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ANTONIO MARCOS KORB EM BUSCA DA TERRA PROMETIDA : A COLONIZAÇÃO DO DISTRITO DE JACUTINGA NAS DÉCADAS DE 1940 E 1950

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ANTONIO MARCOS KORB

EM BUSCA DA “TERRA PROMETIDA”: A COLONIZAÇÃO DO DISTRITO DE JACUTINGA NAS DÉCADAS DE 1940 E 1950

CURITIBA JUNHO - 2010

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II ANTONIO MARCOS KORB

EM BUSCA DA “TERRA PROMETIDA”: A COLONIZAÇÃO DO DISTRITO DE JACUTINGA NAS DÉCADAS DE 1940 E 1950

Monografia apresentada como requisito à obtenção do grau de Bacharel em História, Curso de História, Licenciatura Plena, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná.

Orientadora: Profª. Drª. Roseli Terezinha Boschilia.

CURITIBA JUNHO - 2010

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AGRADECIMENTOS

O resultado de um trabalho de pesquisa resulta de uma síntese de um esforço coletivo, envolvendo várias pessoas e instituições, material ou abstratamente, juntaram-se a ele, e, por dever muito a essas, por diferentes razões, expresso os meus sinceros agradecimentos:

Primeiramente agradeço a Deus pelo “dom da vida” e todas as possibilidades que me proporciona.

Agradeço à minha esposa Luciana pela compreensão e força que tens me dado desde o início deste trabalho. A minha filha Beatriz, que de sua inocência traz sempre mais alegria e tem sido motivo de tantas alegrias e distração nos momentos mais difíceis desta pesquisa. Agradeço aos meus pais e irmãos que me ensinaram a ser curioso e buscar sempre conhecer mais.

Aos meus entrevistados que se dispuseram a expor parte de sua vida em prol de um trabalho que visa contar uma parte de suas vidas.

À Professora Roseli Boschilia por sua paciência e por me dar suporte neste trabalho.

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RESUMO

Esse trabalho tem por objetivo analisar a dinâmica migratória ocorrida para o Sudoeste paranaense, em especial ao distrito de Jacutinga, nas décadas de 1940 e 1950. A fundação da Colônia Agrícola Nacional General Osório (CANGO), em 1943, foi considerada o marco divisor para problematizar a questão da ocupação da região. Para analisar a trajetória dos migrantes que chegaram à região, provenientes dos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, fizemos uso de fontes orais, tendo em vista a ausência de fontes escritas sobre o tema analisado. No total, foram coletadas nove (9) entrevistas, realizadas com pioneiros ou descendentes dos primeiros colonizadores da localidade. Além das fontes orais, contamos ainda com fontes escritas que tratam da colonização da região, como os relatórios da CANGO e obras historiográficas que serviram como fonte para localizarmos leis e decretos que interessavam ao nosso objeto. No que se refere ao referencial teórico, buscamos apoio em autores como Giralda SEYFERTH, Ruy C. WACHOWICZ e Hermógenes LAZIER, cujas reflexões foram fundamentais para discutir as temáticas da imigração e da colonização. No que se refere às fontes orais, buscamos suporte teórico-metodológico em autores como Paul THOMPSON, Janaina AMADO e Marieta de M. FERREIRA, que nos instigaram ao estudo das trajetórias individuais e das lutas cotidianas.

Palavra-chave: Migração, Jacutinga, Sudoeste do Paraná, colonização e memória.

ABSTRACT

This paper aims at analyzing the dynamics of migration occurred for the Southwest Parana, in particular the district Jacutinga, in the 1940 and 1950. The foundation of the National Agricultural Colony General Osorio (CANGO) in 1943, was considered the watershed to discuss the issue of occupation of the region. To analyze the trajectory of migrants who arrived in the region, from the states of Rio Grande do Sul and Santa Catarina, we made use of oral sources in view of the absence of written sources on the topic discussed. In total, we collected nine (9) interviews conducted with descendants of pioneers or early settlers of the town. Apart from oral sources, we still dealing with written sources of colonization of the region, as reports of a CANGO and historical works that served as source for locating laws and decrees that were of interest to our object. With regard to the theoretical framework, we support the authors as Giralda SEYFERTH, Ruy C. WACHOWICZ and Hermógenes LAZIER, whose ideas were crucial to discuss the issues of immigration and colonization. As regards oral sources, we seek theoretical-methodological support to authors such as Paul THOMPSON,

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Janaina AMADO and Marieta M. FERREIRA, which inspired us to study the individual trajectories and daily struggles.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...01

1. OS IMIGRANTES ALEMÃES E A COLONIZAÇÃO DO VALE DO ITAJAÍ E NOVA TRENTO...05

1.1 OS ALEMÃES NO VALE DO ITAJAÍ ...09

1.2 REIMIGRAÇÃO, A BUSCA POR NOVAS TERRAS ...12

1.3 MIGRAÇÃO: SAÍDA, VIAJEM E CHEGADA AS NOVAS TERRAS ..14

2. SUDOESTE PARANAENSE E SUAS PARTICULARIDADES...17

2.1 ENTRE OS LITÍGIOS E AS LEIS: O SUDOESTE PARANAENSE EM QUESTÃO ...18

2.2 COLÔNIA BOM RETIRO – O INÍCIO DA COLONIZAÇÃO DO SUDOESTE...22

2.3 A “MARCHA PARA OESTE” – CRIAÇÃO DA CANGO E DO TERRITÓRIO DO IGUAÇU ...23

2.4. MIGRANTES ALEMÃES PARA JACUTINGA ...26

2.5 RELAÇÃO ALEMÃES, CABOCLOS E INDÍGENAS ...27

3. A FORMAÇÃO DA COMUNIDADE DE JACUTINGA (1948 - 1964) ...29

3.1 ADAPTAÇÃO AO NOVO AMBIENTE...30

3.2 INTEGRAÇÃO SOCIAL...31

3.3 SAÚDE ...34

3.4 RELIGIOSIADE...36

3.5 OS MORADORES DE JACUTINGA E O LEVANTE DOS POSSEIROS ...39

3.6 QUESTÕES DE DIVISAS E REGULARIZAÇÃO DAS TERRAS (GETSOP) ...41

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...43

REFERÊNCIAS...45

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INTRODUÇÃO

O tema de nosso presente trabalho é o processo de ocupação fundiária do sudoeste do Paraná. Este processo é um fenômeno relativamente recente ao compararmos com outras regiões do estado.

Até o final da década de 1910, essa região era constituída por extensa floresta e habitada, quase que exclusivamente por caboclos, remanescentes de luso-brasileiros e indígenas.

A primeira tentativa de ocupação mais efetiva da região ocorreu em 1918, com a fundação da Colônia Bom Retiro e tinha o objetivo de abrigar colonos que foram expulsos da região do Contestado.

Nessa mesma época, as terras periféricas a essa região passaram a ser disputadas judicialmente, colocando em lados opostos, empresas colonizadoras, governo federal e governo estadual conforme veremos no capítulo 2. Nesse contexto, em 1943, o Presidente Vargas criou a Colônia Agrícola Nacional General Osório e, no mesmo ano, criou o Território Federal do Iguaçu dando início a um grande fluxo migratório para as regiões de fronteiras do Sudoeste e Oeste paranaense.

Cabe destacar que aproximadamente 1/3 do Sudoeste paranaense era formado pelas glebas Missões e Chopim. O que diferenciava a região Sudoeste de todas as outras regiões do Estado é que a mesma estava sendo alvo de processos judiciais e, sendo assim, não havendo dono legal das terras, tanto rurais quanto urbanas. Devido a esta pendência jurídica, o governo não podia dar escritura definitiva aos colonos, apenas título provisório. Mais tarde, a CANGO pára de dar os títulos, pois não havia validade alguma1.

De acordo com a historiografia, as famílias que migraram para esta região eram, em sua maioria, descendentes de alemães e italianos, procedentes dos estados de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul. Esse grupo de migrantes, influenciado pela propaganda do Governo Federal, cujo objetivo era a colonização das fronteiras, deu início à chamada “marcha para o oeste”. Vinham em busca de terras, pois sabiam através de terceiros2, que no Paraná o governo federal estava dando terras, e

1 CROCETTI, Zeno Soares. Evolução sócio-espacial do Paraná (Estudo de Geografia econômica do

Paraná). UFSC. Florianópolis. 2004. p. 99.

2 Migrantes que saiam em busca de terras e quando encontraram retornavam para buscar a família e partir

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que nestas estava plantado o seu futuro. Havia também a idéia de um ambiente de vida muito bom, com escolas, igrejas, pontos de comércio.

Com base nessa problemática, este trabalho tem como objetivo, reconstruir a trajetória de um grupo específico de colonos que se estabeleceu nessa região, mais especificamente no distrito de Jacutinga, situado no atual município de Francisco Beltrão3.

Para desenvolver a pesquisa, o primeiro passo foi investigar o contexto histórico, ou seja, estudar o Sudoeste paranaense no tempo e na dinâmica do desenvolvimento da região. Nesse aspecto, o diálogo com autores que refletiram sobre o processo de ocupação do território paranaense foi fundamental para a análise desse contexto histórico.

As questões de fronteiras internacionais são bastante marcantes para esta região, podemos destacar o fato conhecido pela historiografia como “Questão de Palmas”, que foi uma disputa pela demarcação das fronteiras entre Brasil e Argentina. Também no que concerne às divisas entre Paraná e Santa Catarina no foram deixadas de lado. Outro aspecto trabalhado foi à “Revolta do Contestado”, movimento que ocorreu na região Oeste de Santa Catarina e que serviu de pano de fundo para uma nova forma de expansão para a região Sudoeste do Paraná.

Desse modo, uma parte de nosso trabalho está centrada na historiografia regional do sudoeste do Paraná. Trabalhamos com os conflitos regionais que, de alguma forma, influenciaram na definição do território Sudoeste e foi determinante na formação do território paranaense.

Por outro lado, as obras de Giralda SEYFERTH foram de fundamental importância, tanto como referencial teórico quanto como fonte, para estudarmos a vinda dos imigrantes alemães ao Brasil. As discussões promovidas por essa autora acerca do processo de colonização, bem como a fixação dos imigrantes no território catarinense, possibilitaram conhecer a trajetória do grupo que, posteriormente, migrou para a região Sudoeste do Paraná.

Além do diálogo com Giralda SEYFERTH, nos apoiamos em outros autores como Maria L. ANDREAZZA e Sérgio O. NADALIN que refletem sobre o fenômeno imigratório e a colonização. Vale lembrar ainda que autores como

3 O município recebeu esse nome somente a partir de 1952, quando se emancipou do município de

Clevelândia. Desde o seu surgimento, em 1942 até a emancipação, a localidade era conhecida como Marrecas.

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SALAMONI, DREYER e WACHOWICZ também contribuíram para enriquecer a análise sobre o tema da migração.

No que diz respeito às fontes utilizadas para a construção desse trabalho, destacamos as fontes escritas e orais.

Com relação às fontes escritas, juntamos, sobretudo, os documentos sobre a colonização da região (Diário Oficial da União, os relatórios da Colônia Agrícola Nacional General Osório), além de obras historiográficas de Ruy

WACHOWICZ e Rubens da Silva MARTINS, que serviram como fonte para

localizarmos leis e decretos que interessavam ao nosso objeto.

Já no que se refere à utilização das fontes orais, buscamos suporte teórico-metodológico em autores como Paul THOMPSON, Janaina AMADO e Marieta de M. FERREIRA, que nos instigaram ao estudo das trajetórias individuais através de depoimentos de analfabetos, rebeldes, mulheres, crianças, a história de movimentos sociais populares, das lutas cotidianas encobertas e esquecidas.

As entrevistas, realizadas durante o período de janeiro de 2007 a janeiro de 2010, e tiveram em média a duração de 20 a 30 minutos. Para escolha dos entrevistados foram obedecidos os seguintes critérios: em primeiro lugar, os moradores mais antigos, depois por influência na formação da comunidade, o terceiro critério de escolha foi a origem étnica e além destes, entrevistamos pessoas que se propuseram a colaborar com o nosso trabalho. Não conseguimos localizar nenhum descendente dos caboclos.

A metodologia utilizada para a realização das entrevistas teve como preocupação a experiência da migração e esteve, portanto, centrada na história temática. Entretanto, não deixamos de coletar informações relacionadas à origem familiar, estilo de vida, educação, profissão e casamento.

Tendo em mãos a documentação referente ao nosso objeto, estruturamos o texto monográfico em três capítulos. Fizemos a definição destes capítulos a partir do recorte temporal e de construção histórica.

No primeiro capítulo, intitulado “Os imigrantes alemães e a colonização do Vale do Itajaí e Nova Trento”, discorremos sobre a situação da Alemanha no século XIX e os motivos que levaram os alemães a emigrarem. Neste contexto, trabalhamos a imigração dos alemães para o Brasil, dando um destaque especial a Santa Catarina, sua instalação no Vale do Itajaí, os problemas encontrados por estes imigrantes, a criação das colônias agrícolas bem como a divisão das terras

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nestas colônias. Criando assim um ambiente para, nos capítulos subseqüentes, trabalharmos os motivos que levaram os agricultores a re-imigrarem, agora especialmente para o Paraná.

Com base nas informações retiradas das fontes historiográficas e também já fazendo uso das fontes orais, elaboramos o segundo capítulo intitulado “Entre os litígios e as leis: o sudoeste paranaense em questão”. Neste a preocupação foi analisar o sudoeste paranaense a partir de um contexto macro, ou seja, contextualizá-lo dentro da conjuntura tanto nacional, estadual e regional. Discorreu-se sobre os as questões agrárias e litígios que, de alguma forma, exerceram influência na colonização ostensiva desta região. Ainda neste capítulo destacamos a busca por novas terras empreendida por muitos dos descendentes de imigrantes. A fundação da CANGO em 1943 foi considerada o marco divisor desta conjuntura. Neste sentido chegamos ao nosso objeto, pois, a partir deste momento colocamos a comunidade de Jacutinga como protagonista de nosso trabalho. A relação dos migrantes com caboclos e indígenas foi merecedora de um subtítulo específico, pois conforme extraído das entrevistas, os migrantes formularam um conceito sobre esses indivíduos.

Para desenvolver o terceiro capítulo partimos das entrevistas com pessoas que participaram deste movimento migratório. Neste sentido, problematizamos a questão étnica que tem um caráter fundamental na formação social, pois os descendentes de alemães foram predominantes na formação da comunidade. As questões que fazem referência à cultura e à ideologia na organização social também foram vislumbradas neste capítulo.

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1. OS IMIGRANTES ALEMÃES E A COLONIZAÇÃO DO VALE DO ITAJAÍ E NOVA TRENTO

No século XIX percebiam-se as transformações sociais que a modernidade trazia junto de si. Neste período foram presenciadas várias alterações na sociedade, destacando-se a emergência do indivíduo frente ao meio que o caracterizara. A mobilidade social suscitava esperanças às classes menos favorecidas.

A Europa vivia o advento da modernidade, as revoluções industriais e sociais, a busca por direitos como é o caso da Revolução Francesa. Mas, a Alemanha vivia um período de agitações e revoltas contra o poder dominante na época. Até o início do século XIX, a Alemanha manteve-se essencialmente rural4. Segundo SALAMONI esta revolução agrícola e de crescimento populacional ocorrida neste século, serviu como uma mola propulsora para o desenvolvimento industrial e a crescente urbanização da região. O principal reflexo dessa revolução no campo foi o desmantelamento da estrutura feudal, o que ocasionou a expulsão de grande parte dos pequenos camponeses alemães.5 Giralda SEYFERTH6 destaca que cerca de três quartos da população alemã vivia em aldeias ou pequenas cidades. Os Estados que formavam a região da atual Alemanha estavam em situações bastante diversas, conforme a autora expõe:

As condições dos camponeses nesta época eram bastante heterogêneas: em cada Estado tinham suas próprias características e variavam desde uma total sujeição dos servos (Prússia) até o campesinato chamado “livre”7, das regiões

do sul e oeste da Alemanha.8

A historiografia da região apresenta os Estados da Prússia, Hesse e Pomerânia como remanescentes do regime feudal que durou até meados do século XIX. SEYFERTH destaca ainda que na Prússia e em Hesse o camponês estava sujeito à vontade de seu senhor, o qual podia a qualquer momento expulsá-lo de sua casa e da terra à qual explorava. O principal reflexo dessa revolução no campo foi o

4 SALAMONI, Giancarla. A Imigração alemã no Rio Grande do Sul – O caso da comunidade Pomerana

de Pelotas. História em Revista, Pelotas, v. 7, 25-42, dezembro/2001. p. 25.

5 SALAMONI. 2001. p. 25.

6 SEYFERTH, G. A colonização alemã no Vale do ltajai-Mirim. Porto A1egre-RS: Editora

Movirnento, 1974.

7 Segundo SEYFERTH, eram considerados livres os camponeses que não estavam submetidos aos laços

feudais. Nesse caso, o camponês era dono da sua terra, mas isto não queria dizer que não estivesse sujeito à cobrança de pesadas taxas.

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desmantelamento da estrutura feudal, o que ocasionou a expulsão de grande parte dos pequenos camponeses alemães.9

Já, em alguns Estados das regiões sul e sudeste os camponeses tinham como propriedade a sua casa, e as proximidades da mesma que era o quintal. Os trabalhos para seu senhor não excedia alguns dias por ano.

No conjunto, a situação alemã no século XIX era a seguinte: vários Estados conturbados por guerras e revoluções e com uma estrutura econômica muito instável. SEYFERTH destaca que, neste contexto, os camponeses formaram a maior parte dos grupos de emigrantes, juntamente com grupos de liberais que fugiram das revoluções de 1830 e 1848.10

Nesse mesmo período, interessado na adoção de um novo modelo de ocupação e de exploração agrícola, o governo imperial brasileiro deu início à implantação de políticas voltadas para europeus. Com isso,

(...) em 1818, lançou seu projeto de imigração vinculado à ocupação de terras públicas, o qual foi interrompido em 1830, entre outros motivos, por causa das críticas aos subsídios e da escassez de recursos, tendo sido retomado em meados de 1840, impulsionado pelos debates sobre o fim do tráfico de africanos e a regulamentação fundiária (...) as províncias interessadas em receber imigrantes europeus proibiram a posse de escravos no regime de colonização. Tratava-se de distinguir dois modelos de exploração agrícola: a grande propriedade escravista e a pequena propriedade familiar imigrante (...).11

Este projeto tinha o intuito de trazer colonizadores para ocupar os sertões: libertos, emancipados e trabalhadores nacionais ou quaisquer outras categorias sociais cujos referenciais estivessem associados à cor ou à raça ficaram excluídos do segundo modelo por causa de pressupostos de natureza biológica.12 De acordo com as orientações do governo, mesmo empreendimentos particulares como a colônia Blumenau, fundada por Hermann Blumenau, com o objetivo de a estabelecer colonos alemães no Itajaí-açu, proibiam a entrada de escravos nas terras concedidas à empresa.13

O impasse brasileiro estava na necessidade de colonizar o Sul do Brasil. Mas a grande pergunta do governo brasileiro era “onde buscar os colonizadores, uma vez que o regime escravista brasileiro repercutia negativamente junto aos europeus dificultando a atração de imigrantes espontâneos”. A escolha “racial”, por outro lado,

9 SALAMONI. 2001. p. 25. 10 SEYFERTH. 1974. p. 27. 11 SEYFERTH. 2007. p. 79 . 12 Id. 13 Ibiden. p. 86.

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tornava mais explícito o tipo de exclusão vinculado à política de colonização do Império.14 O debate racial, neste período teve bastante ênfase, foram colocadas em dúvida algumas nacionalidades européias, mas, ao mesmo tempo, destaca-se a inconveniência da entrada de mais negros.

Após a Independência, o governo imperial investiu na imigração, enviando agenciadores para a Europa com o objetivo de atrair colonos.15 O perfil do imigrante que o governo buscava deveria ser composto por agricultores que, acompanhado de sua família, se dispusessem a trabalhar a terra, aceitando ser introduzido numa colônia isolada dos centros urbanos. Ivan DREYER destaca que o governo imperial brasileiro contratou soldados mercenários alemães que estavam descontentes e sentiram-se traídos pela confederação “alemã”, agregando-se ainda, a este sentimento, as perseguições empreendidas aos vencidos, pelos dinamarqueses. Foi trazido da Alemanha um efetivo de aproximadamente 1900 homens, que ficaram às ordens do exército imperial brasileiro. Foram constituídos grupamentos de infantaria, artilharia e de sapadores.

A finalidade inicial desses mercenários foi complementar as forças brasileiras que compuseram o Exército Libertador, empregado para combater as tropas do general Manoel Oribe, que sitiava Montevidéu, e, posteriormente, combater o ditador argentino Juan Manoel de Rosas, que articulava, pela força, construir a “grande Argentina”, com a anexação do Estado Oriental, Paraguai e parte do território da província de São Pedro do Rio Grande do Sul.16

O autor destaca ainda que a maioria dos integrantes da artilharia não era de exímios atiradores, mas sim, de indivíduos que visavam obter a passagem gratuita para o Brasil, inspirados nas melhores condições de vida divulgadas pela propaganda dos agentes de contratação.

Com referência a saída dos imigrantes da Alemanha para o Brasil podemos dizer que foi uma política governamental do Império brasileiro conforme vemos a seguir:

Durante o mesmo período em que a Alemanha passava pelo processo de unificação via-se, no império do Brasil um maior interesse pela colonização dos sertões. Tanto empreendimentos particulares17 como oficiais18 foram

14 Ibiden. p. 80. 15 Ibiden. p. 81.

16 DREYER. 2008. p. 28.

17 Giralda Seyferth destaca a criação da colônia de Blumenau, fundada por Doutor Hermann Blumenau,

que, a partir de 1850, iniciou um povoamento de colonização do vale médio deste rio (SEYFERTH, 1974, p. 38).

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8 lançados e penetravam cada vez mais o interior do Brasil. Seguiam os vales dos rios, às vezes isolando-se, mas sempre ocupando regiões inóspitas, completando a posse do planalto e terminando por ligá-lo ao litoral. Essa foi a tendência no Sul.19

No que diz respeito aos motivos pelo qual os imigrantes alemães deixaram sua terra natal podem ser citados a escassez das terras e fragmentação das propriedades, o excesso de trabalho nas áreas industrializadas e o baixo nível de renda no campo e na indústria. È de suma importância lembrar que “a maior parte dos alemães que entraram no Brasil durante o século XIX, portanto, se concentraram (sic) algumas áreas dos dois Estados” 20 localizados mais ao Sul do Brasil. Nos outros Estados o número de imigrantes alemães não tem uma relevância maior, a não ser para o Paraná (aonde a imigração chegou a ser importante só no século XX), e, em menor escala, para o Espírito Santo. Mas, é interessante destacar que os alemães que foram para o Paraná em grande parte saíram das colônias do Rio Grande do Sul e Santa Catarina.21

O Sul do Brasil teve como elemento imprescindível para a sua colonização o advento da imigração alemã desde 1824. Os professores Andreazza e Nadalin afirmam que:

Se, sob uma perspectiva nacional a “imigração” para suprir mão-de-obra superou sempre com larga margem a “colonização” para povoamento, a importância relativa deste último sistema para a história do Brasil Meridional é inconteste.22

O Estado de Santa Catarina recebeu a colonização alemã a partir de 1828. Durante o ano de 1828 desembarcaram na Ilha de Santa Catarina cerca de 625 alemães, que se destinaram à nova Colônia de São Pedro de Alcântara e Mafra, próximo à divisa com o Paraná. As iniciativas de criação das colônias para imigrantes germânicos não surtiram muito efeito, já que a agricultura familiar e a ocupação de terras devolutas, uma vez que o número de imigrantes assentados era pouco significativo e nem todos permaneceram nas colônias.23

18 Podemos destacar a Colônia de São Pedro de Alcântara (1829), Colônia Belga de Ilhota (1845),

Colônia Santa Isabel (1846) e Colonia de Itajaí (1860).

19 ANDREAZZA e NADALIN. 1994. p. 63 20 SEYFERTH, 1974. p. 31

21 Id. p.32

22 ANDREAZZA e NADALIN. 1994. p. 63. 23 SEYFERTH, 1999. p. 01

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1.1 OS ALEMÃES NO VALE DO ITAJAÍ

Conforme consta na historiografia, a ocupação da região do Vale do Itajaí é representativa para entender o modelo colonizador brasileiro, pois este é baseado na imigração. Privilegiadas pelo Estado, a partir de uma legislação que deixava à margem eventuais posseiros e grupos indígenas, que eram considerados obstáculos para o desenvolvimento da agricultura, a base destas colônias de imigrantes era a pequena propriedade familiar. Esse modelo de ocupação, que estava estabelecido nas leis de imigração e colonização, embora privilegiasse os imigrantes, não levava em conta, no entanto, outras questões como a topografia da região destinadas aos colonos.24 Desse modo, segundo SEYFERTH, “cerca 90% da área da bacia do Itajaí é de terrenos acidentados e essa topografia influi desfavoravelmente no desenvolvimento da região.”25 A exigência de fixação de moradia na colônia e a concessão de subsídios restrita àqueles que imigravam em família eram especificadas na maioria das leis e decretos que determinavam e autorizavam a entrada de estrangeiros no país. Para os imigrantes se instalarem, conforme consta na historiografia, necessitavam basicamente de três suportes essenciais: financiamento governamental, terras disponíveis e companhias colonizadoras. A viagem e a instalação eram feitas por companhias colonizadoras, que faziam contratos com o Governo Imperial, que se responsabilizava pelo financiamento da viagem.

Antes de ser colonizada por imigrantes europeus, a região do Vale do Itajaí havia sido inicialmente povoada por grupos indígenas principalmente por tribos Kaingang, além de se registrar a presença de tribos Xokleng e Guarani.26 Marilda SILVA apresenta um segundo momento do povoamento do vale que se dá com a presença de caboclos ou sertanejos ocupando esta terra. Sobre a presença destes dispõe-se “de poucos dados, face à inexistência desdispõe-se tipo de estudo para a região”27. “A referência mais ampla e consistente sobre a presença de caboclos e sertanejos no Vale, no momento da chegada dos imigrantes europeus, é feita por Peluso Jr.”.28 A situação acima apresentada nos permite visualizar o quanto ela se encaixa nos objetivos

24 Id.

25 SEYFERTH. 1974. p. 31

26 SILVA, Marilda C. G. da, A imigração italiana e a vocação religiosa no Vale do Itajaí. XXIV

Encontro Anual da ANPOCS, Petrópolis, 23 a 26 de outubro de 2000.

27 SILVA. 2000. p.05.

28 SILVA. 2000. p.05. Citação da autora que encontra-se em Peluso Jr., Victor A. - Aspectos Geográficos

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estratégicos definidos pelo governo Imperial, que com a imigração e colonização de vastas áreas despovoadas, porém habitadas por índios, desejava torná-las seguras e valorizadas, integrando-as à economia catarinense. SEYFERTH destaca que muitas tentativas de colonização não tiveram um maior desenvolvimento devido aos ataques indígenas que não permitiam a fixação segura dos imigrantes.

Os imigrantes de origem germânica concentraram-se mais na região do Vale do Itajaí e ao norte de Santa Catarina, já os de origem italiana localizaram-se mais ao Sul do estado. Em 1836, o governo provincial autorizou o estabelecimento de duas colônias às margens do Rio Itajaí-Mirim: Pocinho e Tabuleiro, cada uma com dois arraiais, entre eles estão o Arraial Belchior e outro nas nascentes do ribeirão da Conceição, afluente do Itajaí - Mirim.29 Essa colonização foi promovida com população luso-açoriana e, como o que aconteceu em Gaspar, com descendentes dos colonizadores alemães de São Pedro de Alcântara. A primeira tentativa de colonização estrangeira na área se deu em 1845, quando o belga Charles van Lede fundou a Colônia Belga de Ilhota, no baixo Itajaí-Açu.30 Essa colônia fracassou alguns anos depois, tendo seus integrantes migrado para as outras colônias que estavam sendo fundadas nas Províncias de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

No que condiz a colonização do Vale do Itajaí, pode-se dizer, que a mesma começou a partir do ano de 1850 quando “ocorreu a fundação da Colônia Blumenau, em territórios do Médio Vale do Itajaí, tendo como precursor o doutor Otto Hermann Blumenau. Em 1860 foi criada a colônia que hoje é Brusque”.31 Com a criação das colônias no Vale do Itajaí, é importante destacar que muitos dos colonos que estavam alocados na Colônia São Pedro de Alcântara deslocaram-se para as novas colônias do Vale do Itajaí em busca de melhorias, juntando-se aos novos imigrantes recém chegados da Europa.32

29 O Rio Itajaí-mirim, ao juntar-se com o rio Itajaí-Açu, na cidade de Itajaí, forma o rio Itajaí. A principal

cidade banhada pelo rio Itajaí-Mirim é Brusque. FONTE: Rppn Rio das Lontras. Site: http://rppnriodaslontras.blogspot.com/2007/08/vidal-ramos-e-votorantim.html [17/05/2010].

30 O rio Itajaí-Açu é o rio mais importante do Vale do Itajaí. Forma-se no município de Rio do Sul, pela

confluência do rio Itajaí do Sul com rio Itajaí do Oeste. Seus maiores afluentes pela margem esquerda são o rio Itajaí do Norte (na divisa de Lontras e Ibirama), o rio Benedito (em Indaial) e o rio Luís Alves (em Ilhota). No município de Itajaí, pouco antes da foz do Oceano Atlântico - mais precisamente 8 km - o rio Itajaí-Açú recebe as águas do principal afluente pela margem direita: o rio Itajaí-Mirim. Passa, a partir daí, a chamar-se rio Itajaí. FONTE: RIBEIRO, Carlos Ribeiro. Oceanos e Grandes Rios. Sítio: Portal CEN. http://www.caestamosnos.org/Oceanos_e_Grandes_Rios/Bloco8.html [17/05/2010].

31 CORRÊA, Carla Eunice Gomes; PEREIRA, Tatiane Viega Vargas. Gestão Urbana e Regional no

Vale do Itajaí: o caso de Blumenau. UNESC. Florianópolis . Sítio

http://www.apec.unesc.net/III%20EEC/Desenvolvimento/Artigo%2018.doc [15/05/2010]. p. 03.

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O tipo de povoamento no vale do Itajaí - Mirim, repetiu, em parte, o que aconteceu nas áreas da Alemanha onde predominou a Waldhufendorf 33, ou “Aldeia na linha da floresta. Tratava-se de terrenos alongados com as características acima citadas. Segundo SEYFERTH:

O tamanho do lote atribuído a cada colono no vale do Itajaí - Mirim também se aproxima do tamanho de cada Hufe. (...) a largura de um Hufe (...) variava entre algumas dezenas de metros até cerca de 200 metros e seu comprimento ia desde algumas centenas de metros até quilômetros. (...) os limites do Hufe são lineares e irregulares. O ponto inicial da mesma, e também a direção das propriedades, é determinado por um riacho, um canal ou um caminho, a partir do qual são traçadas as linhas de demarcação.34

Esse tipo de propriedade semelhante ao implantado na Alemanha se deve, segundo SEYFERTH, ao fator de as terras estarem distribuídas ao longo de um vale sendo mais racional a distribuição mais alongada partindo do rio e proporcionando uma paridade nas terras de várzea entre os colonos. As linhas coloniais abertas pelos colonos pioneiros serviram como vias de comunicação e muitas delas foram transformadas em estradas posteriormente.35

O fluxo de imigração no Vale do Itajaí incrementou-se com a chegada, a partir de 1870, de imigrantes italianos, instalados nas bordas das colônias alemãs, especialmente da Colônia Blumenau. As colônias alemãs, em geral, permaneceram isoladas por várias décadas antes de nelas serem introduzidos imigrantes de outras procedências (...).36 A partir da década de 1870, com a entrada de novos grupos de imigrantes e a consequente ampliação da mão de obra agrícola, a Colônia de Blumenau passou a experimentar uma nova fase de desenvolvimento. Outro motivo de satisfação para os alemães ali instalados esta associado ao fato das terras destinadas aos italianos serem periféricas, fazendo com que essa população servisse de escudo às comunidades alemãs centrais, contra ataques de índios e animais selvagens.37

No Paraná os alemães também marcaram forte presença em todas as regiões. antes mesmo da emancipação da província, ocorrida em 1853. A primeira

33 Característica da colonização medieval da floresta negra, Odenwald, leste da Mittelgebrige e em partes

das florestas das terras baixas do norte da Alemanha (SEYFERTH, 1984, p. 48).

34 SEYFERTH, 1974. p. 49 e 50 - Esta divisão de terras é importante, pois, mais a frente, ao estudarmos

o Jacutinga, veremos que na demarcação das divisas serão utilizadas as mesmas categorias de medição.

35 SEYFERTH. 1974. p. 52 36 SEYFERTH. 1974. p. 31

37 FRAGA, Andrey J. T. Rixas e desentendimentos entre os italianos e os alemães na Colônia de

Blumenau, Revista História Catarina. Rio dos Cedros – Berço da Colonização Trentina. Ano III. Número 14. Set/Out de 2009. Lages: Leão Baio. 2009.

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colônia foi fundada em 1829, no atual município de Rio Negro.38 Entre 1877 e 1879, chegou número apreciável de alemães vindos da Rússia. A maior parte dos imigrantes chegou no início do século XX, vindos diretamente da Alemanha, e se estabeleceram sobretudo nas regiões Leste e Sul.

Dentre as colônias que surgiram com a imigração européia destacamos o município de Nova Trento39, pois é de fundamental importância em nossa pesquisa. Os primeiros migrantes que se deslocaram para o Jacutinga são naturais do interior desta localidade.

Nova Trento, situada no vale do rio Tijucas, portanto, fora da bacia do Itajaí, e colonizado por imigrantes de origem italiana, mas o início de sua colonização de deu a partir da colônia alemã de Itajaí. A entrada dos imigrantes italianos e reimigrantes alemães rumo ao Vale do Tijucas possibilitou uma nova frente de colonização aberta seguindo para uma região ainda pouco. “Com isso, em 31 de julho de 1874 foi criado o 4º. Distrito Colonial, que em 1876 recebeu a denominação Nova Trento”.40

1.2 REIMIGRAÇÃO, A BUSCA POR NOVAS TERRAS

Foi a partir de meados dos anos 1940 que pessoas oriundas de colônias alemãs em Santa Catarina e Rio Grande do Sul reimigraram para as Regiões Oeste e Sudoeste do estado do Paraná. A situação das terras no Rio Grande do Sul e Santa Catarina era preocupante.

Um dos principais motivos que levaram estas pessoas a reimigrar foi o fracionamento excessivo da propriedade agrícola, através do crescimento vegetativo da população inerente a reterritorialização de imigrantes europeus, durante o final do século XIX e início do século XX.41 Também buscavam livrar-se da precariedade em que se encontravam as terras de muitas regiões de Santa Catarina, tornadas inférteis por

38 História Do Paraná. Secretaria Estadual de Cultura.

http://www.cultura.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=1 [22/05/2010]

39 Fundada por imigrantes italianos provenientes da Província de Trento, Itália em 1875, daí o nome Nova

Trento. Foi emancipada no dia 08 de agosto de 1892, através da Lei Provincial nº 36 promulgada pelo presidente da província Tenente Joaquim Machado. FONTE: http://www.sc.gov.br/portalturismo/Default.asp?CodMunicipio=80&Pag=5 [23/06/2010]

40 Italianos nos Vales de Tijucas, Itajaí, Norte de SC., 91sc1652. Enciclopédia Simpozio. SÍTIO:

http://www.cfh.ufsc.br/~simpozio/EncReg/EncSC/MegaHSC/Santa%20Catarina%20Provincial/91sc1650 -1680.htm [22/06/2010]

41 EDUARDO, Márcio Freitas, A Dinâmica territorial das agroindustrias artesanais de Francisco

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técnicas agrícolas primitivas que saturaram a possibilidade de “renovação” desse recurso natural. Tivemos a possibilidade de constatar esses fatos em entrevistas com colonos sudoestinos fixados na região nas décadas de 1940 e 1950. Conforme diz Lino Baack:

E meu pai lá tinha só uma colônia de terra, lá dizia colônia, em torno de 10 hectares. A família grande nós éramos em 10 irmãos, 4 irmãos homens e 6 irmãs mulheres e lá a terra era inçada bastante, muito milham, guanxuma 42 e

outro capim que diziam capim arroz e até confundia quando ia carpir, deixava o capim e cortava o arroz. Meio parecido. A terra já bastante gasta, daí como sabiam que pra cá pro Paraná tinha muita terra. Já outros não precisariam ter saído. O pai do Albino tinha 4 colônias lá e terra boa também. Ele tinha dinheiro lá, lá ele fez mais dinheiro do que aqui. 43

A região Norte do Rio Grande do Sul e a central e Vale do Itajaí em Santa Catarina foram os principais locais de saída de migrantes para o Sudoeste paranaense.44 Segundo EDUARDO,

Os migrantes gaúchos e catarinenses constituíam-se majoritariamente como descendentes de pais e avós (...) processos de desterritorialização em alguns países da Europa, e que, em momento posterior, por força das determinações sociais, implícitas na reprodução ampliada do sistema, reterritorializaram-se no Centro-Sul do Brasil.45

Em suas territorialidades cotidianas, os imigantes europeus, em especial os alemães, eram apegados a valores ligados à permanência, à estabilidade, aos costumes, à obediência. Toda essa estrutura era alicerçada numa base fundamentalmente patriarcal, culturalmente envolvida num tradicionalismo conservador.46

Com o estabelecimento dos imigrantes nos estados sulistas suas gerações foram perpetuadas, mas continuaram mantendo alguns traços culturais herdados de seus antepassados. Porém surgem problemas de ordem pontual como a grande densidade demográfica, provocando uma divisão das colônias entre os descendentes de imigrantes. Este fracionamento excessivo das terras tornou insustentável o modelo de agricultura familiar implantado nestas regiões. Soma-se a isso o desgaste do solo provocado pelo uso de técnicas agropecuárias impróprias para o

42 GUANXUMA: É chamada também de guaxuma. É uma planta anual ou perene que mede no máximo

80 cm de altura. É um antibiótico natural contra febres, afecções pulmonares (catarro pulmonar),

amarelão e afecções do coração. in. FONTE:

http://www.biduart.hpg.com.br/ervas/guanxumaguaranahortela.html [05/06/2010]

43 Lino José BAACK, natural de Nova Trento, Santa Catarina mudou-se para Jacutinga em 1948 aos 11

anos. Colono de origem alemã que concedeu esta entrevista em sua casa no dia 11/07/2009 a Antonio Marcos Korb.

44 GOMES, Iria Zanoni. 1957: a revolta dos posseiros. Curitiba: Criar Edições. 1986. 45 EDUARDO. 2008. p. 50-51.

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tipo de agricultura por eles utilizada. Com isso, o processo de migração para novas regiões brasileiras, onde existiam vastas áreas propícias ao avanço da fronteira agrícola foi uma forma intensamente praticada por gaúchos e catarinenses quando foram condicionados a migrar.47

1.3 MIGRAÇÃO: SAÍDA, VIAGEM E CHEGADA AS NOVAS TERRAS

Neste sentido entramos na questão da migração dos descendentes de alemães para a localidade de Jacutinga. Já vimos os motivos que levaram os descendentes de europeus a iniciar a busca por novas terras. Aqui sinalizamos como se deu a saída dos imigrantes de suas terras em Santa Catarina e Rio Grande do Sul e a chegada ao Paraná.

Pelos motivos delineados para a migração Cecília JUSTIN

HELLMANN relata que:

(...) o pessoal se interessava onde se podia conseguir terras melhores, e daí começaram a correr notícias de que no sudoeste do Paraná havia uma colônia, a Colônia Agrícola Nacional General Osório que estava para ser colonizada. E daí já veio gente procurar aqui, ver as terras, conhecer primeiro.48

Lino BAACK confirma em parte a versão acima ao afirmar que

Olha, foi meu pai que era José Baack, o pai do Albino que é Bernardo Hellmann, mora aqui o seu Paulo Schmitz que é vivo ainda, que veio junto, era moço solteiro de vinte e poucos anos, o irmão dele, o Bras, já falecido, acho que o Henrique Helmann já falecido. Eles escutaram lá boato de que no sudoeste do Paraná existia terra boa para colonizar.49

Ao ficarem sabendo das terras desta colônia vieram conhecer, em 1948, e alguns já ficaram. “Quando vieram olhar a terra, o Paulo e o Bras já ficaram morando aqui onde mora o Paulo Schmitz até hoje. Ta vivo ainda. E daí em Setembro aí nós saímos de lá”.50

Paulo, o Brás Schmitz já ficaram morando em Jacutinga desde janeiro de 1948. Já o restante da família Schmitz e as famílias Rech, Petri e de Henrique

47 Ibiden

48 Bernardo HELLMANN e Cecília JUSTIN HELLMANN, ele natural de Nova Trento, Santa Catarina

migrou para Jacutinga em 1949 aos 20 anos (Faleceu no final de 2009 aos 80 anos). Ela, esposa de Bernardo Hellmann é natural de Treze Tílias, Santa Catarina, migrou para Jacutinga em 1953 aos 15 anos. Ambos de origem germânica. Entrevista concedida na residência do casal no dia 11/07/2009 a Antonio Marcos Korb.

49 BAACK 11/07/2009 50 BAACK 11/07/2009

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Hellmann51, pai de nosso entrevistado Albino HELLMAN, vieram em julho de 1948. A família de nosso entrevistado, Lino José BAACK saiu de Ribeirão Grande, interior de Nova Trento no dia 19 de setembro de 1948 chegando em Jacutinga somente no dia 29 de setembro. Estas famílias foram chegando e estabelecendo-se como vizinhas, com suas casas construídas aproximadamente 1000 metros uma das outras, cada um dentro de sua colônia.

Ao descrever sua viagem de Santa Catarina até Jacutinga, BAACK diz que passaram por algumas dificuldades na estrada. Conforme expôs, vieram em 35 pessoas em cima da mudança num total de três famílias. E a primeira dificuldade foi a demora para percorrer o trajeto. Segundo ele, foram 10 dias até chegar ao Jacutinga.

A gente veio, saiu isso na segunda-feira de manhã o lá do Ribeirão do Sol que era interior de Nova Trento, o nosso lugar lá. Viajamos até o Ribeirão Grande daí a gente pousou lá. Passamos o dia 20 de setembro (1948). Dia 21 daí com carroças viemos até o Rio do Ouro, dava em torno de uns 20 quilômetros, uma coisa assim, lá também só chegava carroça. Daí no Rio do Ouro foi posto em cima de um caminhão terça feira de tardezinha (...) daí chegamos não sei que horas, acho que 10 horas da noite em Blumenau, pousamos lá num hotel. Foi terça a noite. Daí quarta o dia todo chegamos me parece até o Rio do Sul. Quinta o dia todo chegamos, não me “alembro” mais o lugar onde chegamos. Sei que chegamos em Beltrão sábado a tarde. (...). E daí quando foi na terça-feira dia 29 de setembro, daí quem pode caminhar com a mochila e coisarada a gente veio e chegamos aqui onde estou morando hoje.52

Outra questão que ele rememora foi na travessia do rio Chapecozinho, ainda em Santa Catarina, quando da travessia do mesmo, a travessia era feita de balsa e,

O caminhão quase que afundou no Rio Chapecozinho. Quando ele saia da balsa, a balsa né desamarrou o caminhão entrou, pegou é, o pessoal ficou todo na outra margem. Tava só o motorista e o ajudante dele que era um tal de Paulo Herchz. Ele quase queimou patinando o caminhão e por fim o balseiro encostou a balsa atrás um pouco e conseguiu sair, pelo meu ver era a balsa muito pequena para tanta carga, o caminhão carregado, mas conseguiu sair. (Risos) Quase que ficamos só com a roupa do corpo no outro lado do rio Chapecozinho.53

Este era o destino para todos os migrantes nesta época, ficar uma semana na estrada, correndo os riscos até chegar à nova terra. Consta nos relatos de quase todos os entrevistados as dificuldades com a viagem, os objetos e móveis que podiam trazer na

51 Família Schmitz: Bernardo e sua esposa, e sua filha Catarina; Olga o Marcolino Schmitz; Família de

José Rech; Família de Pedro Petri.

52 BAACK 11/07/2009 53 BAACK 11/07/2009

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mudança. “Móveis não foi trazido, isso foi feito tudo aqui depois”.54 É interessante que nos relatos dos primeiros migrantes não aparece a necessidade de trazer fogão, já para os migrantes chegados após 1951 este era indispensável. Conforme levantamos, os colchões, em sua maioria, eram enchidos com palha de milho, o que facilitava a locomoção e o transporte, conforme relata Albino HELLMANN: “o colchão tirava a palha fora e trazia só a roupa, só o saco. Achava palha de milho aqui, se não tinha palha de milho ia samambaia mesmo”.55

54 HELLMANN, A.. 11/07/2009 55 Id.

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17 2. SUDOESTE PARANAENSE E SUAS PARTICULARIDADES

Para entendermos a dinâmica aplicada à colonização do Sudoeste paranaense, primeiramente precisamos estudar alguns pontos cruciais da história desta região. Primeiramente nos deparamos com a questão referente às fronteiras, que é bastante marcante para esta região. A definição de fronteiras naquela região foi marcada por questões nacionais e internacionais. Num primeiro momento, é importante destacar a definição das fronteiras entre Brasil e Argentina, que foi resolvido somente com arbitramento internacional. Fato este conhecido pela historiografia como “Questão de Palmas”.56

Resolvida esta questão, o Paraná continuou com pendências referentes à região Sudoeste do Paraná, desta vez com Santa Catarina conforme veremos a seguir. Outro acontecimento que exerceu importante influência nesta dinâmica foi o conflito conhecido pela historiografia como “Guerra do Contestado” 57 pois obrigou o estado do Paraná a abrir frentes migratórias direcionadas a região Sudoeste com a criação da Colônia Bom Retiro.58

Com a abertura de novas frentes migratórias para esta região, embora “No início do século XX, o sudoeste paranaense, de Mariópolis até a fronteira Argentina, continuava a ser um imenso vazio demográfico. Sua população atingia apenas 3.000 habitantes” 59 Ainda segundo WACHOWICZ os migrantes que vinham para esta região eram migrantes políticos às centenas, provenientes principalmente de Passo Fundo e Palmeira das Missões, refugiaram-se em várias regiões do Paraná. No vale do rio do Peixe constatavam-se 200 gaúchos nessas circunstâncias.60

56 O professor Rui WACHOWICZ, em sua obra intitulada “Paraná, sudoeste: ocupação e colonização”

discorre sobre este tema traçando toda a disputa envolvendo a Confederação Argentina e o Império Brasileiro.

57 O termo “Contestado” remonta a meados do século XIX, quando teve início a disputa dos limites

territoriais entre os estados de Santa Catarina e Paraná. Tal disputa só foi concluída em 1916, ano em que foi assinado o acordo definitivo sobre os limites entre os dois estados. Foram 48 mil quilômetros quadrados de terras disputados, que compunham o “chão Contestado”. (TOMAZI, Gilberto, A Mensagem De “São” João Maria: E Sua Ressignificação Na Experiência Religiosa do Contestado, Último Andar, São Paulo, (14), 109-126, jun., 2006)

58 Em 07 de maio de 1918, pelo Decreto n.º 382, foi criada a Colônia Bom Retiro, demarcada pelo

engenheiro Francisco Gutierrez Beltrão. Em pouco tempo a sede do povoado da Colônia Bom Retiro, passou a se chamar Vila Nova e mais tarde definiu-se por Pato Branco. (Pato Branco, SEEC > Paraná da

Gente > Caderno 5, Sítio:

http://www.prdagente.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=750 15/04/2009)

59 WACHOWICZ, 1985, p. 65 60 Id., p.68

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Não podemos esquecer que as terras compreendidas pela gleba Missões estavam sub-júdice, pois, havia uma disputa judicialmente que se estendia desde o ano de 1920. Essa disputa colocou de lado opostos, empresas colonizadoras, governo federal e governo estadual.61

A colonização foi mais acentuada logo após a criação da CANGO, mas, desde o início do século XX, como está relatado na historiografia consultada62, a região já era explorada pelos caboclos e indígenas, conhecidos como bugres.63 Neste sentido chegamos num ponto crucial na história do distrito de Jacutinga, que é a relação entre migrante e os habitantes mais antigos da região

2.1 ENTRE OS LITÍGIOS E AS LEIS: O SUDOESTE PARANAENSE EM QUESTÃO.

Como já vimos, as terras onde hoje está localizada a região sudoeste do Paraná passou por várias disputas judiciais e foi questionada internacionalmente pela Argentina através da Questão de Palmas (Ver mapa Anexo I). Esta questão desenrolou-se desde a independência da Argentina64 em 1816 até 1895, quando o presidente dos Estados Unidos, Grover Cleveland65·, arbitrou a questão em favor do Brasil.

Conforme consta na historiografia da região,

61 DUARTE, Paulo César Borges, MARTINS, Daniel. A História do sudoeste paranaense através da

fotografia. Projeto de pesquisa sobre ocupação das terras do Sudoeste paranaense. Sítio

http://www.url.freelancenow.com.br/arquivos/1235/PROJETO%20HIST%C3%93RIA%20ATRAVES% 20DAS%20IMAGENS.doc [23/05/2009] p.02.

62 WACHOWICZ, 1985; LAZIER, 1986; PERGORARO, 2008.

63 Bugre: Bras. Indígena selvagem. (http://www.url.priberam.pt/dlpo/Default.aspx [20/06/2010]); Bugre:

sm (fr bougre) 1 Nome depreciativo que se dá ao selvagem do Brasil. 2 Bot Árvore leguminosa (Albizzia lebbeck). sm pl Indígenas não civilizados e ferozes do Brasil, principalmente os de origem tapuia.

(http://.url.michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=bugre [20/06/2010]); Bugre: é a denominação dada a indígenas de diversos grupos do Brasil, por serem considerados sodomitas pelos europeus. A origem da palavra vem do francês bougre, que de acordo com o dicionário Houaiss possui o primeiro registro no ano de 1172 e significa 'herético', que por sua vez vem do latim medieval (século VI) bulgàrus. Como membros da igreja greco-ortodoxa, os búlgaros foram considerados heréticos, e o emprego do vocábulo para denotar a pessoa indígena liga-se à idéia de “inculto, liga-selvático, não cristão” - uma noção de forte valor pejorativo. (http://url.ohermenauta.wordpress.com/2009/12/20/ [20/06/2010]).

64 A definitiva independência da Argentina veio em 9 de julho de 1816, por declaração do Congresso de

Tucumán. Naquele momento Artigas já havia separado a Banda Oriental, o atual Estado do Uruguai, das Províncias Unidas do Rio da Prata, sem que isto tenha significado a independência daquele país vizinho. (TREIN, Franklin, Argentina: entender a história para transcender a crise, 2002 . Sítio: http://www.url.esg.br/uploads/2009/03/franklin1.pdf [12/05/2010] p.04)

65 Grover Cleveland, foi presidente dos Estados Unidos durante os anos de 1885-1889 e 1893-1897

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19 Durante muitos anos a Argentina e o Brasil disputaram a rica região Sudoeste do Paraná. Ao ser definida a linha divisória entre os dois países, a Argentina reinvidicou que a fronteira fosse pelos rios Chapecó e Chopim (portanto o Sudoeste do Paraná pertencia à Argentina). O Brasil defendia que a fronteira Ocidental seguisse os rios Santo Antonio e Peperi-guaçu.66

LAZIER ainda destaca ainda que “não houve um acordo entre as partes” e, com isso, “os dois países escolheram, em 1889, o Presidente dos E.E.U.U. para, como árbitro, decidir o referido problema” 67. Com a defesa do diplomata Barão do Rio Branco, que, “com mapas e documentos irrefutáveis” fez com que Cleveland desse a vitória ao Brasil nesta questão. Somente “a partir de 1895 que esta região passou a pertencer oficialmente ao Brasil”.68

Se compararmos o Anexo I que se refere à Questão de Palmas e o anexo II referente à Gleba Missões verificamos que uma grande porcentagem de terra requerida pelos argentinos faz parte das Glebas Missões e Chopim, que anos mais tarde, acolherão a Colônia Agrícola Nacional General Osório (CANGO) 69 que exerce papel fundamental sobre nosso objeto de estudo.

Outro tema bastante relevante foi a disputa judicial entre Paraná e Santa Catarina pela definição das divisas e a posse das terras que formam hoje o Oeste Catarinense e o sudoeste paranaense. Conforme destaca LAZIER, “inicialmente a região era disputada por São Paulo e Santa Catarina” [e] “a partir de 1853 (...) a disputa continuou entre o Paraná e Santa Catarina”.70 Conforme o autor, Rui Barbosa advogou em favor do Paraná e Epitácio Pessoa defendeu Santa Catarina. Esta querela teve um desfecho apenas em 1916.

(...) os dois Estados assinaram o acordo de fronteira no dia 20 de outubro de 1916. Afonso Camargo assinou pelo Paraná e Felipe Schmidt por Santa Catarina. O referido acordo confirmado pelo Presidente da República Wenceslau Braz, sendo que a maior parte das terras em litígio passou para Santa Catarina.71

66 LAZIER. 1986. p. 35. 67 Id.

68 Ibiden.

69 A CANGO foi fundada pelo presidente Getulio Vargas a 12 de maio de 1943 através do decreto-lei

12.417. “Art. 1. – Fica criada a Colônia Agrícola Nacional “General Osório”, no Estado do Paraná, na faixa de 60 quilômetros da fronteira, na região Barracão-Santo Antonio, em terras a serem demarcadas pela Divisão de Terras e Colonização do Departamento Nacional de Produção vegetal, do Ministério da Agricultura. Parágrafo único: A área a ser demarcada não será inferior a 300.000 hectares – Fonte: DIÁRIO OFICIAL (Secção I) DECRETO N. 12.417 — DE 12 DE MAIO DE 1943. Cria e Colônia

Agrícola Nacional "General Osório", no Estado do Paraná. Rio de Janeiro. Sexta-feira 14 Maio de

1943. p. 7399. http://www.url.jusbrasil.com.br/diarios/2294126/dou-secao-1-14-05-1943-pg-7/pdf. [15/05/2009].

70 LAZIER. 1986. p. 35. 71 Id. p. 36.

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Esta questão era puramente de ordem política, pois no que condiz à população da região, não havia muita diferença em ser morador do Paraná ou de Santa Catarina, conforme vemos a seguir “Vale lembrar que essa disputa não tinha muita relevância na população, pois o poder era sempre representado pelos coronéis, tanto fazia pertencer a Santa Catarina ou ao Paraná”.72

Antes de sair o resultado da questão jurídica entre os estados houve uma forte revolta popular, conhecida pela historiografia como a “Guerra do Contestado” que ocorreu onde hoje é a região Oeste de Santa Catarina e Sul do Paraná.

A Guerra do Contestado foi um conflito social e político que envolveu os estados do Paraná e Santa Catarina entre 1912 e 1916; é na verdade o ápice de uma questão maior, qual seja, a da definição dos limites fronteiriços entre Paraná e Santa Catarina, que se estende no tempo desde antes da constituição da província do Paraná em 1853.73

Mas esta região não ficou sem conflitos, pois, como fim destas duas questões entramos num terceiro momento relacionado à Gleba Missões, que foram as disputas judiciais em várias instâncias tanto relacionadas ao Estado quanto à iniciativa privada.

Conforme verificado na historiografia regional, os litígios judiciais tiveram início a partir da primeira década do século XX. O início dos processos judiciais remete ao pagamento à empresa Brasil Railway Company pela construção da estrada de ferro São Paulo - Rio Grande. O Governo do Estado pagou esta dívida com terras públicas.

Com a revolução de 1930, o General Mário Tourinho assume o Governo do Estado como interventor. Ao estudar as concessões feitas à citada empresa, constatou irregularidades,

(...) inclusive o não cumprimento do contrato por parte da referida companhia. Em seguida, pelos Decretos nº.s. 300 e 29, de 30-11-1930 e 5-1-1931, anulou algumas daquelas concessões. Entre as titulações anuladas estavam as glebas Missões e Chopim. Com essa medida o território do Sudoeste do Paraná voltou ao domínio do poder público.74

72 PITZ, Ivo. A Guerra do Contestado (1912-1916). Sítio: Ivo Pitz,

http://www.url.ivopitz.pro.br/?arquivo=texcontestado [15/12/2009]. p. 01.

73 A Guerra do Contestado foi um conflito social e político que envolveu os estados do Paraná e Santa

Catarina entre 1912 e 1916; é na verdade o ápice de uma questão maior, qual seja, a da definição dos limites fronteiriços entre Paraná e Santa Catarina, que se estende no tempo desde antes da constituição da província do Paraná em 1853.(NEUNDORF, Alexandro. A questão de limites entre Santa Catarina e Parana e a construção identitária paranaense: as fronteiras, o outro e o projeto intelectual. Ouro Preto.

Revista Eletrônica Cadernos de História. Ano II, n. 01, março de 2007. Nota 11. p. 03.)

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A empresa Brasil Railway Company recorreu à justiça e em 1940, sem uma determinação judicial o Governo Federal incorporou todos os bens da empresa ao patrimônio nacional, inclusive os bens reincorporados pelos decretos estaduais, as Glebas Missões e Chopim. Após a incorporação, a pendência sobre as propriedades (...) continuou existindo, agora entre o Governo Estadual e o Governo Federal.75

Importante destacar que neste meio tempo surge a figura de José Rupp. O governo catarinense cedeu autorização ao cidadão José Rupp para a extração da erva mate e da madeira no planalto catarinense, mas, acontece, porém, que a mesma Cia. de Estradas de Ferro São Paulo – Rio Grande recebeu do governo catarinense, em função de estradas de ferro a serem construídas, a área de terra onde José Rupp estava trabalhando.76 Com isso,

Em 1920, quando a disputa fronteiriça entre Paraná e Santa Catarina já estava resolvida, começou o litígio judicial entre José Rupp e a Companhia. Rupp perdeu em primeira instância, em 1920, tendo sido embargados e apreendidos seus depósitos de erva-mate já extraída. Na apelação, em 1925, Rupp teve sua posse sobre aquelas terras reconhecidas. A companhia recorreu então no Supremo Tribunal Federal que, em 1938, confirmou os direitos de Rupp. Diante dos prejuízos que tivera até então, Rupp exigiu na justiça uma indenização da Companhia Estrada de Ferro São Paulo Rio (...). Como os bens da EFSPRG tinham sido nacionalizados em 1940, o crédito de Rupp era junto ao Patrimônio Nacional.77

Com a negativa do Governo Federal em pagar a Rupp, o mesmo então “desistiu e cedeu (isto é, vendeu) seu crédito para a firma que iria infernizar durante sete anos a vida dos pequenos agricultores do Sudoeste, a Clevelândia Industrial e Territorial Ltda, CITLA” 78, quando José Rupp cedeu seu crédito à CITLA. A partir, portanto, de 26 de julho de 1950, o Poder Público deveria pagar a indenização não mais a José Rupp, e sim à CITLA.79

A partir daí, conta Lazier (s/d, p.10), aconteceu o milagre. Aquilo que era ilegal passou a ser ilegal. Aquilo que era indevido passou a ser legítimo. Aquilo que era indeferido passou a ser deferido. Com a entrada da CITLA na problemática do recebimento de indenização todas as portas se abriram, e, em 17/11/1950, foi acertado entre a CITLA e a Superintendência das Empresas Incorporadas ao Patrimônio Nacional o acordo sobre a indenização. O acordo foi a titulação para a CITLA da Gleba Missões e parte da Gleba Chopim como pagamento daquele crédito.80

75 Id. p. 40. 76 Ibiden 77 ABRAMOVAY. 1981. p. 54. 78 Id. p. 55. 79 LAZIER. 1986. p. 41.

80 ABRAMOVAY. 1981. p. 55. Aqui ABRAMOVAY cita LAZIER no que concerne a mudança de

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É sem levar em consideração todas estas contendas judiciais que Getúlio Vargas cria, em 1943 a Colônia Agrícola Nacional General Osório que analisaremos mais a frente.

2.2 COLÔNIA BOM RETIRO – O INÍCIO DA COLONIZAÇÃO DO SUDOESTE A colonização do Sudoeste do Paraná foi mais acentuada logo após a criação da CANGO, mas, desde o início do século XX, como está exposto na historiografia consultada, a região já era explorada pelos caboclos indígenas. WACHOWICZ e PEGORARO citam a Colônia Bom Retiro, fundada em 1918, com o objetivo de alocar colonos que foram obrigados a sair das terras da região do Contestado. Também não podemos nos esquecer dos produtores de erva-mate e dos suinocultores, que tiveram importância significativa no processo inicial de colonização.

A “Guerra do Contestado” serviu de pano de fundo para uma nova forma de expansão para a região sudoeste, conforme WACHOWICZ destaca:

Em 1916, o Paraná perdia o oeste de Santa Catarina com a assinatura do acordo do Contestado. Inúmeros eram os paranaenses descontentes, que por diversos motivos não queriam permanecer sob jurisdição catarinense. Para albergar essa gente e tentar reunir no sudoeste a população cabocla do Contestado, o Paraná criou pelo decreto 382, de 7 de maio de 1918, a colônia de nacionais Bom Retiro.81

Esta colônia situava-se na região onde hoje temos a cidade de Pato Branco e serviu para acolher os paranaenses que não queriam permanecer sob o comando de Santa Catarina ou que foram desabrigados com a Guerra do Contestado. Sobre a forma como se deu a criação e o desenvolvimento da colônia Wachowicz destaca que:

Apesar do artificialismo e de sua característica desordenada e intermitente, a colonização, dirigida pelo Estado do Paraná no sudoeste, continuava. Entretanto, em 1918 e 1920, esta colonização oficial sofreu um outro grande revés. Por obrigações contratuais advindas, o Paraná foi obrigado a titular para a Brazil Railway Co. extensos territórios devolutos em pagamento pela construção da estrada de ferro ramal de Guarapuava. Extensas glebas do sudoeste paranaense, entre outras espalhadas pelo Estado, foram tituladas a essa empresa. Entre elas está a gleba Missões com 425.731 hectares.82

E continua:

81 WACHOWICZ. 1985. p.74. 82 WACHOWICZ.1985. p. 81- 82

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23 Nas décadas de 1930 e 1940, as posses que compunham os terrenos ao derredor de Pato Branco começaram a ser paulatinamente vendidas para colonos procedentes do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, inicialmente em número bastante reduzido.83

Neste sentido, o autor afirma que “a busca de novas frentes agrícolas, num primeiro momento, se dava sem o apoio do Estado”.84 Nesta época, o sudoeste paranaense era predominantemente ocupado por caboclos. Os caboclos foram os primeiros a entrar na região. “Derrubaram parte da mata, fizeram pequenas plantações de milho e feijão, construíram pequenas casas de pinheiro lascado, organizaram mangueirões. Em suma, apossavam-se dos terrenos.” 85

2.3 A “MARCHA PARA OESTE” – CRIAÇÃO DA CANGO E DO TERRITÓRIO DO IGUAÇU

Em 1930, o Brasil passa por um novo momento histórico que se deu com a tomada do poder por Getúlio Vargas. O novo governo tinha o intuito de criar a idéia de nação em todos os sentidos. Por isso, houve a centralização do governo na pessoa de Vargas. Este período foi denominado pela historiografia como o final da República Velha e início de um período com grandes mudanças.

As primeiras mudanças foram na forma de conduzir o governo que se caracterizou pelo nacionalismo e populismo. Primeiro conquistar o povo, depois criar a idéia de nação. Para nacionalizar, era preciso que houvesse uma definição de fronteiras e cuidar para que estas fronteiras fossem respeitadas.

ABRAMOVAY destaca que “Foi nesta época que Getúlio Vargas tentou concretizar um dos mais ambiciosos objetivos de seu governo, a Marcha para o Oeste, a colonização das terras distantes e desocupados” 86, e para isso era necessário conquistar colonos para que houvesse o deslocamento dos mesmos de onde estavam estabelecidos para os novos núcleos coloniais a serem criados. “Neste quadro é que foi criado um órgão que teve a maior importância na ocupação do Sudoeste Paranaense: a Colônia Agrícola Nacional General a CANGO” 87, já referida anteriormente.

83 Id. p.85 84 Id. 85 Id. 86 ABRAMOVAY. 1981. p. 51. 87 Id.

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Importante destacar que “Nas palavras de Vargas, a Marcha incorporou ‘o verdadeiro sentido de brasilidade’, uma solução para os infortúnios da nação.” 88 O ideal deste movimento era trazer o máximo de pessoas para povoar as fronteiras brasileiras, solucionando os problemas demográficos das áreas mais litorâneas, bem como o destas regiões fronteiriças, até então abandonadas pelo governo brasileiro. Conforme consta na historiografia, somente em 1940, através do decreto-lei número 200989, que propicia a criação dos núcleos coloniais e também estabelece as normas reguladoras das relações entre as empresas destinadas à colonização e os colonos. “Os objetivos eram de ‘fomento da pequena propriedade’ através de apoio Estatal, através de auxílios governamentais e supervisão de órgãos técnicos até a emancipação dos núcleos, além de assistência social às famílias”.90

Na década de 1940 foram as colônias: CANGO – Colônia Agrícola Nacional General Osório (1943) no Paraná, a CAND - Colônia Agrícola Nacional de Dourados (Criada em 1943 e instalada em 1948) no então estado do Mato Grosso, hoje, Mato Grosso do Sul e a CANG - Colônia Agrícola Nacional de Goiás (1941) no estado de Goiás.91

Enfocando, particularmente a CANGO, vimos que a região sudoeste, em especial a Gleba92 Missões, estava em situação irregular, pois havia vários processos jurídicos questionando a propriedade da mesma. Em 1943 sem que esta questão tivesse sido resolvida, Getulio Vargas através do decreto lei nº 12.417 criou a Colônia Nacional General Osório (CANGO) com o objetivo de colonizar as terras da região de fronteira sudoeste do Paraná. A CANGO instalou seu escritório na vila de Marrecas, atual Francisco Beltrão.

O legislador que redigiu o decreto nº. 12.417 sabia perfeitamente da ilegalidade da fundação da Colônia. Não definiu os limites da mesma e sim apenas a sua extensão, a qual não poderia ser inferior a 300 mil hectares, mas não estabelecia o máximo. Por sinal, os limites da Colônia nunca foram

88 GARFIELD , Seth; COLLEGE, Bowdoin. As raízes de uma planta que hoje é o Brasil: os índios e o

Estado-nação na era Vargas. Revista brasileira de História. vol.20 n.39 (p. 13 - 36) São Paulo 2000. p. 16.

89 Informação constante no texto: A “Marcha para o Oeste”: colônias Nacionais e colonização oficial

pública e privada no (1930-70). Retirado do Sítio: http://www.url.zsee.seplan.mt.gov.br/divulga/amarchaparaooeste:colôniasnacionaisecolonizaçãooficialpú blicaeprivadanoestado(1930-70).rtf [22/05/2009].

90 Id.

91 ABREU, Silvana de. Planejamento Governamental - a SUDECO no espaço mato-grossense:

contexto, propósitos e contradições. USP. São Paulo. 2001. p. 57.

92 Gleba: Solo cultivável, terreno que contém mineral. Antigamente, terreno feudal a que os servos

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