entre comunidades linguísticas, também chamado de empréstimo. A noção de estrangeirismo, contudo, confere ao empréstimo uma suspeita de identidade alienígena, carregada de valores simbólicos relacionados aos falantes da língua que originou o empréstimo”. (GARCEZ; ZILLES, 2001, p. 15).

(28)

apresentou é bem interessante, considerando que o sinal [NÃO] em Libras (Figura 11) é um sinal que nos remete automaticamente ao seu sentido devido a sua iconicidade4, ao ver alguém sinalizando [NÃO] em Libras,

temos a imagem de uma cabeça dizendo “não”, sendo utilizado de forma gestual pelo universo de pessoas ouvintes, o que faria qualquer pessoa, conhecedora ou não da Libras entender a comunicação.

Figura 11 – Sinal da palavra [NÃO] em LIBRAS sinalizado pelo pesquisador

Fonte: Elaborada pelo Autor.

Figura 12 – Desenho do sinal [NÃO] em LIBRAS

Fonte: Dicionário Capovilla

(Capovillhttp://trabalhandocomsurdos.blogspot.com.br/p/blog-page.html).

4 “A noção da iconicidade também está presente nas pesquisas das línguas orais, que tratam a iconicidade como uma relação de semelhança/similaridade entre a forma (o código linguístico) e seu significado em diferentes níveis da estrutura linguística (fonologia, morfologia e léxico, sintaxe e discurso). Um exemplo seriam as onomatopeias, palavras que imitam a estrutura sonora das coisas do mundo, como o “tique-taque” (i.e. som de um relógio funcionando)”. (DINIZ, 2010, p. 21).

(29)

Por isso, ela estaria adotando o sinal [NÃO] em ASL como estratégia de preservação do conteúdo (apelo à iconicidade) de sua comunicação. De que forma o estrangeirismo tão comum nas línguas faladas são também comuns (ou não) nas línguas sinalizadas? Em que proporção o sinal [NOT] em ASL e outros sinais estrangeirizados tem sido convencionalizados (SAUSSURE, 1916) entre seus usuários aqui nas CF das comunidades surdas do Brasil? Esses questionamentos podem ser respondidos, a depender do que encontraremos nos dados coletados. Por ora, esses exemplos ilustram a relevância de se estudar o tema de variação linguística e o quanto ainda há para se pesquisar.

Dados os exemplos percebemos que a comunicação é um movimento constante, fazendo com que a língua esteja sempre se modificando ao longo dos tempos, nela está contida a forma de organizar o mundo em nomes e estruturas linguísticas, as pessoas modificam e se modificam com a língua. O mesmo se dá nas línguas de sinais.

Primeiro, pensamos em observar os sinais dicionarizados e dali fazer uma descrição e análise quanto à variação. Posteriormente, entendemos que entrevistar surdos de diferentes cidades e regiões poderia ser uma alternativa. Para tanto, pensamos no gênero – narrativas. Nas línguas de sinais é através das narrativas de vida que as comunidades surdas compartilham e imprimem suas histórias. Essa exposição na sua língua natural – língua de sinais – possibilita a aceitação de sua identidade, o contato surdo com surdo, o compartilhamento da cultura, o acesso ao conhecimento, a sua constituição enquanto sujeito de dever e direitos, a luta por garantias, etc. Se não, o surdo ficaria preso a uma língua que obedece uma modalidade diferente de sua condição, ou seja, a língua majoritária de seu país, oral/auditiva.

1.1 JUSTIFICATIVA DA PESQUISA

Entende-se que esta pesquisa contribue para o conhecimento sobre a comunidade surda, as identidades linguísticas em questão, bem como para uma melhor compreensão da função social e desenvolvimento sociolinguístico da Libras. Por isso, esse estudo justifica-se pela relevância dada as línguas de sinais ao conhecer e re-conhecer as variedades linguísticas nas narrativas de vida dos surdos investigados. Consideramos esta uma proposta importante e pertinente, que contribuirá para o desenvolvimento das pesquisas na área e suporte teórico para comunidade em geral, usuários ou não da língua de sinais. Os dados

(30)

podem nos iluminar também quanto ao uso/contato de surdos com outras variedades em sinais e sua relação com a Língua Portuguesa.

Minha história de vida também se mistura a essa pesquisa enquanto participante/observador dos movimentos da comunidade surda, como mencionei na introdução. Todavia, destaco aqui também que vivenciei situação de conflito e tensão referentes às mudanças e influência linguística, por meio dos diálogos entre surdos de diferentes regiões.

Uma situação de conflito que aconteceu em um determinado momento da minha vida envolveu um amigo surdo. Conversávamos informalmente e assim que sinalizei a palavra praça (Figura 7) causou certa estranheza ao meu colega que me interrompeu na hora e questionou que sinal era aquele. Fiquei surpreso, pois, o sinal praça era o mesmo que sempre utilizei. Ele tinha certeza que havia aprendido aquele sinal e que estava confuso, afirmando que eu é que estava equivocado e que tinha certeza que a comunidade surda de Passo Fundo utilizava outro sinal (Figura 8) para a palavra praça.

Para compreender melhor esta situação de conflito precisamos perceber em que contexto aconteceu. Moro na cidade de Passo Fundo, desde minha infância, aprendi a língua de sinais com a comunidade surda daqui, aos 9 anos de idade. Meu amigo surdo morava na cidade de Sananduva e devido as dificuldades linguísticas encontradas veio para Passo Fundo para estudar e aprender a língua de sinais, foi quando nos conhecemos e passamos a ser amigos pois tínhamos a mesma idade (18 anos) e na época estudávamos na mesma classe. Com o passar do tempo ele foi adquirindo a língua de sinais através da interação com a comunidade surda, conhecendo os sinais específicos dos locais da cidade como: shopping, lojas, etc. Depois de um tempo, ele passou em um concurso público e mudou-se para a cidade de Florianópolis–SC, o contato diminuiu, porém, a amizade permaneceu.

Esse foi outro fato que motivou a pesquisa, no sentido de expandir meu olhar não apenas à descrição das variações dos sinais, mas também em olhar desdobramentos nos usos sociais que culminassem em tensão, conflito e, eventualmente, construção de preconceitos. Fiquei instigado com a variação linguística e as influências que os sinais sofrem dependendo dos usuários, o local de origem e da bagagem cultural que cada pessoa vai adquirindo com o passar do tempo e como a língua vai se desenvolvendo e se modificando. Por conta dessas memórias, busquei entender melhor esse processo, esses conflitos entre falantes de uma mesma língua, fiquei desejoso em aprender mais, foi então, que, ao retornar para minha cidade, comecei uma pesquisa de maneira informal, primeiro perguntando para os surdos da comunidade o sinal que estes

(31)

utilizavam para a palavra praça e se havia variações deste sinal na comunidade surda da nossa cidade, conforme ilustrado abaixo:

Figura 13 – Sinal da palavra [PRAÇA] em LIBRAS

Fonte: Elaborada pelo Autor.

Figura 14 – Variação linguística do sinal da palavra [PRAÇA] em LIBRAS

Fonte: Elaborada pelo Autor.

Na pesquisa encontrei duas variações, a qual apresentei acima. Mas logo a reflexão me provocou a querer busca mais. Então, optamos pela coleta de dados a partir de narrativas filmadas, resgatando um pouco da história e das experiências de vida de cada indivíduo em relação à língua de sinais e a língua oral, para, posteriormente e através destas, adentrar nas análises sobre as variações linguísticas e de potenciais evidências de preconceito linguístico.

As narrativas surdas nesse contexto da pesquisa veem para proporcionar aos surdos valorização e respeito linguístico de suas histórias de vida, de suas memórias. O fato de escolher narrativas está relacionado com a possibilidade dos entrevistados se expressarem de forma natural através da sua L1 resgatando através das perguntas pré-selecionadas um pouco de sua trajetória de resistência e luta contra o

(32)

poder hegemônico ouvintista (ABRAHÃO, 2003), recorrendo pelas suas autênticas identidades culturais e linguísticas, também defendido pelas noções de pesquisa autobiográfica.

É importante ressaltar que a escrita em português para o surdo é um processo de apropriação de uma segunda língua, a qual apresenta especificidades na forma de seu registro, bem como nas limitações de seus usuários. Devido a esse fato, a escolha das análises através das narrativas sinalizadas, as quais compõem a pesquisa, são construídas em torno de um ideal de cultura, utilizando a língua de sinais como marca autêntica dos surdos, numa perspectiva política, cultural e histórica. A narrativa segue uma lógica que André (1998, p. 39) designa como “movimento”, ou seja, “os elementos que compõem a ação devem criar um interesse progressivo, que conduza o leitor ao conflito e, deste, ao desfecho, dentro de uma atmosfera dramática sugestiva”.

No processo de análise dos vídeos a partir das narrativas surdas, será necessário coletar e documentar informações sobre as variações linguísticas pelos entrevistados. Os registros em vídeo serão registrados através do programa ELAN.

O programa escolhido foi o ELAN, que é um sistema de transcrição importante, desenvolvido para registros de coleta de dados em vídeo e/ou áudio, para finalidades de anotação, de análise e de documentação, o que contribui para novas possibilidades na área da lingua de sinais. ELAN (EUDICO – Linguistic Annotator) permite além da criação, a edição, visualização e a busca de anotações através de dados de vídeo, também permite a criação de ‘trilhas’ para registro e análises específicas. Esta ferramenta de multimídia tem contribuído muito para desenvolvimento de pesquisas na área da Libras. O software foi desenvolvido pelo Instituto de Psicolinguística Max Planck, na Holanda, com o objetivo de produzir uma base tecnológica para a anotação e a exploração de gravações. Segundo Quadros (2009, p. 17):

O ELAN apresenta o tempo associado aos trechos transcritos, é de fácil interface entre as diferentes informações, permitindo um número ilimitado de registros determinado pelos pesquisadores. Comporta 9 conjuntos de diferentes caracteres e exporta os registros como documentos de texto. Através deste sistema, o pesquisador pode visualizar diferentes blocos de informação simultaneamente (como os vídeos, as glosas, as traduções das glosas, as marcas não-manuais, os sons associados aos sinais, o contexto, os

(33)

comentários, entre outros.). No momento em que o pesquisador fixa em um ponto determinado da transcrição, imediatamente os outros blocos de informação relacionados a ela aparecem.

As possibilidades que o programa apresenta são enormes, podendo ser salvos vários vídeos e visualizados de diferentes formas. Os vídeos (até quatro) podem ser visualizados simultaneamente e sincronizados de acordo com sua necessidade e proposta. Os vídeos podem ser rodados em diferentes velocidades.

Além de transcrever, ele possui estatísticas de diversos tipos e sua quantidade de ocorrências. Neste caso, a utilização de trilhas possibilita a seleção de vocabulário controlado, tipos linguísticos, trilhas de transcrição. A primeira coisa que será feita ao utilizar o ELAN é definir quais as trilhas de transcrição que serão necessárias para alcançar os objetivos da pesquisa e, a partir disso, é possível determinar o tipo linguístico que vamos aplicar a cada trilha de transcrição e o vocabulário controlado.

Uma trilha é o conjunto das anotações que compartilham das mesmas características, por exemplo, uma trilha que contém a transcrição das glosas de um sinalizante, uma outra trilha que contém a tradução dessas glosas e assim por diante.

As trilhas serão nomeadas em classes, selecionadas e categorizadas em:

 Interferência linguística  Empréstimo linguístico

 Alternância e sobreposição de línguas  Tensão/Conflito

Após as transcrições das glosas dos vídeos serão feitos os cortes das narrativas, então a tradução para a Língua Portuguesa, e as análises das situações encontradas serão realizadas por meio desses cortes que servirão de comprovação e registro real da situação vivenciada pelos participantes da pesquisa.

A investigação se estende sobre a análise das variações linguísticas naturais na Libras, as interferências linguísticas, bem como os condicionadores, os quais regulam e condicionam nossas escolhas. Segundo Coelho (2015, p. 20, grifo do autor)

(34)

Os condicionadores ajudam o analista a delimitar quais são os contextos mais propícios para a ocorrência das variantes em estudo. Eles são divididos em dois grandes grupos, em função de serem mais ligados a aspectos internos da língua ou

externos a ela.

Resumindo, a pesquisa e coleta de dados tem um teor qualitativo, com base nas noções de pesquisa autobiográfica. O uso do ELAN para análise dos dados será fundamental no processo de tradução e análise dos dados coletados com o diálogo com as fundamentações teóricas/científicas, que serão desenvolvidas ao longo da pesquisa.

1.2 OBJETIVO GERAL

O objetivo geral desta pesquisa é identificar as variações

línguísticas através de narrativas autobiográficas dos surdos das

regiões sul e nordeste do Brasil, apontando situações de conflitos

vivenciadas pelos narradores e fenômenos de interferências

linguísticas, empréstimo, sobreposição e alternância de línguas.

1.3 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

 Identificar as variações linguísticas através das narrativas autobiograficas coletadas por meio do programa ELAN;

 Comparar as variações linguísticas encontradas nas narrativas em língua de sinais utilizadas pelos indivíduos surdos pertencentes a diferentes regiões do país (regiões Sul e Nordeste);

 Observar fenômenos como interferência, empréstimo linguístico, sobreposição e alternância de línguas nos discursos dos entrevistados;

 Identificar se há ocorrências de conflito/tensão e preconceito linguístico causadas pelas variações linguísticas.

(35)

2 REVISÃO DE LITERATURA

Vale ressaltar um aspecto, em que Karnopp (2005) apresenta uma reflexão, muito pertinente, vivenciada pelos alunos surdos na fase escolar. Na rotina educacional, os alunos surdos por não terem a presença de insumo em língua de sinais, deparam-se com limitações no uso da língua majoritária (português) e com a escrita. Isso reflete na construção de sua identidade surda e provavelmente esse pode ser um dos motivos que contribui para que se perpetue a tradição histórica a qual dá privilégio ao uso das línguas de modalidade oral-auditiva, menosprezando a utilização da Libras pelos surdos, criando-se talvez daí, vários dos mitos hoje conhecidos (GESSER, 2009).

Em relação à aquisição da Língua Portuguesa pelas crianças surdas, em sua maioria, ocorre na infância com a família, mesmo os que são filhos de pais surdos, e para alguns via serviços de um profissional fonoaudiólogo, o qual tem como objetivo funcional, o de promover a aquisição do Português oral. Neste contexto, a língua de sinais é, muitas vezes, tardiamente adquirida. Essa forma equivocada de aquisição reflete negativamente no desenvolvimento linguístico das crianças surdas. No processo de aquisição da Língua Portuguesa é comum acontecer problemas, por não ser um processo natural para as crianças surdas (QUADROS, 1997). Trata-se de um cenário sociolinguisticamente complexo, em que os surdos vivem situações bilíngues, transitando em variedades da língua oral e da língua de sinais (GESSER, 2009). Embora defendamos a importância da Língua de Sinais para o completo desenvolvimento linguístico-cognitivo dos surdos, entendemos que a escrita da Língua Portuguesa também faz parte do mundo surdo, como exemplo, uma segunda língua no processo de escolarização, podendo ser instrumento adicional para a defesa dos seus interesses e cidadania, na construção de seus direitos e na criação de políticas públicas. E porque essa discussão é importante para um estudo que tem como foco a análise e descrição de variação linguística em Libras?

No que diz respeito às línguas de sinais, o que é crucial na vida dos surdos, é possível observar tanto a interferência do Português no uso de alguns léxicos (e isso decorre tanto por conta do processo de escolarização como também das interações e experiências de vida em sociedade, em ambos os casos com forte influência da língua majoritária oral,) como também a variação vai depender de inúmeras variáveis sociais no contato surdo-surdo. Como toda língua humana, a Libras passa, naturalmente, pelo processo contínuo e gradual de variação e mudança

(36)

linguística, seja por motivações internas, de uso de alguns sinais, transformando o léxico, seja por contato com outras línguas de sinais ou até mesmo com as línguas orais, como mencionamos acima. Portanto, torna-se indispensável compreendermos as mudanças linguísticas em curso, bem como os fatores sociais e os processos de variações existentes. Em uma mesma língua há diferentes formas e variedades com que os usuários executam os sinais, como afirma Felipe

Como toda língua, as línguas de sinais aumentam seus vocabulários com novos sinais introduzidos pelas comunidades surdas em resposta a mudanças culturais e tecnológicas. As línguas de sinais não são universais, cada língua tem sua própria estrutura gramatical. Assim como as pessoas ouvintes em países diferentes falam diferentes línguas, também as pessoas surdas por toda parte do mundo, que estão inseridos em “culturas surdas”, possuem suas próprias línguas. (1990, p. 81).

Nos estudos das línguas de sinais evidenciam-se os dialetos regionais (STROBEL e FERNANDES, 1998), salientando o seu caráter de língua natural. As autoras trazem exemplos de variações regionais, sociais, e variações relacionadas às mudanças históricas. Porém, vamos nos limitar às variações geográficas e, por isso, buscamos compreender melhor sobre outras formas variantes e registrá-las, visto que são poucos os registros dessa variação e análise das variantes nesse processo. Segundo BASSO e SCHMITT,

A LIBRAS também apresenta dialetos regionais, reforçando seu caráter de língua natural. As variações na LIBRAS ocorrem de várias formas, como alterações na configuração de mãos (forma que a mão assume na realização do sinal) ou na localização espacial do sinal (local onde o sinal é realizado), sem que seu sentido e significado sejam perdido ou modificados. Também há sinais diferentes para representar um mesmo referente, usando em diferentes regiões do país, às vezes do mesmo estado. (2007, p. 50 e 51).

(37)

Evidenciando as narrativas autobiográficas dos entrevistados a proposta será de identificar as variações linguísticas geográficas, através de oito entrevistas, sendo que quatro realizadas na região Sul e quatro na região Nordeste do Brasil. A partir da problemática apresentada sobre a presença de variação linguística em Libras e situação de conflitos causadas por elas, é possível fazer uma reflexão com base nos estudos de Xavier (2010, p. 58), que defende o seguinte:

A discussão sobre a variação linguística em LSB não pode se resumir a apenas utilizar uma comparação dos processos de variação linguística que promove uma diversidade linguística e o enriquecimento do vocabulário. A organização de estudos da variação linguística em LSB está relacionada à percepção do mundo e à construção de significados. Podemos dizer que, na LSB, encontramos uma condição linguística de grande complexidade, em decorrência dos processos de aquisição de língua, dos aspectos culturais e do impacto político e social desses aspectos na vida dos Surdos. E esses fatores dependem ainda de outras variáveis: usos da língua, interlocutores proficientes, possibilidade de adquirir uma segunda língua, métodos formais ou informais de aprendizagem de segunda língua e a relação de cada sujeito com a LSB e a Língua Portuguesa.

Neste sentido, o repertório sociolinguístico das comunidades surdas é bem variado, apresentando determinadas marcas na Libras influenciadas em função da região, da idade, do gênero, da formação educacional, e assim por diante. Ainda sobre a variação linguística e sua complexidade, Camacho (2006) afirma que

Há quatro modalidades, mais usuais, de variação: variação histórica, que revela a trasformação da língua acompanha com as mudanças sociais,alguns prões são deixados e outros criados, em que gerações mais velhas e mais novas entram em conflito: Variação geográfica, que se explica pelas diferentes formas que uma expressão é tomada em determinada região; Variação social, que diz respeito às expressões diferentes atribuídas a umre

(38)

ferente, por pessoas da mesma sociedade, e fatores como o grau de escolaridade, o nível socioeconômico, idade, sexo são determinantes para disitinguir grupos distintos de fala verbal dentro de uma classe, em que uns gozam de uma língua de maior prestígio e outro não; Variação estilística, que se apresentaquando uma mesma pessoa utiliza várias formas da língua, que se configura de acordo com o contexto de fala. (apud SORDI ICHIKAW, 2003, p. 44).

Com isso, podemos perceber que a língua é heterogênea e dinâmica, e ainda, essas variações estão ligadas com o ambiente sócio-cultural e, por isso, são fatores importantes que determinam as escolhas lexicais de cada indivíduo.

Assim, ao investigar e identificar as variedades linguísticas de sinais e a presença de conflito e/ou tensão nos discurso de pessoas surdas brasileiras, estaremos descrevendo o repertório linguístico de alguns surdos, de diversas regiões do Brasil, fluentes na Libras. Trata-se de um estudo que toma e retoma as narrativas de vida de alguns surdos contados via sua memória, sendo este o “componente essencial na característica do(a) narrador(a) com que o pesquisador trabalha para poder (re)construir elementos de análise que possam auxiliá-lo na compreensão de determinado objeto de estudo”. (ABRAHÃO, 2003, p. 80).

Além disso, buscaremos também compreender o impacto das variações linguísticas presentes nas narrativas surdas coletadas e se há alguma marca de conflito e/ou tensão em alguma situação linguística vivenciada e/ou observada por eles em algum momento de suas vidas. Com a aporte do Programa ELAN reunindo recortes de momentos das narrativas em que identificou-se variações linguísticas geográficas e conflitos/tensão na vida dos entrevistados.

O trabalho de registro das narrativas da trajetória de vida dos surdos será mediado através da escolha de perguntas-chave que norteará as análises. O registro dessa documentação em Libras envolve procedimentos que configuram uma metodologia na perspectiva de pesquisa autobiográfica

Ao trabalhar com metodologia e fontes dessa natureza o pesquisador conscientemente adota uma tradição em pesquisa que reconhece ser a realidade social multifacetária, socialmente construída por

(39)

seres humanos que vivenciam a experiência de modo holístico e integrado, em que as pessoas estão em constante processo de autoconhecimento. (ABRAHÃO, 2003, p. 80).

Pretende-se nesta linha de pesquisa, compreender o fenômeno de estudo, sem o intuito de criar generalizações. A coleta de dados será feita por gravação em vídeo e contará com a transcrição de Libras por meio do ELAN (EUDICO – Linguistic Annotator) que nos permitirá, além da criação, da edição, da visualização, também a busca rápida de anotações através de dados em vídeo registrados no sistema (QUADROS, 2014, p. 31).

A sessão destinada à revisão de literatura vai revelar o universo das contribuições científicas de autores sobre os temas: narrativas enquanto herança cultural; narrativas autobiográficas; variação linguística. Além de algumas definições de conceitos relacionados à língua de sinais como: interferência linguística, empréstimo linguístico, sobreposição e alternância de línguas.

2.1 NARRATIVAS ENQUANTO HERANÇA CULTURAL DOS SURDOS

Os entrevistados foram escolhidos aleatoriamente, tendo como requisito mínimo formação universitária e residência em cidades do Brasil. Além disso, o perfil dos entrevistados é de surdos que criaram associações como forma de resistência construindo um caminho de lutas e conquistas. Portanto, quem começa a integrar essas comunidades, percebem de cara essas características e seus modos de vida, suas crenças e seus valores, a partir do que é sinalizado, são feitas via narrativas. Não se consegue conhecer essa comunidade através de livros ou registros literários, poucos livros temos a disposição relatando a forma de vida das comunidades surdas. Recentemente, com os impulsos da tecnologia, é que podemos perceber muitos registros através de vídeos sendo produzidos e que, certamente, estarão fazendo parte do arsenal da herança cultural das comunidades surdas, servindo de alicerce à pesquisa e propagação da história dos surdos do Brasil.

Não podemos negar a importância da herança cultural que se recebe dos antepassados para a nossa vida em sociedade, é graças a ela

(40)

que se consegue viver no coletivo, fazer parte de um grupo e adquirir uma cultura. Aceitá-la é inevitável, porém, isso não significa que será preservada e transmitida sem alterações, as mudanças e transformações inevitavelmente fazem parte da condição humana e é o que possibilita novas aprendizagens. Pode-se refletir sobre a questão da herança cultural, concluindo que é através dela que o sujeito se conecta à sociedade, sendo a linguagem grande facilitadora desse processo. No entanto, mesmo se constituindo desde a infância em uma determinada cultura, as pessoas passam a protagonizar mudanças na medida em que vão interagindo culturalmente uns com os outros, no trânsito das mais variadas culturas, isso significa que o sujeito tem a oportunidade de modificá-la através da força maior ou menor de sua influência dentro do grupo. É possível dizer, então, que além da capacidade de observação, a capacidade de comunicação é a grande responsável desse processo de aquisição da chamada herança cultural, pois permite que a cultura seja transmitida às futuras gerações, como explica Laraia (2001) “a comunicação é um processo cultural”. Reforçando essa ideia CAVALLI-SFORZA refere

Assim, a linguagem pode ser entendida como um mecanismo para a transmissão da cultura, no qual há sempre, no mínimo, um emissor, um receptor e a informação que é transmitida de um a outro. A linguagem aumenta enormemente a eficiência do processo e constitui a própria base da cultura humana. Mais do que qualquer outro fator, ela permite que os seres humanos se adaptem e dominem a circunvizinhança num espaço de tempo bastante curto. (2003, p. 227).

Para Strobel a cultura pode ser entendida como “[...] o jeito do sujeito surdo entender o mundo e modificá-lo a fim de torná-lo acessível e habitável ajustando-o com suas percepções visuais, que contribuem para a definição das identidades surdas. [...] isso significa que abrange a língua, as ideias, as crenças, os costumes e os hábitos do povo surdo”. (STROBEL, 2009, p. 27). Destacamos que nesse processo cultural, as narrativas também fazem parte dessa herança cultural das comunidades surdas.

A narrativa é um dos artefatos culturais das comunidades surdas, que possibilita o encontro do surdo com o surdo e intensifica o compartilhamento de saberes entre grupos e gerações. Assim, o ato de narrar se torna um ato de conhecimento, isto é, uma rede tecida de

(41)

representações diversas, traduções variadas sobre o mundo e sobre o objeto da história que cria sonhos, utopias e compartilha outras realidades (PÉREZ, 2003, p. 101). Portanto, “narrar a vida é reinventá-la. É produzir novos sentidos, é reatualizar em novo contexto, as marcas inscritas em nosso corpo, em nossa história” (PÉREZ 2003, p. 112). Ao narrar, os surdos constroem e desconstroem suas memórias, relembram as histórias vividas, os surdos se transformam em objeto de conhecimento para o outro e para si mesmos. Ao narrarem suas experiências, reinventam, acrescentam e imprimem suas emoções, recriam suas histórias, suas perspectivas e se tornam protagonistas da sua caminhada.

Deste modo, as narrativas são elementos riquíssimos para pesquisas linguísticas, pois são produções subjetivas e naturais, ou seja, as narrativas residem no campo da informalidade da comunicação o que possibilita uma gama de relatos sem os limites impostos a outros tipos de comunicação que requer um comportamento formal. sil.

2.1.1 NARRATIVAS AUTOBIOGRÁFICAS

As histórias de vida, biografias, autobiografias e narrativas individuais e coletivas vêm sendo utilizadas na pesquisa em educação enquanto processo de produção de conhecimento relativo à escola e ao ensino, à formação, ao trabalho docente e demais aspectos relacionados ao fenômeno educacional. No decorrer dos anos, e com as contribuições das pesquisas, as narrativas autobiográficas foram configurando-se como um método científico, que consiste numa série de normas (métodos) a serem seguidos para a produção de conhecimentos e comprovação de um determinado assunto, passando, assim, a ser reconhecido no meio acadêmico.

Trazendo um pouco para minha realidade de pesquisa na área da linguística e sociolinguística, esse método das narrativas autobiográficas contribuem para o processo de investigação, pois o ponto mais significativo é que essa investigação passa a ser utilizado como fonte rica em conhecimento e coloca o Ser Humano no centro das investigações, valorizando cada vez mais histórias de vida dos surdos e o relevante valor linguístico que elas agregam.

Tais contribuições promoveram um redirecionamento da visão tradicional, pois fomentou a necessidade de se repensar a realidade, surge então, uma nova forma de ver, analisar e explicar as pequenas coisas, os pequenos fatos, o nosso cotidiano, dos diferentes modos de ser e o que faz parte dessas escolhas dos diferentes modos de estar no mundo. Para

Referências

Documentos relacionados

Para preparar a pimenta branca, as espigas são colhidas quando os frutos apresentam a coloração amarelada ou vermelha. As espigas são colocadas em sacos de plástico trançado sem

Para Souza (2004, p 65), os micros e pequenos empresários negligenciam as atividades de planejamento e controle dos seus negócios, considerando-as como uma

A placa EXPRECIUM-II possui duas entradas de linhas telefônicas, uma entrada para uma bateria externa de 12 Volt DC e uma saída paralela para uma impressora escrava da placa, para

O objetivo do curso foi oportunizar aos participantes, um contato direto com as plantas nativas do Cerrado para identificação de espécies com potencial

O valor da reputação dos pseudônimos é igual a 0,8 devido aos fal- sos positivos do mecanismo auxiliar, que acabam por fazer com que a reputação mesmo dos usuários que enviam

Os roedores (Rattus norvergicus, Rattus rattus e Mus musculus) são os principais responsáveis pela contaminação do ambiente por leptospiras, pois são portadores

As cadeias laterais variam em certo nível entre as diferentes formas de clorofila encontradas em diferentes organismos, mas todas possuem uma cadeia fitol (um terpeno ) ligada

Este desafio nos exige uma nova postura frente às questões ambientais, significa tomar o meio ambiente como problema pedagógico, como práxis unificadora que favoreça