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Estudantes surdos no ensino superior: reflexões sobre a inclusão no curso de letras libras/ língua portuguesa da UFRN

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO. GISELE OLIVEIRA DA SILVA PAIVA. ESTUDANTES SURDOS NO ENSINO SUPERIOR: REFLEXÕES SOBRE A INCLUSÃO NO CURSO DE LETRAS LIBRAS/ LÍNGUA PORTUGUESA DA UFRN. NATAL/RN 2017.

(2) GISELE OLIVEIRA DA SILVA PAIVA. ESTUDANTES SURDOS NO ENSINO SUPERIOR: REFLEXÕES SOBRE A INCLUSÃO NO CURSO DE LETRAS LIBRAS/ LÍNGUA PORTUGUESA DA UFRN. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação. Orientador: Prof. Dr. Francisco Ricardo Lins Vieira de Melo. NATAL 2017.

(3) UFRN- UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN/Biblioteca Setorial do CCSA. Paiva, Gisele Oliveira da Silva. Estudantes surdos no ensino superior: reflexões sobre a inclusão no curso de letras libras/ língua portuguesa da UFRN / Gisele Oliveira da Silva Paiva. - Natal, 2017. 97f. : il.. Orientador: Prof. Dr. Francisco Ricardo Lins Vieira de Melo. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Educação. Programa de Pós-graduação em Educação. 1. Educação – Dissertação. 2. Educação inclusiva – Deficiência auditiva – Dissertação. 3. Ensino superior - Dissertação. I. Melo, Francisco Ricardo Lins Vieira de. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título. RN/BS/CCSA. CDU 376-054.57.

(4) BANCA EXAMINADORA. ______________________________________________________________________ Prof. Dr. Francisco Ricardo Lins Vieira de Melo UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. ______________________________________________________________________ Profª. Dra. Rita de Cássia Barbosa Paiva Magalhães UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. ______________________________________________________________________ Profª. Dra Vanda Magalhães Leitão UFC – Universidade Federal do Ceará. ______________________________________________________________________ Profª. Dra. Lúcia de Araújo Ramos Martins UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. ______________________________________________________________________ Profª. Dra. Ana Lúcia Oliveira Aguiar UFRN – Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.

(5) Natal/RN, 29 de maio de 2017. DEDICATÓRIA. Dedicamos este trabalho aos discentes Surdos que nos permitiram acesso ao seu mundo íntimo.

(6) e que de forma encantadora compartilharam conosco anseios e sentidos. AGRADECIMENTOS. Agradeço a Deus, ser supremo, por estar sempre comigo e me encorajar na longa caminhada da vida. Ao meu esposo, Amon Paiva, por toda paciência e carinho nesses dias tão difíceis. Aos meus pais, Oliveira e Sandra, por todo amor e cuidado. Ao meu orientador, que ao longo dessa jornada tornou-se um amigo muito precioso. À minha amiga Laralis Oliveira que não mediu esforços para se fazer presente em cada escrita desse texto, prestando-me coorientação. À Lorena, recém-chegada a nossa instituição, mas que tem se mostrado uma grande amiga, estando comigo nos momentos de alegrias e de dificuldades durante esses meses finais. A todos os familiares e amigos que, de forma direta ou indireta, contribuíram para minha formação, pelo estímulo, pela força para superar os obstáculos. Por fim e mais importante, a minha Amably, pois desde que soube da sua chegada, meu coração se inundou de forças, alegria e sentido. Dedico a você, minha filha, essa vitória!.

(7) RESUMO Este trabalho tem como objetivo conhecer e analisar a opinião de alunos Surdos sobre o curso de Licenciatura em Letras-Libras/Língua Portuguesa como Segunda Língua (LLLP) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), em relação à formação acadêmica. O estudo traz como aporte teórico os Estudos Culturais e os Estudos Surdos em Educação para pensar a inclusão de Surdos nesse novo cenário. Articular as questões que envolvem as reflexões trazidas pelos próprios estudantes, bem como a proposta do curso no processo não só inclusivo, mas formativo dos discentes, é colocá-los no lugar de protagonistas de sua própria formação. Inicialmente, este trabalho perpassa as raízes históricas da Educação dos Surdos, vislumbrando os Estudos Surdos enquanto marcador epistemológico. Para alcance do nosso objetivo, realizamos uma pesquisa qualitativa do tipo exploratória. O estudo teve como lócus o Curso de LLLP da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Participaram dele sete estudantes Surdos, regularmente matriculados, e pertencentes ao 4º e 6º período do curso. Os dados foram coletados a partir de entrevista em Língua de Sinais Brasileira e com base na análise documental. Para análise, foram propostas três grandes categorias: “Acessibilidade no Curso”, “Currículo” e “Atuação docente no Curso de LLLP”. Os resultados, organizados a partir da análise do discurso, sinalizaram para a necessidade de uma possível revisão do Projeto Pedagógico Curricular (PPC), dado que foi compartilhado com demais docentes do curso que, conjuntamente, têm refletido sobre como realizar mudanças nele. Identificarmos algumas necessidades no curso, como reorganização das disciplinas; a criação de uma área de ensino de Língua Portuguesa para usuários de Libras, algo imprescindível, mas inexistente no PPC; e o fortalecimento de ações de extensão que se tornem regulares na oferta, como os cursos de Libras para ouvintes e de ensino de Língua Portuguesa como segunda língua para os Surdos. Por fim, fomentar a articulação entre os diversos setores da instituição com o curso de LLLP com vistas a assegurar o acesso, a permanência e egresso com sucesso aos estudantes Surdos, foi uma necessidade identificada pela pesquisa.. Palavras-chave: Inclusão. Ensino Superior. Letras Libras/Língua Portuguesa. Surdos..

(8) ABSTRACT This work aims to know and analyze the opinion of Deaf students about the undergraduate degree course in Letters-Brasilian Sign Language (Libras)/Portuguese Language as a Second Language (CLLLP) of the Federal University of Rio Grande do Norte (UFRN), in relation to academic training. The study brings as a theoretical contribution to the Cultural Studies and to the Deaf Studies in Education to think about the inclusion of Deaf people in this new scenario. The research articulates the questions that involve the reflections brought by the Deaf students themselves, as well as the proposal of the course in the process not only inclusive but formative of the students, is to consider them as protagonists of their own formation. Initially, this work runs through the historical roots of the education of the Deaf, glimpsing Deaf Studies as an epistemological marker. Then, to reach our goal, we use a qualitative research of the exploratory type. The research had as locus the LLLP Course of the Federal University of Rio Grande do Norte. Seven deaf students, regularly enrolled in the 4th and 6th semesters of the course, participated in the study. The data were collected from an interview in Brazilian Sign Language and based on documentary analysis. Three categories were proposed for analysis: “Accessibility in the Course”, “Curriculum” and “Teaching Experience in the LLLP Course”. The results, organized from the analysis of the discourse, signaled the need for a possible revision of the Curricular Pedagogical Project (PPC), what was shared with other teachers of the course who, together, have reflected on how to make changes in it. We identify some needs on the course, such as the reorganization of the disciplines, the creation of a Portuguese language teaching for users of Libras area, which is essential but non-existent in the PPC, and the strengthening of extension actions, that must become offered regularly, such as the Libras courses for listeners and Portuguese as a second language course for the Deaf students. Finally, fostering the articulation among the various sectors of the institution with the LLLP course in order to ensure the access, the permanence and successful egress for Deaf students was also a need identified by the research.. Keywords: Inclusion. Undergraduation. Letters-Libras/Portuguese Language. Deaf people..

(9) LISTA DE ILUSTRAÇÕES. Figura 1 – Abertura do vídeo de entrevista .................................................................... 42 Figura 2 – Entrevista produzida em Libras. ................................................................... 43. Quadro 1 – Números de vagas, inscritos e aprovados por ano nos processos seletivos do CLLP no período de 2013 a 2016. .................................................................................. 33 Quadro 2 – Caracterização dos participantes segundo roteiro aplicado na coleta de dados. .............................................................................................................................. 37 Quadro 3 – Distribuição de carga horária dos componentes curriculares ...................... 61 Quadro 4 – Quantitativo de disciplinas obrigatórias por tema ....................................... 62 Quadro 5 – Levantamento de Dissertações e Teses BTDT e CAPES ............................ 66. Tabela 1 – Quantidade de vagas preenchidas por Surdos em cada edição do vestibular do curso de Letras-Libras/Língua portuguesa da UFRN ................................................ 48.

(10) LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS. ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas CAENE – Comissão Permanente de Apoio aos Estudantes como Necessidades Educacionais Específicas CCHLA – Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes CERES – Centro de Ensino Superior do Seridó CLLP – Curso de Letras Libras/Língua Portuguesa CNE – Conselho Nacional de Educação COMPERVE – Núcleo Permanente de Concursos da UFRN CONADE – Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência CONAE – Conferência Nacional de Educação DLET – Departamento de Letras EaD – Educação à Distância ES – Estudos Surdos FENEIS – Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IFRN – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte LBI – Lei Brasileira de Inclusão LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais LLLP – Letras Libras/Língua Portuguesa LS – Língua de Sinais MEC – Ministério da Educação NEE – Necessidades Educacionais Específicas NUPPES – Núcleo de Pesquisa em Políticas de Educação para Surdos PDI – Plano de Desenvolvimento Institucional.

(11) PPC – Projeto Pedagógico de Curso PPGEDU – Programa de Pós-Graduação em Educação SECADI – Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade TCLE – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido THE – Teste de Habilidades Específicas TILS – Tradutores e Intérpretes de Libras UFAC – Universidade Federal do Acre UFAM – Universidade Federal do Amazonas UFC – Universidade Federal do Ceará UFCG – Universidade Federal de Campina Grande UFES – Universidade Federal do Espírito Santo UFG – Universidade Federal de Goiás UFGD – Universidade Federal da Grande Dourados UFMT – Universidade Federal do Mato Grosso UFRB – Universidade Federal do Recôncavo da Bahia UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina UFU – Universidade Federal de Uberlândia.

(12) SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 1 1.1 Objetivo Geral ....................................................................................................... 4 1.2 Objetivos Específicos ............................................................................................ 4 2 BREVE PASSEIO PELAS RAÍZES HISTÓRICAS DA EDUCAÇÃO DE SURDOS: DO CONGRESSO DE MILÃO À INCLUSÃO NO ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO ........................................................................................... 6 2.1 Movimentos surdos e as mudanças no cenário brasileiro a partir da década de 1990. ...................................................................................................................... 12 2.2 Estudos surdos enquanto campo epistemológico. ............................................ 14 2.3 Novas concepções, novas políticas, novo cenário: a chegada do surdo ao ensino superior brasileiro. ........................................................................................ 18 2.4 Principais dispositivos legais sobre educação de surdos no Brasil. ................ 20 2.4.1 ACESSO AO ENSINO SUPERIOR: UM SONHO QUE SE TORNOU POSSÍVEL. ............................................................................................................. 27 2.5 Um novo cenário na UFRN: A importância do Programa Incluir e da criação da Comissão Permanente de Apoio ao Estudante com Necessidades Educacionais Especiais (CAENE) na UFRN. ................................................................................. 29 2.5.1 SOBRE A CRIAÇÃO DO CURSO DE LETRAS-LIBRAS/LÍNGUA PORTUGUESA COMO SEGUNDA LÍNGUA NA UFRN................................... 31 3 SINALIZANDO OS DISCURSOS: UM MÉTODO QUE CONVOCA O PROTAGONISMO DO ESTUDANTE SURDO. ...................................................... 35 3.1 Os caminhos elegidos .......................................................................................... 35 3.2 Lócus da pesquisa ............................................................................................... 36 3.3 Participantes da pesquisa ................................................................................... 36 3.4 Instrumentos e materiais para coleta de informações ..................................... 39 3.5 Procedimentos para coleta dos dados. .............................................................. 41 3.6 Procedimentos para análise dos dados.............................................................. 44 4 MÃOS E CORPOS QUE FALAM SOBRE INCLUSÃO: ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ............................................................................ 46.

(13) 4.1 Acessibilidade no curso de Letras Libras/Língua Portuguesa como segunda língua da UFRN ........................................................................................................ 47 4.1.1 PRIMEIRA ETAPA: THE ............................................................................. 47 4.1.2 SEGUNDA ETAPA: REDAÇÃO ................................................................. 51 4.1.3 ATUAÇÃO DOS TRADUTORES/INTÉRPRETES DE LIBRAS NO CURSO DE LETRAS LIBRAS/LÍNGUA PORTUGUESA DA UFRN. .............. 54 4.1.4 ATUAÇÃO DOS TÉCNICOS QUE ATENDEM AO CURSO DE LLLP ... 58 4.2 Currículo.............................................................................................................. 59 4.3 Atuação dos docentes do curso de LLLP .......................................................... 67 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 73 REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 76 ANEXOS ....................................................................................................................... 85.

(14) 1 INTRODUÇÃO O universalismo que queremos hoje é aquele que tenha como ponto em comum a dignidade humana. (...) Temos o direito de ser iguais quando a diferença nos inferioriza e o direito a ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza. Boaventura de Souza Santos, 1997.. Nos idos de 2005, logo após a promulgação do Decreto n° 5.626/2005, quando a Comunidade Surda Brasileira começava a vislumbrar um cenário de mudanças no campo da educação, ouviam-se rumores sobre a oferta das primeiras turmas para os cursos de graduação em Letras com habilitação em Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o que se tornaria realidade em 2006 para as turmas de Licenciatura em Língua Brasileira de Sinais via Educação à Distância (EaD). Dois anos depois, em 2008, uma nova oferta do curso aconteceu para novas turmas de Licenciatura e de Bacharelado pela mesma instituição. Na ocasião, submeti-me à seleção por vestibular e fui aprovada para o curso de Bacharelado em Letras-Libras, passando a participar de todo aquele processo de transformações que adentrava espaços até então inimagináveis por Surdos, seus familiares e profissionais da área. Após minha formação, continuei estudando e participando ativamente dos espaços e diálogos sobre educação de Surdos e seu processo de inclusão, tanto na educação básica quanto no ensino superior. Em 2013, começava um ensaio sobre a implementação de um curso de Licenciatura em Letras-Libras/Língua Portuguesa como segunda língua (CLLP) na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). E, em meados de maio do mesmo ano, quando estava na condição de professora da disciplina de Libras no Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN), fui chamada para participar da comissão que faria a tradução da prova do vestibular da primeira turma do CLLP, que ingressaria no segundo semestre de 2013. Em 2015, adentrei no curso de CLLP da UFRN, agora na condição de professora. Porém, anteriormente a isso, em decorrência de minha inserção em outros espaços onde encontrava os Surdos, já tinha notícias de dificuldades vivenciadas por seus alunos. No lugar de pesquisadora, às vezes no de professora, e sempre no de militante, atuando em prol da real inclusão do Surdo, a partir dos relatos que chegavam 1.

(15) a mim sobre a referida graduação, levantava questionamentos do tipo: “como poderia um curso construído para atender o Surdo em sua especificidade linguística não incluílo de fato?”; “Quais estratégias poderiam ser modificadas para que o aluno Surdo pudesse não só ter acesso, mas permanecer com qualidade no curso?”; “Quais seriam as maiores dificuldades enfrentadas pelos alunos Surdos no curso?”. Tais experiências e questionamentos me fizeram investir no Mestrado em Educação da UFRN com o objetivo de discutir os avanços e percalços enfrentados durante a trajetória acadêmica de alunos Surdos e a sua relação com a inclusão a partir da inserção deles no curso de Licenciatura em Letras-Libras/Língua Portuguesa como segunda língua desta Universidade. O desejo por este tema de pesquisa justifica-se pela existência, dentro da própria UFRN, de diretrizes que contemplem tal necessidade de investigação. O Plano de Desenvolvimento Institucional 2010-2019, em seu capítulo oito coloca como metas algumas ações diretamente voltadas para a inclusão de pessoas com deficiência na instituição. A primeira que consideramos importante mencionar é a Número 7, qual seja, "criar curso de Licenciatura em Letras-Libras/Língua Portuguesa". Investigar de que modo essa meta tem se realizado é de interesse da instituição. Ainda dentre as metas do PDI, temos "acompanhar e avaliar o ingresso, o acesso, a permanência e a terminalidade de estudantes com necessidades educacionais especiais – NEE, visando assegurar as condições adequadas para o sucesso acadêmico e social" (UFRN, 2014, p. 70). Consideramos nosso trabalho como possível instrumento para acompanhamento e avaliação de discentes com NEE, sobretudo os surdos da instituição, uma vez que se detêm sobre a fala desses sujeitos a respeito do curso em questão. O mesmo documento coloca como meta "estimular a articulação entre os grupos de pesquisa para desenvolver estudos e tecnologias com abordagem interdisciplinar voltados para as demandas e melhoria da qualidade de vida das pessoas com necessidades educacionais especiais" (UFRN, 2014, p. 71), com cujo cumprimento cremos que nosso trabalho contribui.. 2.

(16) Justifica-se a pesquisa em proposição, ainda, pela escassez de trabalhos que voltem seu olhar para os alunos Surdos, especificamente das licenciaturas em LetrasLibras na modalidade presencial. Dar voz a esse grupo social no atual momento histórico da educação do Rio Grande do Norte é pertinente, uma vez que compreender suas expectativas, dificuldades e percepções sobre o processo de inclusão na referida instituição, poderá orientar futuras políticas institucionais visando sempre à melhoria do atendimento a esses sujeitos e garantir de fato sua chegada e permanência com qualidade no ensino superior. Por fim, justifica-se por também estar em consonância com o Plano Viver sem Limite, especificamente, quando toca a questão sobre o acesso à Educação, que consta no capítulo nº 4 do Decreto de n° 7.612 de 2011. Sabe-se que o aluno Surdo que chega ao ensino superior é um sujeito sóciohistórico-cultural que, em geral, percorreu uma considerável trajetória escolar em escolas especiais, escolas comuns com ou sem práticas inclusivas, ou por uma alternância entre estes tipos de escolas e, portanto, construiu saberes, os quais possibilitam seu avanço na escolaridade. Então, ouvindo os próprios sujeitos, com suas vivências e reflexões sobre o processo inclusivo, poderemos trazer contribuições políticopedagógicas que atendam às suas especificidades educacionais e ao processo de inclusão de forma geral. A partir dessa perspectiva, a presente pesquisa utilizou os pressupostos da pesquisa qualitativa, por ser mais adequada à compreensão da vida dos participantes em seu cotidiano, buscando realizar, através de entrevista semiestruturada, a análise dos dados de acordo com os eixos norteadores deste estudo. A empiria foi conduzida por sete entrevistas com sujeitos Surdos, regularmente matriculados nas turmas 2013.2 e 2014.2 do CLLP da UFRN. Reconhecendo as especificidades dos participantes da pesquisa, fizemos as entrevistas em vídeo-Libras1, seguidas de tradução para a Língua Portuguesa escrita. Posteriormente, a tradução foi revisada por um intérprete de Libras com a presença de um consultor Surdo para garantir a fidelidade dos dados traduzidos. Tais procedimentos foram aplicados na busca pelo alcance dos objetivos traçados para a pesquisa, a saber:. 1. Roteiro de entrevista elaborado em Libras pela pesquisadora. A versão em português foi submetida e aprovada pelo comitê de ética da UFRN. 3.

(17) 1.1 Objetivo Geral Conhecer e analisar a opinião de alunos Surdos sobre o curso de LetrasLibras, da UFRN, em relação a sua formação acadêmica.. 1.2 Objetivos Específicos • Ouvir e descrever a opinião dos alunos Surdos quanto ao Curso de Letras-Libras/Língua Portuguesa a partir da sua implantação na UFRN; •. Identificar elementos que contribuam para o fortalecimento do. curso de Letras-Libras/Língua Portuguesa da UFRN; • Contribuir para o fortalecimento do curso Letras-Libras na UFRN. Quanto à composição, este trabalho encontra-se assim delineado: no capítulo dois (2), fazemos um “Breve passeio pelas raízes históricas da educação de Surdos: do Congresso de Milão à inclusão no ensino superior brasileiro”, com fins de situar o Leitor sobre a repercussão das tomadas de decisão ocorridas em 1880 que reverberam até os dias de hoje. Feito isso, nos subtópicos desse mesmo capítulo, apresentamos os Movimentos Surdos e as mudanças no cenário Brasileiro a partir da década de 1990, bem como os Estudos Surdos enquanto campo epistemológico. Brevemente discorremos sobre os cursos de Letras-Libras e finalizamos adentrando a realidade da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN. No capítulo três (3), “Sinalizando os discursos: um método que convoca o protagonismo do estudante Surdo” explicitamos o lócus da pesquisa, os caminhos elegidos, participantes da pesquisa, instrumentos e materiais para coleta de informações e os procedimentos para análise dos dados utilizados para a construção deste trabalho. Também dentro desse capítulo, mostraremos dados sobre a caracterização geral dos entrevistados através de quadros descritivos que mostram informações sobre a identificação, escolarização e compreensão da Língua Portuguesa e Libras. Partindo para o capítulo quatro (4), “Mãos e corpos que falam sobre inclusão: análise e discussão dos resultados”, apresentaremos nossos eixos de análise. 4.

(18) Por fim, exporemos nossas “Considerações Finais” com o objetivo de contribuir para o nosso campo de pesquisa, para o fortalecimento do curso e para uma permanência de qualidade dos Surdos que, neste momento, alcançaram o sonho de chegar ao ensino superior.. 5.

(19) 2 BREVE PASSEIO PELAS RAÍZES HISTÓRICAS DA EDUCAÇÃO DE SURDOS: DO CONGRESSO DE MILÃO À INCLUSÃO NO ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO Ao iniciarmos este trabalho, percebemos que não poderíamos adentrar ao nosso campo de pesquisa propriamente dito sem, primeiramente, mencionar questões mais gerais sobre a inclusão de Surdos no campo educacional. Mediante isso, apresentaremos reflexões sobre espaços e tempos de educação para Surdos, buscando levar o leitor a entender o percurso inclusivo que o estudante Surdo trilhou em seu processo de escolarização. Após essa caminhada, discorreremos sobre a inclusão de Surdos no ensino superior fazendo um paralelo com as nossas expectativas ao propor esse estudo, tendo como marco teórico para a construção de toda a pesquisa os Estudos Culturais, que buscam entender como a cultura produz subjetividades e modos de ser e estar no mundo. Entendendo a diferença não como um desvio patológico de uma norma, mas propondo e problematizando os tempos e espaços que vêm sendo pensados para os Surdos ao longo dos últimos séculos, como aponta Thoma (2006). O marco inicial escolhido para nossa explanação foi o Congresso de Milão, evento muito conhecido na história da educação de Surdos, realizado em 1880, em Milão, na Itália. Poderíamos partir de vários outros momentos históricos, mas optamos pelo Congresso de Milão por este ser o evento de maior repercussão para o ensino de Surdos no mundo todo. O que pode ser resgatado desse período é o fato de que tanto os Surdos quanto a Língua de Sinais estavam sendo alvo de discussão pelos ouvintes que representavam a educação naquela época. Fazendo um paralelo com o que vivemos hoje, observamos que as políticas atuais colocam mais uma vez o Surdo e a Língua de Sinais (LS) em vigência, mas é preciso saber dos próprios sujeitos o que eles têm a dizer. Caso contrário, corremos sérios riscos de repetirmos a cena que narraremos a seguir. Para entendermos o cenário histórico-social em que ocorreu o Congresso, retornemos ao século XVIII, pois nesse período além de ocorrer a formação dos Estados Nacionais e a Revolução Industrial, tivemos a grande influência do cartesianismo adentrando as concepções da época. Todo esse contexto influenciou fortemente a dinâmica social, principalmente, fomentando uma nova visão que se lançava sobre o 6.

(20) humano, mediante a construção entre o que era normal ou patológico. Saía-se da ideia da doença para a do doente, tornando-o um objeto de uma intervenção arbitrária, sistematizada pelos consagrados estudos anatômicos, como afirma Foucault (apud DIAS; MOREIRA, 2011). Oliveira (2015) analisa que nesse período começa a ganhar força a ideia de que a fala era superior a qualquer outra forma de expressão, sendo a única credencial de humanidade que diferenciava o homem do animal. O estudo da linguagem foi um dos motivos que despertaram o interesse pela oralidade, o qual vinha sendo realizado desde a metade do século XVII, por meio da elaboração da Gramática de Port Royal, em 1660, a qual trazia em si estudos sobre as regras da linguagem e remetia a Leis universais do espírito. Em outras palavras, “no espírito se encontrariam as Leis universais que se manifestam por meio da fala. Assim, racionalidade e fala seriam indissociáveis” (OLIVEIRA; SILVA, 2013, p. 68). Nesse período, já se apontava a importância da unidade linguística para a formação de um povo. Através dessa ideia, inicia-se a busca pela unificação populacional por meio do uso de uma única língua a fim de se resgatar a identidade cultural. Isso foi observado pelos defensores de uma única língua oral e, diante da grande circulação que a Língua de Sinais tinha, havia receio de que os Surdos fugissem ao uso da língua eleita como oficial, o que servia de ameaça à solidificação nacional. Sob a influência dessas concepções, ainda no século XIX, foi realizado o Congresso Internacional de Educação de Surdos, na cidade de Milão, na Itália. Tal agregação teve como objetivo a análise e escolha de um método que fosse eficaz para a educação do Surdo. Além disso, os temas propostos para serem discutidos nessa ocasião disseram respeito às vantagens e desvantagens do internato, tempo de instrução, trabalhos mais apropriados aos Surdos, quantidade de alunos por classe, medidas de cunho curativo e preventivo, enfermidades etc. Embora os temas fossem variados, as discussões estiveram voltadas quase que exclusivamente às questões referentes ao oralismo e à Língua de Sinais (BORNE, 2002). No dia 11 de setembro de 1880, naquele que ficou conhecido como Congresso de Milão, houve uma votação contra o uso da Língua de Sinais na educação dos Surdos. Em sua maioria, os participantes votaram, por aclamação, a favor da aprovação do uso exclusivo dos métodos orais. A partir daí, a Língua de Sinais foi 7.

(21) proibida, oficialmente calcada na alegação de que ela destruía a habilidade da oralização dos sujeitos Surdos (STROBEL; PERLIN, 2006). Ressalta-se, ainda, que o congresso foi organizado e patrocinado por professores defensores do Oralismo Puro2, dentre os quais Alexander Grahan Bell teve grande influência. Após o evento, muitos países adotaram o método oralista, abolindo de vez o uso da Língua de Sinais no contexto educativo, o que levou o Povo Surdo3 a iniciar um longo e árduo processo em defesa da sua língua. Strobel e Perlin (2008) relatam que houve momentos, antes do Congresso de 1880, em que a Língua de Sinais era valorizada. A maioria dos sujeitos Surdos dominava a arte da escrita e há evidências de que havia muitos escritores Surdos, artistas Surdos, professores Surdos e outros sujeitos Surdos bem sucedidos. Com as deliberações do congresso, houve uma crise séria entre a Cultura Surda e a educação, pois no decorrer da trajetória histórica do Povo Surdo e suas diferentes representações sociais vimos os domínios do ouvintismo4, relativos a qualquer situação relacionada à vida social e educacional dos sujeitos Surdos, se ampliando. Isto significou a ascensão dos métodos oralistas, que continuam a ser utilizados até hoje, mesmo que em menor escala. Contudo, a Língua de Sinais ganhou potência dentro da própria Comunidade Surda, passando a ser mais valorizada como ferramenta de trocas culturais demarcando uma comunidade. Mais de um século depois do Congresso, Carlos Skliar (1998) analisa o cenário que levou à decisão da Língua de Sinais e seu legado cultural no processo educacional dos Surdos. Ele faz referência aos esforços em estabelecer um estado italiano, recentemente emancipado, coeso e unificado política e linguisticamente. A Itália, depois da Unificação pós-década de 1860, além dos problemas graves de ordem política, econômica e social que vivia, se deparava com a diversidade linguística da grande massa da população que se comunicava em dialetos e continuava condenada ao. 2. Oralismo Puro: “é um dos recursos que usa o treinamento de fala, leitura labial, e outros, este recurso é usado dentro das metodologias orais, entre eles, o verbotonal, oral modelo, materno reflexivo, perdoncini e entre outros” (STROBEL; PERLIN, 2008, p. 19). 3 Povo Surdo: “ refere-se aos sujeitos Surdos que não habitam no mesmo local, mas que estão ligados por uma origem, por um código ético de formação visual, independente do grau de evolução linguística, tais como a Língua de Sinais, a cultura surda e quaisquer outros laços”. (STROBEL, 2008, p. 29). 4 Ouvintismo: “é um conjunto de representações dos ouvintes, a partir do qual o Surdo está obrigado a olhar-se e narrar-se como se fosse ouvinte” (SKLIAR, 1998, p. 15). 8.

(22) analfabetismo, em oposição a uma minoria letrada que falava e escrevia a língua italiana. A ideia era eliminar as diferenças que se tornavam cada vez maiores entre a língua escrita e a língua falada, entre a cultura burguesa e o distanciamento do povo. Nesse contexto, a Língua de Sinais também deveria ser eliminada das escolas, o que contribuiria para atenuar o desvio linguístico, obrigando as crianças surdas a aprender língua oral comum. Se no século XVIII os Surdos foram considerados como sujeitos aptos ao trabalho nas fábricas, no século XIX, com o fortalecimento do discurso médico e tecnológico, eles passaram a ser considerados sujeitos defeituosos, que necessitam de reparo (SILVA, 2014). A educação dos Surdos, após a escolha do método oral, apresentou vários fracassos. A votação a favor do oralismo puro no Congresso de Milão causou um enorme sofrimento para o povo Surdo. A proibição do uso das línguas de sinais perdurou por mais de 100 anos, mas mesmo assim os Surdos conseguiram manter vivo o desejo de ter livre e reconhecida a sua língua materna. Quanto às decisões tomadas em consequência da votação do Congresso de Milão, não é exagero dizer que muitos atos cruéis passaram a ser praticados, envolvendo crianças, jovens e adultos Surdos que, até então, sinalizavam em liberdade absoluta. Uma língua oprimida e dizimada, cujo sacrifício causou um atraso social que perpetuou o estereótipo de deficiência e incapacidade dos cidadãos Surdos, cuja diferença, até o século XIX, se manifestava. Na história da modernidade, em nome da razão e da racionalidade, frequentemente se instituíram sistemas brutais e cruéis de opressão e exploração. Tanto estruturas estatais quanto estruturas organizacionais de empresas capitalistas supostamente constituídas e geridas de acordo com os critérios da razão e da racionalidade, produzem apenas sofrimento e infelicidade (SILVA, 1999, p. 4).. Silva (1999) aponta que a história está cheia de momentos em que sistemas brutais são criados, e que em muitos registros sobre a educação dos Surdos, vemos as inúmeras práticas e instrumentos que foram utilizados no sentido de corrigir a audição e a fala.. 9.

(23) O oralismo, então, passou a ser considerado o melhor método a ser utilizado em todo o processo educacional do Surdo. Essa concepção inventa a surdez como “falta” de audição e de oralidade, marcando a incompletude desses sujeitos e tratandoos como alguém que precisa de estímulos e condicionamentos que os possibilitem ouvir e falar. Nesse sentido, os Surdos são educados para se integrarem à sociedade ouvinte, ou seja, uma educação para corrigir uma anomalia, segundo Santos (2015). Toda essa concepção em torno da oralidade perpetuou-se por muitos anos e levou à existência de escolas e classes especiais nas quais a compreensão sobre a educação de Surdos ficou mantida pelo viés clínico-terapêutico. Cabe destacar que, ao pensar a surdez como patologia, deficiência, doença, ignoram-se modos de compreender e viver o mundo pelos Surdos. Tal concepção ainda é defendida por professores de Surdos, reaparecendo em suas práticas diárias. Após muitos anos da vigência do oralismo puro, evidencia-se um grande declínio na educação dos Surdos, o que levou a muitas críticas sobre esse modelo, conforme coloca Skliar (2010) sobre o oralismo e seus ideais fracassando juntamente com a educação de Surdos. Por volta dos anos 70, já se ventilavam novas ideias no Brasil, que resgatavam o uso da Língua de Sinais, da sua gramaticalidade e do uso dela no ensino de Surdos. Nesse período, observamos o uso da Língua de Sinais mesmo que incorporada à estrutura da Língua Portuguesa, na tentativa de satisfazer dois grupos de concepções diferentes. Começa a circular uma nova concepção chamada de Comunicação Total ou Bimodalismo. O que estava em destaque nesta velha-nova forma de ensinar o Surdo era o ganho na comunicação. O que antes se pautava na reabilitação e integração na sociedade por meio do aprendizado da língua oral, agora pauta-se na comunicação. Tudo que pudesse facilitar a comunicação era válido. Como exemplo disso, língua oral, leitura labial, Língua de Sinais, mímica, expressão corporal e facial, desenho, dramatização, treinamento auditivo, escrita, datilologia, entre outras tantas formas que viabilizassem o repasse da informação, eram estimulados concomitantemente. Independentemente. de. sua. intenção. comunicativa,. o. método. da. comunicação total tem seu mérito por deslocar a língua oral como o principal objetivo. 10.

(24) na educação do Surdo e considerar prioritária a comunicação destas crianças (LIMA, 2015). Botelho (2010) afirma que os maiores problemas desse método não residem na expressão comunicacional e sim na sua recepção, já que enquanto o ouvinte se expressa com diferentes linguagens (gestuais, vocais, Língua de Sinais etc.), considera estar produzindo sentido. Porém, na recepção feita pelo Surdo, o sentido não é o mesmo, pois a língua de base do ouvinte é a portuguesa e a dos Surdos é a Língua de Sinais. Esses discursos e práticas ouvintistas permearam e ainda permeiam as políticas públicas educacionais e práticas docentes, pois foram se afirmando como verdade a respeito dos sujeitos e de sua aprendizagem, impossibilitando olhar os Surdos com outras lentes (LIMA, 2015). Paralelamente a essa corrente, uma nova concepção nos Estados Unidos começa a ganhar notoriedade, por volta da década de 1970, um movimento de reivindicação contra a forma como os Surdos estavam sendo ensinados, que culminou com o surgimento da filosofia bilíngue de educação de Surdos. Essa filosofia tem como pressuposto básico que “os Surdos devem ser bilíngues, ou seja, devem adquirir a Língua de Sinais como língua materna, já que ela é considerada a língua natural dos Surdos; e, como segunda língua, deve ser adquirida a majoritária de seu país” (OLIVEIRA; SILVA, 2013, p. 23). Para alguns autores, como Goldfeld (2002), essa proposta tem sido considerada a mais adequada para o ensino de crianças surdas, pois considera a Língua de Sinais como sendo a língua natural do Surdo, estando pautada no ensino da Libras como primeira língua, e da Língua Portuguesa, no caso do Brasil, na modalidade escrita e/ou oral, como segunda língua do Surdo. Autores ligados ao bilinguismo percebem o Surdo de forma bastante diferente dos autores oralistas e da comunicação total. Para os bilinguistas, o Surdo não precisa almejar uma vida semelhante à do ouvinte, podendo aceitar e assumir sua surdez. Na ideologia do bilinguismo, as crianças surdas precisam ser colocadas em contato primeiro com pessoas fluentes na Língua de Sinais, sejam seus pais, professores ou outros, mas existem divergências quanto à definição do bilinguismo enquanto prática 11.

(25) educacional. Em alguns países, compreende-se que a criança surda deve adquirir a Língua de Sinais e a modalidade oral da língua do seu país, sendo posteriormente alfabetizada também na língua oficial de seu país. Entretanto, autores como Sánchez (1993) acreditam ser necessário para o Surdo adquirir a Língua de Sinais e a língua oficial de seu país apenas na modalidade escrita, e não na oral. 2.1 Movimentos surdos e as mudanças no cenário brasileiro a partir da década de 1990 Os anos 90 podem ser considerados como um período de lutas por vários movimentos sociais e educacionais no Brasil. Em termos educacionais, esse período também pode ser considerado como uma década marcada por grandes transformações no contexto histórico mundial. Nesse período, diversos países emergentes buscavam soluções, utilizando-se de estratégias de enfrentamento, para problemas que dificultavam a promoção de uma educação básica de qualidade. Movimentos oriundos desse período se organizaram em grupos identitários com vistas às lutas por direitos sociais, econômicos, políticos, e, mais recentemente pelos direitos culturais. Nessa frente, podemos citar, também, os movimentos de luta por melhores condições de vida e de trabalho no meio urbano e no meio rural, e os movimentos globais ou globalizantes, que se constituíram como lutas atuantes em redes sociopolíticas e culturais exercitadas via fóruns, plenárias, colegiados, conselhos etc. Esses mesmos autores evidenciam que: [...] dentre os principais movimentos educacionais dos anos 90 destaca-se o movimento de pessoas surdas, que se engajaram nas lutas por igualdade de direitos, combatendo o preconceito e a discriminação. Discutiram a oficialização da língua de Surdos, com a mobilização da população por meio de passeatas, atos públicos nas ruas, que foram articuladas por várias representações de associações, com o apoio de escolas destinadas para Surdos, dos familiares e de educadores, por todo o território nacional (XAVIER; SIQUEIRA, 2011, p. 2).. Nesse cenário, os movimentos Surdos passaram a ganhar força no Brasil e, engajada nesse movimento, a Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos5 (FENEIS), sediada no Rio de Janeiro, descentraliza sua atuação, expandindo-se para 5. Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (FENEIS) é uma entidade filantrópica que tem por finalidade a defesa de políticas em educação, cultura, saúde e assistência social, em favor da Comunidade Surda Brasileira, bem como a defesa de seus direitos. Para mais informações acesse: <http://www.feneissp.org.br/>. 12.

(26) outras regiões do Brasil com o objetivo de articular-se politicamente e intensificar as ações que dariam visibilidade aos movimentos Surdos na década de 90 em diferentes fóruns de lutas pelos direitos humanos (XAVIER; SIQUEIRA, 2011). Thoma e Klein (2010) apontam para as articulações feitas entre os movimentos Surdos e a universidade no final da década de 90 com o objetivo de potencializar uma virada epistemológica no campo educacional, social, cultural e político dos Surdos no Brasil. Ressalta-se que debates conceituais sobre a Língua de Sinais, o bilinguismo e os reflexos dos modelos clínico-terapêutico e socioantropológico na educação de Surdos foram travados em busca de um território fértil para a construção e instalação de um novo discurso sobre a Surdez6 (FERNANDES; MOREIRA, 2014). Os movimentos Surdos surgidos nessa década caminharam em duas direções, uma protagonizada por pesquisadores e outra composta pelos próprios Surdos, familiares e profissionais da área, que buscavam construir um campo epistemológico, localizando os movimentos Surdos dentro dos movimentos multiculturais mundiais (FERNANDES; MOREIRA, 2014). Toda essa inquietação da Comunidade Surda Brasileira estava marcada pelo descontentamento sobre o lugar que a surdez ocupava na sociedade e, principalmente, a forma como a educação de Surdos estava sendo conduzida por mais de um século. Esse movimento promovido por associações, escolas de Surdos, organizações não governamentais, articulados com familiares de Surdos e profissionais da área “levou à oficialização da Língua Brasileira de Sinais (Libras), primeiramente em alguns municípios e Estados, e posteriormente serviu de estratégia para o fortalecimento do movimento Surdo no sentido de chegar ao Congresso Nacional brasileiro, no ano de 2002”, para a promulgação da Lei de Oficialização da Libras em todo o território nacional, a saber, a Lei nº 10.436/2002 (THOMA; KLEIN, 2010, p. 4). Ainda sobre os anos 90, devemos pontuar que várias pesquisas vinculadas à Comunidade Surda foram realizadas por Surdos e ouvintes no ambiente do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGEDU) da Universidade Federal do Rio Grande do 6. Surdez: há no seio da Comunidade Surda uma convenção, uma distinção entre o sujeito surdo (com s minúsculo) e Surdo (com s maiúsculo). Aos que se enquadram nos modelos “audistas” – os Surdos que não são culturalmente Surdos – são indicados com s minúsculo, relativa à surdez auditiva; os “Surdos” com s maiúsculo, portanto, são aqueles formadores de uma entidade linguística e cultural. (SACKS, 1998, p. 16). 13.

(27) Sul (UFRGS). Essas pesquisas tiveram e têm importante papel nas mudanças educacionais e políticas e na vida dos Surdos do Brasil, trazendo à tona discussões sobre identidade e cultura surdas, representações acerca desses sujeitos, acessibilidade, entre outros temas. Eventos também foram organizados nesses espaços acadêmicos visando fortalecer as políticas educacionais voltadas para as pessoas surdas. Dentre esses, podemos enumerar a realização de cursos de formação de professores e intérpretes, de fóruns permanentes de discussão e proposição de políticas. Destacamos dentre eles o V Congresso Latino-Americano de Educação Bilíngue para Surdos, realizado no ano de 1999.. 2.2 Estudos surdos enquanto campo epistemológico As produções científicas do Brasil, principalmente as realizadas pelos primeiros mestres e doutores advindos do sul do país orientados pelo professor Skliar, serviram para fortalecer um novo referencial teórico a ser utilizado nas pesquisas com Surdos. Para a construção de toda a minha pesquisa, convido o Leitor a usar as lentes dos Estudos Culturais em Educação (HALL, 1997), especificamente, quando retomo os Estudos Surdos (LANE, 1992; LADD, 2003; SKLIAR, 1999), que nos permitem fazer conexões entre linguagem, narrativas e produções de sentidos. O pensamento moderno ocidental produziu uma divisão entre o visível e o invisível no mundo social. Santos (2010) afirma que as coisas invisíveis são constituídas por meio de linhas que separam radicalmente a realidade social em dois universos diferentes. O que está situado do outro lado da linha foi produzido como universo inexistente, correspondendo a uma vasta gama de experiências desperdiçadas, tornadas invisíveis, tais quais seus autores. Sendo assim, tudo aquilo que é produzido como inexistente é excluído de forma radical. Nesse sentido, temos as distinções visíveis que estruturam a realidade social deste lado da linha a partir da invisibilidade das distinções entre este e o outro lado da linha. Boaventura de Souza Santos (2010) faz a crítica a esse sistema de exclusão social e nos convida à prática de um pensamento que rompa com as maneiras ocidentais modernas instituídas de pensar, conhecer e agir, ou seja, um convite a pensar lugares 14.

(28) outros, pensar a inexistência de dois lados como essencialidade, mas como invenção, pensar o “entre” para complexificar, ampliar e movimentar nossas compreensões em vez de criar oposições e dicotomias. Sá (2002) destaca que a pós-modernidade rejeita os sistemas de pensamento dos séculos XIX e XX e propõe que a história não seja interpretada de uma forma única e centralizada, mas sim que seja contextualizada partindo dos discursos dos diferentes emissores. Trata-se de questionar a história contada apenas a partir do ponto de vista de alguns, sem levar em conta outros discursos da sociedade em um determinado tempo e espaço. Estes discursos não são imparciais e carregam representações únicas dos sujeitos que os emitem. Não existem mais critérios universais de validação de um discurso como sendo a única versão da realidade, mas os discursos desvelam verdades relativas. Na educação de Surdos, essas dicotomias estiveram e estão presentes desde muito tempo, colocando os Surdos ora no lado da visibilidade, ora no da invisibilidade. Diante disso, faz-se necessário demarcar por quais caminhos construímos nossa pesquisa e apontar nosso olhar para a linha da visibilidade, levando a discussão da educação dos Surdos por aberturas que muitas vezes não estamos acostumados a ver/ler/ouvir. Além dos estudos sobre identidade, diferença e representação, situa-se também sob o escopo dos Estudos Culturais os Estudos Surdos (ES), que têm se dedicado à compreensão dos fenômenos sociais vivenciados pelo povo Surdo em diversas esferas, dentre as quais têm tido destaque a educacional, lugar de nosso trabalho (OLIVEIRA, 2013). Sarturi (2012) afirma que, em pesquisas na área dos Estudos Surdos, temáticas como História do Povo Surdo, a Língua de Sinais, o movimento Surdo, a literatura surda, as diferentes identidades, a discussão das políticas públicas e a relação da deficiência com a surdez são recorrentes. Podemos dizer que questões como estas serviram e ainda servem de norteadores para a produção de pesquisas no campo da educação de Surdos. Um dos precursores dessas investigações no Brasil foi o professor Carlos Skliar que, juntamente com seu grupo de pesquisa, conforme mencionando anteriormente, começa a aproximar os estudos da surdez ao campo dos Estudos. 15.

(29) Culturais, denominando essa parceria de “Estudos Surdos”. Para Skliar, os Estudos Surdos [...] se constituem enquanto um programa de pesquisa em educação, onde as identidades, as línguas, os projetos educacionais, a história, a arte, as comunidades e as culturas surdas, são focalizados e entendidos a partir da diferença, a partir do seu reconhecimento político (SKLIAR, 2005, p. 5).. Fazer referência aos Estudos Surdos enquanto campo epistemológico é pertinente, em primeira instância, para que nos debrucemos sobre os principais aspectos que perpassam o conceito de surdez, que, como qualquer outro conceito, passa por transformações históricas. Assim entendemos que estamos atravessando um momento de redefinição deste conceito (BEHARES, 2000) e, historicamente, sabe-se que a tradição médico-terapêutica influenciou a definição da surdez a partir do déficit auditivo e da classificação da surdez (leve, profunda, congênita, pré-linguística etc.), mas deixou de incluir a experiência da surdez e de considerar os contextos psicossociais e culturais nos quais a Pessoa Surda se desenvolve (SÁ, 2006). A partir dessa discussão, ousamos dizer que Ser Surdo é representar-se pela experiência visual e não pela ausência de algo, mas pela presença, presença esta demarcada pela Língua de Sinais como elemento constituinte da subjetividade desse sujeito, conforme apontam Skliar (1998), Perlin (1998), Quadros, (2000), Sá (2006), dentre outros. Lopes (2011, p. 7) afirma que “a Surdez é uma grande invenção e, em acordo com a autora, não nos referimos à surdez enquanto materialidade inscrita em um corpo, mas à surdez como construção de um olhar sobre aquele que não ouve”. Sendo assim, inventamos a surdez culturalmente, pois tecemos narrativas diversas, interpretações e produzimos sentidos a respeito dela nos diferentes campos discursivos, religiosos, clínicos, linguísticos, entre outros. A surdez, enquanto marca inscrita no corpo, é fortemente representada pela perda ou falta da audição e, a partir dessa conceituação, os variados campos de estudos foram desenvolvendo formas de se trabalhar e lidar com ela e com os sujeitos que “sofrem” dela, considerando-a como anormalidade (LIMA, 2015).. 16.

(30) As posições culturais foram aos poucos ganhando visibilidade com a presença desta teoria. Entre as descobertas culturais, temos alguns artefatos como a Língua de Sinais, a história cultural, a pedagogia de Surdos, o currículo Surdo, a literatura surda, a identidade surda, as artes surdas e muitos outros. Os Estudos Surdos, com a aproximação aos Estudos Culturais, invertem aquilo que a teoria moderna denomina como deficientes, além de retirar a discussão do lugar da subjugação depositada no Surdo como sendo sempre o problema, assim como faz a teoria crítica, como afirma Perlin e Strobel (2009). Os Estudos Culturais vão permitir lituras do mundo, novos espaços de educação de Surdos, descobrir as diferenças sobre o que somos e o que fazemos a partir desta diferença. Discorrer sobre a educação dos Surdos sob o viés da representação cultural não é nenhuma atividade neutra e, também, não se constitui em novidade. Muitos teóricos como Skliar (1998) citado anteriormente, Silva (1999), Veiga-Neto (1998), Costa (2005), Corraza (1997) e Lopes (2004) percorrem esse caminho há longos e duros anos buscando representar a surdez por veredas e espaços demarcados pela teoria cultural, saindo do âmbito da teoria tradicional, onde a repetição da deficiência e dos estereótipos foi de fundamental importância no processo de representação do Surdo. Cada qual se situa a partir de um contexto em que se consegue sustentar uma diferença educacional, pois leva a esta convergência das especificidades surdas e a prever “manobras” para estratégias de atuação. Aproximar a educação do Surdo a este campo teórico proporciona uma nova linguagem educacional, novos discursos com conotação cultural, isto é, novas ferramentas de trabalho que permitem outros espaços teóricos, como diz Thompson: [...] no caso de programas educacionais como os dos Estudos Culturais eles podem ajudar os educadores e as instituições a desenvolverem a consciência das variadas motivações e valores, assim como fornecer dados para a pesquisa que estimem os efeitos das suas políticas e práticas (THOMPSON, 2005, p. 35).. Para Lima (2015) o discurso que ecoa no campo da educação é de que a surdez pode ser um fator de determinação do grau de compreensão e do nível de aprendizagem dos estudantes Surdos. Assim, para a educação desse público, as propostas pensadas são desenvolvidas a partir de uma pedagogia, em sua maioria, com referencial no processo de ensino e de aprendizagem para ouvintes, também visando a 17.

(31) “padronização”, a correção e a normalização das pessoas com deficiência. A questão é: o que, como ou quem decidiu essa referência? Decisões como essa e tantas outras ao longo da história foram tomadas por ouvintes considerados conhecedores do que era melhor para as pessoas surdas, uma vez que estas estavam impossibilitadas de viver em sociedade de forma plena.. 2.3 Novas concepções, novas políticas, novo cenário: a chegada do surdo ao ensino superior brasileiro O início do século XXI tem sido bastante propício ao surgimento de novidades no âmbito da educação a nível nacional, as quais já despontavam, ainda que timidamente, no final do século passado. No Brasil, do ano de 2007 para o de 2008, assistimos à criação e propagação de um dos documentos que concretizou uma tendência que notadamente começou a ganhar corpo na década de 1990. Trata-se do documento da Política Nacional de Educação Especial sob a Perspectiva da Educação Inclusiva. O objetivo dessa Política, em termos gerais, é promover “o acesso, a participação e a aprendizagem dos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas escolas regulares, orientando os sistemas de ensino para promover respostas às necessidades educacionais especiais” (BRASIL, 2008, p. 8). Nesse mesmo cenário de mudanças, observamos a chegada dessa e de outras políticas com um ar de esperança para que as pessoas com deficiência, de fato, pudessem ter acesso à educação, em qualquer nível de ensino. Dentre os documentos internacionais que influenciaram e foram determinantes para as mudanças no âmbito das políticas educacionais Brasileiras, particularmente no que se refere ao acesso e permanência de estudantes com NEE no ensino superior, destacam-se:  1990 Declaração de Jomtien7: Declaração Mundial sobre Educação para Todos: Satisfação das necessidades básicas de aprendizagem.. 7. Disponível em: <http:// ww.pitangui.uepg.br/nep/documentos/Declaracao%20-%20jomtien%20-%20 tailandia.pdf>. Acesso em: 25 mar. 2017). 18.

(32)  1994 Declaração de Salamanca8: sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área das Necessidades Educativas Especiais.  2001 Declaração da Guatemala9: promulga a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de deficiência. Abrimos um parêntese nesse parágrafo para refletirmos sobre a importância da Declaração de Salamanca no que se refere à criação de dispositivos legais especialmente no nosso país. A perspectiva da inclusão foi inaugurada fortemente na Conferência de Salamanca, realizada na Espanha em parceria com a UNESCO em 1994, onde representantes de 92 países e 25 organizações internacionais participaram dessa Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais. O resultado foi a elaboração da Declaração de Salamanca, documento que norteia princípios e políticas educacionais inclusivas de vários países, inclusive do Brasil, que tem adotado diretrizes inspirado nesses princípios em vários documentos oficiais, embora não signatário da mencionada conferência (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994; BUENO, 2011; MAGALHÃES, 2011). BUENO; MELETTI (2011, p. 2) expressa que: [...] assim, fica claro que a Declaração de Salamanca apresenta como perspectiva política a inclusão de toda e qualquer criança no ensino regular, independentemente de suas condições físicas ou de sua origem social ou cultural. Franco e Dias (2005, p. 6) esclarecem que: [...] a partir da década de 1990, com a realização da Conferência Mundial de Educação para Todos (1990) e com a Declaração de Salamanca de Princípios, Política e Prática para as Necessidades Educativas Especiais (1994), passou a vigorar a “era da inclusão”, em que as exigências não se referem apenas ao direito da pessoa com deficiência à integração social, mas sim, ao dever da sociedade, como um todo, de se adaptar às diferenças individuais.. Permanecendo com este pensamento, sobre a importância da Declaração de Salamanca, a qual alerta sobre a urgência de combater as atitudes discriminatórias da 8. Disponível em: <http://portal.mec.gov. br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf>. Acesso em: 25 mar. 2017). 9 Disponível em: <http://portal.mec.gov. br/seesp/arquivos/pdf/guatemala.pdf>. Acesso em: 25 mar. 2017).. 19.

(33) sociedade em relação à pessoa com deficiência, e nos convida a assumirmos o compromisso de assegurar o direito à educação às crianças, jovens e adultos com necessidades educacionais especiais nas escolas regulares de orientação inclusiva. Trata-se de alcançar uma educação para todos. Bueno e Meletti (2011) advogam que, com as proposições políticas da referida Declaração, a educação especial passa a ser identificada como uma modalidade de educação a ser ofertada, preferencialmente, no ensino regular.. 2.4 Principais dispositivos legais sobre educação de surdos no Brasil. Para Oliveira e Silva (2013), há pelo menos quatro dispositivos legais de âmbito Federal basilares que tocam diretamente o Surdo: Lei nº 10.098/2000 (Lei da Acessibilidade); Lei nº 10.436/2002 – (Lei de Libras) Decreto nº 5.626/2005; Lei nº 12.319/2010 (Lei do Tradutor-Intérprete de Libras–TILS); e a esta compilação legal, acrescentaria a Lei n° 13.146/2016 (Lei Brasileira de Inclusão). As conquistas dos movimentos sociais, em especial as dos movimentos Surdos, deslocaram a questão da diferença do ser Surdo da condição auditiva como elemento nucleador de um povo; para um povo, ou comunidade, com cultura própria (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2014, p. 5). Mesmo antes da política de inclusão ser criada de fato, a tendência mundial à inclusão existente no início do século XXI influenciou a criação do que chamamos de políticas linguísticas. Essa mudança de paradigma aponta para um novo modelo de educação, centrado no Surdo enquanto sujeito e não mais na sua condição auditiva, que o colocava apenas no rol das deficiências. Iniciaremos pela Lei promulgada em 2000, de nº 10.098 que “estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências” (BRASIL, 2000/2013). Ou seja, essa Lei não trata apenas de especificidades relativas às pessoas surdas. As autoras Oliveira e Silva (2013) relatam que, no capítulo VII, essa Lei aborda a questão da acessibilidade comunicacional, a qual toca diretamente os Surdos, uma vez que, para esses sujeitos, a primordial condição de acessibilidade é o uso de sua 20.

(34) língua, a Libras, mostrando a responsabilidade que tem o Poder Público na promoção da acessibilidade comunicacional à informação, à educação e à cultura, bem como na formação de profissionais aptos a trabalharem na acessibilidade do Surdo. A Lei aponta, ainda, a necessidade de garantia de acessibilidade comunicacional para o Surdo também nos serviços de radiodifusão, não só pela “linguagem de sinais”, mas por outros meios disponíveis, como closed caption, que legenda toda informação sonora que passa na TV. A Lei da acessibilidade é tão relevante para a acessibilidade do Surdo, porque se constitui um marco no acesso à educação por reconhecer sua forma natural de comunicação – os sinais, prevendo, inclusive, a formação de profissionais aptos a interpretarem para os Surdos informações que estejam em Língua Portuguesa. Isso abriu as portas para a criação da próxima Lei sobre a qual iremos discorrer. Promulgada em 2002, a Lei nº 10.436 é considerada a maior conquista legal dos Surdos brasileiros de todos os tempos.. Embora os Surdos sempre tenham. considerado e usado a Língua Brasileira de Sinais como língua legítima, a população Brasileira, em geral, não atribuía relevância a esse esforço. A indiferença frente a ele foi agravada após o início da vigência da filosofia educacional oralista, conforme relatamos anteriormente nesta dissertação. A Lei de Libras, como é conhecida, define o que é a Libras para efeitos legais. Vejamos: [...] entende-se como Língua Brasileira de Sinais – Libras, a forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil (BRASIL, 2002/2013).. Oliveira e Silva (2013, p. 15) esclarecem que essa Lei reconhece a Libras como meio de comunicação oficial da comunidade de pessoas surdas do Brasil e: [...] responsabiliza o poder público e as empresas concessionárias de serviços públicos pelo fomento do uso e da difusão da Libras; obriga o poder público e as empresas concessionárias de serviços públicos de saúde a oferecerem tratamento adequado ao Surdo; determina a implementação da disciplina de Libras nos cursos de formação de professores e nos cursos de fonoaudiologia, devendo integrar os PCN’s.. 21.

(35) A seriedade com que se passou a considerar as questões educacionais relativas aos Surdos foi inédita graças ao documento de 2002. A Lei de Libras veio para abalar. estruturas. tradicionalmente. sedimentadas. pela. segurança. de. saberes. aparentemente inquestionáveis. A reformulação de concepções por parte dos professores e dos gestores de todos os níveis de ensino seria inevitável nesse ponto. Seguindo essa cronologia, temos o Decreto nº 5.626/2005.. As Leis nº. 10.098/2000 e 10.436/2002 não discorrem extensivamente sobre a acessibilidade do Surdo ou sobre a Libras. Ao contrário, ambas somam apenas oito artigos que versam sobre esses temas. Como qualquer outra lei, elas dão determinações gerais. As orientações sobre como essas determinações serão executadas ficam a cargo de um Decreto, e no caso da Lei da Acessibilidade e da Lei de Libras, um dos dispositivos que detalham sua forma de concretização é o Decreto nº 5.626, do ano de 2005. Para as autoras citadas, esse documento é, antes de tudo, prova de como a Lei de Libras representou avanço significativo nas leituras e nas pesquisas sobre os Surdos. No Decreto, a Pessoa Surda é definida não como “aquela que não escuta”, ou “aquela que tem perda auditiva” somente, mas como “aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais – Libras”. Importante esclarecer que anteriormente ao Decreto nº 5.626, já desde finais da década de 1980, as discussões sobre uma visão socioantropológica da surdez e sobre a educação bilíngue para Surdos aconteciam no Brasil, sobretudo entre a comunidade surda e em alguns núcleos acadêmicos. O Núcleo de Pesquisa em Políticas de Educação para Surdos (NUPPES), da UFRGS, tem grande representatividade nesse sentido. Apesar disso, não deixa de constar no Decreto o conceito de deficiência auditiva, o que demonstra a resistência que existe para o desvencilhamento da concepção de Surdo a partir daquilo que lhe falta, a audição. Porém, ainda que não deixe de conceituar o que vem a ser deficiência auditiva, esse dispositivo legal distancia-se minimamente de uma visão monofocal medicalizada da surdez, compreendida como [...] um déficit, uma falta, uma deficiência mensurável em decibéis, partindo para uma concepção do Surdo que busca se aproximar mais 22.

Referências

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