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Fazendo Gênero 8 - Corpo, Violência e Poder. Florianópolis, de 25 a 28 de agosto de 2008

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Florianópolis, de 25 a 28 de agosto de 2008

A inserção da mulher nos programas de microcrédito em Pernambuco (2002-2006): autonomia econômica ou subordinação reconfigurada?

Raquel Oliveira Lindôso1

Palavras-chave: microcrédito; autonomia econômica; subordinação. ST 13 – Gênero e o trabalho de mulheres em grupos formais e informais

1. Antecedentes e bases teórico-metodológicas da pesquisa

O antecedente imediato desta pesquisa é nossa monografia (LINDÔSO, 2005), onde foi proposta a investigação do papel do microcrédito como gerador de emprego e renda. Durante a elaboração de nosso trabalho várias indagações surgiram – em especial, indagações sobre a condição da mulher de baixa renda engajada em empreendimentos econômicos solidários - EES, inicialmente compreendidos como promotores do protagonismo feminino via inclusão no mercado.

A presente pesquisa terá por objetivo geral investigar com mais profundidade as condições de inserção das mulheres nos programas de microcrédito em Pernambuco entre 2002 e 20062. O que será feito a partir de uma análise de dados de volume de crédito concedido, porte dos empreendimentos e atividades produtivas financiadas (disponíveis na Secretaria de Economia Solidária e no banco do Nordeste, entre outros), bem como de informações socioeconômicas, além da bibliografia pertinente ao tema da divisão sexual do trabalho e da autonomia econômica.

2. Apresentação dos resultados

Conforme sua concepção original, os programas de microcrédito têm seu público-alvo formado por indivíduos que estão à margem das instituições convencionais de concessão de crédito. A experiência do Grameen Bank, em Bangladesh, é ilustrativa: de início, 94% dos empréstimos eram concedidos preferencialmente a mulheres pobres ou empobrecidas (em geral viúvas, mulheres que foram abandonadas pelos maridos e que ficaram incumbidas de criar os filhos e responder pelas despesas domésticas). Isto porque se verificou a preocupação das mulheres em garantir melhores condições de vida a seus filhos3, proporcionar uma vida mais digna, educação, alimentação, vestuário; enfim, elas estavam mais próximas de suas famílias.

“Um primeiro ponto foi efetuar empréstimos exclusivamente a mulheres, mas também porque elas usavam melhor o ganho derivado, beneficiando a família toda, com prioridade

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para as crianças, ao passo que os homens tenderiam a pensar primeiramente em si. (...) Desta forma, o Grameen tornou-se implicitamente um projeto de libertação feminina” (Singer, 2002).

Assim, na medida em que os chamados “bancos dos pobres” passaram a efetuar operações distintas dos bancos que, tradicionalmente, consideravam apenas os homens como tomadores preferenciais de crédito, o microcrédito passou a ser visto como uma das condições para a conquista da autonomia econômica das mulheres no mundo do trabalho (particularmente em relação a agiotas e ao cônjuge), tornar estável sua pequena atividade empreendedora (a constatação de crédito para capital de giro), melhorar sua condição de vida cotidiana e, sobretudo, construir e fortalecer organizações de auto-gestão e um “espaço público de proximidade”.

Além disso, há uma racionalidade econômica que norteia esses programas de microcrédito: eles não só são inclusivos, na medida em que articulam a intervenção pública no combate à desigualdade (que se expressa, por exemplo, em índices mais elevados de “exclusão bancária feminina”) como também atenuam o racionamento de crédito e as dificuldades de mobilização de poupança para atividades produtivas (GUÉRIN, 2005; DOLIGEZ, 2002).

No Brasil, esses programas, em especial os surgidos a partir da década de 1990, tiveram por objetivos primordiais a geração de renda para ex-trabalhadores e ex-trabalhadoras assalariadas e donas-de-casa, que se engajaram em empreendimentos econômicos solidários4.

No entanto, a autonomia – em termos de renda – conquistada pelas mulheres tomadoras de microcrédito não autoriza a apontar os programas de financiamento de empreendimentos econômicos solidários como ‘imunes’ a uma divisão sexual do trabalho, que lhes é anterior e que parece se recolocar quando se considera não só o volume de microcrédito demandado pelas mulheres como também as atividades “femininas” por ele beneficiadas.

Isabelle Guérin (2005) observa que ao analisar os efeitos dos benefícios gerados pelo microcrédito é necessário ter prudência porque “o microcrédito pode tanto libertar as mulheres de certos vínculos de dependência como forjar novas dependências, reforçando assim as desigualdades entre homens e mulheres e também entre as próprias mulheres”.

No Brasil, o microcrédito tem-se apresentado como uma estratégia para amenizar os efeitos causados pelo desemprego (evidenciando o desemprego masculino), pois se torna alternativa para a falta de empregos formais. Sendo, portanto, o microcrédito uma ação de combate à pobreza resultante das taxas de desemprego e não de combate a desigualdade de gênero e/ou exclusão bancária feminina. Por sua vez, a predominância feminina na tomada de empréstimos em instituições de microcrédito está relacionada à diminuição da renda familiar em virtude do desemprego masculino e não à emancipação feminina favorecida pela expressão e reivindicação da categoria.

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Ora, se o microcrédito está, conceitualmente, muito relacionado à criação de “espaços públicos de proximidade” – favoráveis ao aprendizado de necessidades coletivas que acene para lutas de classe, de suma importância para a inclusão das mulheres no mundo produtivo –, dados dos motivos de criação de EES no Brasil até 2005 apontam para outra realidade. Assim, lê-se no Atlas

da economia solidária 2005 que os três principais motivos para a criação desses empreendimentos

são [foram]:

“alternativa ao desemprego (45%), complemento da renda dos sócios (44%) e obtenção de maiores ganhos (41%). Dois outros motivos têm destaque: possibilidade da gestão coletiva da atividade (31%) e condição para acesso a crédito (29%). Essa situação modifica-se de acordo com as várias regiões. O motivo “alternativa ao desemprego” é o mais citado nas regiões Sudeste (58%) e na região Nordeste (47%). Por sua vez, na região Sul o motivo mais citado é a possibilidade de “obter maiores ganhos” (48%) e “fonte complementar de renda” (45%). Nas regiões Norte e Centro-Oeste, o principal motivo citado é o “complemento de renda” (46% e 53% respectivamente)” (MINISTÉRIO, 2005: 26).

Ao analisar a participação feminina segundo o porte dos empreendimentos e atividades produtivas financiadas na região do Nordeste, verificou-se que quanto menor o tamanho do empreendimento e menor o montante do crédito concedido, maior será a participação da mulher. Assim, a predominância feminina (63%) se limita aos EES com menos de 10 sócios enquanto que 66% dos empreendimentos com mais de 20 sócios são comandados por homens (MINISTÉRIO, op.cit.).

Esses dados reafirmam a concepção de que a renda feminina funciona como complementação da renda familiar, persistindo a idéia de que as obrigações familiares – entendidas como exclusivas à mulher, ou prioritárias dela – explicam os baixos rendimentos da atividade produtiva. Outra razão explicativa para a relação inversa entre participação feminina e porte dos EES – em especial no caso nordestino – é que as atividades produzidas pelas mulheres engajadas nos programas de microcrédito estão mais próximas do trabalho manual (artesanato, bordado, costura, tradicionalmente “feminino”) além da possibilidade de definir sua jornada de trabalho, conciliando-a com suconciliando-as tconciliando-arefconciliando-as domésticconciliando-as.

A força de trabalho feminina5 é cada vez mais elevada à condição de símbolo e protagonista de formas de gestão do trabalho social alternativas ao desemprego (masculino!) e às relações mercantis excludentes. O que se observa de fato é que a condição de mulher trabalhadora está ainda sujeita à tríplice atribuição de cuidar da família, da reprodução da força de trabalho e da continuidade da produção social (como assalariada ou não) e, agora, sobretudo, sujeita a subordinação dos mecanismos de mercado. O que no primeiro momento supõe uma independência aparente pode resultar na continuidade da dependência, no que se refere aos deveres domésticos e

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familiares, e na subordinação dentro do processo de reprodução social, ou seja, uma dupla

subordinação: ao trabalho social – e, portanto, ao mercado – e ao trabalho doméstico.

Bibliografia

ANTUNES, Ricardo. Dimensões da precarização estrutural do trabalho. In: DRUCK, Graça, FRANCO, Tânia e BORGES, Ângela (orgs.). A perda da razão social do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2007, p. 13-22.

DOLIGEZ, F. dix ans d’études de l’impact de la microfinance: synthèse de quelques observations de terrain. In: SERVET, J-M; GUÉRIN, I (orgs.). Rapport du centre Walras 2002. Exclusion et

liens financiers. Paris: Econômica, 2002.

GUÉRIN, Isabelle. As mulheres e a economia solidária. São Paullo: Loyola, 2005.

LINDÔSO, Raquel Oliveira. O papel do microcrédito na geração de emprego e renda. Monografia de graduação em Ciências Econômicas. Caruaru-PE: Favip, 2005, mimeo.

MINISTÉRIO do Trabalho e Emprego. Secretaria Nacional de Economia Solidária. Atlas da

economia solidária no Brasil. Brasília: Senaes/ MTE, 2006.

SINGER, Paul. Introdução à economia solidária. São Paulo: Perseu Abramo, 2002.

______. Economia política do trabalho: elementos para uma análise histórico-estrutural do

emprego e da força de trabalho no desenvolvimento capitalista. São Paulo: Hucitec, 1977.

YUNUS, Muhammad. O banqueiro dos pobres. São Paulo: Ática, 2000.

1 Bacharel em Ciências Econômicas (Favip, 2005). Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Trabalho- GET

(Bacharelado em Serviço Social da Universidade Federal de Pernambuco).

2 Não foi possível, na presente etapa de nossa pesquisa, reunir dados suficientes de Pernambuco, pelo que decidimos

não apresentar os disponíveis. De todo modo, não diferem muito dos resultados para a Região Nordeste.

3 GUÉRIN (2005) nota que na Nigéria muitas mulheres tomadoras de empréstimos em instituições de microcrédito

formaram uma poupança com o propósito de conceder o “dote”, ainda necessário para garantir um “bom” casamento naquela sociedade tradicional. O que reafirma – ainda que mediante um exemplo espantoso para os ocidentais... – a preocupação das tomadoras de crédito com as suas famílias.

4 No âmbito do Sistema Nacional de Informações em Economia Solidária –SIES, os empreendimentos econômicos

solidários compreendem as organizações:

“a) coletivas - organizações suprafamiliares, singulares e complexas, tais como: associações, cooperativas, empresas autogestionárias, grupos de produção, clubes de trocas, redes e centrais etc;

b) cujos participantes ou sócios(as) são trabalhadores(as) dos meios urbano e rural que exercem coletivamente a gestão das atividades, assim como a alocação dos resultados;

c) permanentes, incluindo os empreendimentos que estão em funcionamento e aqueles que estão em processo de implantação, com o grupo de participantes constituído e as atividades econômicas definidas;

d) com diversos graus de formalização, prevalecendo a existência real sobre o registro legal [onde se incluiriam todas aquelas microempresas não reconhecida ou assumidamente ‘solidárias’, isto é, organizadas e realizadas solidariamente por trabalhadores e trabalhadoras sob a forma coletiva e autogestionária] e;

e) que realizam atividades econômicas de produção de bens, de prestação de serviços, de fundos de crédito (cooperativas de crédito e os fundos rotativos populares), de comercialização (compra, venda e troca de insumos, produtos e serviços) e de consumo solidário” (MINISTÉRIO, 2006: 13).

5 O ingresso da mulher na força de trabalho está historicamente articulado ao nível da remuneração masculina suficiente

para manter a mulher em casa. No início do sistema de produção capitalista a participação feminina na força trabalho foi intensa justificada pelos baixos salários dos operários e pela mão de obra feminina desqualificada e, assim, “ainda mais explorada”, as mulheres dos proletariados do século XIX só permaneceram no mercado enquanto que a insuficiência salarial dos seus homens as coage para tanto. É nesse momento histórico que se constata o primeiro movimento feminista que combate pela igualdade jurídica e política entre sexos e pelo direito da mulher a instrução superior, a luta por um lugar no mundo trabalho, mas mão nas fábricas. Se a saída e entrada de parte do contingente feminino estão relacionadas aos ganhos do marido a outra parte do contingente se relaciona a uma condição social superior o que supõe uma subordinação entre as mulheres, o que as impedem de que se (re)conhecerem como categoria,

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construção de necessidades particulares coletivas afastando-as historicamente. O que nos revela uma subordinação entre homens e mulheres e, especialmente, entre as próprias mulheres. Uma subordinação historicamente e contraditoriamente construída. O processo de feminização do trabalho surge no mundo de trabalho contemporâneo como tendência , “cerca de 40% da força de trabalho ou mais em diversos paises avançados e também na América Latina”(ANTUNES,2007:19). As mulheres ocupam os dois extremos da estrutura ocupacional, com a permanência das de “cima” (executivas e profissionais intelectuais superiores) dependendo da permanência das de “baixo” (emprego doméstico e formas de trabalho precarizado e flexibilizado marcados pela perda de direitos sócias).

Referências

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