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SEGURO PRIVADO: ENTRE A SOLIDARIEDADE E O RISCO

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SEGURO PRIVADO: ENTRE A SOLIDARIEDADE E O RISCO

DOUTORADO EM DIREITO

(2)

SEGURO PRIVADO: ENTRE A SOLIDARIEDADE E O RISCO

Tese apresentada à Banca Examinadora do

Programa de Estudos Pós-graduados Stricto Sensu

em Filosofia do Direito da Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo, como

exigência parcial para obtenção do título de

DOUTOR em Direito, sob orientação do

Professor Doutor Nelson Nery Júnior.

(3)

GANDA, Cláudio

CA_______ Seguro Privado: Entre a Solidariedade e o Risco.

Orientador: Professor Doutor Nelson Nery Júnior. São Paulo/SP: 2010, 437 págs.

Tese (Doutorado em Direito) Centro de Estudos Pós-graduados da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP.

1. Homem. 2. Sociedade. 3. Contratualismo. 4. Ética. 5. Política. 6. Economia. 7. Riscos. 8. Seguro. 9. Solidarismo. 10. Mutualismo.

(4)

Banca Examinadora

________________________________________________________________

Professor Doutor NELSON NERY JÚNIOR (Presidente – PUC/SP)

________________________________________________________________

Professor Doutor RICARDO HASSON SAYEG (PUC/SP)

________________________________________________________________

Professor Doutor PAULO LUIS DE TOLEDO PIZA (FGV)

____________________________________________________________________

Professor Doutor ANTONIO MÁRCIO DA CUNHA GUIMARÃES (PUC/SP)

________________________________________________________________

(5)

À D. Geralda Ganda, sempre!

À Rose; O tempo, senhor de todas as curas, nos concede a oportunidade

de experimentá-lo a cada sopro de nossas existências, a fim de que possamos cumprir essa travessia colhendo o que de melhor a vida pode oferecer: a sabedoria. A partir dela todas as demais coisas, em que pesem os seus defeitos, se revelam perfeitas e, como num jogo de quebra-cabeça, a harmonia que resulta do encontro dos seres desnuda tamanha perfeição que não ousamos jamais duvidar de que seja eterna. Assim tenho colhido até aqui e é isto que me permite hoje saber: Minha eterna Rose, amo

você!

À Maria Izabella; A emoção que transborda do meu coração confessa o quão abençoado sou e, mesmo sem que ainda lhe tivesse visto os olhinhos e sem lhe ter tomado nos braços, sabia o quanto te amo. Maria Izabella, amada filha, seja bem vinda!

(6)

Ao Clézio (In Memoriam); A vida, falível e finita, floresce cândida e leve para os bem aventurados que, por misericórdia ou benção, se nutrem no convívio com alguns poucos seres que, de tão iluminados e generosos, tornam esse nosso viver mais intenso e útil. Luzes que são, deixam-nos também iluminados, e, leves, projetam-se para o infinito, afastando-se sem nos deixar. Clézio, meu

(7)

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, instituição de ensino superior de notória

respeitabilidade em âmbito nacional e internacional, e cujo compromisso social e científico permite

a produção e difusão dos saberes, da edificação e emancipação humana;

Ao Professor Doutor Nelson Nery Júnior, em relação a quem, como ato de elementar justiça,

cumpre-nos demonstrar respeito e profunda admiração, e a quem devemos, como tem se tornado

costumeiro, para nossa felicidade, valiosos ensinamentos, dedicada atenção e inesgotável paciência.

Ao Professor Doutor Ricardo Hasson Sayeg, seleto amigo, irmão que contagia a cada dia com

demonstrações renovadas de bondade e sabedoria, virtudes que o dignificam sem enfraquecê-lo em

vaidades;

Ao Professor Doutor Antonio Márcio da Cunha Guimarães, douto no tema securitário, companheiro

de magistério jurídico nesta PUC/SP e distinto amigo que enobrece a trajetória de quem o cerca;

Ao querido Dr. Maurício Rodrigues Hortêncio, ilustre advogado, amigo incondicional, irmão

predileto que não esmoreceu no apoio e estímulo permanentes, não obstante os pesados encargos

dessa escolha;

Agradecimentos, que se estendem ao infinito com o propósito de que alcancem o saudoso Dr. Paulo

de Oliveira Filho, ilustre professor, com quem tivemos a honra da convivência e, de quem, a

oportunidade de haurir conhecimentos e exemplo de vida.

Por fim, amadas Rose e Maria Isabella, riquezas à vista de quem à dívida de gratidão se soma a

(8)

O passado não é imóvel pelo simples fato de ser

passado. Muda-se a posição do observador no tempo,

e eis que uma luz nova se projeta sobre os fatos,

revelando aspectos imprevistos, detalhes que alteram

substancialmente o quadro histórico, abalando

convicções das mais robustas.”

(Miguel Reale)1

(9)

Todo homem que for dotado de espírito filosófico

há de ter o pressentimento de que, atrás da realidade

em que existimos e vivemos, se esconde outra muito

diferente e que, por consequência, a primeira não

passa de uma aparição da segunda

(Friedrich Nietzsche)2

(10)

Seguro Privado e os Controles de Abusividade”, com a qual o autor obteve, na mesma instituição e também sob orientação do ilustre Professor Doutor Nelson Nery Júnior, o título de Mestre em Direito.

Enquanto naquele trabalho nos ocupávamos de estudar o contrato de seguro sob a sua estruturação interna, princípios regentes, elementos e características, víamos sobressair questionamentos acerca da essência desse negócio jurídico, os quais padecem de literatura específica e autorizada, sobretudo no âmbito acadêmico, dado que nos estimula e, mais que isso, nos desafia a enfrentar o tema segundo os seus vetores naturais humanos para, a partir deles, buscar uma conformação de cunho racional.

Adotamos, pois, como objetivo central deste trabalho o desafio de desenvolver um projeto de investigação do contrato de seguro, visando fazer uma análise e reflexão crítica a partir dos fatores de eclosão psicológica da necessidade de segurança e do interesse securitário, almejando vislumbrar os fundamentos dessa prática, quiçá, sob nova perspectiva jurídica, sobretudo no que concerne à tradicional dicotomia entre seguro social e seguro privado.

Com efeito, a despeito de se tê-lo por negócio econômico ou jurídico, vimos que o seguro é antes uma manifestação humana involuntária, inadvertida e desorganizada, com origem no processo biológico e desenvolvimento no campo de domínio da psicologia. Desse modo, avultam-se, do cotejo, liames da matéria com conhecimentos de trato das ciências exatas, notadamente as ciências matemáticas, e aprofundadamente nas ciências humanas, sendo possível, assim nos parece, viável o estudo do seguro também dentro dos domínios da antropologia, da psicologia, da sociologia, da economia, do Direito e do Estado.

A bem demonstrar a ambivalência do seguro, basta alinharmos de início o seu incondicional multilateralismo, assim como a inexpugnável hibridez dos interesses individuais e coletivos que o marcam, os quais ainda se desdobram, como visto, em difusos, tamanha a pujança e abrangência econômico-social que lhe são peculiares, com o seu trato adicional no campo do direito privado.

Mesmo em conta do aspecto marcadamente patrimonial que o caracteriza de modo indelével, permite-se atestar que o seguro não se cinge a barreiras de ordem econômica ou cultural, sendo até certo ponto natural a sua expansão para além dos marcos fronteiriços nacionais, com tendência globalizante.

Demarcadas as experiências do seguro anglo-saxão, de vocação capitalista e traço individualista – ao menos no que toca aos resultados financeiros da operação – e o de origem alpina, este centrado no mutualismo, o estudo dirige o seu olhar para os princípios informativos da operação, com destaque para o mutualismo e a solidariedade, essenciais e comuns a qualquer modelo securitário, não sem antes indagar sobre ser de ordem pública toda e qualquer operação de seguro, dada a supremacia do bem comum almejado pela prática e preponderância do aspecto coletivo sobre o individual.

(11)

This work is an unfolding and in depth thesis entitled: "The insurance contract and private control of abuse". This thesis was supervised under the guidance of renowned professor Dr. Nelson Nery Junior, MA Law.

While we examined insurance contracts under their structures, their principles in which they govern, and in their elements and characteristics, several questions arose about the essence of this legal transaction. The topic lacks peer reviewed literature and academic articles. Therefore, it is a challenging subject and we would like to address the issues of human instinct and find a conformation of human nature in which insurance contracts act.

Therefore, the objective of this paper is to challenge of developing a research project about insurance contracts in order to make an analysis and critical reflexion from the psychological factors in which the need for security has developed and in the interest of insurance. The aim of this paper is to discuss the reasons for such practice under a new legal perspective, especially regarding the traditional dichotomy between social insurance and private insurance.

In spite of similar economic or legal structures, we noted that insurance is involuntary, inadvertent and disorganized. The origin of insurance is a biological process in which the field of psychology has developed. Moreover, sciences such as mathematics and even humanities and social sciences such as: anthropology, psychology, sociology, economics, law and state, have manifested the issue even further.

A good example of insurance law, in which aligns unconditional multilateralism, as well as the impregnable hybrid of individual and collective interests that mark it, unfolds in such that is a breadth and strength of the socio-economic situation that is peculiar to, and in which has additional tract on the field of private law. In regard to the predominant aspect of society, insurance policies cannot be limited to economic or cultural barriers, since they are likely to expand beyond their national border, as a result of globalization.

As demonstrated in the instances of the Anglo-Saxon insurance policy, capitalism and individualism—at least in financial situations –and within the Alpine region, it is centred on the communitarianism. This study looks at the principle information of the operation, and more specifically at mutualism and solidarity, which are essential and common to any model insurance. However, not before inquiring about whether or not an insurance transaction is a good public policy, the interest of the whole must be overlooked by the interest of the individual.

(12)

PRIMEIRA PARTE: O HOMEM

Capítulo I: Aproximação através da Antropologia ... 34

I.1. A antropologia como ciência ... 34

I.2. A Antropologia biológica ... 38

I.3. A Antropologia sócio-cultural ... 54

I.3.1. Antropologia arqueológica ... 55

I.3.2. Arqueologia lingüística ... 57

Capítulo II: Aproximação através da Psicologia ... 58

II.1. Propriedades primárias do indivíduo (as faculdades cognitivas humanas) ... 61

II.1.1. O pensamento ... 64

II.1.2. A inteligência ... 66

II.1.3. O conhecimento ... 68

II.1.4. A consciência ... 70

II.1.4.1. Uma das categorias do espírito humano: a noção de “pessoa” e do “eu”... 73

II.1.5. A linguagem ... 77

II.1.6. A liberdade ... 81

II.2. Os sentimentos, paixões e vícios na órbita do indivíduo: a etiologia da neurose ... 85

II.2.1. O desamparo e a angústia ... 87

II.2.2. A violência e o medo ... 89

II.2.3. O medo e o imaginário do medo ... 94

II.2.4. Incerteza, insegurança, ansiedade ... ... 103

II.2.5. Perigo e risco ... 108

II.2.6. O homo ludens ... 112

Capítulo III: Aproximação através da Sociologia ... 117

III.1. A natureza social do homem ... 119

III.2. A sociologia como ciência ... 122

SEGUNDA PARTE: A HUMANIDADE Capítulo I: Em busca de nós mesmos ... 131

I.1. O mundo através da Mitologia ... 133

I.2. O mundo através da Filosofia ... 140

I.3. O mundo através das Ciências ... 147

I.4. O mundo através das Revoluções ... 152

TERCEIRA PARTE: A SOCIEDADE Capítulo I:. Conceitos sociológicos fundamentais (contatos, interações, relações e fatos sociais) ... 156

I.1. Contatos sociais ... 158

I..1.1. Isolamento social ... 160

I.2. Interações sociais ou reciprocidade das ações sociais ... 162

I.3. Relações sociais ... 164

(13)

I.4.1. Adaptação ... 170

I.4.2. Acomodação ... 170

I.4.3. Assimilação ... 171

I.4.4. Aculturação ... 172

I.5. Fatos sociais ... 173

Capítulo II: Conceitos sociológicos fundamentais (estrutura, regulamentação e instituições sociais) ... 176

II.1. Estrutura social ... 176

II.2. Regulamentação e Controle social ... 178

II.3. Instituições sociais ... 180

II.3.1. A Família ... 182

II.3.2. O Estado ... 184

II.3.2.1. O interesse público e o privado ... 186

II.3.3. A Igreja ... 189

II.3.4. Instituições Educacionais ... 192

II.3.5. Instituições Econômicas ... 192

Capítulo III: A vida em sociedade ... 195

III.1. A Cultura ... 197

III.1.1. Socialização ... 198

III.2. A linguagem ... 209

III.2.1. A Comunicação social ... 212

III.2.1.1. A indústria cultural ... 214

III.2.1.2. A ideologia ... 216

III.3. A Política ... 220

III.4. O Comércio ... 221

III.6. A Economia ... 224

III.6.1. O Capitalismo ... 228

QUARTA PARTE: O SEGURO Capítulo I: Seguro e segurança: o aspecto semântico ... 235

Capítulo II: A etiologia do seguro ... 239

II.1: Angústia, medo, incerteza, insegurança, risco e perigo: crepúsculo da felicidade? ... 247

II.2: Gestão dos riscos ... 252

II.2.1. Modos de enfrentamento dos riscos ... 256

II.2.1.a. Modos de gestão individual de riscos: prevenção e poupança ... 258

i. Prevenção ... 258

ii. Retenção ... 260

iii.Distribuição ... 263

II.2.1.b. Modos de gestão coletiva de riscos: partilha e transferência ... 264

i. Partilha dos riscos ... 264

ii. Transferência dos riscos entre agentes ... 267

(14)

II.3. Seguro: atomização do contrato social ... 282

i) Coletivismo ... 283

ii) Comunitarismo ... 287

iii)Solidarismo ... 290

iv)Mutualismo ... 293

Capítulo III: Manifestação do seguro ... 298

III.1. O seguro como jogo ou aposta ... 300

III.2. O seguro técnico ... 303

i. A empresarialidade ... 305

ii. Seguro é prestação de serviços ... 307

iii. Seguro é relação de consumo ... 310

iv. Obrigação de meio, de resultado ou de garantia? ... 313

v. Da atividade securitária não resulta risco para a seguradora (teoria da base objetiva do negócio) ... 319

vi. Contrato multilateral e multitudinário ... 327

vii. Função social do contrato de seguro ... 330

viii. Da inexistência de alienação de patrimônio pelo do contrato de seguro ... 334

III.2.1: O seguro mútuo ... 344

III.2.2: O seguro mercantil ... 351

III.2.3: O seguro alpino ... 360

III.2.4. O seguro social ... 363

Capítulo IV: O direito do seguro ... 370

IV.1. O contrato de seguro brasileiro de lega lata... 379

IV.2. O contrato de seguro segundo a doutrina ... 385

IV.3. Jurisprudência do seguro ... 387

IV.3. O contrato de seguro brasileiro de lege ferenda ... 392

QUINTA PARTE: CONCLUSÕES ... 397

(15)

AA.VV. autores vários a.C. antes de Cristo

ac. acórdão adap. adaptação

ADC Ato das Disposições Constitucionais Transitórias ADIn Ação Direta de Inconstitucionalidade

adj. adjetivo; adjunto

AGF Assurances Générales de France AGU Advocacia Geral da União

al. alemão

ALCA Associação de Livre Comércio das Américas ampl. ampliado (a)

ANS Agência Nacional de Saúde Suplementar art./arts. artigo/artigos

atual. atualizado (a)

BACEN Banco Central do Brasil

BGB Código Civil alemão (Bügerliches Gesetzbuch)

ca. circa; cerca de; por volta de

CADE Conselho Administrativo de Defesa Econômica Câm. Câmara

Cap. Capítulo

cc. centímetros cúbicos c/c. combinado com

CC/16 Código Civil brasileiro (Lei Federal nº 3.071/1916) CC/02 Código Civil brasileiro (Lei Federal nº 10.406/2002)

CDC Código de Defesa do Consumidor (Lei Federal nº 8.078/90) CECA Comunidade Européia do Carvão e do Aço

CEE Comunidade Econômica Européia

CEEA Comunidade Européia de Energia Atômica

cf. conforme; confira, confronte, compare CF Constituição Federal

CF/88 Constituição Federal de 1988 cit. citado; citação

civ. civil; cível

CONSU Conselho Nacional de Saúde Suplementar CONSIF Confederação Nacional do Sistema Financeiro

coord. cordenação; coordenador; coordenadora CMN Conselho Monetário nacional

CPC Código de Processo Civil

cs. indica pronúncia greco-italiana do x CVM Comissão de Valores Mobiliários

D. Dom

d.C. depois de Cristo Des. Desembargador (a)

DJ Diário da Justiça DL Decreto-lei

(16)

DOU Diário Oficial da União Dr. Doutor

Dra. Doutora

EC emenda constitucional

ECA/USP Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo ed. edição

EDIPUCRS Editora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul EDUNEB Editora da Universidade do Estado da Bahia

EEE Espaço Econômico Europeu

EFTA Associação Européia do Comércio Livre

e.g. exempli gratia

em. ementa; ementário

epi equipamento de proteção individual est. estadual

et. al. e outros

Et. Nic. Ética a Nicômaco

et. seq. e seguintes

EUA Estados Unidos da América Exeg. Exegese

FEA-USP Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo fed. federal

FGV Fundação Getúlio Vargas

FEMAR Fundação de Estudos do Mar (Brasil: Botafogo – Rio de Janeiro/RJ) fr. francês

FUCAP Faculdades Unidas Capivari - Capivari de Baixo/SC FUNENSEG Fundação Escola Nacional de Seguros

geom. geometria gr. grego

ibidem; ibid. do mesmo autor, em página diferente ou mesma obra

idem; id. referência subsequente de um mesmo autor

i.e. isto é inc. inciso

in. inglês

IRB Instituto de Resseguros do Brasil IRB-Brasil RE IRB Brasil Resseguros S/A.

it. italiano

j. julgado / julgamento LACP Lei da Ação Civil Pública lat.; lt. latim

LC Lei Complementar

loc. cit. no trecho citado Maa Milhões de anos

MEFP Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento MERCOSUL Mercado Comum das Américas

Min. Ministro (a) m.v. maioria de votos n.; n° número

(17)

OIT Organização Internacional do Trabalho ONU Organização das Nações Unidas

op. cit.; opus citatm obra citada p.; § parágrafo p.; pág. página

págs. páginas

par. ún. parágrafo único

passim por aqui e ali; em diversas passagens Profª. Professora

Prof. Professor Prov. provimento

PUC/SP Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Rel. Relator (a)

res. resolução

rev. revisão ou revisado (a) séc.; s. século

seç. seção s/d; [s. d.] sem data

s/e; [s. e.] sem editora

s.f. substantivo feminino sic assim mesmo

s.m. substantivo masculino s/n sem número

SNSP Sistema Nacional de Seguros Privados SP São Paulo

ss. seguintes

STF Supremo Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça

SUSEP Superintendência de Seguros Privados T. Turma

t. tomo

TACiv/SP Tribunal de Alçada Civil de São Paulo (extinto) tb. também

TCE Tratado da Comunidade Européia tirag. tiragem

TJMG Tribunal de Justiça de Minas Gerais TJRJ Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro TJSP Tribunal de Justiça de São Paulo

t.l.a. tradução livre do autor Trad. Tradução; tradutor(a)

UFPA Universidade Federal do Pará un. unânime

UNCTAD United Nations Conference on Trade anda Development UNESP Universidade do Estado de São Paulo

UniFMU/SP Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas - São Paulo v.g. verbi gratia

vol. volume

(18)

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Cameleiros da Mesopotâmia ... 344

Figura 2 – Navios ... 351

(19)

INTRODUÇÃO

A tarefa não é contemplar o que nunca foi contemplado, mas pensar como ainda não se pensou sobre o que todo mundo tem diante dos olhos. (Schopenhauer) 1

O tema exposto no presente ensaio foi eleito dentre outras alternativas por possibilitar relevante e oportuna discussão em torno da atividade securitária de caráter privado em todo o mundo, sobretudo no que respeita às suas repercussões sociais, econômicas e jurídicas, jornada que se abre ante a perspectiva de releitura e de ressignificação do contrato de seguro, tomado o mesmo a partir dos elementos técnicos e jurídicos envolvidos, com possível revisão da hermenêutica que o envolve desde a sua aparição organizada no Renascimento, tudo com o escopo de sua reconfiguração ou reclassificação no âmbito do Direito.

(20)

Trata-se, o seguro, de mecanismo de prevenção contra riscos que tem origem no espírito de solidariedade, sentimento inerente ao homem, o que haveria de imprimir conotação exclusivamente comunitária à atividade, modelo em que a solução econômica se constrói pela repartição dos riscos entre uma mutualidade e cujos resultados deveriam reverter exclusivamente para o grupo sob a forma de investimentos e de fomento ao desenvolvimento social equilibrado, meio de cumprimento dos objetivos fundamentais da República que traduzem o escopo do desenvolvimento nacional (CF, art. 3º, I).

No entanto, iniciada nos negócios a riscos do mar, a atividade securitária adquiriu o traço da transferência de riscos, modalidade contratual em que a parte tomadora assume para si as consequências adversas oriundas dos riscos eleitos, com objetivo de lucro. Assim, nascida e cultivada em meio ao efervescente comércio marítimo europeu desde os primeiros sinais de esgotamento do modelo feudal, a atividade securitária sempre aguçou a imaginação do homem comum, ao mesmo tempo em que lhe despertava fascínio, especialmente em virtude da elevada margem de prosperidade dos capitalistas financiadores das expedições, via de enriquecimento, porém, que não se abria senão mediante assunção de elevada carga de riscos. Tais circunstâncias cobriam o seguro de admiração e perplexidade, na mesma dimensão de como, nos salões de jogos, as apostas em andamento atraem e mantêm absorta, à volta da roleta, uma boa parcela de admiradores.

(21)

ideias de Montesquieu e Rousseau, dentre outros, desembocou na Revolução Francesa, marco principal de emergência e de preponderância do indivíduo. Com efeito, consolidados os ideais iluministas, inaugurada a soberania do povo a partir da qual se alicerça o Estado de Direito, desencadeou-se a implantação de governos presididos pela Razão. A esse modelo de Estado incumbe, pois, a função precípua de promover a segurança que o máximo de liberdade individual passou a exigir, respeitado o ideal do laissez-faire, laissez-passer2, fundamento da garantia de que o fluxo de capital estivesse livre de qualquer interferência do Estado, o que, sabemos, assegurou a ascensão da burguesia.

A nosso ver, a despeito de ser prática liberal recorrente a privatização dos lucros e a socialização dos prejuízos, sobressai coerente com os desígnios egoísticos do liberalismo a dicotomização do seguro em público e privado, olvidado, por óbvio, o trinômio iluminista essencial que ditava as palavras de ordem no levante de 1789: liberté, égalité, fraternité.3

Agora, em tempos de inegável redimensionamento do individualismo jurídico, que se forjou a reboque da Revolução burguesa de 1.789, e de supremacia do mandamento legal da função social do contrato, na sintonia dos princípios constitucionais da Carta Política de 88 e também do recém promulgado Código Civil brasileiro com o seu apego ao princípio da socialidade4, quer nos parecer enfrentar crise de paradigma o contrato de seguro pautado pela transferência de riscos, mormente se tomarmos a observação sob o ângulo da empresa seguradora como mera administradora de um fundo comunitário, o que desafia a construção de um novo processo de relações entre

2 Deixe à vontade; deixe passar. 3 liberdade, igualdade, fraternidade.

(22)

capital, trabalho e Estado, sem perder de vista, nessa mesma dinâmica, os ditames da função social da propriedade e, na sua extensão, da empresa.

Tal paradoxo oferece um campo de pesquisa bastante fértil no plano teórico, posto que ainda pouco explorado. Trata-se de tema social, econômico e jurídico de crescente importância, que, bem por isso, interessa não só aos estudiosos e operadores do direito, bem como a toda a sociedade, o que, nesse sentido, exige do investigador uma certa mobilidade do intelecto como pressuposto para a produção de um novo conhecimento em torno do objeto já tido sob o domínio da razão.

Seguimos, então, os passos metodológicos sugeridos pelo eminente professor Luciano de Camargo Penteado, Doutor e Mestre pela Universidade de São Paulo – USP, que em sua obra do Direito das Coisas, leciona:

O direito normalmente tem sido estudado a partir da lei. Parte-se dela para depois, com a citação de jurisprudência, exemplificar o que se passa. Trata-se assim, o caso concreto, de modo residual, dando-se pouco valor à perspectiva judicial que o sistema de direito apresenta. Entretanto, muitas vezes, é preciso inverter a ordem para pensar o direito a partir do caso concreto, para dele extrair as generalizações necessárias ao conhecimento científico do direito.5

O seguro, a fortiori, está a reclamar esta postura dos estudiosos, tendo em vista que as incontáveis peregrinações em torno do tema mostram marchas e contramarchas sobre as mesmas pegadas e trilhas inicialmente abertas em direção ao seu conhecimento, nada úteis, porém, para desvendar-lhe os “mistérios” mais evidentes.

E nessa linha de propósito, a pesquisa aqui implementada busca se filiar à corrente doutrinária do capitalismo humanista, cujo pensamento orienta estudos voltados aos princípios e fundamentos que sustentam uma teoria do Direito que

(23)

harmoniza os aspectos econômicos do capitalismo com os pilares dos direitos humanos e sociais, tudo sob a ótica do capitalismo democrático eleito pela Constituição Federal de 1988, com sustentação nos pilares da soberania, da cidadania, da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais da livre iniciativa e do trabalho humano, com vistas a assegurar a todos condições de vida digna, sob os ditames da Justiça Social.6

Nesse compasso, adotada como referencial teórico a antítese da corrente de pensamento liberal ou neoliberal que defende o livre mercado, assim também expressada com ênfase pela chamada Escola de Chicago7, neste estudo envidaremos esforço teórico na empreitada de demonstrar o que entendemos, no caso do seguro e em decorrência da visão puramente capitalista, consistir em inconsistência fundamental marcada pela indevida apropriação do instituto do seguro pelo capital, em detrimento do desenvolvimento econômico, social, político e cultural.

Para além disso, independentemente da frontal inconsistência teórica acima referida, a mais aguçar as dúvidas em torno da mencionada crise paradigmática do contrato de seguro, tomemos em lembrança as lições de Mauro Cappelletti coligidas em nossa já aludida dissertação de Mestrado “O Contrato de Seguro Privado e os Controles de Abusividade” 8, as quais dão conta de que a

6 A respeito da Doutrina Humanista de Direito Econômico, vide o Grupo de Estudos de Direito Econômico, da

PUC/SP, coordenado pelo eminente Professor Doutor Ricardo Hasson Sayeg.

7 Escola de pensamento econômico monetarista, reunida em torno de Milton Friedman e de outros professores da

Universidade de Chicago, e que sustenta a possibilidade de manter-se a estabilidade de uma economia capitalista apenas por meio de medidas monetárias, baseadas nas forças espontâneas do mercado. Milton Friedman, o principal teórico do grupo, considera a provisão de dinheiro o fator central de controle no processo de desenvolvimento econômico. Explica as flutuações da atividade econômica não pelas variações do investimento, mas apenas pelas variações de oferta de dinheiro – entendida como a demanda monetária que depende da renda permanente dos agentes econômicos. [...] Apoiando-se numa forte crença nos mecanismos de competição e nas forças do livre mercado, a Escola de Chicago é contrária a qualquer política poskeynesiana de participação do Estado na expansão das atividades econômicas, sustentando que qualquer intervenção desse tipo é inútil e nociva e que apenas uma correta política monetária pode levar à estabilidade econômica. Além de Friedman, destacam-se na Escola de Chicago Henry Simons, F. A. von Hayek, Frank Knight e George Stigler. (Paulo Sandroni, Dicionário de Economia ...,; op. cit. págs. 305/306, verbete : Escola de Chicago.

8 Cláudio Ganda, O Contrato de Seguro Privado e os Controles de Abusividade. São Paulo: PUC/SP, 2004.

(24)

tradicional dicotomia do interesse em público (o indivíduo em relação ao Estado) e privado (os indivíduos em inter-relação) sofreu acentuada transformação, pois entre eles passaram a ser vislumbrados os interesses intermediários que transbordam daqueles meramente individuais, sem, contudo, alcançar a categoria de interesse público, fazendo emergir os direitos metaindividuais ou interesses de grupos de indivíduos.9

De fato:

Há um momento no qual os interesses individuais, agrupando-se, despojam-se de sua carga de egoísmo, para formar um novo ente: o interesse coletivo. Aí, não se trata de um reforço à tutela dos interesses individuais, conferido pelo grupo, mas da defesa de um interesse que depassa a mera soma dos interesses pessoais, agrupados. Esses interesses coletivos encontram seu lugar a meio caminho entre os interesses particulares e o interesse público ou geral.... 10

No caso das operações de seguro, certo que os interesses nelas enfeixados extravasam os dos sujeitos comumente eleitos, a saber, segurados e seguradora, vemos sobressair aqueles próprios do conjunto dos segurados que, em última análise, é titular da formação do fundo comum de que se vale a seguradora para garantir o ressarcimento de sinistros cobertos e, assim, adimplir com um dos aspectos de sua obrigação de promover a garantia contratada. Visto sob esta lente, não é menos certo que a seguradora, no papel de agente do pagamento da importância segurada, por exemplo, dela não é titular, posto que o faz por terceiro, no caso a mutualidade de segurados.

Nessa perspectiva, forçoso concluir que se a seguradora ressarci mal um sinistro, enriquece indevidamente o segurado, em prejuízo da comunidade dos seus segurados, já que o faz com recursos do fundo comum; no viés oposto,

9 “Formações sociais e interesses coletivos diante da justiça civil”. São Paulo: Revista de Processo v. 2, nº 5, págs. 129/159, Jan./Mar. 1.977.

(25)

injustamente recusado o ressarcimento de prejuízo advindo de sinistro coberto – leia-se previsto - pela apólice, descumpre sua obrigação de prestar a garantia contratada, em detrimento do escopo do seguro, consistente em elidir o estado de insegurança daqueles que aderiram. Ipso fato, não obstante a providência securitária, na hipótese de rejeição de justo ressarcimento, todos voltam ao estado de insegurança, ante a possibilidade de sofrer dano sem possibilidade de recomposição patrimonial.

Como se vê, há uma escala de interesses no seguro que transcende aos estritamente intersubjetivos, os quais não estão a receber adequada abordagem ética e teórica e, consequentemente, não encontram coerente trato e proteção do Estado, mercê do olhar mercantilista lançado sobre a operação, o que veda a possibilidade, nas economias desenvolvidas, de se utilizar o sistema securitário como um moderno recurso de proteção econômica e moral ao alcance da comunidade segurada e proveito de toda a sociedade, mormente diante da opção política de financiamento público direcionado às áreas de interesse social, como saúde e segurança, matérias de inquestionável emergência e inegável identidade com o contexto do seguro.

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Assim definidas as duas vertentes, decorre lógico inferir que o primeiro dos sistemas aqui abordados, também conhecido por modelo marítimo, tem o seguro como um mercado submetido às regras da livre concorrência, em que a precariedade dos contratos e a segmentação das tarifas suplantam a inerente solidariedade que dessai da diluição dos riscos no seio de uma coletividade. O outro, de nítido caráter institucional, atua através de organismos cooperativos de seguro e de previdência em que se compartilham os riscos, dependendo, para tanto, de mercado rigorosamente regulamentado, viés oposto àquele primeiro. Curiosamente, a experiência assistencialista erigida a partir das guildas, corporações artesanais ou corporações de ofício, e das hansas, associação de mercadores, largamente atuantes na Europa medieval, não obstante fundada nos mesmos pressupostos da atividade securitária, não foi eficiente para cultivar essa prática sob os cânones do solidarismo, bastando-se em marcos de inauguração do seguro social previdenciário.

A dualidade demarca não só o seguro segundo os sistemas de sua exploração econômica, mas expõe a coexistência de mais de um modelo capitalista, tal como alude Michel Albert em sua obra “Capitalisme contre capitalisme” (Paris: Éditions du Seuil, 1991), o que assume importância máxima no

cenário contemporâneo de profundas e ao mesmo tempo rápidas transformações dos rumos das sociedades ocidentais, sobretudo no que respeita aos aspectos socioeconômicos e espaciais, aí entendido o fenômeno da globalização, talhado para um sistema produtivo de escala, facilitador da consolidação de grandes empresas e de mercados transnacionais, com grande fluxo de capitais, produtos e serviços.

Por mais simplória que possa parecer a lição de fecundar a terra que dá o trigo e permite o milagre do pão11, cujo grão tem de morrer para germinar;

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morre, nasce trigo, vive, morre pão12, é no solo fértil das lições filosóficas de Aristóteles, Hobbes e Kant que buscaremos diálogo com as questões políticas, éticas e jurídicas mantidas em aberto por essas três figuras para o trato das relações entre justiça, direito e democracia, triangulação que este estudo irá realçar como exigência da redescoberta do chamado seguro privado.

É esse o contexto que servirá de norte para a pesquisa que se propõe: visando a sistematização do conhecimento em torno das concepções consagradas universalmente sobre o seguro, com enfoque no conhecido seguro privado, e buscando identificar em cada uma delas a sua teoria geral, através da qual possibilitar-se-á a obtenção dos respectivos conceitos, características e regras gerais, e a política, assim entendida a parte do estudo dedicada à investigação das normas regentes dos institutos, adotadas em países filiados a uma e à outra corrente, a fim de que o seguro alcance efetivamente a sua melhor performance.

Nessa seara, uma vez identificada a segura definição do instituto, unitária ou não, fixados os conceitos econômico, social e jurídico do seguro, proceder-se-á a uma análise comparativa dos sistemas jurídicos apropriados a cada um dos modelos conhecidos, especialmente no que respeita à tutela dos interesses enfeixados nas operações securitárias.

Para tanto, indispensável investigar, a partir da gênese da atividade securitária e seus vetores sociais e econômicos, sobre a classificação científica de todos os elementos constantes da operação, providência a se valer de recursos multidisciplinares, partindo, no particular, da doutrina do contrato social.

A nossa acuidade em torno do seguro em sua projeção exclusivamente comunitária encontra eco na obstinação da educação grega em formar por meio

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dela verdadeiros homens, nos quais a consciência clara dos princípios naturais da vida humana e das leis imanentes que regem as suas forças corporais e espirituais adquire a mais elevada importância.

O princípio espiritual dos Gregos não é o individualismo, mas o «humanismo», para usar a palavra no seu sentido clássico e originário. [...] Tal é a genuína paideia grega, considerada modelo por um homem de Estado romano. Não brota do individual, mas da idéia. Acima do Homem como ser gregário ou como suposto eu autônomo, ergue-se o Homem como idéia. (sic) 13

Na mesma linha de observação filosófica, conforme sinalizamos, pretendemos apoiar a busca também na doutrina contratualista, a qual encontra defesa difundida a partir das obras de Hobbes, Rousseau e Locke, adicionadas, ainda, as contribuições advindas de Ronald Dworkin e John Rawls.

Respeitadas a complexidade do tema e a interpenetração de várias áreas do saber no fenômeno social do seguro, esta abordagem não foge ao imperativo de cooperação e de interação entre as disciplinas das ciências sociais e humanas já destacadas acima, única alternativa, no nosso entender, de tornar profícua a investigação e o diagnóstico dos caracteres inatos e das transformações e adaptações por que tem passado o instituto ao longo de sua história.

Bem por isso, como se verá adiante, o estudo se desenvolve em quatro partes, dedicada cada uma delas ao enfoque específico da interação do sujeito com os elementos externos de organização da vida individual e, principalmente, comunitária e do desenvolvimento dessas instituições desde a Antiguidade, em especial o Estado. Uma quinta e última parte do trabalho é destinada ao arremate dos achados e análise dos mesmos, o que se apresenta sob a forma de conclusões.

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A primeira parte (O Homem) é dedicada ao estudo do homem sob a perspectiva antropológica, buscando compreensão da lógica do homem sob suas dimensões básicas, partindo da observação da interação biológica e cultural do indivíduo e relacionando-a com a mente humana dentro do contexto psicológico, ritual e geográfico. Na segunda parte (A Humanidade), voltamos nossa atenção para a evolução da aventura do homem desde sua aparição sobre a Terra, assinalando a epopéia que o mesmo protagonizou em busca de conhecimento, modo de se dominar o ambiente com vistas à estabilidade e à segurança. A seguir, na terceira parte (A Sociedade), estudamos os conceitos sociológicos fundamentais, tratando de destacar as vinculações manifestadas na vida coletiva de diferentes modos, as quais se manifestam, segundo os estudiosos, em termos de contatos, interações, relações e fatos sociais. Segue-se, na quarta parte (O Seguro), a abordagem do instituto tomado em foco pela tese, cuidando advertir que o fazemos especificamente em torno do seguro privado, tomando-o desde sua pulsão psicológica, instalada involuntária e desorganizadamente nos sentimentos do indivíduo, até a sua elaboração material, esta consubstanciada no contrato de seguro que se organiza assentado, inexoravelmente, numa mutualidade. Por fim, na quinta e última parte (Conclusões), como já dito, procuramos arrematar as idéias e articulações do texto mediante a tentativa de sustentação da natureza pública do contrato de seguro, empreendendo esforço também para demonstrar ser teoricamente equivocada a tradicional dicotomia entre seguro público e privado.

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dissonância entre a produção e aplicação da lei formal e os parâmetros éticos que devem orientá-las à realização da justiça.

O trabalho terá por base a pesquisa bibliográfica multidisciplinar, envolvidas as áreas da Antropologia, Sociologia e Psicologia, recaindo nos domínios da Filosofia do Direito o fio condutor da presente tese. A pesquisa será tomada em doutrina nacional e estrangeira, seja em livros, artigos, monografias ou teses, cuidando, ainda, de cotejar a legislação interna e a jurisprudência voltadas ao assunto, sendo que no seu desenvolvimento, com efeito de sustentação teórica, observaremos a identificação dos fenômenos que consagram novos paradigmas, novos conceitos relacionais e contratuais impositivos, por decorrência, de uma nova categorização do contrato de seguro.

No tocante ao título emprestado a este ensaio, seja-nos permitido adicionar uma nota explicativa e ao mesmo tempo antecipatória da linha da pesquisa.

Quer nos parecer decorrente do enfrentamento político e de deliberação legislativa a questão sobre ter o seguro como atividade econômica dada à livre iniciativa do capital, nos limites próprios emoldurados pelo liberalismo clássico, e submetendo os contratantes ao libelo do pacta sunt servanda, caso em que a opção se rende ao argumento do negócio mercantil que justifica o lucro a partir dos riscos da atividade – embora saibamos, hoje, da inexistência da álea no contrato de seguro -, ou tê-lo como instrumento comunitário, de índole solidária e voltado para a efetiva segurança coletiva e promoção do bem comum.

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[...] liberdade e igualdade formal dos contraentes apareciam como os pressupostos, não só da prossecução dos interesses particulares destes últimos, mas também do interesse geral da sociedade. As teorias económicas então prevalentes – traduzidas no plano prático, na directiva do

laissez-faire, laissez-passer – pretendiam, de facto, que o bem estar colectivo podia conseguir-se da melhor forma, não já com intervenções autoritárias do poder público, mas só deixando livre curso às iniciativas, aos interesses, aos egoísmos individuais dos particulares, que o mecanismo do mercado e da concorrência – a «mão invisível» de Adam Smith – teria automaticamente coordenado e orientado para a utilização óptima dos recursos, para o máximo incremento da «riqueza da Nação». E é claro que esta liberdade de iniciativa económica, considerada socialmente útil e necessária, traduz-se no plano jurídico precisamente da liberdade, entendida igualmente conforme o interesse social, de estipular contratos quando, como e com quem queira. Na segunda metade do século passado um juiz inglês exprimia sugestivamente este pensamento: «se há uma coisa – afirmou sir George Jessel na fundamentação de uma sentença de 1875 – que o interesse público (public policy) requer mais do que qualquer outra, é que homens adultos e conscientes tenham a máxima liberdade de contratar, e que os seus contratos tenham a tutela dos tribunais». (negritamos) 14

No entanto, é cediço e a história confirma, a liberdade não tem sido um atributo útil a viabilizar a realização da justiça; ao contrário, o seu uso tem proporcionado em larga escala a usurpação de direitos e a tirania. Demais disso, ante a cultura jurídica contemporânea, sobretudo a brasileira, erigida sobre os valores edificantes do humanismo, ou seja, da dignidade da pessoa humana, da valorização social do trabalho e da livre iniciativa15, em busca da construção de uma sociedade livre, justa e solidária, com garantia de desenvolvimento nacional e erradicação da pobreza e da marginalização para o bem de todos16, não há como não se ter por anacrônica a ideia de absoluta liberdade econômica, tal como apregoada e ferrenhamente defendida pelo neoliberalismo.

Adiantando-nos em arrefecer eventuais prevenções acerca da histórica – e infelizmente procedente - crítica sobre a ineficiência da intervenção estatal na economia, alentamos com o fato de que a doutrina humanista do direito

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econômico nasce do processo de universalização e garantia dos direitos humanos fundamentais, nas suas dimensões econômica, cultural e social, assim como consagrado na Carta das Nações Unidas e nos documentos internacionais posteriores que assentam a inalienabilidade dos valores do homem e da humanidade, de sorte que a factibilidade de modelos alternativos ao despotismo econômico haverá de ser construído e incorporado à realidade do mundo posmoderno.

Conforme mencionamos acima, apregoamos a adesão ao “compromisso ético e social de colaborar com a aplicação do ‘direito do bem’ que, com fundamento na livre iniciativa e valorização do trabalho humano, garantam a todos uma existência digna conforme os ditames da justiça social”. 17

17 Ricardo Hasson Sayeg, Revista de Direito Internacional e Econômico. Porto Alegre: Síntese, ano 1, nº 1, pág.

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Capítulo I: Aproximação através da Antropologia

I.1. A Antropologia como ciência

Carvalho NunesI

Para a Antropologia, o Mesmo e o Outro são o Mesmo; ou, o Outro e o Mesmo são o Outro.

(Mércio Pereira Gomes)18

No ano de 1800 desta nossa era Cristã, um grupo de médicos e naturalistas fundou em Paris a Sociedade dos Observadores dos Homens, visando promover o estudo da História Natural, através da qual forneceriam, principalmente, de acordo com o projeto, orientação aos viajantes e exploradores de regiões longínquas.19 Ficou, no entanto, impossibilitada de prosseguir com suas atividades, pois, em decorrência das Guerras Napoleônicas que se alongavam em demasia, o comércio e as viagens ao exterior cessaram.

Com isso, interrompido o fluxo de dados e informações úteis aos estudiosos, a entidade reorientou o seu foco para questões históricas e psicológicas ligadas à etnologia.20 Portanto, embora não por livre escolha dos patrocinadores, a História Natural foi negligenciada em favor da Filosofia, da Política e da Filantropia. Somente entre 1830 e 1840, momento de grande

18 InAntropologia: ciência do homem; ciência da cultura, pág.12.

19 Até o século XVIII o saber antropológico ficou circunscrito às contribuições de cronistas, viajantes, soldados, missionários e comerciantes que discutia, em relação aos povos que conheciam, a maneira como os mesmos viviam, cultivavam seus hábitos, normas, características, interpretavam os seus mitos, os seus rituais, a sua linguagem, etc.

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importância para o estudo do homem, é que a aparição e consolidação da Antropologia se deram com aceitação científica.21

Do gr. άνθρωπος, transl. anthropos = homem + λόγος, transl. logos = estudo, razão. Antropologia significa estudo e - também - lógica do homem e da humanidade em sua totalidade, sendo que, no primeiro caso a mesma se revela um dos campos das ciências humanas, tal como a sociologia ou a economia, ao passo que, sob o segundo enfoque, o estudo se concentra na observação da mente humana dentro do seu contexto psicológico, ritual e geográfico, ou seja, relacionando-se com temas próprios de outros campos do saber, a antropologia, aqui, assume um aspecto mais sensitivo, tomando em observação o homem em sua interação cultural e biológica, consideradas essas as dimensões básicas do ser humano.

Por ser ciência da humanidade e da cultura, com um campo de observação extremamente vasto, preocupa-se, no espaço, com toda a terra habitada; no tempo, durante cerca de dois milhões de anos, com todas as populações socialmente organizadas.

Sobressai lógico, portanto, que duas subáreas da antropologia, com objetivos definidos e interesses teóricos próprios, inauguraram esse campo científico, a saber, a Antropologia Biológica e a Antropologia Cultural, às quais se somaram, por questões de ordem prática, os subcampos da Arqueologia, da Antropologia Linguística e da Antropologia Aplicada. A propósito, não é demais anotar que o Dicionário de Ciências Sociais, do Instituto de Documentação da Fundação Getúlio Vargas22, faz inserir adiante do verbete “antropologia”, as seguintes especialidades da área: Aplicada, Cultural, Econômica, Física,

21 Sol Tax, “Início da ciência do homem” - Panorama da Antropologia. Rio de Janeiro: Editora Fondo de Cultura, 1966, pág. 10.

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Política, Social, Urbana, além de explicitar a Antropometria23, o que entende com a vastidão do campo de observação da antropologia, que, por ser muito amplo, não é possível ser realizado por um único profissional, soando certo que nenhum antropólogo conseguiria dominar, sozinho, todos os campos abrangidos pela disciplina.

Os estudiosos da história da Antropologia explicam que os filósofos gregos, por se julgarem pertencentes a um povo muito superior aos demais e nações vizinhas - a quem chamavam de bárbaros -, por não terem olhos ou interesse em relação aos mesmos, não podem ser confundidos como precursores ou mesmo fundadores dessa ciência, cuja característica mais marcante, a propósito da epígrafe, é exatamente mirar o outro como um possível igual a si mesmo. Santo Agostinho, ícone teológico do catolicismo, muito tempo depois, descreveria as civilizações greco-romanas pagãs como moralmente inferiores em relação às sociedades cristianizadas.24

O professor Mércio Pereira Gomes, antropólogo, professor adjunto do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal Fluminense, destaca em sua obra, por exemplo, que a Europa somente se abriu à possibilidade de reconhecimento do valor de outras culturas quando se encontrava em situação de iminente perda de sua identidade medieval e, por isso, hesitante quanto às possibilidades de seu futuro e duvidando de si mesma. Só assim pode ver e conceber outros povos, ainda que no plano puramente

23 Antropometria: uma das técnicas da antropologia física que consiste em um sistema convencional de medir e realizar observações no corpo humano, no esqueleto e nos demais órgãos, utilizando procedimentos adequados e científicos. (op. cit., pág. 69).

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teórico, como variedades humanas, cada qual com seus próprios valores e significados.25

No mesmo passo das outras ciências humanas que têm no homem e na humanidade os seus objetos de estudo, cada qual destacando um ou alguns aspectos, parte ou dimensão humanas, a Antropologia toma-os em sentido integral de homem, mulher e coletividade, mas também sob o enfoque de espécie da natureza e ser da cultura e da razão.26

É a ciência que mais expressa a busca humana por compreender as eternas questões que permeiam nosso intelecto desde tempos imemoriais sob um ponto de vista totalizante: Quem somos? De onde viemos? Porque somos o que somos? O que há de comum e de distinto entre nós? É a busca humana por responder as questões sobre sua origem e natureza. Através dos estudos antropológicos conhecemos melhor a nós mesmos e aos outros. Estamos em busca da compreensão dos elementos que compõem a própria natureza humana.27

Em França de 1895, com a publicação da obra Regras do Método Sociológico, Émile Durkheim elege os fenômenos sociais como objeto da investigação sócio-antropológica, episódio que marca o início da linhagem francesa da Antropologia, a qual tomaria os fatos sociais com a complexidade que suplantava o entendimento da época e, juntamente com Marcel Mauss, esse autor toma as representações primitivas para elaboração da obra Algumas formas primitivas de classificação, publicada em 1901.

Contemporaneamente à Antropologia Francesa, nasce nos Estados Unidos da América, a partir dos estudos de Franz Boas, o relativismo cultural e, na Inglaterra, floresce o funcionalismo, inspirado na obra de Durkheim, que enfatiza o trabalho de campo, com a observação direta do participante, forma de

25 Mércio Pereira Gomes, op. cit., págs. 11 a 31. 26 Idem.

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apreender na sua totalidade o conhecimento de determinada cultura, privilegiando o paralelismo entre as sociedades humanas e os organismos biológicos. Paralelamente a tudo isto, Claude Lévi-Strauss inaugura, na década de 1940, a Antropologia Estrutural, centralizando o debate na idéia de que existem regras estruturantes das culturas na mente humana, assumindo que essas regras constroem pares de oposição em função da organização do sentido. Como fundamento de sua teoria, Lévi-Strauss se vale de duas fontes primordiais, a saber: a corrente psicológica de Wilhelm Wundt e o trabalho no campo da lingüística, denominado Estruturalismo, de Ferdinand Saussure, além das influências advindas de Durkheim, Jakobson, Kant e Marcel Mauss.

I.2. A Antropologia Biológica

A diferença marcante entre a matéria viva e a matéria inanimada é que a matéria viva reage a estímulos de maneira a aumentar suas probabilidades de sobrevivência. (...) É igualmente característica da ameba, essa pequena massa gelatinosa que fica na raiz da árvore genealógica animal, como do homem, que se empoleirou nos mais altos galhos. (Ralph Linton)28

Através da Antropologia Biológica procura-se compreender o homem como ser biológico, indagando sobre sua origem, evolução, variações e constituição física, em busca do desenvolvimento do conhecimento enfatizado

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nas características fisicobiológicas das populações humanas, tanto antigas como modernas, destacando, ainda, a relação entre biologia e cultura.29

O público, de um modo geral, toma contato com a Antropologia através de noticiários, pela imprensa em todas as suas modalidades, não sendo rara a exposição ou referência a documentários científicos dessa área, tornando-se compreensível a imagem corriqueira que se tem dessa ciência, no mais das vezes associada às escavações arqueológicas, à busca da origem do homem, à comparação deste com os macacos, ao poder do instinto sobre a cultura e a civilização, até porque esses foram, por certo, os primeiros assuntos desse campo a seduzir o interesse do público e até dos pesquisadores, quando dos tempos iniciais desse saber.

O mundo todo se mobilizou em discutir e se inteirar da notícia sobre a descoberta de um certo esqueleto no vale de Neander, na Alemanha de 1856, o qual, chamado homem de Neanderthal, fora proposto como um ancestral humano, tornando-se o elo perdido entre o homem e os grandes símios. Logo a seguir, a mais contribuir para esse imaginário coletivo em torno da nossa origem, dá-se a publicação das obras Da origem das espécies através da seleção natural (1859)30 e A descendência do Homem (1871)31, ambas do biólogo inglês Charles Darwin. A partir daí, estimulada pela teoria evolucionista, iniciava-se uma mudança radical na forma de se pensar a diversidade das espécies da natureza e o sentido científico da vida. Nascia a Antropologia Biológica, segundo a qual:

29 Cf. Rossano Carvalho Nunes, idem.

30 Evolução das espécies. Título original: On the origin of species by means of natural selection or the preservation of favoured races in the stuggle for life (em português: “Sobre a origem das espécies por meio da seleção natural ou A preservação de raças favorecidas na luta pela vida). Londres, 24 de novembro de 1859. O título foi simplificado para The origin of species a partir da 6ª edição, em 1872.

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[...] o homem é visto e definido como um ser da natureza que evoluiu fisicamente até chegar, há uns 80.000 anos (a partir de seu surgimento há cerca de 200.000 mil anos) à condição atual, desde então praticamente sem mudanças essenciais, a não ser aquelas derivadas e adaptações físicas aos quatro cantos da Terra.32

A esse propósito, aliás, cumpre anotar que durante o mês de Fevereiro de 2009 foi divulgado pela BBC Brasil que cientistas do Reino Unido, liderados pelo pesquisador Matthew Bennett, encontraram pegadas humanas de cerca de 1,5 milhões de anos, nas proximidades de Ileret, no norte do Quênia, as quais revelam que os pés e o modo de andar de alguns dos primeiros hominídeos já eram bem parecidos com o do ser humano moderno. As pegadas, atribuídas ao

Homo erectus, apresentavam sinais de dedos pronunciadamente arqueados, curtos e alinhados, além de o tamanho e espaçamento entre elas refletirem altura, peso e modo de caminhar idênticos ao do homem atual. Embora admirável, essa descoberta, publicada na revista “Live Science”33, não identifica as pegadas mais antigas pertencentes a um membro da linhagem humana, posto que marcas do Australopithecus afarensis, encontradas em Laetoli, na Tanzânia, em 1978, datam de 3,7 milhões de anos. A conquista arqueológica dos ingleses, no entanto, é uma importante peça para mapear a evolução dos humanos

modernos, tanto em termos de fisiologia como na forma como o Homo erectus

se relacionava com seu meio ambiente. O Homo erectus foi um grande salto na evolução, demonstrando uma maior variedade de dieta e de habitat, e foi a primeira espécie da linhagem humana a sair da África, cerca de 200.000 anos atrás, em busca de alimentos que se escasseavam naquele continente.3435

32 Mércio Pereira Gomes, op. cit., págs. 16/17.

33Live Science é o nome de uma das mais prestigiadas revistas científicas do mundo. Foi fundada em 1880 e é publicada pela American Association for the Advancement of Science (AAAS). Seus artigos são submetidos a processo de revisão paritária e sua tiragem semanal é de 130 mil exemplares, além das consultas on line, o que eleva o número estimado de leitores a 1 milhão.

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A propósito de tal descoberta, rememoram-se os escólios de René Dubos, segundo os quais o homem é produto da hereditariedade e do ambiente em que cresce, vive e em que cresceram seus ancestrais e que, embora a História comece convencionalmente com o período dos mais antigos documentos escritos, ou seja, na época da civilização sumeriana, há cerca de 6.000 anos, tantos são os artefatos bem preservados e conservados da Idade da Pedra que fornecem hoje informações precisas sobre a vida humana, que o período pré-literário deve ser incluído na história da sociobiologia da Humanidade.36

Segundo esse autor:

A variedade de acabamento e a existência de modelos para vários tipos de uso indicam, melhor do que palavras jamais poderiam, que o

35 Importante lição sobre o quadro evolutivo do Homo Sapiens pode ser obtido na obra de Mércio Pereira Gomes (Antropologia: ciência do homem, filosofia da cultura. São Paulo: Contexto. 2009), em que o autor assinala:”Um dos quadros mais cambiantes da Antropologia Biológica é o da reconstituição da evolução da linhagem humana. A cada momento os resultados de novas pesquisas arqueológicas parecem mudar radicalmente aquilo que se tinha por certo alguns meses antes. O mesmo se dá no campo da Biologia Molecular, que tanto tem contribuído para se entender esse processo através dos estudos sobre a evolução da mitocôndria do DNA. Há muita divergência de opinião entre os antropólogos, e mesmo quando alcançam um consenso mudam na primeira notícia de novas descobertas. Mas uma coisa até agora é certa. Homo sapiens e toda a sua linhagem surgem e evoluem na África. Assim, o quadro que se apresenta aqui é apenas o estado da arte em agosto de 2007, podendo mudar em setembro ou em 2008. Homo sapiens é o resultado de um processo evolutivo que começa há uns seis milhões de anos (6 Maa) quando nosso primeiro ancestral, o Australopithecus, desmembra-se de uma família mais ampla que incluía os chimpanzés. Antes, por volta de 10Maa, os dois haviam se desmembrado de uma linhagem que continha os gorilas e os orangotangos. Os Australopithecus já tinham uma postura ereta ou semi-ereta, e isso é o que mais os distingue dos chimpanzés, já que o tamanho de seus cérebros era quase igual, em torno de 400 cc. Os Australopithecus permaneceram na Terra até cerca de 1,4 Maa e tiveram várias espécies, uns mais robustos e outros mais graciosos. Dos graciosos, provavelmente o Australopithecus africanus é que surgiu o primeiro hominine do gene Homo. Isso por volta de 2,5 Maa. Da primeira fase do gênero Homo se desenvolvem ao menos duas espécies, o habilis e o rudolphensis, e talvez do habilis, já com o uso de utensílios de pedras, surgem ao menos três espécies: erectus, ergaster e heidelbergensis, todos por volta de 1,9 Maa. Todas essas espécies se espalharam da África para a Europa e Ásia e conviveram entre si. Homo erectus sobreviveu no sudeste asiático até pelo menos 53 mil anos (53 Maa). Em algum momento, por volta de 200 Maa, surgem duas espécies muito próximas em termos de tamanho do crânio e capacidade linguística, o Homo neanderthalensis e o próprio Homo sapiens. Alguns antropólogos consideram o neanderthal uma variação do Homo sapiens, outros, seu precursor. De todo modo, eles conviveram e provavelmente disputaram entre si até 28 Maa. Daí por diante não há mais sinal de neanderthal. A não ser que o Homem das Montanhas seja um sobrevivente! Homo sapiens alcançou a Austrália por volta de 60 Maa, parece que ainda sem arco e flecha, mas chegou às Américas, via Estreito de Behring, que ligava a Sibéria ao Alasca, por volta de 35 Maa, já armado de arco e flecha. Por volta de 12 Maa já havia grupos humanos na ponta da América do Sul e em todas as partes do mundo.” (sic - págs. 18/19).

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homem da idade da pedra tinha dominado muitas habilidades e desenvolvido uma organização familiar e social complexa. 37

E adverte:

A condição humana do homem pré-histórico é de relevância direta para nossas próprias vidas, porque dele herdamos a maior parte de nossas características fisiológicas e mentais e com ele compartilhamos as mesmas necessidades fundamentais. Muitos aspectos da vida moderna são profundamente afetados pelas forças que moldaram o Homo Sapiens e sua vida já no Paleolítico Superior ou Antiga Idade da Pedra, há mais de 100.000 anos.38

O autor acrescenta, ainda, que:

O Homo Sapiens não difere dos animais tanto pela sua habilidade para aprender quanto pelos tipos de coisas que aprende, particularmente pelo acúmulo de suas experiências sociais no decorrer dos empreendimentos coletivos ao longo de milhares de gerações. Em outras palavras, a espécie humana fica melhor caracterizada pela sua história social.39

As referências acima têm o propósito de despertar a atenção para a constatação em torno da qual se reúnem em consenso os antropólogos e cientistas sociais, de acordo com a qual vivemos hoje o processo de excepcional acumulação cultural de cerca de seis milhões de anos, assim entendidos os padrões de comportamento desenvolvidos historicamente como reação conjunta a estímulos impostos pelo meio ambiente, pelos próprios indivíduos e pelo intercâmbio cultural e socialmente transmitidos de geração em geração.

Rossano Carvalho Nunes, graduado em História pelo Centro Universitário do Vale do Itajaí, em Santa Catarina, possui especialização em História Social pela FUCAP, com ênfase em Antropologia Cultural e Biológica, e Coordenador do Grupo Veritas de Pesquisa em História e Antropologia,alinhava:

37 Um animal tão humano, pág. 39.

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O padrão de respostas (...) repetido diversas vezes no decorrer da vida social gerando os padrões de comportamento, valores éticos e sociais, regras de convivência, religiões entre tantos outros complexos (...) vão caracterizando uma sociedade” de sorte que, “... a cultura é, então, diretamente produzida através das relações sociais e respostas-criativas encontradas por uma sociedade e constituída num sistema simbólico compreendido e compartilhado por seus integrantes. O desenvolvimento das sociedades é altamente dinâmico, estando sujeito a uma grande variedade de estímulos. A cultura, portanto, é trabalhada constantemente no decorrer do tempo através dos constantes estímulos. O homem é um produto não só de fenômenos biológicos, mas do meio cultural onde foi socializado, sendo herdeiro de um processo acumulativo de experiências culturais de seus antepassados.40

Isto levou Dubos, que foi professor de microbiologia e patologia experimental da Universidade Rockfeller, na cidade de Nova York – EUA, a discorrer em sua obra sobre o que denomina ”O Registro Genético de Experiências Passadas” 41 e, como exemplo cita:

Todos os organismos vivos retêm provas estruturais e funcionais de seu passado evolutivo remoto. Sejam quais forem as condições sob as quais nasceram e se desenvolveram, suas respostas aos estímulos são sempre afetadas pelas experiências do passado, que estão incorporadas em sua constituição genética. As etapas evolutivas, através das quais o homem atingiu o nível de Homo sapiens, explica, por exemplo, os motivos por que a estrutura de sua espinha dorsal pode ser comparada à dos peixes primitivos, ou porque a salinidade de seu sangue ainda reflete a composição da água do mar da qual a vida terrestre emergiu originariamente. O espessamento da sola do pé, em relação à pele do resto do corpo, constitui, provavelmente, uma expressão da lembrança biológica do passado, uma vez que esse processo começa antes que o organismo experimente qualquer estímulo de atrito e é perceptível mesmo dentro do útero. Parece certo admitir que, à medida que os ancestrais protoanfíbios do homem, ocasionalmente, saíram da água e impulsionaram-se sobre a terra com seus lobos em forma de nadadeiras, estes órgãos reagiram criando um espessamento insignificante da parte da pele que entrava em contato com o solo, da mesma forma que

40 In "Anthopology", op. cit.

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