NÚMERO 90, ANO VIII JUNHO DE 2016
I
RECEITA FEDERAL AMPLIA POSSIBILIDADES DE COMPENSAÇÃO DE TRIBUTOS FEDERAIS
Recentemente veio a público a Solução de Consulta 29/COSIT/SRF, que aclarou um antigo debate sobre a compensação de tributos federais. Referida consulta estabeleceu, como regra geral, a permissão que tributos federais sejam compensados com os créditos, também de tributos federais, reconhecidos por decisão judicial transitada em julgado, mesmo que essa decisão tenha permitido apenas a compensação com débitos de tributos da mesma espécie (IPI com IPI, IR com IR, etc.).
O debate nasceu junto com a própria lei que só permitia a compensação tributária em relação a tributos da mesma espécie. Após algumas reviravoltas, o STJ pacificou o entendimento de que a compensação tributária é possível, independentemente do destino das respectivas arrecadações e da espécie do tributo. O problema não atacado na decisão era a respeito das ações transitadas em julgado que só pediam a compensação de tributos de mesma espécie. A solução de consulta ora noticiada veio esclarecer, em definitivo, que mesmo
nesses casos pode haver compensação com quaisquer tributos administrados pela Receita Federal. Por outro lado, a Solução de Consulta manteve a vedação à compensação de tributos administrados pela receita com as contribuições previdenciárias (INSS). A vedação trata daquelas contribuições para financiamento da seguridade social incidentes sobre a folha de salário das empresas, sobre o rendimento dos empregadores domésticos e dos trabalhadores, embora a negativa também seja questionável perante o Judiciário, agora com ímpeto renovado.
II
RECEITA FEDERAL ALTERA INTERPRETAÇÃO SOBRE CRÉDITOS DE PIS E COFINS
No último dia 09 de junho, a Receita Federal publicou no Diário Oficial da União uma boa notícia aos contribuintes que comercializam produtos tributados no regime monofásico (onde o imposto todo é cobrado do primeiro elo da cadeia produtiva). Em suma, o chamado “Ato Declaratório Interpretativo nº 4” estabelece que as empresas que possuem produtos tributados naquele regime podem usar créditos relativos à venda de itens isentos, sujeitos a alíquota zero, suspensos ou sem incidência de tributos.
Entre os beneficiados estão as concessionárias de veículos (onde ocorre a vendas de carros novos, peças e prestação de serviços), supermercados (no qual há
a venda de produtos de higiene pessoal e demais produtos), livrarias (que se dedicam não só à venda de livros como artigos de papelaria) e distribuidora de produtos de informática (comercialização de equipamentos incluídos no "Programa de Inclusão Digital" e demais produtos).
O ato declaratório modifica todas as conclusões em contrário constantes em soluções de consulta ou em soluções de divergência da Receita e abarca as empresas submetidas no regime cumulativo ou no não cumulativo, importando apenas a necessidade de realização do cálculo do percentual de quanto representa a venda de produtos que podem aproveitar os créditos.
Ainda, considerando que referido ato altera todas as posições em contrário e expõe entendimento do próprio órgão de fiscalização, a tendência é que os contribuintes que têm direito a esses créditos podem inclusive reclamar o que
não puderam compensar nos últimos 5 anos. De toda forma, recomenda-se, por
cautela, que tal compensação seja pela via judicial, lembrando-se de que não é incomum ocorrer mudanças de entendimento do Fisco e os prazos para a homologações dos PER DCOMPs costumam ser extensos. Não vale a pena ficar “descoberto”.
III
IPI – EM BUSCA DA SEGURANÇA PERDIDA
O direito existe para dar segurança, previsibilidade. A lei existe para que todos saibam o que podem e o que não podem fazer, com estabilidade, sem dependerem da boa vontade de algum governante volúvel. Assim, todos podem planejar suas condutas. É assim em muitos países, claro, mas não aqui. Cada dia mais fica claro que, no Brasil, a lei existe para que todos dependam das interpretações ditosas e criativas do nosso Judiciário. O fato é que os tribunais brasileiros contribuem mais, a cada dia que passa, para o clima de insegurança jurídica que tanto nos prejudica. É justamente o oposto de sua função de existir. Passadas décadas da criação de alguma lei, muitas vezes ainda há dúvidas básicas sobre seu alcance e significado. Entendimentos jurisprudenciais são consolidados apenas para serem substituídos logo em seguida, e o que diz o texto da lei importa cada vez menos. A moda é criar algum princípio, dizer que consta da Constituição, e chegar onde se pretende chegar.
Vamos citar um exemplo emblemático. O IPI consta da Constituição de 1988, mas ainda não se sabe como deve ser pago por importadores que pratiquem mera revenda. Simplesmente não se sabe se ele deve ser pago apenas na importação, ou se novamente na revenda no mercado interno. Apesar de não haver nova industrialização no Brasil, a Receita Federal exige o duplo pagamento. Até 2012, era pacífico o entendimento pró contribuinte do STJ, no sentido de que a incidência deveria ocorrer só na importação, uma única vez. Tão pacífico era o entendimento que os julgamentos eram sempre por unanimidade. Então começa o drama, que dividimos em atos, como numa peça de teatro, uma tragédia grega:
1. Outra turma julgadora do mesmo STJ começou a julgar em sentido diverso, também por unanimidade!
2. É feito um julgamento para solucionar a divergência na Corte. A decisão pró contribuinte foi vencedora, mas por apertada maioria.
3. Meses depois, no fim de 2015, de surpresa: o STJ reverteu entendimento em sentido pró fisco (dupla incidência), desta vez, com efeitos para os demais processos do país (a chamada lei de recursos repetitivos).
4. Como o STF sempre se recusou a apreciar o tema, alegando que não possui matéria constitucional, a questão parecia resolvida.
5. Agora, com as esperanças praticamente perdidas, surge neste mês a notícia de que o STF concedeu uma liminar para suspender a exigência da dupla tributação. É uma boa notícia, mas difícil até de narrar em retrospecto, de forma resumida, quando mais de se vivenciar por anos a fio, enquanto Suas Excelências se resolvem sobre como pagar um imposto criado há 28 anos. Mas o pesadelo continua.
6. Em meio às tais oscilações de nossos Ministros, alguns contribuintes tiveram seus casos julgados de forma definitiva. Lembrem que estamos falando das instâncias mais altas do país. Assim, uma empresa que teve seu caso julgado em agosto de 2015 ganhou o direito de não recolher IPI duas vezes, enquanto outra que teve o caso julgado em novembro perdeu o processo. Em ambos os casos de forma definitiva.
7. Para finalizar, a Procuradoria da Fazenda Nacional tem ajuizado ações revocatórias, no intuito de anular o direito de quem já se submeteu a tantos anos
de litígio e ganhou-o há poucos meses. Só que essa ação só é cabível no prazo de até 2 anos da decisão a ser anulada. E quem ganhou esse processo há mais tempo? Cenas do próximo capítulo: Alguns aspectos relacionados à questão da ação revocatória então em pauta para serem julgados pelo STF em breve. Isso deve impactar no item 7 acima. Qual será a mudança da vez? Será que mesmo quem viver verá?
O custo desta bagunça para o país é imenso, mas não nos cabe apenas reclamar. O sistema jurídico nos obriga a lutar até o último fio de esperança, sempre, e cada vez mais de forma a evitar os riscos financeiros da insegurança. Quem não