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Coleção jovem jurista 2018

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Melhores trabalhos de conclusão

de curso de Graduação em Direito

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estão imbuídos do espírito de engajamento com a realidade que nos cerca e de responsabilidade com o desenvolvimento global. Esta postura requer um novo olhar sobre o Direito, resultado de uma atua-ção refl exiva, tal qual presente nestes artigos. Bus-ca-se ultrapassar os horizontes da sala de aula e da apro priação passiva do conhecimento, com o incen-tivo aos estudantes em fomentarem trabalhos acadê-micos com qualidade e inovação. Este é o momento da criação e do risco intelectual por parte do aluno, o resultado pode ser conferido pelo leitor nesta obra.

Sérgio Guerra

Diretor da FGV Direito Rio

e de outras áreas ligadas à atuação pública e priva-da, a Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fun-dação Getulio Vargas – FGV Direito Rio – iniciou suas atividades em julho de 2002. A criação desta nova escola é uma estratégia da FGV em oferecer ao país um novo modelo de ensino jurídico capaz de formar lideranças de destaque na advocacia e nas carreiras públicas.

A FGV Direito Rio desenvolveu um cuidadoso plano pedagógico de ensino, contemplando cur-sos de graduação, pós-graduação e de extensão. O programa surge como valorosa resposta à crise do ensino jurídico observada no Brasil nas últimas décadas, que se expressa pela incompatibilidade entre as práticas tradicionais de ensino do direito e as demandas de uma sociedade desenvolvida. Em seu plano, a FGV Direito Rio assume o papel de formar profi ssionais preparados para atender às reais necessidades e expectativas da sociedade brasileira em tempos de globalização. Seus cursos reforçam o comprometimento da Escola em inse-rir no mercado profi ssionais de Direito capazes de lidar com áreas interdisciplinares, dotados de uma visão ampla das questões jurídicas e com sólidas bases acadêmica e prática.

A Coleção Jovem Jurista é um importante instru-mento para difusão do pensainstru-mento e do tratamen-to dado às modernas teses e questões discutidas nas salas de aula do curso de graduação em Direito desenvolvido pela FGV Direito Rio. Desta forma, esperamos oferecer a estudantes e advogados um material de leitura que possa efetivamente contri-buir com seu aperfeiçoamento profi ssional.

FGV Direito Rio

Prêmio Alfredo Lamy Filho de Inovação em Trabalho de Conclusão

PEDRO M. DELFINO, com o trabalho “Construindo o primeiro algoritmo aprovado

no Exame da OAB”, orientado por Alexandre Rademaker e Daniel Vargas.

Prêmio Miranda Rosa de Qualidade em Trabalho de Conclusão

VINICIUS DA SILVA CARDOSO, com o trabalho “A utilização de Propostas

de Emendas à Constituição como forma de reação a decisões do Supremo

Tribunal Federal”, orientado por Joaquim de Arruda Falcão e coorientado por

Diego Werneck Arguelhes.

Menção honrosa do Prêmio Alfredo Lamy Filho de Inovação em Trabalho

de Conclusão

DANIEL LOPES DA SILVA FERREIRA OLIVEIRA, com o trabalho “Automação do

processo de due diligence: como algoritmos podem cortar tempo e trazer

eficiência às auditorias legais?”, orientado por Daniel Magalhães Chada.

Menção honrosa do Prêmio Miranda Rosa de Qualidade em Trabalho

de Conclusão

JULIA JACQUES DE MORAES DIAS COELHO, com o trabalho “O conceito de

beneficiário final no regime jurídico do investidor não residente”, orientado por

João Manoel de Lima Junior.

ISSN 2179-0906

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Edição produzida pela FGV Direito Rio Praia de Botafogo, 190 | 13º andar Rio de Janeiro | RJ | Brasil | CEP: 22250-900

55 (21) 3799-5445 www.fgv.br/direitorio

Coleção Jovem Jurista

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Atribuição — Uso Não Comercial — Não a Obras Derivadas

Impresso no Brasil

Fechamento da 1ª edição em dezembro de 2018

Este livro consta na Divisão de Depósito Legal da Biblioteca Nacional. Os conceitos emitidos neste livro são de inteira responsabilidade dos autores.

Coordenação: Rodrigo Vianna, Sérgio França e Thaís Mesquita Capa: 2abad

Diagramação: Leandro Collares — Selênia Serviços 1ª revisão: Halime Musser Prado Henrique

2ª revisão: Erika Nogueira Vieira

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Mario Henrique Simonsen / FGV

Coleção Jovem Jurista / Daniel Lopes da Silva Ferreira Oliveira... [et al.]. — Rio de Janeiro : Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas, 2018.

288 p.

Conteúdo: Oliveira, Daniel Lopes da Silva Ferreira. Automação do processo de due diligence: como algoritmos podem cortar tem-po e trazer eficiência às auditorias legais?. — Coelho, Julia Jacques de Moraes Dias. O conceito de beneficiário final no regime jurídico do investidor não residente. — Delfino, Pedro Moysés. Construindo o primeiro algoritmo aprovado no exame da OAB. — Cardoso, Vini-cius da Silva. A utilização de propostas de emendas à constituição como forma de reação a decisões do Supremo Tribunal Federal.

Inclui bibliografia. ISSN: 2179-0906

1. Direito e informática. 2. Algoritmos de computador. 3. Investi-mentos estrangeiros. 4. Auditoria jurídica. 5. Separação de poderes. 6. Brasil. Supremo Tribunal Federal. 7. Brasil. Congresso Nacional. I. Oliveira, Daniel Lopes da Silva Ferreira. II. Coelho, Julia Jacques de Moraes Dias III. Delfino, Pedro Moysés. IV. Cardoso, Vinicius da Silva. V. Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas.

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APRESENTAÇÃO 7 AUTOMAÇÃO DO PROCESSO DE DUE DILIGENCE :

COMO ALGORITMOS PODEM CORTAR TEMPO E TRAZER EFICIÊNCIA

ÀS AUDITORIAS LEGAIS? 11

Daniel lopesDa silva Ferreira oliveira

O CONCEITO DE BENEFICIÁRIO FINAL NO REGIME JURÍDICO DO

INVESTIDOR NÃO RESIDENTE 65

Julia JacquesDe Moraes Dias coelho

CONSTRUINDO O PRIMEIRO ALGORITMO APROVADO

NO EXAME DA OAB 147

peDro Moysés DelFino

A UTILIZAÇÃO DE PROPOSTAS DE EMENDAS À CONSTITUIÇÃO COMO FORMA DE REAÇÃO A DECISÕES DO SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL 211

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A Coleção Jovem Jurista, editada pela Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas, tem o intuito de trazer, a cada ano, os trabalhos premiados por sua excelência e aspectos inovadores produzidos por discentes da graduação em Direito. Este volume traz os trabalhos de conclusão de curso vencedores dos prêmios Miranda Rosa de Qualidade e Alfredo Lamy Filho de Inovação, bem como as respectivas menções honrosas recebidas, dentre os trabalhos apresentados no ano de 2017/2018.

O Prêmio Alfredo Lamy Filho de Inovação foi concedido a Pedro Moysés Delfino pelo trabalho “Construindo o primeiro algoritmo aprovado no Exame da OAB”, em que questiona a possibilidade de um computador ser aprovado no Exame de Ordem da OAB. O autor não discute a validade jurídica do Exame da OAB, sua constitucionalidade ou a qualidade da prova, mas problematiza o modelo de educação jurídica – popular entre vários cursos de direito – orienta-do para maximizar o sucesso na aprovação. A partir de um algoritmo simples, Pedro descreve a construção de um data set e a realização de dois experimen-tos computacionais, apresenta um caminho possível de aplicação comercial, discute as razões para a baixa performance de resultados e apresenta possíveis medidas para o aprimoramento do algoritmo.

Embora o algoritmo criado não tenha superado a performance humana, a contribuição inovadora do Delfino se traduz no diálogo entre o Direito, a Mate-mática e a Ciência da Computação, resultante do programa de dupla gradua-ção entre as Escolas de Direito e de Matemática Aplicada da Fundagradua-ção Getulio Vargas do Rio de Janeiro. O trabalho contou com a orientação dos professores

Alexandre Rademaker e Daniel Barcelos Vargas1, tendo sido inspirado na

pes-quisa científica contemporânea referente ao contexto do Bar Exam americano. Ainda sob o prisma da inovação, o trabalho de Daniel Lopes da Silva Fer-reira Oliveira, orientado pelo professor Daniel Chada, recebeu menção honrosa. Daniel estudou o atual modus operandi das due diligences jurídicas realizadas

1 O primeiro é professor da FGV EMAp – Escola de Matemática Aplicada da Fundação Getulio Vargas e

foi o responsável pela orientação no campo da Ciência da Computação; o segundo, pela orientação no campo jurídico, sendo professor da FGV Direito Rio – Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas.

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por escritórios de advocacia, buscando encontrar ineficiências no processo. O trabalho demonstrou que o uso de algoritmos computacionais melhora a eficiência dos processos e traz benefícios não só para os advogados, mas tam-bém para seus clientes.

A hipótese inovadora apresentada por Daniel Oliveira foi a possibilidade de delegar a um computador o trabalho inicial de mapeamento e identifica-ção de cláusulas contratuais relevantes em uma auditoria jurídica. O estudo com ênfase no mercado de fusões e aquisições analisou startups estrangeiras, apontando que o uso de softwares “pode realizar a tarefa inicial de uma au-ditoria legal com maior precisão e acurácia do que um advogado”. Assim, a automatização defendida poderia maximizar a velocidade e a constância dos serviços prestados, bem como disponibilizar um poderoso banco de dados de documentos, em que organizar e encontrar qualquer informação seria bem mais fácil.

Já o prêmio Miranda Rosa de qualidade foi concedido a Vinícius da Sil-va Cardoso pelo trabalho “A utilização de propostas de emendas à Constitui-ção como forma de reaConstitui-ção a decisões do Supremo Tribunal Federal”, sob a orientação do professor Joaquim Falcão e a coorientação do professor Diego Werneck Arguelhes. O trabalho mapeou as reações das casas do Congresso Nacional às decisões do Supremo Tribunal Federal, revelando padrões quanto ao número, à demora, à diferença entre reações positivas e negativas e aos pe-ríodos da reação do Congresso Nacional em face das decisões do STF.

Vinícius analisou as Propostas de Emenda à Constituição aprovadas pelo Senado Federal ou pela Câmara dos Deputados, bem como o conteúdo de cada uma das PECs aprovadas por cada uma das casas do Poder Legislativo federal, comparando seus dispositivos com as decisões do STF.

A Premiação Miranda Rosa de Qualidade ofereceu uma menção honrosa ao trabalho “O conceito de beneficiário final no regime jurídico do investidor não residente”, escrito por Julia Jacques de Moraes Dias Coelho sob a orienta-ção do professor João Manoel de Lima Junior.

Julia Jacques analisa se e como a recente mudança do conceito de be-neficiário final promovida pela Receita Federal do Brasil altera o regime jurí-dico do investidor não residente. O trabalho foi realizado a partir de pesquisa empírica-exploratória com entrevistas entre representantes do setor público e privado para a identificação dos eventuais obstáculos e impasses observados no mercado financeiro depois da mudança promovida pela Receita Federal do Brasil. A autora conclui que a definição do conceito de beneficiário final é im-portante para consolidar o regime jurídico do investidor não residente no Brasil e analisar casos de registro de beneficiários finais domiciliados no Brasil como investidores não residentes.

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Por fim, cabe ressaltar que a FGV Direito Rio assume o compromisso de fomentar um modelo de ensino que sirva de estímulo a experiências de qua-lidade e inovação no horizonte jurídico. Os trabalhos dispostos nesta coleção refletem esse panorama, a partir de estudos voltados para problemas de im-portância jurídica para o país, região ou sociedade. Isto significa pensar o Direi-to com engajamenDirei-to e postura crítica, voltando os olhos para a realidade. E os nossos alunos mostram-se imbuídos desse espírito. Esperamos, com esta ini-ciativa, continuar a incentivá-los na busca por uma formação humanística mar-cada pela capacidade de apreensão, reflexão e produção criativa do Direito.

Thiago Bottino

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Resumo

O presente trabalho tem por objetivo estudar e demonstrar que o atual modus operandi das due diligences jurídicas realizadas por escritórios de advocacia possui ineficiências, que podem ser mitigadas com o uso de algoritmos compu-tacionais. Para isso, foi desenvolvido um protótipo de classificador bayesiano que usa machine learning e n-gramas. O seu objetivo é mostrar como é possí-vel automatizar o trabalho inicial de mapeamento e identificação de cláusulas contratuais relevantes em uma auditoria jurídica de escrituras de emissão de debêntures em português, o que não é feito hoje. Para a cláusula de Valor Total da Emissão, o classificador alcançou, na média, a Média F de 77,18%. Já na cláu-sula de Vencimento Antecipado por Alteração de Controle, obteve 74,41%. Por fim, quando exposto à cláusula de Vencimento Antecipado por Cross Default, a Média F do protótipo foi de 72,352%.

Palavras-Chave

Algoritmos Computacionais, Auditoria Jurídica, Automatização, Clientes, De-bêntures, Escritórios de Advocacia, Escrituras de Emissão, Fusões e Aquisi-ções, Ineficiência, Machine Learning.

Introdução

Em função da natureza, os advogados corriqueiramente debruçam-se sobre leis, contratos e petições. Às vezes, o volume de páginas que precisam ser es-tudadas ultrapassa a casa das centenas. A reação mais comum de uma pessoa ao ver uma pilha de documentos é de desespero ou de desmotivação, mas o problema vai além: a leitura demanda longas e exaustivas horas, que podem levar ao desinteresse e até mesmo a erros de análise.

O cenário descrito acima é vivido por diversos advogados que trabalham com auditorias legais (due diligences) em escritórios de advocacia. Facilitar a vida deles foi um dos motivadores deste artigo, e uma possível solução foi encontrada em um programa de computador. A tecnologia vem afetando e

EFICIÊNCIA ÀS AUDITORIAS LEGAIS?

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transformando diversas áreas de trabalho no mundo atual, facilitando a vida dos empregados, empregadores e clientes por meio de processos mais eficien-tes. Agora, esses avanços tecnológicos vêm chegando à área da advocacia.

Por quase um século, indústrias sofreram mudanças. Nos Estados Unidos, há estudos que classificam que quase metade dos empregos possuem alta pro-babilidade de serem automatizados e substituídos (CARL e OSBORNE, 2013, p. 44). Para um exemplo concreto, hoje temos a Uber introduzindo carros auto-máticos e diminuindo a necessidade de motoristas, mesmo contra a vontade de

taxistas.1 Contraintuitivamente, em paralelo a essas inovações, os advogados

continuaram por muito tempo desempenhando suas tarefas sem aparentes im-pactos (HENDERSON e ZAHORSKY, 2011, p. 41).

No entanto, com a evolução do poder computacional, é certo que o mo-delo de trabalho na advocacia e, principalmente nos escritórios, mude. Como será argumentado neste texto, há ineficiências que afetam os próprios juristas e podem levar a cobranças excessivas por um serviço que poderia ser entregue em menos tempo e feito com maior precisão. Essas características são causas diretas de uma pressão tecnológica que, hoje, já inicia uma mudança estrutural

na profissão (HENDERSON e ZAHORSKY, 2011, p. 40).2

O objetivo geral deste artigo é mostrar como a auditoria legal, uma impor-tante atividade realizada em escritórios de advocacia, pode ser otimizada com o uso de sistemas de software, gerando benefícios não só para os clientes, mas também para os próprios advogados. É de extrema relevância compreender que a tecnologia não veio para acabar com o mercado jurídico, mas para auxi-liá-lo, conforme será defendido ao longo do texto.

A compreensão dessa diferença é importante principalmente para evitar potenciais barreiras à inovação existentes na advocacia. A primeira delas é uma espécie de “rejeição irracional” a mudanças na profissão, ocasionada majorita-riamente pela falta de informação e compreensão sobre o funcionamento e

be-nefícios trazidos pelas novas ferramentas tecnológicas (SUSSKIND, 2013, p. 12).3

1 A iniciativa está disponível em:

<https://www.uber.com/cities/pittsburgh/self-driving-u-bers/>. Acesso em: 27 abr. 2018.

2 Um dos exemplos concretos dessa mudança é a já existente automação documental e

contratual (Document Assembly). Ou seja, contratos e documentos que antes eram feitos manualmente por advogados e começaram a ser automatizados. São feitos rapidamente em computadores, trazendo o conhecimento diretamente para as mãos dos clientes e ga-nhos consideráveis de tempo. Para mais exemplos, leia: KATZ, Daniel Martin. “Quantitative Legal Prediction or How I Learned to Stop Worrying and Start Preparing for the Data-Dri-ven Future of the Legal Services Industry”. Emory Law Journal, Atlanta, v. 62, n. 4, p. 911, 2013. Disponível em: <http://law.emory.edu/elj/content/volume-62/issue-4/thrower-sym-posium-articles/quantitative-legal-prediction%20.html>. Acesso em: 27 abr. 2018.

3 Richard Susskind, em seu livro Tomorrow’s Lawyers, chamou de “rejeição irracional”

(“irra-tional rejectionism”) o fenômeno em que o cético nega, rejeita tecnologias com as quais não tem experiência direta pessoal, sendo, por conseguinte, desconhecedor dos seus efeitos.

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Adicionalmente, o próprio modelo atual de billable hours, conforme será abordado aqui, cria desincentivos à otimização do trabalho e, assim, a mudan-ças. Entender o escopo e os impactos da inserção de sistemas de software na advocacia é importante para desconstruir a ideia de que alterações seriam prejudiciais para um dos modelos de negócio mais empregados em escritórios.

Assim, o presente trabalho revela-se pertinente conforme vai de encontro direto às supracitadas barreiras à inovação e desmistifica as suas fundações. Mostra como os advogados podem ser ajudados, em vez de prejudicados, e, ao mesmo tempo, estuda a existência de benefícios aos clientes, tais quais os impactos nos preços dos serviços jurídicos.

Nesse contexto, escolheu-se a mencionada atividade de auditoria legal para ser analisada, a qual possui etapas preliminares de mera captação e identificação manual de cláusulas contratuais. Esse trabalho maquinal, lento e repetitivo não somente é passado aos estagiários, mas também consome tempo dos advoga-dos, que precisam revisar a tarefa feita. No fim, todos os minutos despendidos com essa etapa crucial, mas simples, e que poderiam ter sido empregados na solução de problemas estratégicos, são debitados da conta dos clientes.

Mais especificamente, escolheu-se estudar a atividade de due diligence em mercado de capitais que ocorre em uma fusão e aquisição (Merger and Acquisition ou M&A). Como será abordado, um M&A movimenta grandes volu-mes financeiros. Ademais, a auditoria legal na subárea de mercado de capitais possui procedimentos bem-definidos e, portanto, mecanizáveis, além de existi-rem fontes disponíveis de contratos públicos, como escrituras de emissão, para servirem de base à pesquisa.

A hipótese principal deste artigo é mostrar a real possibilidade de delegar ao computador o trabalho inicial de mapeamento e identificação de cláusulas contra-tuais de interesse em uma due diligence. Além disso, as outras hipóteses são de que (i) a máquina o faria em menos tempo e (ii) com maior precisão e acurácia. As consequências práticas são (a) que aos advogados restaria a atividade intelectual, high end de análise dos dados obtidos, livrando-se de uma etapa extremamente burocrática, e (b) que aos clientes poderiam ser cobrados valores menores.

Para validar as hipóteses (i) e (ii), este trabalho tem um objetivo mais es-pecífico de elaborar um protótipo de software que leia contratos em português e tenha como output um mapeamento, com alta precisão, de algumas cláusulas contratuais relevantes para uma due diligence na área de mercado de capitais.

Após exaustiva pesquisa,4 não se encontrou, até o momento de escrita do

tex-4 A pesquisa foi efetuada (i) em ferramentas de busca on-line, (ii) em conversas com

advo-gados do mercado e (iii) no “Radar de Lawtechs e Legaltechs”, da Associação Brasileira de Lawtechs & Legaltechs (AB2L), que dispõe todas as startups de tecnologia aplicada ao di-reito. Disponível em: <https://www.ab2l.org.br/radar-lawtechs/>. Acesso em: 27 abr. 2018.

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to, informação alguma de outro algoritmo focado em mapear contratos em português para o mercado brasileiro.

Para cumprir com os objetivos, no Capítulo 1 será dada uma explicação detalhada das características do mercado jurídico que justificam a entrada de inovações tecnológicas para corrigir ineficiências do serviço prestado. Em se-quência, falar-se-á sobre o mercado de auditoria legal em M&A e de como as características problemáticas mencionadas se fazem presentes. Então, será in-troduzido o estado atual da tecnologia.

Os aspectos tecnológicos abordados servirão de ponte para, no Capítulo 2, mostrar como softwares de due diligence podem corrigir as falhas apresen-tadas. Comentar-se-ão exemplos existentes em países como os Estados Unidos e a Inglaterra e as suas relevâncias.

Então, nos capítulos seguintes, será apresentado o protótipo de algorit-mo para mapeamento de cláusulas em português. Abordar-se-á a metodologia usada para desenvolvê-lo e calcular a sua taxa de sucesso, além de possíveis impactos.

Espera-se que, com este artigo, fique demonstrada a importância das mu-danças tecnológicas no mundo jurídico. É também um esforço para contribuir com outras pesquisas acadêmicas na área, além de abrir as portas e incentivar a entrada de novos softwares no mercado brasileiro.

1. O mercado de M&A e o estado atual da tecnologia

Para compreender a importância do presente trabalho e entender o que será abordado ao longo do texto, faz-se necessário introduzir e estudar mais a fun-do características basilares (i) fun-do mercafun-do jurídico, (ii) fun-do mercafun-do de M&A e (iii) do estado de arte da tecnologia. Esses pontos serão abordados neste capítulo.

1.1 O mercado jurídico atual

O mercado jurídico é um dos mais tradicionais do Brasil. Ainda assim, acredi-ta-se que possui ineficiências cuja base está nos temas que serão discutidos nesta subseção. A seguir, dissertar-se-á sobre um dos pontos sensíveis aos clientes e grandes negócios jurídicos: a precificação dos serviços. Em sequên-cia, cumpre trazer à tona uma incoerência da advocacia: a cobrança de servi-ços estandardizados.

1.1.1 Modelo de precificação dos serviços jurídicos

A precificação dos serviços jurídicos é um ponto sensível e de contrastes. Como agentes racionais maximizadores do seu bem-estar, tanto os advogados quan-to os clientes preferem o caminho que mais lhes favoreça, ou seja, o que lhes

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traga os mais expressivos benefícios (MANKIW, 2012, p. 6).5 Nesse caso, ambos

se encontram em lados opostos: quando se trata de pagamentos, os juristas querem receber mais, enquanto os clientes querem pagar menos e somente o justo (FORTNEY, 2005, p. 101).

Atualmente, existem alguns métodos de precificação, que podem ser usa-dos em combinação ou separadamente. Percentuais sobre os ganhos do clien-te com o serviço, taxa fixa e taxas cobradas no caso de sucesso da operação (Success Fees) são alguns exemplos. Entretanto, entre os mais usados pelos advogados está a cobrança por hora de serviço, ou as denominadas billable hours (FORTNEY, 2005, p. 101-102; PARDAU, 2013).

Nos escritórios que adotam esse modelo, os advogados costumam ter uma espécie de planilha ou sistema no qual devem inserir todas as horas que trabalharam no dia, acompanhadas do cliente para o qual se dedicaram e um breve resumo da atividade. Os dados resultantes servem para cobrar de forma justificada os clientes, mas também são um mecanismo de controle, posto que os escritórios têm em suas mãos uma fonte comparativa da produtividade dos seus membros.

Naturalmente, essa forma de cobrança é a responsável por um grande conflito de interesses dos serviços legais. Qual é o incentivo para os juristas serem mais rápidos e terem uma economia de tempo, ou então deixarem de debitar horas de baixa produtividade (FORTNEY, 2005, p. 1)?

Na verdade, o incentivo é sempre o oposto do que o cliente deseja: debitar o maior número possível de minutos — obviamente, sem passar dos limites do razoável e lícito. Para o advogado, isso aumenta os seus ganhos — por meio dos bônus do escritório — e, ainda, serve como atestado de que está efetiva-mente trabalhando.

O contraste supracitado evidencia um problema de agência (JENSENe

MECKLING, 1975, p. 5). O agente contratado para prestar o serviço jurídico não age necessariamente no melhor interesse de quem o contratou.

Nesse contexto, fica evidente o motivo pelo qual as billable hours são uma barreira a inovações, pelo menos àquelas que corrijam ineficiências em setores jurídicos. Qual é o seu incentivo para debitar menos horas? Essa pergunta é crucial, pois a redução da carga debitada é a consequência natural da presta-ção de um serviço que aplique novas tecnologias em busca de maior eficiência. Essa visão, entretanto, contrasta com o posicionamento da clientela. Hoje, há um movimento crescente para que os advogados possam fazer mais por

5 A definição de agente racional foi abordada por Gregory N. Mankiw em seu livro Introdução

à Economia: “Uma pessoa racional faz o melhor para alcançar seus objetivos, sistemática e objetivamente, conforme as oportunidades disponíveis”.

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menos (HENDERSONe ZAHORSKY, 2011, p. 40).6 A precificação por essa

me-todologia leva à inacessibilidade aos serviços legais por parte da população e por empresas de médio e pequeno portes (SUSSKIND, 2013, p. 4).

Para que a pressão dessa parcela do mercado seja satisfeita, escritórios teriam a necessidade de baixar os seus preços. Essa redução pode-se dar de forma absoluta, cobrando menos por hora de trabalho, ou relativa, cobrando o mesmo valor, mas com procedimentos e rotinas mais ágeis e eficientes. Assim, temos um mercado que luta por preços menores para seus clientes, mas remu-nerações maiores para seus trabalhadores.

O presente trabalho não tem como objetivo solucionar esse impasse, mas, no máximo, mostrar como um software aplicado aos serviços jurídicos pode be-neficiar ambas as partes sem se opor ao modelo de negócios vigente. O proble-ma de agência supracitado é de importante menção, pois a não ser que a tec-nologia se ajuste ao sistema vigente ou o altere, sua aplicação será improvável. 1.1.2 Estandardização do trabalho

Há muito tempo acredita-se que o serviço prestado pelos advogados é único. Afinal, para cada cliente existiria uma solução diferente, trabalhada de formas distintas, feita sob medida (SUSSKIND, 2013, p. 24). Esse tipo de personaliza-ção justificaria os preços cobrados e conferiria importância aos juristas.

No entanto, uma parte considerável do trabalho, na verdade, passa por um processo de estandardização. Para se cumprir a tarefa de escrever um contrato, por exemplo, não se começa a partir de uma folha em branco (SUSSKIND, 2013, p. 25-28). A verdade é que, para evitar o retrabalho ou mitigar riscos como o esquecimento de cláusulas primordiais, esse processo de “construção”, assim como uma porção de outros desempenhados dentro de um escritório, é inicia-do com base em modelos pré-existentes. “Nada se cria, tuinicia-do se transforma.” A máxima de Lavoisier é aplicada recorrentemente no mercado jurídico por meio de processos e procedimentos que servem de guia ao trabalho dos advogados.

Entretanto, se já há uma base, um padrão que é sempre usado, há espaço para essa parte do trabalho ser barateada ou até mesmo mecanizada e auto-matizada. Se a tarefa pode ser traduzida em um padrão, em regras e passos bem definidos e delimitados, ela pode ser transposta em um algoritmo e tradu-zida para que computadores possam realizá-la.

Nesse caso, a não utilização da automação representaria um ponto de ine-ficiência nos procedimentos rotineiros de um escritório de advocacia. Para os clientes, isso ocasionaria uma economia desejada, sem que os serviços fossem prestados com uma qualidade inferior.

6 “Rather, the sea change reflects an urgent need for better and cheaper legal services that can keep pace with the demands of a rapidly globalizing world.”

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1.2 O mercado de M&A

Uma operação de M&A, usando a interpretação literal do termo, pode ser tra-duzida em uma operação na qual duas companhias se fundem para formar uma terceira, ou na qual uma adquire a outra. Nesse último caso, a consequência pode ser a simples inclusão da adquirida no grupo econômico da adquirente, que passa a ser a sua controladora, ou a sua incorporação pela própria compra-dora, deixando de existir.

Essas operações envolvem uma reestruturação societária, e são reguladas pela Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, a Lei das Sociedades Anônimas, e pelo Código Civil:

Art. 227. A incorporação é a operação pela qual uma ou mais sociedades são absorvidas por outra, que lhes sucede em todos os direitos e obrigações. (...)

Art. 228. A fusão é a operação pela qual se unem duas ou mais sociedades para formar sociedade nova, que lhes sucederá em todos os direitos e obrigações.

No entanto, usando-se o lato sensu, as Mergers and Acquisitions abrangem um grupo muito maior de operações que as descritas acima. Nas palavras de BOTREL (2012, p. 21):

[A] nomenclatura fusões e aquisições identifica o conjunto de medidas de crescimento externo ou compartilhado de uma corporação, que se concretiza por meio da “combinação de ne-gócios” e de reorganizações societárias. Estão inseridas na termi-nologia sob análise não somente compras de ativos empresariais e participações societárias, e a união de duas ou mais sociedades para a formação de uma terceira, mas também a formação de grupos societários, a constituição de sociedades de propósito específico (SCP), a formação de consórcios, a cisão, a incorpo-ração de sociedades ou de ações etc. Enfim, o modelo jurídico escolhido pelas partes pode variar consideravelmente, pois o que caracteriza uma operação de fusão e aquisição é a sua finalidade: servir de instrumento de implementação da estratégia de cresci-mento externo ou compartilhado. (grifo nosso)

Dessa forma, o mercado de M&A é excelente para o presente trabalho devido à sua amplitude e à sua relevância para o crescimento de negócios. Ademais, conforme será discutido em sequência, é um mercado grande. Dado

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que esse crescimento é estratégico para as sociedades e não é barato, os ad-vogados potencialmente conseguem extrair maiores volumes financeiros por

seus serviços.7 Assim, uma fusão e aquisição torna-se uma das principais fontes

de renda para os escritórios que atuam no ramo empresarial. 1.2.1 Tamanho do mercado

As operações de M&A envolvem desde sociedades de baixo valor, até aquelas que são avaliadas em bilhões de reais. Exemplos conhecidos no Brasil são a fusão entre

a BM&F e a Cetip,8 e a aquisição do HSBC Brasil pelo Bradesco.9 Todos esses casos

movimentaram grandes quantias financeiras, e servem como parâmetro para ver e entender (i) a importância desse mercado, e (ii) o tamanho que podem alcançar.

De acordo com dados consolidados pela auditoria PricewaterhouseCoo-pers Brasil Ltda. (PwC), em 2017 foram anunciadas 643 transações dessa

cate-goria no Brasil,10 dentre as quais 216, ou seja, 33,6%, tiveram seus valores

divul-gados.11 O montante final dessas 216 operações foi avaliado em incríveis 48,9

bilhões de dólares. Se assumirmos que esses 33,6% são bem representativos da amostra total, pode-se estimar que 100% do ramo de aquisições representaria 145,5 bilhões de dólares em 2017 — e mesmo que não sejam, já se trata de um mercado bilionário e atrativo.

O cenário é ainda mais positivo quando fazemos um comparativo com os últimos anos. Em 2017, o número de transações foi 16% inferior à média dos

sete anos anteriores, e, mesmo assim, alcançou aquele valor.12

Dentre as 643 fusões e aquisições, 16 tiveram valor de compra acima de

1 bilhão de dólares.13 Se o escritório de advocacia responsável por uma dessas

operações conseguir extrair 1% do valor total, já são 10 milhões de dólares de receita bruta — valor sobre o qual serão descontados os extensos custos do

7 Seja devido à maior quantidade de horas de trabalho necessárias — e “biladas”, debitadas

do cliente — em uma operação desse tipo, ou até mesmo por colocarem success fees, re-cebendo um percentual do valor da transação, caso se concretize de fato.

8 A operação foi amplamente divulgada e teve que passar pelo crivo da Comissão de Valores

Mobiliários (CVM). Disponível em: <http://www.valor.com.br/financas/4910720/cvm-apro-va-fusao-entre-bmfbovespa-e-cetip>. Acesso em: 28 abr. 2018. A sociedade resultante foi a

[B]3 (http://www.b3.com.br/pt_br/).

9 A operação foi divulgada pelo Valor Econômico. Disponível em: <http://www.valor.com.

br/financas/4160938/bradesco-compra-operacao-brasileira-do-hsbc-por-us-52-bilhoes>. Acesso em: 28 abr. 2018.

10 Dentre as transações, incluem-se aquisições, compras de ações, joint ventures, fusões, in-corporações e cisões.

11 Esses dados são do relatório de Fusões e Aquisições no Brasil de dezembro de 2017,

pu-blicado pela PwC. Disponível em: <https://www.pwc.com.br/pt/estudos/servicos/asses-soria-tributaria-societaria/fusoes-aquisicoes/2017/pwc-fusoes-aquisicoes-dezembro-2017. html>. Acesso em: 29 abr. 2018.

12 Idem.

(20)

trabalho dos advogados. É um volume alto o suficiente para que esse caso seja considerado uma das prioridades do escritório.

Gráfico 1 — Número de transações de M&A anunciadas de 2002 até 2017

Fonte: Relatório de Fusões e Aquisições no Brasil da PwC, 2017.

Figura 1 — Ranking de escritórios de advocacia por valor de operações de M&A que participaram no Brasil em 2017

Fonte: Global M&A Market Review — Legal Ranking da Bloomberg, 2017.

Para entender o impacto que as operações de M&A podem ter, basta olhar o ranking em volume movimentado pelos escritórios em transações no Brasil

(21)

(Figura 1). A empresa Bloomberg Finance LP, de Data Analytics, faz relatórios com rankings sobre serviços jurídicos. Em 2017, o primeiro colocado havia co-lecionado assessoria em 66 fusões e aquisições, que, juntas, totalizavam mais

de 15 bilhões de dólares.14

1.2.2 A atividade de due diligence jurídica

Ao iniciar uma aquisição, fusão ou outro tipo de reestruturação societária, as partes precisam entender muito bem com quem estão se relacionando e para onde estão caminhando. Assim, uma operação de M&A não se resume à assi-natura do contrato que sela a parceria entre as duas sociedades, mas envolve diversos estudos prévios para averiguar se a transação de fato vale a pena e se não possui riscos desconhecidos.

Nesse contexto, uma das principais tarefas desempenhadas pelos

ad-vogados é a auditoria legal, ou due diligence jurídica.15 Esse serviço,

resumi-damente, ajuda o contratante a entender os riscos legais do negócio em que está prestes a entrar, e a ver se de fato está assinando aquilo que desejava

(GATTIKER, 2007).16

Assim, para cumprir com essa função e mitigar riscos, os escritórios anali-sam os documentos e contratos da sociedade com a qual o tomador de serviço está se relacionando. A partir dessa análise, é possível averiguar se há vulnera-bilidades no negócio, como contratos que não estão em conformidade com a legislação vigente e acordos que serão desfeitos se a operação se concretizar

(NEJMe BRUNA, 2002).17

14 Esses dados podem ser obtidos no legal ranking do Global M&A Market Review — Legal Rankings de 2017 da Bloomberg, p. 8. Disponível em: <https://data.bloomberglp.com/pro-fessional/sites/10/Bloomberg-Global-MA-Legal-Ranking-FY-2017.pdf>. Acesso em: 29 abr. 2018.

15 No site do escritório Veirano Advogados, encontramos uma entrevista com Fernando

Ver-zoni, sócio da banca na época, em que afirma que “os advogados especializados em fusões e aquisições tipicamente atuam na realização de auditoria legal”. Disponível em: <http:// www.veirano.com.br/por/contents/view/fernando_verzoni_fala_do_mercado_de_m_a_ no_brasil>. Acesso em: 29 abr. 2018.

16 “When people talk about acquiring another firm, the term ‘due diligence’ comes up sooner or later. Usually, legal definitions of due diligence say something such as: ‘Due diligence is a measure of prudence, activity or assiduity, as is properly to be expected from, and ordinarily exercised by, a reasonable and prudent person under the particular circumstances. It is not measured by any absolute standard but, nonetheless, depends on the relative facts of the special case’. In plain language, this definition means that due diligence helps in making sure that the acquirer of the goods gets what he/she paid for.” (grifo nosso) Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/242595403_Merger_and_Acquisition_Ef-fective_Information_Security_Depends_on_Strategic_Security_Metrics>. Acesso em: 29 abr. 2018.

17 Em primeiro plano, esses procedimentos envolvem a verificação da boa ordem dos

re-gistros contábeis da empresa em questão, mas também incluem a avaliação de aspectos legais relacionados a seus ativos e a operações que possam refletir em seu patrimônio, mas que nem sempre são retratados por técnicas contábeis.

(22)

Imagine uma companhia que está interessada em adquirir uma concessio-nária de serviço público — a exemplo do Metrô Rio — querendo capturar o valor que ela gera. Se o contrato de concessão pública define que a mudança de controle acarreta na opção de rescisão unilateral por parte do poder público, a transação de M&A pode não se justificar devido ao risco envolvido.

Problemas como o mencionado acima devem ser identificados durante uma due diligence e são o que a tornam importante. No entanto, essa sua im-portância acaba ofuscando o fato de que essa atividade pode ser feita de for-ma for-mais eficiente do que como é realizada atualmente. Hoje, ainda naquela máxima de que nada se cria, os advogados iniciam suas análises em busca de certas cláusulas que são mais comuns e que poderiam vir a ser problemáticas. Ou seja, ocorre uma padronização, cria-se um modelo para o trabalho a ser feito. A abordagem é lógica e faz sentido, se não fosse a grande quantidade de papéis na qual esses dados precisam ser procurados.

Essa parte maquinal de procura recai não somente nos estagiários, mas também nos advogados, que precisam revisar o trabalho dos primeiros e, ain-da, aprofundar a análise. Por conseguinte, são horas perdidas para desempe-nhar uma função que não demanda conhecimentos profundos, e que, por ser necessária, é debitada do cliente.

A referida etapa da auditoria legal é, então, estandardizada, ou seja, de-composta em passos e regras bem delimitados que, se cumpridos, levam ao correto resultado final. Posto isso, seria possível traduzir essas regras delimita-das em um algoritmo e delegá-lo a um computador, automatizando essa parte inicial repetitiva e maquinal.

Para entender melhor o exposto, vamos analisar a due diligence jurídica feita na área de mercado de capitais.

1.2.3 Due diligence em mercado de capitais

Ao entrar em uma operação de M&A, uma parte da due diligence realizada deve ser focada na área de mercado de capitais. Usamos essa

nomenclatu-ra panomenclatu-ra nos referir a todos os contnomenclatu-ratos de valores mobiliários18 negociados

Cabe aqui enfatizar essa segunda modalidade de due diligence, mais especificamente no que diz respeito à avaliação dos aspectos legais das possíveis contingências existentes, o que pode ser traduzido para o português como “auditoria jurídica”.

18 Os valores mobiliários são estipulados em mais de um dispositivo normativo. No entanto, o

art. 2º da Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976, fixa uma definição e rol original de com-ponentes desses valores: “I — as ações, debêntures e bônus de subscrição; II — os cupons, direitos, recibos de subscrição e certificados de desdobramento relativos aos valores mobi-liários referidos no inciso II; III — os certificados de depósito de valores mobimobi-liários; IV — as cédulas de debêntures; V — as cotas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de clubes de investimento em quaisquer ativos; VI — as notas comerciais; VII — os contratos futuros, de opções e outros derivativos, cujos ativos subjacentes sejam valores mobiliá-rios; VIII — outros contratos derivativos, independentemente dos ativos subjacentes; e IX

(23)

pelas sociedades participantes, como Escrituras de Emissão de Debêntures

(NEGRÃO, 2012, p. 474)19 e Termos de Securitização de créditos imobiliários

(DEACON, 2004, p. 674).20,21

Essa análise é crucial, pois os valores mobiliários muitas vezes represen-tam ativos importantes para a companhia. Além disso, é muito comum terem cláusulas que alteram esses contratos no caso de uma operação de reestrutu-ração societária. Dessa forma, na ocorrência de uma aquisição, o comprador, que irá suceder o adquirido em todos os direitos e deveres, pode se deparar com uma situação diferente da que pretendia encontrar após a compra.

A escolha por focar o presente trabalho no ramo de mercado de capitais encontra respaldo em dois fatores. Inicialmente, na supracitada relevância no contexto de uma auditoria legal em M&A. Em segundo lugar, pois há exemplos, fácil e publicamente disponíveis na internet, dos contratos previamente men-cionados, tal como nas páginas de informações aos investidores de

Distribui-doras de Títulos e Valores Mobiliários.22

A partir da leitura desses documentos, é possível extrair algumas das cláu-sulas que são de importante identificação no momento da due diligence:

— quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive re-sultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros”.

19 As debêntures são títulos de crédito emitidos pela companhia para conseguir captar recursos

de investidores. De forma simplificada, serve como uma maneira de se pegar empréstimo com juros diferenciados das instituições financeiras. “Por sua natureza de instrumento de captação de recursos às sociedades por ações, concedem direito de crédito a seu possuidor.”

Esse tipo de valor mobiliário está estipulado no art. 52 da Lei das Sociedades Anô-nimas: “A companhia poderá emitir debêntures que conferirão aos seus titulares direito de crédito contra ela, nas condições constantes da escritura de emissão e, se houver, do certificado”. Conforme está elucidado nesse dispositivo legal, a Escritura de Emissão de Debêntures é o documento onde estão descritas as condições da emissão e todos os direi-tos conferidos pelos títulos.

20 “Securitisation is the process of converting cash flow arising from underlying assets or debts (receivables) due to the originator (the entity which created the receivables) into a smoothed repayment stream, thus enabling the originator to raise asset-backed finance through a loan or an issue of debt securities — generically known as asset-backed securities or ABS — which is limited recourse in nature to the credit of the receivables rather than that of the originator as a whole, and with the finance being self-liquidating in nature.”

21 Os títulos de crédito lastreados em créditos imobiliários são denominados Certificados de

Recebíveis Imobiliários (CRI), conforme o art. 6º da Lei 9.514, de 20 de novembro de 1997. Já os CRIs são considerados valores mobiliários pela Resolução nº 2.517, de 29 de junho de 1998, do Banco Central do Brasil.

22 A CVM disponibiliza uma definição formal de Distribuidoras de Títulos de Valores Mobiliá-rios em seu site oficial. Disponível em: <http://www.cvm.gov.br/menu/regulados/correto-ras/corretoras_dist.html>. Acesso em: 29 abr. 2018.

(24)

(i) valor de emissão;23

(ii) data de vencimento;24

(iii) vencimento antecipado25 — alteração de controle;26

(iv) vencimento antecipado — operação societária;27

(v) vencimento antecipado — Cross Default;28

(vi) garantias.29

As duas primeiras sempre são procuradas, pois definem se o documento vale a pena ser analisado. Se o valor for muito baixo, ou se a data de vencimen-to ocorrer antes da transação, o contravencimen-to não tem robustez o suficiente para oferecer riscos para a operação.

Já a terceira, a quarta e a quinta envolvem pontos sensíveis para a opera-ção de M&A. Um vencimento antecipado ocorre quando, devido a certos even-tos, o contrato tem seu vencimento declarado em data anterior à estipulada inicialmente. No caso de uma Escritura de Emissão de Debêntures, o vencimen-to antecipado significa que a companhia vai ter que pagar antecipadamente o crédito que deu para os investidores em troca de recursos na data de emissão.

Muitos contratos da área de mercado de capitais estipulam o vencimento antecipado caso ocorra uma mudança do controle societário da companhia, ou uma fusão, incorporação ou cisão. Assim, é imprescindível identificar em que contratos essas cláusulas se encontram, caso contrário, passarão despercebi-das e, após a conclusão da operação de M&A, ocorrerá o vencimento antecipa-do, fazendo com que as sociedades tenham que arcar com um volume maior de passivo que deve ser liquidado em curto prazo — às vezes sem que se tenha tido tempo de disponibilizar recursos suficientes para o pagamento.

23 Exemplo: O valor total da emissão será de R$245 milhões de reais, na Data de Emissão (“Valor da Emissão” ou “Valor Nominal Total”).

24 Exemplo: As Debêntures vencerão em 30 de dezembro de 2016 (“Data de Vencimento”). 25 Exemplo: Observados os termos e condições desta Escritura e sem prejuízo das hipóteses

de vencimento antecipado automático, aqui previstas, o Agente Fiduciário poderá declarar antecipadamente vencidas todas as obrigações relativas às Debêntures e exigir o imediato pa-gamento, pela Emissora, do saldo devedor do Valor Nominal Total das Debêntures, acrescido da Remuneração, devida desde a Data de Integralização, ou da última data de pagamento da Remuneração, conforme o caso, até a data do efetivo pagamento, calculada pro rata temporis, e demais encargos, independentemente de aviso, interpelação ou notificação judicial ou extra-judicial, na ocorrência de qualquer um dos seguintes eventos (“Eventos de Inadimplemento”). 26 Exemplo: Alteração do controle, direto ou indireto, da Emissora, exceto se aprovado previa-mente por Debenturistas detentores de, no mínimo, 75% de todas as Debêntures em Circulação. 27 Exemplo: Cisão, fusão, incorporação ou qualquer forma de reorganização societária

envol-vendo a Emissora, sem que haja a prévia autorização dos Debenturistas.

28 Exemplo: Vencimento antecipado de dívidas da Emissora ou do lnterveniente-Garantidor em montante, individual ou agregado, igual ou superior a R$ 10 milhões).

29 Exemplo: Como garantia do fiel e pontual pagamento das Debêntures, cada um dos Garan-tidores, de forma irrevogável e irretratável, presta fiança em favor dos Debenturistas, repre-sentados pelo Agente Fiduciário, obrigando-se como fiadores e principais pagadores, em caráter solidário, pelo pagamento de quaisquer valores devidos nos termos desta Escritura.

(25)

Em relação ao Cross Default,30 o risco é ainda maior. Essas cláusulas

vincu-lam o vencimento antecipado do contrato a uma inadimplência cometida pela companhia em outro contrato. Um exemplo comum é o vencimento antecipa-do de debêntures em função antecipa-do vencimento antecipaantecipa-do de outro antecipa-documento. Ao combinar as cláusulas (iii), (iv) e (v), pode-se criar um cenário que in-viabilize qualquer M&A. Se essa operação ocasionar o vencimento antecipado de um contrato, e os demais possuírem cláusulas de Cross Default, desenca-deará um vencimento antecipado em cascata, elevando em larga escala o pas-sivo de curto prazo da companhia, o que pode levar à sua falência.

Finalmente, a cláusula de garantia mostra-se relevante, pois indica quais são os ativos da companhia que estão vinculados ao pagamento do crédito dado pelos investidores.

Então, o que os exemplos supracitados nos mostram sobre a atividade de due diligence jurídica? Os advogados, ao abrirem os contratos de mercado de capitais, vão diretamente procurar essas cláusulas. Elas são as partes mais impor-tantes a serem encontradas, e achar cada uma delas representa um passo essen-cial e bem definido que é cruessen-cial para a análise de risco feita na auditoria legal.

Ainda assim, em documentos que podem chegar a cem páginas, encon-trá-las não é fácil e demanda tempo. Nesse contexto, temos uma tarefa que consome tempo dos advogados e dinheiro dos clientes, mas que não exige o exercício intelectual e especializado do jurista. Por conseguinte, melhor seria se pudesse ser feita de outra forma e, até mesmo, automatizá-la.

Em síntese, temos em mãos um mercado grande e muito rentável para os escritórios de advocacia, mas cuja principal atividade — o que fica explícito no ramo de mercado de capitais — possui partes extremamente maquinais e repe-titivas, e, por isso, ineficientes quando realizadas manualmente.

1.3 O estado da arte da tecnologia

Muito se falou até agora sobre as ineficiências no modus operandi atual dos serviços legais e sobre o mercado de M&A, mas ainda não está claro como a tecnologia poderia auxiliar. Para isso, inicialmente, cumpre colocar em evidên-cia alguns conceitos e mostrar em que ponto de desenvolvimento estamos hoje, principalmente no tocante à ciência da computação.

Neste artigo, tecnologia não se refere à construção física de máquinas, circuitos ou robôs, papel típico de um engenheiro, mas principalmente às

con-30 Para entender o que representam essas cláusulas de forma mais contextualizada, recomen-da-se a leitura da seguinte reportagem do Valor Econômico: <http://www.valor.com.br/ financas/2819220/bndes-anuncia-medidas-para-estimular-debentures-de-infraestrutura>. Acesso em: 29 abr. 2018.

(26)

tribuições, por meio da implementação de softwares, que a ciência da compu-tação pode nos oferecer.

Para se auxiliar em uma melhoria da atividade de due diligence, o principal obstáculo é conseguir que o computador leia, entenda e mapeie documentos. Hoje, já foram desenvolvidas ferramentas suficientes e necessárias para o proces-samento de documentos e a mineração, qualificação e busca de suas informações. Em sequência, vamos abordar três tópicos que serão essenciais para a concretização do objetivo proposto e mostrar como poderiam ser úteis. 1.3.1 Reconhecimento de texto

Conforme previamente elucidado, a atividade de auditoria legal por essência mexe com a leitura de inúmeros documentos. No entanto, nem todo o material a ser analisado vem nas melhores condições de leitura: a maior parte dele é enviada no Formato Portátil de Documento (Portable Document Format ou PDF), não pesquisável. São cópias reprográficas ou fotos de contratos com assinaturas das partes e carimbos do cartório.

Diferente de documentos do Microsoft Word, facilmente pesquisáveis e de texto selecionável, não passam de imagens, muitas vezes pouco nítidas, cujas pa-lavras não são reconhecíveis de imediato pelo computador. Esse é um grande pro-blema na vida dos advogados que cuidam dessa atividade. Em vez de conseguirem executar uma busca rápida (“ctrl + f”) e pesquisar dados simples, como uma data, são obrigados a procurar visualmente todas as informações, o que demanda um tempo considerável que poderia ser empregado em tarefas mais especializadas.

Esse obstáculo, entretanto, já foi enfrentado e soluções foram criadas. Há aplicativos e softwares no mercado que se encarregam de realizar o denomi-nado Reconhecimento Óptico de Caracteres (Optical Character Recognition ou OCR), que consiste, basicamente, no processo de identificar letra ou outro ele-mento textual em uma imagem escaneada e convertê-lo para o caractere corres-pondente. Assim, sendo a operação bem sucedida, o resultado é um documento

com texto que pode ser pesquisado e manipulado (HENDERSON, 2009, p. 355).31

1.3.2 Processamento de Linguagem Natural

Uma vez que se tem documentos pesquisáveis em mãos, é necessário que o computador possa entendê-los e processá-los. Nessa toada, um dos ramos da ciência da computação que ganha força é o denominado Processamento de Linguagem Natural (Natural Language Processing ou NLP).

31 “Optical character recognition (OCR) is the process of identifying the letter or other docu-ment eledocu-ment that corresponds to a given part of the scanned image and converting it to the appropriate character. If the process is successful, the result is a text document that can be manipulated in a word processor, database, or other program that handles text.”

(27)

Os estudiosos dessa área têm como principal objetivo fazer com que os computadores possam reconhecer e efetivamente interpretar e processar tex-tos expressos em nossa linguagem ordinária, não somente textex-tos escritex-tos em

códigos de linguagens de programação (HENDERSON, 2009, p. 330).32 Uma

das principais empresas envolvidas nessa atividade é a International Business Machines (IBM), que começou a comercializar uma plataforma de análise

tex-tual avançada sob o software Watson.33

Nesse contexto, o supracitado software da IBM é um excelente exemplo para ser mencionado. Em 2011, em uma competição televisionada

norte-ame-ricana de perguntas e respostas chamada “Jeopardy!”,34 Watson foi desafiado

por dois antigos vencedores. Com um banco de dados contendo inúmeras

infor-mações e dados estruturados e desestruturados,35 ele foi capaz de identificar as

perguntas que lhe eram feitas, processá-las, compreendê-las e buscar as

respos-tas em sua memória antes dos demais participantes, saindo como o vencedor.36

O mencionado supercomputador é um exemplo de como a tecnologia vem se desenvolvendo. Para conseguir o feito que mencionamos, a atividade de NLP anda de mãos dadas com estudos linguísticos: é preciso compreender e processar o significado das palavras nas frases. Considerando que existem diversos desafios de interpretação, como a possível existência de múltiplos sig-nificados para um termo dentro da mesma linguagem, torna-se um trabalho

nem um pouco trivial.37

32 “Since at least the days of Hal 9000 and early Star Trek, the computer of the future was su-pposed to be able to understand what people wanted, when expressed in ordinary language and not programming code. Computer scientists have been working on this capability, cal-led natural language processing (NLP), for decades.”

33 Conteúdo sobre o assunto está disponível em: <https://www.ibm.com/watson/services/na-tural-language-understanding/> e https://www.ibm.com/watson/about/index.html>. Aces-so em: 29 abr. 2018.

34 Dados da competição encontram-se disponíveis em: <https://www.jeopardy.com/>. Aces-so em: 29 abr. 2018.

35 Dados estruturados são aqueles que estão organizados de uma forma que facilite o seu uso por programas de computador. Já dados desestruturados são o oposto. Um exemplo é um artigo de jornal: tem-se somente os dados brutos. As informações estão presentes no corpo do texto sem qualquer padrão ou forma de organização que facilite a interpretação por um algoritmo computacional.

36 Veja artigo do jornal The NY Times da época: <http://www.nytimes.com/2011/02/17/scien-ce/17jeopardy-watson.html?pagewanted=all>. Acesso em: 29 abr. 2018.

37 Podem-se listar três exemplos de desafios de interpretação linguísticos nesse campo: (i) a polissemia, (ii) as expressões idiomáticas e (iii) as correferências. O primeiro ocorre quando uma mesma palavra possui mais de um significado. Este é o caso do termo “vela”, que pode se referir à peça de um barco, ou ao objeto de cera usado para iluminar ambientes. Já o segundo está presente quando uma expressão assume significado diferente das palavras que a compõe. Um exemplo é a expressão “bater as botas”, que quando conjugada desta forma simboliza que alguém faleceu. Por fim, as correferências representam o evento em que dois termos independentes entre si se referem à mesma pessoa ou objeto. No trecho “Pedro é simpático, mas ele nunca ganhou a simpatia de seus colegas. O rapaz nunca en-tendeu a razão”, tanto “Pedro” quanto “ele” e “rapaz” se referem à mesma pessoa.

(28)

Assim, entre as estratégias para reconhecimento das palavras, está a aná-lise estatística. A partir de uma base, com um banco de dados com inúmeras

palavras, trechos e textos — que chamamos de Corpus (MANNINGe SCHÜTZE,

1999, p. 6)38 —, é possível calcular, por exemplo, a probabilidade de a palavra

“manga” significar a fruta, ou o pedaço da roupa, dado os demais termos pre-sentes no parágrafo em que se insere (HENDERSON, 2009, p. 330) (MANNING

e SCHÜTZE, 1999, p. 40).39

Esse mecanismo pode ter diversas aplicações, entre elas, a de servir como corretor ortográfico (spell checker). O Corpus é usado como parâmetro para cal-cular se há mais chances de um termo escrito errado ser A ou B. Usando o mesmo exemplo, é possível se inferir se “manfa” — que não existe em nosso dicionário —, no contexto em que se insere, deveria ter sido escrita como “manga” ou “manta”.

Outro uso consiste em predizer a palavra seguinte de um parágrafo. Nova-mente, usando um Corpus como amostra para se gerar probabilidades, é pos-sível, dados dois ou três termos anteriores (Bigramas e Trigramas,

respectiva-mente) deduzir qual será o próximo (MANNINGe SCHÜTZE, 1999, p. 73-74; 353).

Por fim, podemos também usar a abordagem estatística para comparar pará-grafos. Por meio das palavras que se encontram no parágrafo que se busca com-parar, é possível calcular a probabilidade de outro trecho tratar do mesmo assunto. Das três mencionadas funcionalidades, pelo menos a primeira e a última são úteis para a automação da auditoria legal. O corretor ortográfico é uma ex-celente ferramenta de apoio ao OCR. Apesar dos avanços no reconhecimento textual, muitas das imagens de documentos são de qualidade extremamen-te ruim. Assinaturas e carimbos de cartórios passam por cima das palavras e poluem contratos. Consequentemente, criam-se obstáculos para o software de leitura, e o resultado final nem sempre é perfeito: perdem-se pontuações,

cabeçalhos, palavras são escritas erradas (MANNINGe SCHÜTZE, 1999, p. 475;

p. 68-71).40 A partir do momento em que possuímos esse corretor ortográfico,

podemos corrigir as inexatidões do reconhecimento de texto.

38 “A body of texts is called a corpus — corpus is simply Latin for ‘body,’ and when you have several such collections of texts, you have corpora.”

39 “Probability theory deals with predicting how likely it is that something will happen. For example, if one tosses three coins, how likely is it that they will all come up heads.” 40 Denomina-se “Ruído” (Noise) todas essas interferências existentes. Para tratar esse

proble-ma, é usado um modelo chamado Noisy Channel: o seu objetivo é decodificar e achar o resul-tado final, o output, dado o mais provável input. No caso do OCR, temos o seguinte fluxo:

Aplicação Input Output P(i) P(θ|i)

OCR Texto a ser pro-cessado

Texto com erros Probabilidade da linguagem do texto

Modelo de erros do OCR

(29)

Já no tocante à comparação entre parágrafos, esse é o centro da auto-mação. Conforme explicado, inicialmente os advogados procuram por certas cláusulas específicas e previamente delimitadas. Dessa forma, se tivermos um Corpus com exemplos das cláusulas que desejamos encontrar, podemos pegar qualquer contrato e tentar identificá-las em seu inteiro teor.

Note que essa tarefa não é tão simples quanto executar uma busca rápida (“ctrl + f”) em um texto pesquisável. Para cada contrato, uma mesma cláusula pode apresentar diferentes variações. Mesmo que mude somente pequenos trechos e palavras, as ferramentas de busca dos leitores de texto mais comuns procuram sequências certas e exatas de termos, e não trechos similares. Por meio de uma abordagem probabilística, é possível resolver esse problema e alcançar o objetivo central deste artigo.

1.3.3 Machine learning

Uma vez que já temos a forma de achar as cláusulas nos documentos, precisa-mos aperfeiçoar a exatidão do software. Para isso, pose aplicar todo o de-senvolvimento que vem ocorrendo com o chamado Aprendizado de Máquinas ou machine learning.

O Aprendizado de Máquinas pode ser definido como métodos computa-cionais que se baseiam em experiências passadas para incrementar a perfor-mance do sistema e fazer predições mais acuradas. A cada nova interação do software, novos dados e informações lhe são passados. Esse conhecimento extra, então, pode ser usado para treiná-lo e para melhorar os seus resultados

(MOHRIet al., 2012, p. 1).

Essa suíte de ferramentas, algoritmos e técnicas, muitos dos quais ainda são campos de pesquisa abertos, pode ser encontrada por trás de diversos programas que usamos no dia a dia. Dentre eles estão as ferramentas de busca

(MOHRIet al., 2012, p. 2). O Google possui um algoritmo capaz de se

aperfei-çoar e se amoldar para cada um de seus usuários. Dependendo do que cada pessoa busca, ou seja, nas experiências passadas de cada usuário, o buscador é refinado e nos apresenta desde sites diferentes, até propagandas que são mais

compatíveis com os gostos de quem o usa.41

Ademais, os usos de machine learning vão muito além do já menciona-do. Seja nos filmes e séries que são recomendados de acordo com os gostos

de cada um na Netflix,42 seja no cálculo do tempo de entrega e preparo de

41 Mais informações acerca do Google podem ser encontradas nos seguintes links: <https:// www.bloomberg.com/news/articles/2015-10-26/google-turning-its-lucrative-web-search-o-ver-to-ai-machines> e <https://www.forbes.com/sites/bernardmarr/2017/08/08/the-ama-zing-ways-how-google-uses-deep-learning-ai/#5ffad9cc3204>. Acesso em: 29 abr. 2018. 42 Mais informações disponíveis em:

(30)

um pedido no UberEATS,43 na seleção da dificuldade de exercícios para um

aluno em sites de aprendizado como Kahn Academy,44 e até mesmo em

diagnósticos médicos.45

Pense nas aplicações disso para a automação do processo de due dili-gence. Os próprios advogados — usuários — poderiam auxiliar o software a melhorar a sua performance: a cada nova cláusula corretamente identificada, o seu texto pode ser inserido no Corpus, aumentando a quantidade de casos en-contrados pelo computador. Alternativamente, os usuários também poderiam sinalizar eventuais cláusulas incorretamente identificadas e, com isso, ajudar o software a entender e aprender quais casos ele deveria retornar como válidos, e quais são inválidos. Um exemplo trivial dessa ferramenta é a opção “adicionar ao dicionário” do editor de texto Word.

Nesse contexto, o Aprendizado de Máquinas talvez seja um bom sinaliza-dor do estado da arte da nossa tecnologia. A ideia de que softwares possam aprender sozinhos e se aperfeiçoarem pode parecer estranha e distante, mas já está presente no nosso dia a dia, e possui inúmeras aplicações.

2. Softwares de due diligence no mercado jurídico

A aplicação dos tópicos e tecnologias abordados no capítulo anterior não pode mais ser considerada uma novidade em auditorias legais no mercado jurídico. Embora não muito difundidas no mercado brasileiro, existem startups cujo foco é utilizar a ciência da computação e ferramentas de machine learning para via-bilizar análises contratuais mais céleres e eficientes. Assim, auxiliam a tornar o trabalho dos advogados menos árduo, além de lhes economizar tempo.

Nesse contexto, podem-se mencionar ao menos quatro dessas sociedades que possuem como um de seus focos due diligences. Primeiro, a Counselytics,

situada em Nova Iorque.46 Segundo, a eBrevia, uma startup fundada em

par-ceria com a Universidade de Columbia, por exemplo, por alunos de escolas da

mencionada universidade e da Harvard Law School.47,48 Um dos seus principais

43 Mais informações disponíveis em: <https://eng.uber.com/michelangelo/>. Acesso em: 29 abr. 2018.

44 Mais informações disponíveis em: <http://david-hu.com/2011/11/02/how-khan-academy--is-using-machine-learning-to-assess-student-mastery.html>. Acesso em: 29 abr. 2018. 45 Mais informações disponíveis em:

<https://www.ibm.com/blogs/think/2017/07/ai-schizo-phrenia-research/>. Acesso em: 28 abr. 2018.

46 Para mais informações, o site oficial pode ser acessado pelo link: <http://counselytics. com/>. Acesso em: 30 abr. 2018.

47 Para mais informações, o site oficial pode ser acessado pelo link: <https://ebrevia.com/ awards/>. Acesso em: 30 abr. 2018.

48 Mais informações disponíveis em: <http://entrepreneurship.columbia.edu/startup/ebre-via/>. Acesso em: 30 abr. 2018.

(31)

clientes é o reconhecido escritório de advocacia Baker Mckenzie,49,50 que atua

em parceria no Brasil com o Trench Rossi Watanabe.51 Por fim, temos a Kira

Systems52 e a Luminance.53 Pegaremos os dois últimos exemplos para entrar

em mais detalhes sobre os seus produtos e efetividade.

2.1 Kira Systems

A Kira Systems é uma sociedade norte-americana que conta com a Deloitte, a DLA Piper LLP, a Freshfields Bruckhaus Deringer LLP (Freshfields), a Clif-ford Chance LLP e a Latham & Watkins LLP como exemplos de seus principais clientes. Os quatro últimos são alguns dos maiores escritórios de advocacia do mundo, citados em rankings globais de maiores escritórios em número e

volu-me financeiro de operações de M&A.54

No ramo de due diligence, a startup se propõe a automatizar a extração e a análise de cláusulas-chave em diversos tipos de contratos, evitando que os advogados tenham que revisar manualmente inúmeros documentos. Dessa forma, caso se queira achar cláusulas de mudança de controle, o sistema de-senvolvido pela sociedade é programado para identificá-las e iluminá-las nos

contratos.55

De acordo com o site oficial da sociedade, a ferramenta que utilizam é ca-paz de identificar sempre ao menos 90% das ocorrências de uma cláusula nos documentos disponibilizados. Consequentemente, os advogados poderiam

fo-car suas auditorias nos 10% restantes.56,57

49 O escritório anunciou a parceria com a eBrevia em seu site oficial. Disponível em: <https:// www.bakermckenzie.com/en/newsroom/2017/08/ai-to-enhance-ma-and-transactional>. Acesso em: 30 abr. 2018.

50 Para mais informações sobre o escritório, acessar o link: <https://www.bakermckenzie. com/en/>. Acesso em: 30 abr. 2018.

51 Para mais informações sobre o escritório, acessar o link: <http://www.trenchrossi.com/ site/Atuacao-global.html>. Acesso em: 30 abr. 2018.

52 Para mais informações, o site oficial pode ser acessado pelo link: <https://kirasystems. com/>. Acesso em: 30 abr. 2018.

53 Para mais informações, o site oficial pode ser acessado pelo link: <https://www.luminance. com/>. Acesso em: 30 abr. 2018.

54 Um desses rankings está presente no Global M&A Market Review — Legal Rankings, feito pela Bloomberg, na p. 4. Disponível em: <https://data.bloomberglp.com/professional/si-tes/10/Bloomberg-Global-MA-Legal-Ranking-FY2017.pdf>. Acesso em: 30 abr. 2018. 55 Mais informações disponíveis em: <https://kirasystems.com/how-it-works/due-diligence>.

Acesso em: 30 abr. 2018.

56 Mais informações disponíveis em: <https://kirasystems.com/how-it-works/built-in-provi-sions>. Acesso em: 30 abr. 2018.

57 Um dado que não é mencionado é a precisão do software desenvolvido. Embora consi-ga identificar 90% das ocorrências de determinada cláusula, é provável que, para realizar isso, identifique erroneamente e coloque na mesma classificação cláusulas que não são as desejadas. No entanto, partindo do fato de que é mais fácil para uma pessoa analisar uma porção de parágrafos pré-selecionados do que documentos inteiros, mesmo que não tenha uma precisão alta, pode ser que compense o uso da ferramenta desenvolvida.

Imagem

Gráfico 1 — Número de transações de M&amp;A anunciadas de 2002 até 2017
Figura 2 — Arquivo xls usado para classificar   as cláusulas da Base de Dados
Gráfico 2 — Gráfico de barras que mede a frequência das palavras   nas cláusulas de Valor de Emissão
Gráfico 3 — Gráfico de barras que mede a frequência dos Bigramas  encontrados nas cláusulas de Valor de Emissão
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