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Bairros de habitação popular no Porto, 1899-1933. A prática de uma Arquitectura Económica, Saudável e Cómoda nas vésperas do Moderno

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BAIRROS DE HABITAÇÃO POPULAR NO PORTO, 1899-1933

A PRÁTICA DE UMA ARQUITECTURA ECONÓMICA, SAUDÁVEL E CÓMODA NAS VÉSPERAS DO MODERNO

ELISEU MANUEL VIEIRA GONÇALVES

TESE DE DOUTORAMENTO APRESENTADA

À FACULDADE DE ARQUITECTURA DA UNIVERSIDADE DO PORTO EM 2014

ÁREA CIENTÍFICA: ARQUITECTURA

Orientação científica:

Professor Doutor Rui Jorge Garcia Ramos Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto Co-orientação científica:

Professor Catedrático Carlos Sambricio E. Echegaray

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O trabalho de investigação que suporta esta tese foi parcialmente realizado no âmbito da Bolsa de Investigação SFRH/BD/70340/2010 da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) do Governo Português. Teve ainda o apoio do Centro de Estudos de Arquitectura e Urbanismo (CEAU) da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto (FAUP) - financiamento por Fundos FEDER através do Programa Operacional Factores de Competitividade – COMPETE e por Fundos Nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia no âmbito do projecto PEst-C/EAT/UI0145/2011.

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Para a pequena Carlota.... à Carla, parte inseparável, pelo seu apoio e paciência. ... aos meus pais.

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V AGRADECIMENTOS

Nos seus mais variados aspectos, a investigação desenvolvida cruzou-se com instituições e pessoas distintas cuja colaboração, generosidade e saber se tornaram indispensáveis à produção final deste documento.

Em primeiro lugar, quero expressar a minha gratidão ao orientador deste trabalho, o Professor Rui Jorge Garcia Ramos que, desde o primeiro momento, abraçou o tema, depois o consagrou no Mapa da Habitação do Atlas da Casa, fazendo acreditar num desfecho útil. Foi um privilégio ter usado da sua erudição, paciência e amizade.

Agradeço ao Professor Carlos Sambricio, co-orientador, pelo seu precioso contributo na formação de perspectivas interpretativas acerca do tema, referenciação de bibliografia fundamental e, sobretudo, pela providencial colocação de possíveis hipóteses a desenvolver.

Na sua condição de coordenador do grupo de investigação Atlas da Casa, do Centro de Estudos de Arquitectura e Urbanismo, agradeço ao Professor Domingos Tavares todos os meios colocados à disposição desta investigação e, ainda nesse contexto, a minha gratidão aos colegas do Mapa da Habitação pela partilha de informação e conhecimento.

Pelo apoio prestado, agradeço à Fundação Instituto Marques da Silva, na pessoa da Dra. Paula Abrunhosa, ao Arquivo do Forte de Sacavém, na pessoa da Dra. Eugénia Costa, ao Arquivo Histórico Municipal do Porto, na pessoa da Dra. Rute Reimão, e à Eliane Michelon, directora dos Archives Municipales de Mulhouse. Igualmente, os meus agradecimentos às arquitectas Catarina Gonçalves e Vera Santos, ao arquitecto Alcindo Spínola, pela preciosa ajuda aquando da recolha dos processos de obra e seu tratamento gráfico. Por fim, a minha profunda estima para aqueles colegas da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, amigos confidentes de percurso, pela reflexão conjunta e amizade. Desses, não posso deixar de distinguir os que de longa data me acompanham, especialmente, o António Madureira, o Marco Ginoulhiac e o José Quintão.

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NOTA PRÉVIA SOBRE CRITÉRIOS DE REDACÇÃO

Nesta dissertação foram utilizados documentos de autoria, proveniência e pertinência diversa cujos critérios de referenciação importam esclarecer.

As fontes bibliográficas internacionais usadas são, na sua maioria, de raiz francófona e anglo-saxónica, restando ainda um número significativo de documentos em italiano e castelhano. Porque todos eles são idiomas familiares ao meio académico português e, em particular, ao disciplinar da Arquitectura, optou-se por manter na transcrição a língua original. Noutros casos, de línguas que obrigavam a outro tipo de esforço de interpretação, irrelevantes para os objectivos da tese, optou-se por utilizar traduções em português, ou por nós traduzidas a partir de outras versões, para se garantir maior continuidade de leitura. Uma situação que se repete é a relacionada com textos germânicos editados em castelhano que foram inseridos na tese em português a partir da nossa interpretação. Ainda, pela mesma razão, optou-se por actualizar o português arcaico de alguns documentos coevos.

Integra a dissertação um catálogo de fichas individuais de obras relativo aos bairros inventariados. As fichas apresentam-se alinhadas com um sistema de referenciação alfanumérico que integra a sigla BHP. Essas referências, assinaladas no corpo principal do texto entre parêntesis rectos (ex.: [BHP_11]), indicam que informação mais sistematizada pode ser consultada no referido catálogo. Neste tipo de sigla, tal como noutras abreviaturas (ex.: fontes arquivísticas e instituições - apresentadas em lista própria) usou-se o critério geral de contrair o nome na primeira entrada, optando-se por referir a partir daí a sigla correspondente.

Dada a extensa lista de personalidades referidas achou-se útil indicar entre parêntesis curvos os anos extremos das vidas daquelas em que esse dado é relevante no contexto da narrativa.

Salvo raras excepções, as imagens que ilustram o texto são provenientes de fontes primárias, na sua maioria inéditas.

As citações em nota de rodapé e na lista bibliográfica foram inseridas segundo o recomendado pela Norma Portuguesa NP 405-1/2/3/4. A fonte de letra utilizada no corpo principal do texto é a mesma fixada pela Universidade do Porto para as capas das dissertações.

Neste documento não se tomam as alterações introduzidas no último Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

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IX RESUMO

Na presente dissertação é analisado o processo de desenvolvimento de novas formas de residência dirigidas às classes populares a partir do momento em que, no final do século XIX, a vida na cidade é alvo de medidas reformistas instigadas pela economia social e pelo higienismo com forte impacto nos hábitos, nos modos de habitar e na transformação do espaço doméstico e público - na estruturação de uma nova ordem urbana. O estudo centra-se nos processos de formulação e construção de conjuntos de habitação popular surgidos no Porto entre 1899 e 1933, com o objectivo de apurar a relação dessas dinâmicas com o aparecimento de novos modelos conceptuais de habitação simples corrente.

Tomando material empírico dominado por processos de obra, o trabalho verifica as circunstâncias em que foram enunciadas soluções de habitação desenhadas sobre o imperativo de serem económicas, saudáveis e cómodas. Estas três condições determinaram uma arquitectura da casa distinta da historicamente usada na conformação da cidade industrial e liberal portuense de que as ilhas e a casa burguesa estreita são paradigmas. Neste quadro, foram isoladas algumas problemáticas disciplinares que estiveram na génese desse tipo de arquitectura: a discussão entre o uni e o multifamiliar, o efeito normativo no desenho do espaço doméstico, a relação entre a cidade e o campo, o desenvolvimento urbano informal, ou ainda a questão do modelo e do tipo como reprodutores distintos de soluções arquitectónicas.

Assim, é enunciado um estádio prévio da casa mínima moderna no interior de uma narrativa centrada na habitação económica que se expande para além do limite temporal fixado, reafirmando, entre o final da Monarquia Constitucional e os alvores do Estado Novo, uma continuidade ideológica dominada pelo unifamiliar.

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PALAVRAS CHAVE:

Arquitectura; habitação popular; bairros; cidade industrial; higiene; reformismo social; espaço doméstico; transformação urbana; Porto

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XI ABSTRACT

The thesis analyses the process of developing new forms of dwelling addressed to the working classes starting from the moment when, in the late nineteenth century, life in the city was under reform measures instigated by the social economy and the hygienism with strong impact on habits, ways of dwelling, domestic and public space renovation and, consequently, structuring a new urban order. In this scope, the study focuses on the establishment of low-income housing in Porto taking place amid 1899 and 1933. The aim of the investigation was to understanding the dynamics related to the emergence of new conceptual models about simple and regular urban housing.

The empirical material involving primary sources was mainly obtained in national and municipality archives, consisting essentially of architectural design projects. By means of this information the research verifies the circumstances in which the housing solutions were idealized under the imperative of being cheap, healthy and comfortable. Those three conditions appear to have determined a new architecture of the house distinct from one historically used to build the industrial and liberal urban form of Porto.

In the dissertation a number of disciplinary problems considered as keys were identified and isolated to verify the genesis of this type of housing: the discussion between single and multi-family housing; the regulatory effect on domestic space conception; the relationship between city and countryside related to informal urban growth areas; or the problem amid model and type as distinct reproducers of architectural solutions.

Thus, an early stage of the minimum modern house is enunciated within a narrative centered on affordable housing issue confirming, in the timeframe between the end of the Constitutional Monarchy and the beginning of Estado Novo dictatorship, an ideological continuity dominated by single-family houses architecture.

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KEYWORDS:

Architecture; working-class housing; company towns; industrialized city; hygiene; domestic space; social economy; urban reform; Porto

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XIII LISTA DE SIGLAS

AHMP Arquivo Histórico Municipal do Porto AFS Arquivo do Forte de Sacavém/ IRHU

AFIMS Arquivo da Fundação Instituto Marques da Silva AMOP Arquivo do Ministério das Obras Públicas AMG Arquivo Municipal de Gaia

ADP Arquivo Distrital do Porto

AADP Arquivo da Assembleia Distrital do Porto

AHP Arquivo Histórico Parlamentar da Assembleia da República Portuguesa AFCG Arquivo Fundação Calouste Gulbenkian

ACML_AC Arquivo da Câmara Municipal de Lisboa – Arco de Cego AMM Archives Municipales de Mulhouse

BNP Biblioteca Nacional de Portugal

BOA Biblioteca da Ordem dos Arquitectos Portugueses

BFAUP Biblioteca da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto BFEUP Biblioteca da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto BFLUP Biblioteca da Faculdade de Letras da Universidade do Porto BFMUP Biblioteca da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto BINSA Biblioteca do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge BMP Biblioteca Municipal do Porto

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XV LISTA DE FIGURAS

Fig. 1: Bairro Operário O Comércio do Porto – Lordelo. M.O. Manuel Fortunato de Oliveira Motta. Porto, 1901. [O Comércio do Porto ao completar 80 anos. Porto: O Comércio

do Porto,1934] 14

Fig. 2: Bairro de Casas Económicas do Amial. Porto, 1938. [Suplemento do jornal O Século.

Lisboa: Sociedade Nacional de Tipografia, Junho, 1940] 14 Fig. 3: Bairro na Rua Oliveira Monteiro. Mestre-de-obras Manuel Gomes da Silva, Porto,

1898. [LO 262/1898 - AHMP] 20 Fig. 4: Vila Júlia. Arquitecto Miguel Ventura Terra, Estoril 1901-1904. [A Construção

Moderna, nº 122, 1904] 20

Fig. 5: Maquete do Bairro Municipal de Olhão. Arquitecto Carlos Ramos c. 1930. [Estúdio

Novais -AFCG] 24

Fig. 6: Projectos do Bairro Municipal do Funchal. Solução A e B. Arquitecto Carlos Ramos, c.

1931. [AFS] 24

Fig. 7: Levantamento aero fotométrico - zona de São Vitor, 1939. [AHMP] 32 Fig. 8: Levantamento aero fotométrico - zona do Amial, 1939. [AHMP] 32 Fig. 9: Bairro da Fábrica de Cerâmica Lusitânia. Coimbra, 1933. [Revista Cerâmica e

Edificação, nº 5, Maio 1933, p. 118] 70 Fig. 10: Solução para as últimas casas da Colónia Estevão de Vasconcelos. Rua da

Carcereira, Porto, 1922. [AHMP] 70 Fig. 11: Dispositivos técnicos do banho veiculados em 1890 em Paris. [La Construction

Moderne. Decembre 1890, p.130] 74 Fig. 12: Dispositivos técnicos de banho comercializados em 1910 no Porto. [Catálogo

Illustrado. Porto: Tipografia Santos, 1910] 78 Fig. 13: Maison Ouvrière exposta no Salon parisiense de 1911. Anatole de Baudot, c. 1908.

[Médiathèque de l’Architecture et du Patrimoine de Paris] 82 Fig. 14: Proposta vencedora do Concurso Fundação Rothschild. Paris, 1905. [Construção

Moderna. Volume VII, nº195, Agosto de 1906] 84 Fig. 15: Cidades Jardins. [A Arquitectura Portuguesa, nº9 , Setembro de 1932] 96 Fig. 16: Maison Dom-Ino. Le Corbusier e Jeanneret, sem local, 1914. [Fondation Le

Corbusier] 98

Fig. 17: Cité-jardin aux Crétets. Le Corbusier e Jeanneret, La Chaux-de-Fonds, 1914.

[Fondation Le Corbusier] 98

Fig. 18: Letchworth. Robert Unwin e Barry Parker, 1911. [Letchworth Garden City. London:

First Garden City Ltd, . London: Batsford, 1911, p. 32] 98 Fig. 19: Litografia do carré mulhousienne. Émille Muller, 1853. [AMM] 116 Fig. 20: Familistério de Guise. Jean Baptiste Godin, 1859. [Serões – revista mensal illustrada.

Vol. I, nº 3, Maio e Junho de 1901] 128 Fig. 21: Kapelleveld, Cité-Jardin, Bruxelas, Louis van der Swaelmen, 1922-1926.

[Cités-Jardins 1920 - 1940 en Belgique. Bruxelles: Archives d’Architecture Moderne,1994] 160 Fig. 22: Bairro Económico para Lisboa. Adães Bermudes, 1897. [BNP] 182

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Fig. 23: Bairro da Companhia Portuense de Casas Económicas na Rua Costa Cabral

[BHP_84]. Implantação, Processo Licenciamento, 1919 [AHMP] 192 Fig. 24: Bairro da Companhia Portuense de Casas Económicas na Rua Costa Cabral

[BHP_84]. Projecto de casas C, Processo Licenciamento, 1919 [AHMP] 192 Fig. 25: Bairro Social - Ministério do Trabalho. Adães Bermudes, Caetano de Carvalho e

Edmundo Tavares, 1919. [Arquivo da Câmara Municipal de Lisboa – Arco de Cego] 194 Fig. 26: Arco do Cego – Secretariado de Propaganda Nacional. Fotografia Mário Novais c.

1930 [Arquivo Fundação Calouste Gulbenkian] 194 Fig. 27: Cooperativa Grupo Dez de Maio. Arq. José Ferreira Penêda, Porto,1926. [A

Arquitectura Portuguesa, nº30, 1926] 198 Fig. 28: Cooperativa Grupo Dez de Maio., Rua do Seixal. Arq. Aucíndio dos Santos, 1929.

[AHMP] 198

Fig. 29: Bairro da Seguradora “A Garantia”, Rua do Amial, 1929. [AHMP] 200 Fig. 30: Bairro da Companhia de Seguros “O Trabalho”, Rua Costa Cabral, 1928. [AHMP] 200 Fig. 31: Bairro da Construtora Portuense de Casas Económicas, Rua de Monsanto, 1929.

[AHMP] 202

Fig. 32: Moradias Económicas Alto da Pasteleira [BHP_214]. Arqt.º Joaquim Madureira, 1937.

[AHMP] 204

Fig. 33: Levantamento da Ilha de S. Vítor. Arquitectos Joaquim Madureira e Amoroso

Lopes, c. 1930 [Arquivo Pessoal António Madureira] 210 Fig. 34: Zona industrial do Campo 24 de Agosto, Bonfim. Domingos Alvão, c. 1900 [A

cidade do Porto. Alvão 1872-1946. Porto: Edição da Fotografia Alvão, 1984] 216 Fig. 35: Zona industrial do Campo 24 de Agosto, Bonfim. Foto Guedes, c. 1900 [AHMP] 216 Fig. 36: Distribuição topográfica dos surtos de tuberculose no Porto. António de Almeida

Garrett, 1912. [Tuberculose e habitação no Porto. Porto: Enciclopédia Portuguesa,

1914] 232

Fig. 37 (Gráfico A): Número de fogos por freguesia verificado ao ano. [Fonte dos dados:

Instituto Nacional de Estatística] 240 Fig. 38 (Gráfico B): Superfície (m2) por habitante verificada ao ano. [Fonte dos dados:

Instituto Nacional de Estatística] 240 Fig. 39: Planta de localização dos bairros BHP a partir do sistema anelar de Ezequiel de

Campos, sobre cartográfica de 1963 242 Fig. 40 (Gráfico C): Número de fogos e área dos lotes por zona urbana anelar. [Fonte:

bd_BHP] 244

Fig. 41: Os mal alojados. Plano Geral de Urbanização da Cidade do Porto, 1948. [Arquivo

Histórico da DGOTDU] 246

Fig. 42: Monte Aventino na Planta de Telles Ferreira de 1892. Bairro do Comércio do Porto

(1901) e o traçado da futura Avenida Fernão de Magalhães 252 Fig. 43: Exemplos de Distribuição quadrilátera: Proposta de Cottineli Telmo (1933) e Bairro

da CP (1931). [Arquitectura Portuguesa, nº 8, Setembro 1933/ Arquitectura

Portuguesa, nº7, Julho1931] 256 Fig. 44: Composição Bairro de António Ramos Pinto, Porto. Francisco de Oliveira Ferreira,

1927. [AHMP] 256

Fig. 45: Monte Pedral na Planta de Telles Ferreira de 1892. Marcação do Bairro do Comércio

do Porto sob malha preestabelecida. 258 Fig. 46: Companhia Fabril Salgueiros. Gravura c. 1910 [Exposição de Arqueologia

(17)

XVII

Industrial. Porto: Associação Industrial Portuense, 1999] 262 Fig. 47: Monte Pedral no Levantamento aéreo-fotométrico de 1939. Bairros BHP (azul);

Industrias (amarelo); Equipamentos públicos (púrpura). 262 Fig. 48: Bairro Rua Vila Meã. Licenciamento de Obra, 1898. [AHMP] 268 Fig. 49: Brigada de desinfestação de ilhas. Foto Guedes, 1899. [AHMP] 268 Fig. 50: “Cubagens por Habitante”. Elementos para o Estudo do Plano de Urbanização da

Cidade do Porto,1939. [Arquivo DGOTDU] 276 Fig. 51: Bairro de António Pereira Cardozo, Rua Delfim Maia. Licenciamento de Obra, 1910.

[AHMP] 278

Fig. 52: Casas operárias do Bairro de António Pereira Cardozo, Rua Delfim Maia.

Licenciamento de Obra, 1910. [AHMP] 278 Fig. 53: Bairro em S. Vitor. Licenciamento de Obra, 1924. [AHMP] 282 Fig. 54: Bairro da Rua do Cunha [BHP_97]. Licenciamento de Obra, 1915. [AHMP] 284 Fig. 55: Bairro Rua Vasques de Mesquita. Licenciamento de Obra, 1928. [AHMP] 288 Fig. 56: Bairro Travessa Ribeiro de Sousa. Arq. Aucíndio dos Santos, 1933. [AHMP] 292 Fig. 57: Bairro de Rodrigo de Abreu na Rua Guerra Junqueiro. Processo licenciamento,

1907 [AHMP] 296

Fig. 58: Vila de João Machado de Castro na Rua da Carcereira. Processo licenciamento,

1927 [AHMP] 298

Fig. 59 (Gráfico D): Números de fogos por tipo de promoção verificados ao ano. [Fonte:

bd_BHP] 300

Fig. 60: Grupo de casas operárias, Estrada de Carreiros. 1910 [AHMP] 302 Fig. 61: Bairro da Fábrica da Areosa, Circunvalação. 1921 [AHMP] 302 Fig. 62: Bairro Operário do Comércio do Porto, Monte Pedral. Arq.º Marques da Silva. [A

Construção Moderna, Fevereiro de 1902] 308 Fig. 63: Bairro Operário do Comércio do Porto, Monte Pedral. Arq.º Marques da Silva, 1899 .

[FIMS] 308

Fig. 64: Plantas das casas do Monte Pedral e o do Carré Mulhousienne. [AHMP e AMM] 312 Fig. 65: Bairro O Comércio do Porto das Antas. Eng.º Gaudêncio Pacheco. [Boletim do

Trabalho Industrial, nº 66, 1912] 314 Fig. 66: Bairro O Comércio do Porto das Condominhas. M.O. Fortunato d’Oliveira Motta.

Fotografia, 1947. [AHMP] 314 Fig. 67: Projecto de casa de banhos públicos. Eng.º João Carlos d’Almeida Machado, 1899.

[AHMP] 318

Fig. 68: Projecto de habitações para bairros operários. Tipo nº 3A. [AHMP] 318 Fig. 69: Planta geral d’um bairro [de] qualquer dos 6 tipos de casas. Sem data e autor.

Extracto a partir do desenho original. [AHMP] 320 Fig. 70: Projecto de habitações para bairros operários. Tipo nº1. Sem data e autor. Extracto a

partir do desenho original. [AHMP] 320 Fig. 71: Colónia Operária Viterbo Campos. Foto Guedes, c.1930. [AHMP] 332

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Fig. 72: Unidade de quatro casas. Colónia Operária Viterbo Campos, Arrábida, 1914. Eng.º

Aníbal de Barros (assinatura). [AHMP] 332 Fig. 73: Sector Poente da Colónia Operária do Dr. Manuel Laranjeira. Fotografia Guilherme

Barreiros, 1947. [AHMP] 334

Fig. 74: Colónia Operária do Dr. Manuel Laranjeira. Rua de Augusto Leça, Salgueiros, 1933.

[AHMP] 334

Fig. 75: Plano geral do Bairro Social da Arrábida, c. 1919. Marcação dos equipamentos e

Colónia Operária Viterbo de Campos. [AFS 340 Fig. 76: Bairro Social da Arrábida - Casa Tipo A e B, c. 1919. [AFS] 340 Fig. 77: Bairro Labor Honor, Rua Egas Moniz, 1928 [AHMP] 346 Fig. 78: Bloco de habitações Económicas dos Bombeiros Municipais, Rua do Moreira

[BHP_77]. Serviços Municipais, 1933. [AHMP] 348 Fig. 79: Bloco de Habitações Económicas, Rua Barão de S. Cosme [BHP_120]. Serviços

Municipais, 1937 [AHMP] 348

Fig. 80: Bloco de Habitações Económicas. Sem local. Serviços Municipais, 1937 [AHMP] 348 Fig. 81: Bloco Tipo com galeria. 3ª Repartição, c. 1936. [AHMP] 350 Fig. 82: Blocos de Habitações Económicas, Rua de S. Crispim, c. 1936. [ANDRADE, A. J.

Monteiro de – “Casas Económicas”. In, Separata do Boletim de Higiene e sanidade.

Porto: Tipografia Leitão, 1937] 350 Fig. 83: Bloco de Habitação Duque de Saldanha. Fotografia c. 1940 [AHMP] 354 Fig. 84: Carta de localização dos bairros públicos. 1ª Repartição, 1945 [AHMP] 356 Fig. 85: Esboço de proposta para S. Vítor (SAAL). Álvaro Siza Vieira, c. 1975. [MOMA] 368

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XIX SUMÁRIO GERAL

1. Apresentação

1.1. Princípio 3

1.2. A delimitação espacial e temporal como problema 13 1.3. Contra as ilhas: formulação do objecto de estudo 27 1.4. A prática da História em Arquitectura e os seus documentos 36

1.5. Disposição da tese 51

2. Estudar as novas soluções de habitação popular: introdução ao tema

2.1. Bairros de habitação popular: etimologia e acepção 55 2.2. Uma arquitectura menor: prenúncios de modernidade 67 3. O alojamento operário e a (re)formulação da cidade:

constituição dos modelos

3.1. Movimentos europeus para a reforma da habitação económica 103 3.2. Contributos para uma leitura nacional sob o signo do higienismo e da

economia social 132

4. Bairros de habitação popular no Porto,1899-1933: casas simples exemplares

4.1. Os Tempos difíceis e a Situação da classe trabalhadora. Anacronias na

industrialização portuense 207

4.2. Para uma cartografia da arquitectura do trabalho 229 4.3. Formulação das novas soluções de habitação popular 265 5. A prática de uma arquitectura económica, saudável e

cómoda nas vésperas do Moderno A. Fontes e bibliografia

B. Bairros de habitação popular projectados para a cidade do Porto, 1894-1938: Fichas de identificação e caracterização C. Cartografia de localização e análise

(20)
(21)

XXI SUMÁRIO ANALÍTICO 1. Apresentação 1.1. Princípio 3 Introdução 3 Premissas e objectivos 7

1.2. A delimitação espacial e temporal como problema 13 1.3. Contra as ilhas: formulação do objecto de estudo 27 1.4. A prática da História em Arquitectura e os seus documentos 36

Correlato objectivo e metodologia narrativa 36 O corpus documental e o universo da análise 42 Arquivo Histórico Municipal do Porto 46

Outros arquivos 48

1.5. Disposição da tese 51

2. Estudar as novas soluções de habitação popular: introdução ao tema

2.1. Bairros de habitação popular: etimologia e acepção 55 2.1.1. Da sua utilização e promoção: habitação operária ou popular? 56

2.1.2. Da sua produção: casa económica ou barata? 62

2.2. Uma arquitectura menor: prenúncios de modernidade 67

2.2.1. A arte maior da pichelaria 68

2.2.2. Desenho científico da casa operária 79

2.2.3. Cités Ouvriéres, Garden-cities. Hortos operários ou jardins

burgueses? 89

3. O alojamento operário e a (re)formulação da cidade: constituição dos modelos

3.1. Movimentos europeus para a reforma da habitação económica 103

3.1.1. A cidade a reformar 103

3.1.2. Mulhouse, 1853: apologia da casa individual familiar com jardim 110 3.1.3. Guise, 1856: arquétipo do alojamento colectivo associativista 122 3.2. Contributos para uma leitura nacional sob o signo do higienismo e da

(22)

3.2.1. O francesismo português 133

3.2.2. A formulação higiénica 136

3.2.3. O debate político e a Economia social 163

4. Bairros de habitação popular no Porto,1899-1933: casas simples exemplares

4.1. Os Tempos difíceis e a Situação da classe trabalhadora. Anacronias na

industrialização portuense 207

4.1.1. A “questão dos mal alojados” 212

4.1.2. Estádio prévio 224

4.2. Para uma cartografia da arquitectura do trabalho 229

4.2.1. Circunscrição do espaço operário 229

4.2.2. Monte Aventino: um campo de estudo 251

4.2.3. Monte Pedral: zonamento informal a partir da fábrica 257 4.3. Formulação das novas soluções de habitação popular 265 4.3.1. A regulação do construído e os bairros de rendimento 265

Casas de transição nas ilhas 277 Reforma sanitária e reformulação da casa simples 287 Ilhas proletárias e Bairros de pequeno rendimento: continuidades morfológicas 294

4.3.2. Filantropia e compaixão burguesa. O protagonismo do Comércio

do Porto 301

4.3.3. Bairros de promoção pública 316

A habitação no plano de melhoramentos: colónias operárias municipais 316 O breve episódio do Bairro Social Sidónio Pais 337 O Bloco dos Bombeiros Portuenses: modelo precursor do Bloco de Saldanha 343

5. A prática de uma arquitectura económica, saudável e cómoda nas vésperas do Moderno

Habitação portuense mínima 365 Síntese final: habitação económica saudável e cómoda nas vésperas do Moderno 369

A. Fontes e bibliografia

I. Arquivos e bibliotecas 375

II. Fontes manuscritas 375

III. Fontes Impressas 376

IV. Bibliografia internacional sobre habitação 387

(23)

XXIII

VI. Bibliografia de contextualização internacional 391

VII. Bibliografia de contextualização nacional 392

VIII. Bibliografia crítica 395

B. Bairros de habitação popular projectados para a cidade do Porto, 1894-1938: Fichas de identificação e caracterização

I. Introdução 399

II. Organização das fichas individuais 400

III. Parâmetros de caracterização 401

IV. Catálogo de fichas individuais de obras 407

(24)
(25)

1 1. APRESENTAÇÃO

(26)
(27)

3 1.1. Princípio

Introdução

Esta tese decorre das acções de investigação desenvolvidas nos últimos anos sobre a arquitectura da casa tendo como referente temático, geográfico e temporal, conjuntos de habitações económicas – aqui designados genericamente de bairros de habitação popular – construídos na cidade do Porto no primeiro terço do século XX.1

Foram de diversa ordem os estímulos que conduziram à eleição deste objecto de estudo. Destaca-se o interesse prévio pelos processos de democratização do conforto doméstico2 associados à transformação do desenho da casa. Uma atenção particular foi dada à regulamentação de natureza sanitarista que no início do século XX impôs, per si, significativas alterações dimensionais, funcionais e compositivas na habitação.3 Assim, uma fase preparatória a este trabalho foi consagrada ao tema estruturante do higienismo aplicado à arquitectura residencial de final de Oitocentos, o que resultou na publicação de alguns textos focados nas campanhas de moralização e normalização do quotidiano e na inventiva técnica então desenvolvida para a emancipação do uso da casa.4

1 A dissertação teve a sua génese no Projecto de Tese - A habitação popular no Porto, 1899 - 1933. A prática de uma arquitectura económica, saudável e cómoda nas vésperas do modernismo - elaborado no âmbito do Programa de Doutoramento em Arquitectura da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto (perfil de estudos: Projecto do Espaço Habitacional e Formas de Habitar) cuja discussão pública ocorreu em Setembro de 2010.

2 Ver, por exemplo, a leitura que faz do tema o autor francês Roger Henri Guerrand, sinteticamente apresentada em, GUERRAND, Roger Henri – “Aux origines du confort moderne”. In, LUCAN, Jacques, coord. - Eau et Gaz a Tous les Etages. Paris, 100 ans de logement. Paris: Édition du Pavillon de l’Arsenal; Picard Éditeur, 1992, pp. 14 – 29

3 A este propósito deve ser referida a obra incontornável, MOLEY, Christian - L’Architecture du Logement. Culture et logiques d’une norme héritée. Paris: Economica/Anthropos, 1998

4 GONÇALVES, Eliseu – “Das casas octogonais de Orson Fowler à ‘Casa de amanhã’”. Revista Resdomus. Nº1. Porto: FAUP, 2012. http://resdomus.blogspot.pt/2009/07/das-casas-octogonais-de-orson-fowler.html GONÇALVES, Eliseu – “The Octagon in the Houses of Orson Fowler”. In, Nexus Network Journal - Architecture and Mathematics. Basel: Birkhauser/ KWB, 2011

GONÇALVES, Eliseu – “Das Casas Octogonais de Fowler à Dymaxion House de Fuller: do Panóptico ao Panorama. Migrações, errâncias e continuidades no advento do Moderno”. Disponivel em http://www.pequenacasa.blogspot.com/2010/05/das-casas-octogonais-de-fowler-dymaxion_07

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No centro dessas questões encontrava-se a emancipação das ciências médicas. Como afirmou Foucault, em última instância, mais do que um corpus de técnicas de cura e saber, a medicina passou a ser o núcleo dinamizador do conhecimento do homem saudável para uma definição do homem modelo. Para a conformação moderna da sociedade, esses procedimentos sublinhavam “un certain bonheur organique, lisse, sans passion et musclé, communique de plein droit avec l'ordre d'une nation, la vigueur de ses armées, la fécondité de son peuple et la marche patiente de son travail”.5

De entre os métodos usados pelos médicos, o sucesso dos aplicados pelos higienistas a favor da saúde pública contribuiu para elevar a disciplina da Higiene ao estatuto de instituição pública universal. A sua importância na reforma dos hábitos e dos espaços seria sublinhada, por exemplo, quando na Exposição Universal de Paris, em 1889, lhe foi dedicado um pavilhão com a epígrafe Mens Sana in Corpore Sano.6 Quem visitasse Le Palais de L’Hygiène deparava-se com uma exposição centrada no tema da “Hygiène de l’Habitation”, louvando a água e o ar puro, a luz, os costumes próprios, a assistência pública. Com ramos do exercício especializados, desde a tecnologia sanitária à patologia clínica, esta nova ordem patrocinou e legitimou instrumentos de controlo normativos que foram gradualmente intervindo nos modos e nas formas de habitar.

Sobre a importância do pendor higienista nas alterações verificadas ao nível da cidade e da casa, note-se, sumariamente, o que alguns autores confirmam para diversas geografias. Por exemplo, para o território francês Monique Eleb observa o seguinte:

Outre le moyen de lutter contre le risque de propagation des épidémies aux autres classes de la population et la possibilité de s’assurer une main-d ‘ouvre résistent et en bonne santé, l’hygiène représente avant tout l’accession à la moralité. Cette conception

5 FOUCAULT, Michel – Naissance de la clinique. Paris: Presses universitaires de France, 1963, p. 35

6 LE ROUX, Hugues – “Le Palais de L’Higiène”. In, Revue de la Exposition Universel. Paris: Librairies des Imprimeries Réunies, 1889, p. 64

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5 sera un guide dans les formes urbaines, les formes architecturales jusqu’aux sphères intimes de l’habitation.7

No exame ao contexto espanhol, Maria Castrillo Romón8 enfatiza com Ildefonso Cerdá (1815-1876) o reformismo positivista que os higienistas impuseram à cidade industrial ao afirmar:

El papel de la Higiene en el movimiento de reforma del hábitat ha sido crucial. Por un lado, en un contexto progresivamente dominado por el positivismo, estableció puentes entre las ciencias biomédicas y la intervención sobre el espacio, con lo que cubrió las aspiraciones de cientifismo de la práctica urbanística y edificatoria. Por otro lado, el alto grado de consenso político forjado en torno a la higiene allanó el camino para la profunda reorganización del hábitat que el reformismo, (guiado no sólo por estrictos fines sanitarios) impulsó a todas las escalas, desde la ciudad al interior doméstico. 9 Quando se refere a causa sanitária e higiénica na transformação do espaço devem ser colocadas na mesma equação de responsabilidades a quota-parte de outros agentes não médicos igualmente comprometidos. Isto é visível de forma especial quando se analisa a aproximação do controle da autoridade pública à propriedade privada e, consequentemente, ao espaço doméstico da casa. Neste contexto de alteração das fronteiras entre a esfera do privado e do público, George Teyssot elenca um conjunto de forças que gradualmente começaram a agir sobre os processos de construção da cidade, chamando a si tanto os problemas de desenho do espaço urbano como os da simples casa:

É probabile quindi che il bastione del privato, dell’intimo, del domestico non sia più una zona di rifugio e di protezione che si erge a difenderci dalla sfera pubblica […] ma che essa sia stata fagocitata dallo sguardo vorace dei numerosi “esperti” che, dalla seconda 7 ELEB, Monique, DEBARRE, Anne – L’Habitation Ouvriere.- Architectures de la vie privée. XVII XIX siècles. Paris: Éditions Hazan et Archives d'Architecture Moderne, 1999, p.141

8Maria Castrillo Romón é professora na Universidade de Vallodolid tendo desenvolvido aprofundadamente as questões do alojamento operário em Espanha vinculando a esses estudos o carácter reformista das transformações da cidade industrial, nomeadamente, implicando nele o papel dos higienistas. De entre a sua obra destaca-se o livro, ROMÓN, Maria A. Castrillo – Reformismo, vivienda y ciudad: orígenes y desarrollo de un debate: España 1850-1920. Valladolid: Instituto Universitario de Urbanística, Universidad de Valladolid, Secretariado de Publicaciones, 2001.

9 ROMÓN, Maria A. Castrillo – “Vivienda social y planificación urbanística: vestígios reformistas en la prática actual”. In, Revista de Sociologia. Nº13. Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2003, p.154

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metà dell’Ottocento, cominciano a voler progettare di tutti: medici, igienisti, criminologi, riformatori, ingegneri, architetti, decoratori, mobilieri, giudici, assistenti sociali, economisti, sociologi, psicologi, psichiatri. Tutta una fiera armata di portatori di sapere, quindi di poteri, che investono con armi e bagagli la soglia dell’abitazione e distillano gli umori privati al fuoco di cento scienze.10

A Higiene, quando considerada no seu sentido mais lato, apresenta-se como a mais transversal e profícua palavra de ordem de Oitocentos contra as práticas desviantes da industrialização. Para a situação portuguesa, em raras ocasiões esta premissa higienista tem sido avaliada, nomeadamente, quanto à sua responsabilidade na reconfiguração da cidade e do espaço doméstico. Rui Jorge Garcia Ramos, no trabalho que desenvolveu sobre a arquitectura da casa na primeira metade do século XX, refere exactamente esse défice de estudos sobre a Higiene enquanto poder exterior à disciplina que, atuando sobre o espaço e sobre o indivíduo, implícita ou explicitamente, molda o projecto de arquitectura.11

É no espaço da família, como célula social formalizada espacialmente num tipo identificado, que o legislador ou o higienista irão encontrar o campo de acção mais incisivo para o seu controlo social e espacial. – Neste campo, a investigação fundamental é escassa. 12

Dos trabalhos em língua portuguesa referidos como excepcionais, somente a publicação em 2002 de Alexandra Trevisan e Isabel Matias sobre a prestação do médico Ricardo Jorge (1858-1939) no desenvolvimento de medidas de combate à insalubridade no Porto, denominada Higiene e salubridade no Porto,13 se debruça sobre um caso nacional. Entretanto, foi editada a investigação de Tiago Saraiva sobre o papel da Ciência na reforma da cidade de Lisboa tendo como contraponto

10 TEYSSOT, Georges – “Figure d’interni”. In, TEYSSOT, Georges, coord. – Il progetto domestico. Milano: Trienale di Milano/ Electa Editrice, 1986, p.21

11 RAMOS, Rui – A Casa. Arquitectura e Projecto Doméstico na Primeira Metade do Século XX Português. Porto: FAUP Publicações, 2010, p.42 . Nota-se que esta publicação derivou da tese de doutoramento defendida em 2005 intitulada: A Casa Unifamiliar Burguesa na Arquitectura Portuguesa: mudança e continuidade no espaço doméstico na primeira metade do século XX.

12 Idem, p.43

13 TREVISAN, Alexandra, MATIAS, Isabel – Higiene e Salubridade no Porto (1850-1930). Porto: Centro de Estudos Arnaldo Araújo da CESA/ESAP, 2002

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7 Madrid, ambas apresentadas como cidades periféricas à dinâmica médica centro europeia.14 Ainda em 2005 saiu a público o estudo desenvolvido por André Tavares sobre a obra da Clínica Heliântia em Francelos (Vila Nova de Gaia)15 - protagonista de um enredo complexo e heterogéneo que permite entender a vasta rede de interesses multidisciplinares onde era tecido o projecto de arquitectura no início do século. Interessa, por fim, sublinhar a investigação conduzida por Nelson Mota sobre o espaço doméstico da burguesia portuense no final do século XIX, nomeadamente, na sua transformação devido à assimilação de novos hábitos e dispositivos sanitários.16

Face a este alinhamento da produção teórica, a proposição inaugural do estudo que sustenta esta dissertação ficou definida pelo alargamento da problemática relação entre Arquitetura e Ciência, sobretudo por via do higienismo, ao caso particular da habitação corrente erguida naquelas décadas tidas como embrionárias da arquitectura moderna em Portugal.

Premissas e objectivos

A ênfase atrás elaborada sobre o papel da Higiene na renovação do pensamento urbanístico e arquitectónico finissecular importa ser contrabalançada no intuito de manter a reserva suficiente para o discernimento de sofismas e desenvolvimento de uma visão holística dos fenómenos. Um dos cépticos sobre o estudo da cidade assente exclusivamente na razão da Higiene foi Manuel Solà-Morales. Em 1982 escrevia:

[...] conviene no suscitar demasiado de prisa el argumento general que ve en el pensamiento higienista una de las raíces más fuertes de la urbanística moderna. 14 SARAIVA, Tiago - Ciencia y ciudad. Madrid y Lisboa, 1851-1900. Madrid: Ayuntamiento de Madrid, 2005 15 TAVARES, André – Arquitectura Antituberculose, Trocas e tráficos na construção terapêutica entre Portugal e Suíça, Porto, FAUP Publicações, 2005

16 MOTA, Nelson Jorge Amorim – A Arquitectura do Quotidiano – Público e privado no espaço doméstico da burguesia portuense no final do século XIX. Coimbra: Edarq - Edições do Departamento de Arquitectura da Universidade de Coimbra, 2010

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Es difícil distinguir entre circunstancias concomitantes y causas más o menos directas de este movimiento. Las medidas sanitarias.

[...] ¿responden al alza de la demografía urbana o, al contrario, a las muertes epidémicas? ¿Siguen el manifiesto anti-urbano contra los males de la gran urbe, o están luchando por modernizarla y perfeccionarla? ¿Es reforma social o ingeniería? ¿O ambas cosas a la vez? 17

Em rigor, os problemas sanitários e demográficos mais agudos das cidades industriais resultaram em surtos pestilentos graves, facto que forçou um apertado controle físico e moral como acção maior da segurança da saúde pública. Fazer a cidade higiénica implicava transformar a vida dos seus habitantes, alterar costumes, inventar tecnologia ambiental e doméstica, controlar o espaço público e tudo que lhe era adjacente e complementar. Nessa circunstância de emergência destaca-se a necessidade de definir novos programas arquitectónicos e urbanos no âmbito das medidas pro-sanitárias.18 Ou seja, por via da imperiosa necessidade de cultivar hábitos sadios e remover os focos de insalubridade, as elites ver-se-ão constrangidas a transformar ou recriar rapidamente os espaços da cidade, particularmente aqueles directamente referentes à vida do operariado.

Na hierarquia das reformas levadas a cabo a partir dessa persuasão político-higiénica, foram primeiro atacadas as práticas sociais indecorosas ou sórdidas das classes indigentes e a morbidez do seu espaço habitacional. Ora, a questão do alojamento operário encontrava-se no ponto de intercepção desses dois tipos de preocupações dos higienistas e reformadores: habitus e habitat.

Um ilustre estudioso do impacto da Higiene na modificação dos hábitos e dos espaços - Roger-Henri Guerrand19 - demonstrou em Les Origines du Logement Social en France, 1850-1914, estudo incontornável da sociologia urbana, que a resposta francesa à crise do alojamento das massas deu-se em dois tempos: um primeiro, 17 RUBIÓ, Manuel de Solà-Morales – “Ensanche y saneamento de las ciudades”. In, MATEU, Montserrat, coord. - Vivienda y urbanismo en España. Madrid: Banco Hipotecario de España, 1982, p. 176

18 LUCAN, Jacques – “Les Points Noirs des îlots Insalubres”. In, LUCAN, Jacques, coord. - Eau et Gaz a Tous Les Etages. Paris: Picard Éditeur,1992, p. 78

19 Roger-Henri Guerrand (1923-2006), professor na École d’Architecture de Paris, importante historiador e sociólogo françês com uma obra vasta dedicada à cultura material relacionada com os hábitos da higiene e da sua influência na vida urbana. No âmbito do presente trabalho refere-se a obra estruturante para o conhecimento da habitação social em França, Les origines du logement en France, redigida em 1966.

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9 iniciado em finais de Setecentos, criou uma tradição regulamentar e filantrópica; um segundo, a partir de meados de Oitocentos, no seio do liberalismo, integrou os interesses imobiliários e patronais. Nesta última fase, passadas as utopias sociais, alojar o povo segundo os preceitos da higiene tinha um triplo interesse: material, moral e nacional.20 Também, a propósito da alteração dos rituais de limpeza e higiene pela inclusão da água potável no quotidiano urbano e doméstico, Jean-Pierre Goubert21 nota que foi a propósito da higiene da habitação popular que se estabeleceu um programa de reformas para a segurança da própria estrutura social:

L’ordre des corps, l’ordre de la famille, l’ordre des mœurs constituent trois pilleurs sur lesquels repose une “société de sécurité”. Lieu de l’intimité, de la fécondité et du devoir conjugal, le logement est investi d’une valeur sociale et culturelle qui, en raison de sa possible amélioration, sert à la condamnation des “visses” et des “fléaux sociaux” come à la glorification de ses antidotes.22

Por esta via, a questão do alojamento urbano das massas apresentava-se como um dos grandes problemas sociais do século XIX que se iria manter nas primeiras décadas do novo século numa larga maioria das cidades ocidentais. Guerrand afirmou que, pela primeira vez na história, “le rapport de l’homme à sa maison et l’articulation de cette cellule à la communauté urbaine furent posés en toute netteté, suscitant même les expériences les plus hardies”. 23

Sem descurar a situação alemã e inglesa, ou alguns momentos particulares na Espanha, Itália e Bélgica;24 no caso francês, o vigor ideológico, filosófico e produtivo, 20 FLAMAND, Jean-Paul – Loger le Peuple. Essai sur L’histoire du Logement Social. Paris: Éditions la Découverte, 1989, p. 58

21 Jean-Pierre Goubert (1915-2012), tal como Guerrand, foi um autor ligado à história das mentalidades e dos hábitos criada ao redor da escola dos Annales que associava a metodologia das Ciências Sociais à História. À volta da revista Annales d’Histoire Économique et Sociale, encontram-se outras figuras citadas, importantes para a leitura da cultura material no contexto da habitação e da própria construção da investigação: Lucien Febvre, Alain Corbin ou Georges Duby.

22 GOUBERT, Jean-Pierrre - La conquête de l’eau. - L’avènement de la santé à l’âge industriel. Paris: Éditions Robert Laffont, 1986, p. 239

23 GUERRAND, Roger-Henri – Les Origines du Logement Social en France, 1850-1914. Paris: Éditions de la Villette, 2010 [1987], p.19

24 Para uma verificação mais exaustiva da produção de bairros operários na Europa e Estados Unidos, consultar o capítulo “Las ciudades especializadas del trabajo e del tiempo libre” em: SICA, Paolo – História del Urbanismo. El Siglo XIX. Volumen 2º. Madrid: Instituto de Estudios de Administración Local, 1981 [1977], pp. 905-980

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o refinamento, complexidade e escala de grandeza dos meios usados deram origem a notáveis soluções urbanísticas e arquitectónicas que se anunciam parte fundamental das experiências precursoras das vanguardas modernas, incluindo o programa colectivo do Movimento Moderno.25

[A habitação social] fut un lieu d’expérimentation dans les domaines de l’urbanisme, de l’architecture, de la construction, des outils du confort, mais aussi de l’ingénierie sociale, dans le sens du démontage/remontage, quasi mécanique, des strates sociales pour en obtenir un ajustement plus fin, plus adéquat, aux finalités de la société telle que pensée par ses promoteurs. […] Les habitations à bon marché, puis les habitations à loyer modéré, furent dans le même mouvement un des lieux d’entraînement, d’expérimentation, et un des lieux de concrétisation de l’idéologie modernisatrice. Au coeur de celle-ci on trouve la rationalité productiviste, sous toutes ses formes et dans toutes ses composantes idéologiques. L’exaltation de la productivité, articulation agissante de scientisme technocratique et d’économisme plus ou moins teinté d’humanisme ou de socialisme.26

A transformação da casa em máquina de habitar democratizada foi resultado de um conjunto de causas que a premência higienista parece ter agregado e impulsionado. Com trajectórias, intensidades e desfechos particulares, os processos em busca da resposta ideal à habitação popular insalubre urbana não deixam de revelar alguma universalidade tal foi a violência do impacto da industrialização na vida das médias e grandes cidades.

A partir destes dados pode extrapolar-se quer sobre a presença de um quadro de 25 Esta leitura de continuidade histórica, de negação do carácter a-histórico das vanguardas modernas dos anos de 1920 e 1930, de contaminação por outras áreas do saber, pode ser observada na introdução que Leonardo Benevolo escreveu à sua História da Arquitectura Moderna:

“É necessário, portanto, alargar o campo de observação e examinar directamente muitos factos técnicos, sociais, económicos que, de 1750 em diante, sofrem rápida mutação, mesmo que inicialmente não fique evidenciada, de imediato, sua conexão com a arquitectura. Em vários campos, dentro e fora dos limites tradicionais, vêm-se emergir novas exigências materiais e espirituais, novas ideias, novos instrumentos de participação que, num ponto determinado, confluem numa nova síntese arquitectónica, profundamente, diversa da antiga. Assim, é possível explicar o nascimento da arquitectura moderna que, de outra forma, seria totalmente incompreensível; com efeito, se nos limitássemos a uma história das formas, dever-se-ia postular uma nítida solução de continuidade, um rompimento em relação à tradição, que pode ser formulado em termos de polémica, mas que não é historicamente admissível. – O movimento moderno está profundamente enraizado na tradição cultural europeia, e está ligado ao passado por meio de uma sucessão gradual de experiência.” In, BENEVOLO, Leonardo – História da Arquitectura Moderna. São Paulo: Editora Perspectiva, 2001 [1960], pp. 11-12

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11 preocupações semelhante em Portugal, quer sobre o equacionamento dado ao problema português do alojamento das classes laboriosas. Neste contexto, duas interpelações essenciais interessam desde já ser colocadas.

Quais foram os esforços realizados para travar a reprodução da habitação lúgubre comummente aceite como maléfica ao organismo urbano?

Pergunta indissociável de uma segunda dúvida sobre os modelos, programas ou outros antídotos implementados no quadro do desenho da casa.

Quais as práticas arquitectónicas na formulação das novas soluções da habitação económica?

Propõe-se verificar estas hipóteses de trabalho para o caso da cidade do Porto, colmatando, em simultâneo, o vazio de estudos sobre a arquitectura da habitação popular aí realizada, moldada nos termos atrás delineados e indexando-a a um contexto nacional e europeu.

Os conjuntos de casas baratas, construídos ou pensados como contraponto às denominadas ilhas portuenses, constituirão nesta dissertação o corpo de aferição da casa simples ideal debatida na época. Insólitas na tradição construtiva local, importa inquerir estas novas soluções de habitação salubre porque elas podem carregar mutações no tipo de casa corrente existente, ou a sua superação. Por fim, um estudo sobre este género de habitação pode potenciar outras perspectivas sobre a real amplitude da actividade imobiliária das ilhas no princípio do século XX no contexto das fortes restrições colocadas aos focos de maior insalubridade e dos incentivos públicos ao melhoramento higiénico na cidade. Deseja-se capturar a complexa rede de interesses onde a produção da habitação foi tecida a partir de uma análise que partindo das características formais e funcionais do espaço doméstico permita desmontar fenómenos ligados às políticas da infraestruturação urbana, dos planos de embelezamento, às estratégias de arrumação da população no tecido urbano, às

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expectativas de emancipação social do operariado, à actividade imobiliária, à vigilância normativa do poder político, ou aos modelos habitacionais mais consentidos. Neste sentido, espera-se construir conhecimento que esclareça sobre a genealogia da arquitectura da habitação económica, saudável e cómoda nas primeiras três décadas do século XX. Tomando as palavras de António Pizza, constitui o objectivo mais abrangente da presente investigação contribuir para a caracterização dessa génese formativa e estabelecer leituras críticas do seu processo a partir do caso portuense.27

27 PIZZA, Antonio – “La construcción del passado”. In, DC - Revista semestral de Crítica Arquitectónica. Nº 2. Barcelona: Departament de Composició Arquitectónica - ETSAB-UPC, 1999, p.119

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13 1.2. A delimitação espacial e temporal como problema

No título da presente dissertação – Bairros de Habitação Popular no Porto, 1899-1933 – identifica-se, sumariamente, o objecto de estudo e a sua circunstância espacial e temporal.

Tendo como corpo de análise soluções promovidas no Porto, procurou-se extrair aquelas que ilustrariam com níveis diferenciados de intensidade os sinais de um tempo em acelerado ritmo de crescimento urbano no quadro de diferenciadas dinâmicas históricas. Coincidem essas soluções com a reivindicação, para a cidade, de símbolos de modernidade e meios de progresso ostentados nas principais cidades europeias tidas como modelos civilizacionais. Integram-se num ciclo que fecha nos anos de 1930 onde foi previamente discutida a preponderância da dministração central na resolução do défice de habitação digna. Ou seja, estão essas soluções associadas em diversos graus ao momento seminal onde se define o sentido de habitação social num quadro político dominado por constantes oscilações na paz social e impasse quanto às respostas a dar à questão social do alojamento operário. É, pois, expectável que se observem processos de instrumentalização e normalização do espaço habitável. Para mais, sabe-se que o acesso a esse género de habitação mínima para substituir as ilhas, ou os pátios, era socialmente orientado, apontando directamente as famílias beneficiadas e liberalizando o mercado de arrendamento, o que significava uma seriação social por níveis de rendimento familiar. A resolução do problema habitacional das classes baixas é assim colocada numa malha de questões que combina os aspectos culturais, materiais e conceptuais da obra, a ideologia e o uso.

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Fig. 1: Bairro Operário O Comércio do Porto – Lordelo. M.O. Manuel Fortunato de Oliveira Motta. Porto, 1901. [O Comércio do Porto ao completar 80 anos. Porto: O Comércio do Porto,1934]

Fig. 2: Bairro de Casas Económicas do Amial. Porto, 1938.

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15 As datas escolhidas para delimitar cronologicamente o campo do estudo – 1899 e 1933 – são consideradas estratégicas quer no plano específico dos acontecimentos relacionados com a questão do alojamento operário quer no plano da cultura arquitectónica marcado pela questão do “ser moderno”. No âmbito da temática da habitação económica, o ano de 1899 foi marcado pela trágica epidemia de peste bubónica que avassalou a cidade do Porto, acontecimento responsável pelo arranque nesse mesmo ano dos bairros do jornal O Comércio do Porto e pela aceleração da reforma dos Serviços Gerais de Saúde de onde emanaria o primeiro regulamento sobre edifícios. Por sua vez, 1933 foi o ano de aprovação por plebiscito do diploma que lançou oficialmente o Programa de Casas Económicas. Ambiciosa operação no quadro da Constituição do Estado Novo, ponto de não retorno no pensamento político sobre habitação social.

As duas datas marcam, respectivamente, o fim de um período de alheamento generalizado sobre as condições de habitabilidade nas ilhas e a estabilização de um modelo de promoção habitacional fortemente vinculado à ideologia da ditadura de Salazar e à sua lógica corporativa. Se o fenómeno orgânico e local das ilhas atingiu o seu auge na segunda metade do século XIX,28 a jusante, um segundo acontecimento, programado, associado à habitação das classes desfavorecidas, marcará de modo distinto a forma urbana da cidade: trata-se da fase inicial do conjunto de bairros erguidos sob os auspícios do programa estatal das casas económicas de 193329 cujo processo Oliveira Salazar inaugura oficialmente no Porto, em 1934, ao deslocar-se ao estaleiro de S. Roque da Lameira do Bairro do Ilhéu concluído em 1935. Para além desse, numa primeira fase, foram igualmente finalizados o Bairro das Condominhas (1935), o Bairro do Amial (1938), o Bairro da Azenha (1938), o Bairro de Paranhos (1939) e o Bairro de Ramalde (1939).

Num segundo plano, contextual, marcado pelos discursos ao redor do significado 28 Esta quantificação está directamente relacionada com o salto demográfico verificado no período e o correspondente pico de construção é observado em, TEIXEIRA, Manuel C. – Habitação Popular na Cidade Oitocentista - As Ilhas no Porto. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian/JNICT,1996, p.1

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de moderno, o período proposto pode ser filiado nos ciclos históricos enunciados em bibliografia de referência cujas datas de charneira são similares. O eixo do debate, que recentra 1900 como “ano charneira na transição para uma expressão modernista em arquitectura”, 30 foi dominado pelos temas do eclectismo e do classicismo, da actualização técnica e programática no quadro da industrialização e da emergência da casa portuguesa enquanto arquétipo síntese da procura de uma identidade nacional.

Num conhecido texto de 1973, Nuno Portas estabeleceu, em as “Décadas Obscuras” e o “Efémero Modernismo”, duas etapas estruturadoras para a interpretação da “Evolução da Arquitectura Moderna em Portugal”. 31 Aí é dado especial relevo às derradeiras décadas de Oitocentos até ao eclodir da primeira guerra mundial, seguindo-se um período de renovação de linguagens ancorado na produção dos anos de 1930. No momento de fecho das décadas obscuras predominam as tendências realistas e eclécticas assentes no pragmatismo técnico da edificação. A maioria dos exemplos expressa uma racionalidade resultante do processo de modernização infra-estrutural e funcional do espaço doméstico que se associa a uma economia de meios, exigida pela lógica comercial do mercado imobiliário. Este posicionamento assimila timidamente os tempos modernos e marcou, sobretudo, o desenho dos prédios de rendimento e de algumas moradias particulares implantadas nas novas expansões burguesas. Durante a Primeira República alguma produção assimila as tendências internacionais Art Nouveau em simultâneo com a (re)abertura da discussão sobre a casa portuguesa como modelo para a afirmação de um estilo nacional.32 No segundo ciclo, após os anos de 1920, emergem na cena nacional as primeiras propostas alinhadas com os movimentos internacionais do Esprit Nouveau e da Bauhaus. No interior dos condicionalismos culturais e 30 RAMOS, Rui Jorge Garcia – A casa unifamiliar burguesa na arquitectura portuguesa. Mudança e continuidade no espaço doméstico na primeira metade do século XX. Volume I. Dissertação de doutoramento em Arquitectura. Porto: Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, 2004, p. 25

31 PORTAS, Nuno - “A evolução da Arquitectura Moderna em Portugal”. In, ZEVI, Bruno, História da Arquitectura Moderna. Volume II. Lisboa: Arcádia, 1973

32Para uma leitura mais abrangente consultar, RAMOS, Rui Jorge Garcia – “Casa Portuguesa”. Verbete in Fernanda Rollo, dir. – Dicionário de História da I República e do Republicanismo. Volume 1. Lisboa: Edições da Assembleia da República, 2013, p. 573-576

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17 tecnológicos do país, alguns jovens arquitectos experimentam em programas institucionais novas soluções através do recurso à depuração volumétrica e decorativa dos elementos arquitectónicos. Este ímpeto contra a linguagem figurativa dominante, que Nuno Portas apelida de “modernismo efémero”, será em diversos graus silenciado pelo aparelho do Estado Novo após 1933, tornando oficial o gosto por uma estética monumentalizadora.

Como epítome destas perturbações de início de século, uma variedade de problemas historiográficos relativos à produção e ao pensamento arquitectónico na qual se destaca a questão do arquitecto-artista de formação Beaux-Arts, o seu alheamento da realidade sociopolítica, ou o desapego empreendedor pela tecnologia do betão e do aço cuja aplicação aos programas utilitários estava a provocar noutros sectores inovações espaciais importantes.

A partir destas matérias é possível traçar a génese da arquitectura moderna ou, melhor, do sentido de modernidade em arquitectura no contexto do capitalismo industrial, remetendo-a sempre para um território de contradições.

De uma forma geral, o alinhamento vertido do estudo de Nuno Portas evoca alterações que “documentam muito claramente a sobrevivência de Oitocentos durante larguíssimos anos”33 denotando uma continuidade para além de 1900 das transformações social, política e cultural típicas da Segunda Revolução Industrial. José Augusto-França nota que certos “padrões oitocentistas prolongaram-se, ou transbordaram para o século XX”34 tornando difuso o nascimento do conceito de modernismo nas primeiras décadas: “conceito polémico em 1915, integrado em 1930, ultrapassado dez anos depois, e jamais claramente definido”, vacilando entre moda e modo de ser. 35 Definia-se Moderno como um grau maior de consciência moral, cultural e artístico de um processo histórico em “estado de ruptura” com o 33 FRANÇA, José-Augusto – A Arte em Portugal no Século XIX . Volume I. Lisboa: Bertrand Editora, 1990 [1966], p. 15

34 Idem, Volume II, p. 359

35 Sobre o moderno, Augusto-França, dirá mais tarde: “[...] entre nós, «moderno» hesitou sempre entre uma maneira de ser (modo) e uma maneira de fazer (moda), relativas ambas ao que é actual, de agora, ou de há pouco [...] Por conseguinte, há que atender na maneira como foi assumido no «modernismo» português, nas suas várias fases e pelos seus diversos proponentes e utentes”. In, FRANÇA, José-Augusto – O modernismo na arte portuguesa. Lisboa: Bertrand Editora, 1991 [1979], p. 93

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vigente para a melhoria das condições materiais da vida e modificação das relações de poder entre os grupos sociais. Ora, nessas primeiras décadas, a referida consciência nunca se tornou colectiva ou institucional, por conseguinte, nunca a construção da modernidade em arquitectura esteve comprometida com um programa sustentado de transformação social. Quando comparadas com as vanguardas, as obras modernas nacionais foram circunstanciais, inconsequentes e eminentemente fenómeno visual importado e plasmado nas correntes eclécticas de fim de século. Nas propostas mais extremas, surgidas à volta dos anos de 1920, “uma estilização modernizante” concorre com os diversos jogos expressivos do discurso ecléctico difundido a partir das academias. O ponto mais elevado é atingido já nos anos de 1930 com o racionalismo de Luís Cristino da Silva (1896-1976), Porfírio Pardal Monteiro (1897-1957), Carlos Ramos (1897-1969) ou de José Ângelo de Cottinelli Telmo (1898-1947), “involuindo” a partir daí até “uma arquitectura portuguesa, regressada, de modo estilizado, a uma visão tradicionalista das formas e dos símbolos”.36

Esta datação do moderno, que Augusto-França remonta aos primeiros anos da República, foi contestada por Pedro Vieira de Almeida ao remeter para o ano de 1900 o início da sua filogénese. A importância formativa do arranque do século fundamentou-se na leitura da obra de Raul Lino (1879-1974) e Miguel Ventura Terra (1866-1916).37 A polarização evocada ao redor destas duas personagens, segundo Vieira de Almeida, estrutura de forma paradigmática as grandes linhas de acção da arquitectura portuguesa face aos desafios da sociedade de então. Se a ruralidade e o romantismo de Lino, expressos em A Nossa Casa - Apontamentos Sobre o Bom Gosto na Construção das Casas Simples, de 1918, toma alguns exemplares da arquitectura vernacular como lições de autenticidade sobre a arte de bem construir e habitar a aplicar nas novas construções, o cosmopolitismo e o positivismo de Terra leva-o ao 36 Idem, p. 59

37Uma das justificações para a fixação de 1900 como ano marcante na estruturação de um novo modo de actuação projectual, dito modernista, recai nos projectos elaborados por Raul Lino e Ventura Terra para o concurso do pavilhão português na Exposição Universal de Paris.

ALMEIDA, Pedro Vieira – “Carlos Ramos – Uma estratégia de Intervenção”. In, Catálogo Carlos Ramos. Exposição retrospectiva da sua obra. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1986, [s.p.]

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19 domínio da “técnica aprofundada de compartimentar o espaço, de fazer circular, de desempenhar funções e de gerar conforto com o uso a recursos mínimos”38 e uma atenção particular à tecnologia edificatória do momento. Esta dualidade é clara na produção de habitação corrente urbana da qual a obra de Lino parece alhear-se. Pela “via progressista”,39 o desenho racionalista de Ventura Terra para casas de baixo custo, agrupadas em banda, considera a produção em série e o uso de novas técnicas industriais. Sobre esta gama inferior de habitação, que gradualmente toma a carteira de encomenda dos mestres, Rui Jorge Garcia Ramos interroga-se se não teria sido esse o veículo que conduziu, pela via do pragmatismo da produção da obra, ao desenvolvimento de outras metodologias de trabalho e soluções técnicas e formais:

Caberá a esta arquitectura de produção corrente, no cenário português, standardizar e tipificar o projecto de arquitectura para uma construção rápida e mais económica? O racionalismo da concepção e da construção entra assim pela «porta menor» da obra anónima e banal, de reduzidas dimensões e geralmente ignorada tanto dos currículos profissionais como da crítica? 40

A este propósito, deve ser referido o estranho caso do bairro de nove casas em banda mandado construir em 1898 por António de Oliveira Monteiro41 na já então denominada Rua Oliveira Monteiro. Do ponto de vista tipológico, destaca-se a posição da escada que gera em cada piso um núcleo de serviços contíguo à meação.

38 RAMOS, Rui Jorge Garcia – “Ser Moderno em 1900. A arquitectura de Ventura Terra e Raul Lino”. In, Actas do Colóquio “Caminhos e identidades da modernidade: 1910, o Edifício Chiado em Coimbra”. Coimbra: [s.e.], 2009, p. 31

39 Socorre-se do estabelecido por Françoise Choay quando considera os opostos: “concepção progressista” e “concepção culturalista”. Conforme, CHOAY, Françoise - L’urbanisme, utopies et réalités. Une anthologie. Paris: Éditions du Seuil, 1979 [1965], p. 7-12

40 Hipótese de leitura colocada por Rui Jorge Garcia Ramos no contexto da produção da arquitectura doméstica centrada na obra de Ventura Terra. Acrescenta-se a afirmação que foi neste tipo de experiências que mais se notou uma aproximação aos primeiros Siedlung de Peter Behrens, Heinrich Tessenow ou Hannes Mayer.

Cf. Rui Jorge Garcia – “«Produções correntes» em arquitectura: a porta para uma diferente gramática do projecto no início do século XX”. In, NW noroeste. Revista de História, nº1. Guimarães: Núcleo de Estudos Históricos da Universidade do Minho, 2005, p. 62

41 Eventualmente, tratar-se-à do médico António de Oliveira Monteiro (1842-1903), presidente da Câmara Municipal do Porto em 1887 e 1892 e Governador Civil em 1897, impulsionador das obras no Porto de Leixões ou da instalação do Serviço Municipal de Saúde e Higiene do Porto.

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Fig. 3: Bairro na Rua Oliveira Monteiro. Mestre-de-obras Manuel Gomes da Silva, Porto, 1898. [LO 262/1898 - AHMP]

Fig. 4: Vila Júlia. Arquitecto Miguel Ventura Terra, Estoril 1901-1904. [A Construção Moderna, nº 122, 1904]

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21 Para além desta clareza funcional, que concentra banho, cozinha, átrio e pequeno quarto de serviço, uma duplicação de portas nos compartimentos principais resultam numa inusitada flexibilização de uso. A configuração da planta, cuja largura total útil é de 5,6 metros, formando parcelas de 5,8 metros, parece seguir a tendência secular portuense de dividir a propriedade em lotes com 25 palmos (cerca de 5,5 metros)42.

Uma variante ao projecto será construída três anos mais tarde no Estoril pela mão de Ventura Terra, apesar de na primeira proposta de licenciamento, para o Porto, constar como único responsável o mestre-de-obras Manuel Gomes da Silva. Para além do enredo associado à paternidade do projecto convém sublinhar a viagem para sul e o desenraizamento de uma solução já de si contaminada por influências francesas, superando as suas circunstâncias produtivas e geográficas. Embora pareça não estar no propósito inicial do projecto, ele reflecte um fenómeno de repetição de “modelo[s] simples e bem equilibrado[s]” que nas primeiras décadas eram promovidos, entre outras, pelas revistas de arquitectura. Durante esses anos, assiste-se à divulgação espontânea e individual de exemplos didácticos com o objectivo de difundirem práticas simples capazes de elevar a qualidade arquitectónica da construção corrente anónima, em geral, e das casas económicas, em particular.43 No discurso misturam-se os aspectos relacionados com a dimensão mínima dos espaços, a depuração dos elementos decorativos, a disposição dos usos, as facilidades técnicas e, finalmente, a exigências da vida doméstica moderna. Mais 42 Sublinha-se que, segundo alguns autores, esta dimensão é específica do Porto Oitocentista pois esse valor aumentava o número máximo de edificios com frente de rua, reduzindo os custos de urbanização, e integrava-se no saber constructivo local cuja utilização corrente de asnas de madeira e elementos de cantaria normalizados se adequava a essa dimensão.

43 Veja-se, também, o exemplo do nº4 de Abril de 1928 da revista Arquitectura Portuguesa. Na mesma página onde se transpõe um detalhe constructivo de uma porta de entrada idêntico ao utilizado no projecto de Ventura Terra, publica-se “mais dois tipos de pequenas casas de construção económica [...] e como o que publicamos no número de Março fazem parte duma colecção de tipos variados [...]. É um problema interessante o que se refere a casas deste género que podem satisfazer o abrigo das classes operárias, ou a modestos empregados de comércio e indústria cuja familia não é numerosa. [...] Pequena que seja uma casa é sempre um modelo permanente onde a vista do público se vai fixando constantemente e assim se ela tiver qualquer coisa de harmonioso e agradável, a visão reflecte depois essas notas em tudo que ao redor se vá elevando”.

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