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Diálogos sobre o não aprender

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Academic year: 2021

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(1)

DIÁLOGOS SOBRE

0

“NÃo

AI>RI‹:NDER”

Florianópolis

(2)

REGJNA

CÉLIA

L11\HAR1:s

Hosrms

D1ÁLoGos soBRE

0

“NÃo

A1>R1‹:NDER”

Dissertação apresentada ao Centro de Ciências da Educação, Curso de

Mestrado

do Programa

de Pós-

Graduação

em

Educação,

da

Universidade Federal de Santa Catarina,

como

requisito parcial para obtenção

do

grau de Mestre

em

Educação, sob orientação da Professora Dra. Sílvia Zanatta

Da

Ros.

F

lorianópolis

(3)

'<.¢:

,Í É-§§_,4 :U

uN|vERs|DADE

FEDERAL DE

SANTA

CATARINA

CENTRO

D1:

CIÊNCIAS

DA EDUCAÇÃO

z

PROGRAMA

DE Pós-GRADUAÇÃO

0

CURSO

DE

MEs'mADO

EM

EDUCAÇÃO

z ,

“DIALÓGOS

SOBRE

O NÃO

APRENDER”.

Dissertação

submetida

ao

Colegiado

do

Curso

de

Mestrado

em

Educação do

Centro

de

Ciências

da

Educação

em

cumprimento

parcial

para a

obtenção

do

título

de

Mestre

em

Educação.

APROVADO

PELA COMISSÃO

EXANIINADORA

em

23/11/2000

Dra. Silvia Zanatta

Da

Ros

-

UFSC

(Orientadora)

i~

Á

Dra.

Maria

Mana

Furlaneto

-

UFSC

(CO-Orientadora) il/L,'\/

'

6063/

Dra.

Carmen

Silvia

de Arruda Andaló

-

UFSC

(Examinadora)

W

Dra. Cássia Ferri -

UNIVALI

(Examinadora)

~gJ@

Dra. Célia Regina Vendramini

-

UFSC

(Suplente)

Dr: Lucidio Bianchetti

Coordenador

PPGEICEDÍUF

SC

Regina

Célia

Linhares

Hostins

(4)

A

minha

mãe, que,

mesmo

não estando fisicamente entre nós, continua

me

ensinando;

A

todos os professores(as) que ensinam

o

prazer e a dor de aprender;

A

minha

filha,

que

está

em

processo de aprendizagem e

com quem

desejo compartilhar, por muito tempo, essa experiência;

Às

mães

e filhos(as) que

têm

vivido os sofrimentos e as alegrias de ensinar e aprender.

(5)

Este

momento

representa quase

um

ritual.

É

hora de se amrmar, se perfumar, se

colocar inteira para abraçar as pessoas que nos são gratas, olhá-las de frente e dizer

com

emoção: muito obrigada!

Não

foram poucas as vezes

em

que

pensei neste

momento:

no

instante

mesmo em

que

me

indagava sobre o

tema

a investigar tinha razões para agradecer à Cassia pelas valiosas interlocuções que tivemos naquele

momento

e a

partir de então.

quando

discutia o projeto, buscava aprofiindar

meus

estudos sobre o

método

e

ingressava nas primeiras análises da pesquisa,

como

deixar de agradecer à Olinda,

rigorosa professora que talvez

nem

tenha idéia

do

quanto

me

fez crescer;

nas horas mais duras de estudo e de produção, de solidão, de incertezas, queria agradecer à Silvia,

minha

orientadora, por haver compartilhado

comigo

essa dor e delícia de analisar os erros, desfazer equívocos, redefinir caminhos, intensificar estudos;

nas situações

em

que

precisei

me

reconciliar

com

a Língua Portuguesa e afinar

meu

modo

de escrever,

como

deixar de agradecer à Elisabeth Leal, por

me

haver

dado

o

privilégio de contar

com

a sua leitura critica e sugestões valiosas,

nos

momentos

de insegurança por ousar trabalhar

num

campo

de conhecimento até

então desconhecido,

como

o da análise

do

discurso, tinha razões para agradecer à Maria Marta, por haver

me

encaminhado

com

competência e segurança nestes caminhos desconhecidos;

nos importantes

momentos

em

que precisei dos amigos, para dividir angistias, alegrias, sucessos e dissabores, contei especialmente

com

Laureci, Giovana, Helena, Águida, Aninha, Claudia, Sérgio,

Maria

Helena, Jane e Nadir

com

quem

realizei

outros trabalhos de estudos e pesquisas na

FCEE

e usufrui da amizade

do

dia-a dia;

nas horas -em que

me

dedicava a ler cuidadosamente os relatórios pedagógicos escritos pelos professores, queria agradecer-lhes, por

me

terem emprestado suas palavras não para a crítica,

mas

para pensar o

modo como

historicamente se constitui nossos discursos sobre os alunos que “não aprendem”;

(6)

no

exame

de qualificação,

quando

buscava outras possibilidades de pensar

meu

projeto, tive bons motivos para agradecer às Prof's

Carmem

Andaló

e Célia Regina Vendramini pelas importantes contribuições, advertências e sugestões para a continuidade de

minha

pesquisa;

e, nos

momentos

mais íntimos, na hora

do

recolhimento para o estudo e a criação, tinha e tenho especiais motivos para agradecer à Bárbara

minha

filha, que apesar de haver se ressentido da

minha companhia

e atenção, é a grande responsável pela

minha

força,

coragem

e esperança; e a você,

Mario

Rubens,

meu

marido,

que

acompanhou

todo esse processo, assumindo

com

carinho e dedicação mais encargos para que eu pudesse

me

dedicar a dissertação, e

sempre confiou no

valor

do

meu

trabalho e

em

minha

capacidade para completa-lo;

nessas horas de estudo e criação, nos intermináveis dias e frias madrugadas,

agradecia a

um

grande

amigo

que tive ao

meu

lado,

o

nosso cachorro Billy,

que

me

dava a sensação de aconchego e confiança, aquela que experimentamos na

companhia

de grandes amigos;

e

como

coroamento

desses

momentos

todos, agradeço sempre aos

meus

pais, por

me

ensinarem a cultivar as amizades

com

humildade e verdade, a

me

dedicar

com

seriedade àquilo que faço e a assumir

com

coragem

todos os desafios.

(7)

Este estudo

tem

como

propósito analisar os discursos pedagógicos sobre sujeitos que

“não aprendem”,`

com

vistas a apreender suas condições de produção,

bem como

as

contradições

que

determinam sua construção;

Sua

principal fonte de investigação é 0 conjunto de

documentos

que encaminha alunos das escolas da rede regular de ensino de Santa Catarina para o Serviço de

Apoio

Pedagógico, modalidade de ensino especializado

em

funcionamento nessas escolas.

Os

discursos

mereceram

um

estudo aprofundado

no

sentido de compreender:

Como

e por que são produzidos ?

Em

que condições são produzidos?

Com

quem

dialogam?

O

que expressam das relações sociais?

As

análises

suscitaram a discussão de conceitos

como:

diferença e deficiência; linguagem, discurso e dialogia; pertencimento, exclusão e desfiliação. Para compreendê-los procurou-se aprofundar o diálogo

com

interlocutores

como

Vygotsky

e Bakthin, expandindo-se as possibilidades de análise mediante articulações

com

estudos

no

campo

da história e da sociologia

-

com

as obras de Ginzburg,

Thompson, Goflinami

e Castel-

bem como com

estudos de Eni Orlandi

no

campo

da análise

do

discurso.

O

processo de pesquisa

consistiu na descrição e análise dos textos (68 relatórios pedagógicos), elaborados por professores e especialistas das escolas regulares,

no

sentido de rastrear sua conexão íntima e identificar as suas marcas discursivas.

À

primeira vista, os textos

em

análise pareceram fortemente

marcados

pela repetição. Todavia, o que se observou,

num

olhar mais detido, foram as contradições que

permeiam

esse jogo instável de sentidos. Nesses discursos encontra-se, então, não só as palavras

do

outro, ocultas

ou

semi-ocultas nas

palavras de professores e especialistas,

como

também,

as ressonâncias longínquas e quase inaudíveis de elos anteriores, próximos e distantes, da comunicação cultural. Neles manifesta-se

um

diálogo entre as opiniões que se

produzem

na vida cotidiana, o sistema de crenças e superstições, as tendências teóricas, a ciência e a política.

A

compreensão

dessa dinâmica conduziu ao estudo das metamorfoses da desfiliação

ou da

invalidação social e suas manifestações na escola, para compreender a constituição desse processo

histórico que

ameaça

setores mais amplos

da

sociedade, criando os “inúteis para o

mundo”.

(8)

ABSTRACT

The

purpose of this study is to analyze the pedagogical discourses

on

disabled subjects

with the intention to

leam

their producing conditions, as well as the contradictions

which

determine its construction. Being the

main

source of investigation the collection of

documents which

orient students

from

the regular teaching schools of Santa Catarina to the Pedagogical Support Service, a specialized type of education functioning in these

schools.

The

discourses received a deep approach with regard to understand:

How

and

why

are they produced?

Under what

conditions are they produced?

Whom

do

they dialogme with?

What

do

they express

from

the social relations?

The

analysis aroused the

discussion of concepts such as: difference and deficiency; language, speech and dialogy;

belongingness, exclusion and unfiliation. In order to understand

them

intense dialogues

were

taken vvith authors such as

Vygotsky

and Bakthin, expanding the possibilities of analysis through articulations with studies in the field of history and of sociology

-

with

works by

Ginzburg,

Thompson

and Castel- as well as studies

by

Eni Orlandi in the field of the analysis of the discourse.

The

process

of

research consisted of the description and analysis of text (68 pedagogical reports), elaborated

by

teachers and specialists

from

the

regular schools, with the intention to tract

down

its intimate connection and to identify

its discourse marks.

At

first sight, the texts under analysis

seemed

strongly

marked by

the repetition.

However,

upon

a

more

detailed observation the contradictions pervading this

unstable

match of

significance

were

observed. In these discourses

were

found not only

the

words

of the other, hidden or half-hidden in the

words

of the teachers and specialists,

but also the distant resonance and almost inaudible prior links either close or distant of the cultural communication. In

them

is manifested a dialogue

between

the opinions

produced in daily life, the system of beliefs and superstitions, the theoretical tendencies, science and politics.

The

comprehension

of

this dynamic lead to the study

of

the metamorphosis of the unfiliation or social invalidation and its manifestations at school, to

understand the constitution of this historical process

which

threatens wider sectors

of

the

(9)

REFERÊNCIAS

BIBLIOGRÁFICAS

... ..

LISTA

DE

SIGLAS

... .. 9

INTRODUÇÃO

... .. 10

Delimitação e organização

do

campo

de investigação ... .. 14

1

OS

INTERLOCUTORES

E OS PERCURSOS:

um

esboço teórico-metodológico da pesquisa ... .. 21

2

O

JOGO E

SEUS

JOGADORES:

uma

primeira aproximação aos sentidos e significados

que vão

constituindo O sujeito ... ..

34

2.1 Construindo os dispositivos de análise ... ..

34

2.2

Os

jogadores e as regras aparentemente visíveis

do

jogo ... .. 38

-3

AS

MARCAS

E

AS

PROPRIEDADES

DOS

DISCURSOS:

regras

do

jogo à. descobrir ... ._

49

3.1

As

marcas gramaticais ... .. 53

3.2

As

marcas das possibilidades ... .. 59

3.3

As

marcas

do

social ... _.

62

3.4

As

marcas da medicalização ... ..

64

3.5

As

marcas de interação ... ..

67

3.6

As

marcas da reprovação ... ..

69

4

A

DIALOGIA

DO

DISCURSO:

um

encontro

com

O discurso de

outrem

... .. 73

5

AS

METAMORFOSES

DA

DESFILIAÇÃO:

suas manifestações

no

ensinar e

no

aprender ... ..

90

5.1

Um

modo

de compreender a lógica

do

processo histórico ... ..

90

5.2

As

metamorfoses da desfiliação ... ... .. 96

5.3

A

manifestação da desfiliação na escola ... .. 111

5.4

A

desfiliação hoje e os indicadores

da

direção

do

seu

fluxo

futuro ... .. 119

CONSIDERACOES

FINAIS

... .. 125

DOCUMENTAÇÃO

... .. 131

(10)

LISTA

DE

SIGLAS

CRE

=

Coordenadoria Regional de

Educação

CENEI

=

Centro de

Educação

Integrada

DIFM

=

Diretoria de Ensino Fundamental e

Médio

DIEF =

Diretoria de Ensino Fundamental

FCEE

=

Fundação

Catarinense de

Educação

Especial

GEENF

=

Gerência de Ensino Fundamental

(11)

Durante anos segiidos de atuação na educação especial, tenho convivido,

77

interagido e

me

inquietado

com

os discursos sobre sujeitos que “não

aprendem

1

e

com

o papel desses discursos na consagração

ou

legitimação da diferença/deficiência/dificuldades de aprendizagem

como

desvantagem.

Refiro-me

a

determinadas significações produzidas socialmente, que postulam às'_ diferenças

individuais, principalmente às diferenças significativas de

ordem

fisica, cognitiva e/ou

sensorial,

uma

valoração classificatória e quantitativa. Tais significações são

interpretadas, tratadas e mantidas pelo

gmpo

social e pelo próprio sujeito

da

significação

como

uma

desvantagemz. Dentre os discursos que de

alguma

forma contribuem para a consagração dessa idéia, destaco

o

discurso pedagógico que, por sua configuração, se diferencia de outros

como

o jornalístico, o teológico, o assistencial,

mas

que,

como

estes,

desempenham

um

papel na dinâmica das relações sociais.

O

discurso pedagógico adquire

uma

forma e

um

estilo peculiar nas relações que

envolvem

o ensinar e

o

aprender,

uma

vez que é produzido “por

um

falante determinado, para

um

interlocutor determinado

com

finalidades específicas”(Orlandi, l996b)_

Embora

aparentemente enfocado de maneira particular,

contém

em

si a multiplicidade de

discursos “alheios” que,

num

processo de

mútua

interação, dialogam sobre o

tema

em

questão.

Falas

como

as

que

seguem testemunham

a configuração desse discurso:

1 Os “discursos sobre”, na compreensão de Orlandi (1990, p.37), “são

uma

das formas cruciais de

institucionalização dos sentidos”, quer dizer, o discurso, por operar no plano da ideologia, é regido por condições de produção de sentidos específicos e determinados, que se apresentam e se consagram não como

uma

interpretação, mas como a interpretação, com o “sentido de

um

lugar só, universalizado”. 2 Estudos desenvolvidos por profissionais da Educação Especial (Amaral, 1998; Bianchetti e outros,

1998; Omote, 1991) aprofundam as discussões sobre as diferenças nesta perspectiva; alguns deles serão abordados mais adiante.

(12)

11

O

aluno

em

questão apresenta dificuldade acentuada

na

pronúncia

(não sabe falar),

não

assimila conhecimentos,

não

gosta de participar de trabalhos

de grupos

(..)

Tem

dificuldade

em

montar

cálculos até

mesmo com

material concreto.

[O

aluno

Jtem

dificuldade de concentração,

coordenação motora

e equilíbrio,

embora

insiste

em

acertar e socializar-se.

Foi

aplicado

o

teste de maturidade (teste

ABC)

no

qual

o

aluno encontrou

dificuldades sensíveis, incompatíveis

com

sua faixa etária.

O

rendimento cognitivo

não

corresponde

ao

nível

de

3“se'rie.

-

Embora

responsável e dedicada, apresenta

uma

dificuldade muito acentuada de

compreensão

e assimilação (Santa Catarina, 1996a)_

Falas

como

essas e tantas outras permitiram-me construir a hipótese de

que

tal

linguagem, na qual prevalecem atributos de apreciação negativa, gera impasses na ação da escola.

Por

manifestarem

uma

certa crença de que as dificuldades dos alunos residem nas suas características individuais, os educadores se

vêem

como

que

impossibilitados de, através de sua ação, provocar avanços

no

desenvolvimento desses alunos.

O

tema

que

proponho

para estudo

-

Diálogos sobre

o

não

aprender -

tem

sua

origem

em

meu

percurso profissional

como

educadora

do

Centro de

Educação

Integrada da

Fundação

Catarinense de

Educação

Especial -

FCEE,

onde

atuava

como

membro

da equipe responsável pelo

encaminhamento do

Serviço de

Apoio

Pedagógico, nos

níveis nuclear (no

campus

da

FCEE)

e extensivo (no Estado de SC).3

Este Serviço constitui-se

numa

das modalidade de atendimento especializado

para alunos

com

necessidades especiais integrados nas escolas regulares de ensino, e por esta razão seu desenvolvimento é de responsabilidade da

FCEE

e da Secretaria de

3

O

Centro de Educação Integrada -

CENEI

- era

uma

escola de ensino regular, estniturada no campus

da Fundação Catarinense de Educação Especial - FCEE, no período de 1985 ~ 1999, que oferecia

educação infantil e ensino fundamental (la à 4” série) a aproximadamente 400 crianças e adolescentes.

O

trabalho ali desenvolvido norteava a definição da politica de educação especial no Estado de Santa Catarina, de responsabilidade da FCEE, quanto à integração de alunos

com

necessidades especiais no sistema oficial de ensino; realizava, ainda, orientação técnica às modalidades de atendimento especifico

- salas de recursos para portadores de deficiência sensorial

e serviço de apoio pedagógico para portadores de deficiência mental - oferecidas

em

horário oposto ao da freqüência do ahmo

em

classe regular.

No

início de 2000, essa escola sofreu modificações na sua estrutura e não mais funciona como unidade de Serviço da FCEE.

(13)

Estado da Educação, Cultura e Desporto. Estes dois órgãos estaduais, mediante o trabalho integrado das suas equipes técnicas,

definem

e

acompanham

em

conjunto as ações relacionadas ao desenvolvimento da Política de Integração de alunos

com

necessidades especiais na rede regular de ensino

no

Estado.

Nos

inúmeros episódios que vivenciei

no

interior da escola,

em

atividades

relacionadas a Conselhos de Classe, reuniões de estudo de caso, entrevistas

com

familias,

bem como

nos contatos

extemos

com

profissionais das escolas estaduais,

em

que

se tratava de alunos

com

história de deficiência e de dificuldades de aprendizagem,

predominavam

os discursos cujo sentido dominante centrava-se nas caracteristicas peculiares

do

aluno, na sua incapacidade de aprender e

acompanhar

a tunna. Evidenciavam-se

com

certa regularidade tennos específicos

como:

desorganízado, lento, agressivo, esquecido, que pareciam caracterizar marcas inquestionáveis e definitivas da incapacidade desses alunos.

O

esforço

no

sentido de

romper

com

o discurso desqualificador centrado

no

indivíduo não

me

impedia de participar na sua produção

como

interlocutor, tanto que, na definição de propostas

com

vistas à integração dos alunos

com

necessidades educativas

especiais na rede estadual de ensino4, das quais participei, reproduzia discursos

com

as

mesmas

características. '

Por

um

certo

tempo

estive convencida de

que

esse discurso ideológico era exclusividade da escola e se pautava fundamentalmente na falta e na incapacidades.

Com

esse pressuposto formulei a seguinte questão de pesquisa para

compor

meu

projeto de ingresso

no

curso de

Mestrado

em

Educação:

como

se constroem os discursos

da

faltae da diferença nas práticas da escola frente à diversidade

humana?

O

ingresso

no

curso de Mestrado,

em

1998, possibilitou-me,

não

só o aprofiindamento dos princípios teórico-metodológicos necessários à investigação,

como

também

a

compreensão

mais ampliada e crítica

do fenômeno

que pretendia pesquisar.

Em

face desses estudos,

pude

redefinir o projeto inicial, fundamentalmente

no que

se

4 Ressalto a participação na equipe responsável pela elaboração dos documentos: Processo de desenvolvimento do Serviço de Apoio Pedagógico na Unidade de Educação Integrada da

FCEE

- 1990

e Redefinição das diretrizes para estruturação e funcionamento do serviço de apoio pedagógico no

ensino fundamental no Estado de Santa Catarina - 1994.

5 Falta: no sentido de dar ênfase à ausência de certos atributos no indivíduo e, pela exclusão de

uma

(14)

13

refere à superação da leitura unilateral que fazia a respeito

do tema

.

Por

exemplo, se

parto

do

princípio de que na escola se produz só

um

discurso - o da falta - e

que

este é

da escola, corro o risco de, na análise das fontes, buscar apressadamente confirmações legitimadoras dessa hipótese,

propondo

perguntas direcionadas para este

fim

e reafirmando-a

com

conhecidos argmmentos de estudos consagrados. Desta

forma

já saberia previamente o resultado de rninha pesquisa por estar utilizando “procedimentos autoconfirmadores”, na expressão de

Thompson

(1981, p.49).

Compreendi

que,

no

processo de investigação, deveria buscar a sistemática

interrogação das evidências (no caso, os textos dos discursos), pois

mesmo

os fatos aparentemente indiscutíveis

merecem

ser questionados; compreendi ainda que,

implicitamente a qualquer fato, existe

uma

estrutura de relações sociais que ao

mesmo

tempo

mostra

um

movimento

e inibe outro, alimenta alguns discursos e descarta outros.

Negar

as inúmeras facetas de

um

discurso seria negar a presença ativa dos

homens

na produção da linguagem.

Com

o propósito geral de analisar os discursos pedagógicos sobre os alunos

que

“não aprendem”, a partir dos

documentos

e relatórios

que encaminharam

alunos para o Serviço de

Apoio

Pedagógico na rede regular de ensino

no

período de 1994 a 1996,

levanto algumas indagações preliminares:

Como

e por que são produzidos esses discursos?

Em

que condições são produzidos? Quais são seus significados?

Quem

são os interlocutores, ou,

com quem

dialogam?

O

que expressam das relações sociais e

como

os

sujeitos que os

produzem atuam

na constituição destas relações?

No

trabalho de análise desses textos, considerando cada

um

deles

como

um

todo,

manifestação e alicerce de

uma

dada concepção sobre o “não aprender”, procuro descrever as relações organizadoras das concepções

que permeiam

os discursos,

com

vistas a apreender suas condições de produção,

bem como

as contradições que determinam sua

constmçãoõ

6 Para Orlandi (l996b, p.117) o texto, visto “como unidade de significação, é o lugar mais adequado para se observar o fenômeno da linguagem. Porque parto da totalidade e não das partes segmentadas,

(15)

Delimitação e organização

do

campo

de

investigação

A

delimitação

do

problema de investigação decorreu de

um

trabalho de pesquisa

coletivo desenvolvido na

FCEE,

orientado pelo Prof' Elisabeth

Juchem

Machado

Leal,

do

qual participei

como

pesquisadora, anteriormente ao

meu

ingresso

no

mestrado. Essa pesquisa, intitulada: Avaliação

do

processo de integração

de

alunos

com

necessidades especiais -na rede regular de ensino, tinha

como

propósito “descrever e analisar o

processo de integração ocorrido

no

período de 1988 a 1997, notadamente a partir da

perspectiva dos educadores, educandos e famílias”(Santa Catarina, 1997).

As

razões que desencadearam a pesquisa supra citada centravarn-se na necessidade

sentida pela instituição, após dez anos de adoção

da

medida

política

que

garantia matrícula às pessoas

com

necessidades educativas especiais na rede estadual de ensino (Plano Anual de Matrícula, 1988), de realizar

uma

“análise mais acurada das ações desencadeadas

no

âmbito desse processo e seus desdobramentos na rede estadual de ensino, face aos

rumos

futuros de sua atuação.7

Dos

documentos

e dados estatísticos resgatados então, alguns foram fiindamentais para a delimitação

do

presente trabalho. Entre eles destacam-se os dados

que

se referem à “matrícula final de educandos

com

necessidades educativas especiais atendidos

em

serviços de educação especial na rede regular de ensino de Santa Catarina,

no

período de 1988 a 1994” (Santa Catarina, 1998).

No

que diz respeito aos alunos atendidos

em

sala

de apoio pedagógico, destinada às crianças e adolescentes

com

dificuldades de aprendizagem e/ou deficientes mentais, observou-se, de 1989 a 1993,

um

significativo

número

de matrículas,

ou

seja, 13.039

em

1989, caindo para 5.331,

em

1993,

mas

mantendo-se ainda

em

patamares elevados.

No

entanto,

em

1994, or

número

de

matrículas reduz-se drasticamente para 253 alunos.

7 Cabe situar, ainda, que esta pesquisa teve início

em

1997, no

Govemo

do

PMDB,

sendo Governador Paulo Afonso Evangelista Vieira. Tinha como objetivo avaliar os 10 anos de

uma

proposta implantada também no governo do

PMDB

quando era então Governador Pedro Ivo de Figueiredo Carnpos.

De

acordo

com

Michels (1999, p.45),

“A

política de integração

em

Santa Catarina, é legalmente iniciada no

mesmo

ano da promulgação da Constituição Federal de 1988. Esta foi encaminhada pela Secretaria de Estado da Educação e pela FCEE, com a assinatura da Portaria n° 011/87/SE, que garantia o direito a vaga nas escolas estaduais para crianças e jovens

com

idade entre sete e 14 anos. Não excluindo os portadores de deficiência desta faixa etária, abriu-se a possibilidade de efetuar-se matricula para estas

(16)

15

Os

documentos

oficiais, orientadores

do

Serviço de

Apoio

Pedagógico nesse

periodo, evidenciam alguns elementos que

podem

esclarecer as razões

do

excessivo

número

de alunos que freqüentavam o serviço até 1993 (5.331 alunos) e

o

conseqüente decréscimo da matrícula a partir de 1994 (253 alunos).8

Nesse

ano foi possível acompanhar,

como membro

integrante da equipe da

FCEE,

as discussões junto à equipe

do

ensino fundamental da

SED

quanto às dificuldades e preocupações

que

decorriam

do encaminhamento

a este serviço.

A

primeira referia-se ao elevado

número

de alunos

do

sistema regular

que

estavam sendo caracterizados, inadequadamente, tanto pela escola quanto pelos órgãos oficiais,

como

clientela da educação especial.

A

segunda preocupação dizia respeito aos desencontros de

ordem

teórico-metodológica presentes nas definições técnicas destes dois órgãos.

A

FCEE

encarninhava orientações baseadas nos princípios da psicanálise de Freud e da epistemologia genética de Piaget, a partir das proposições da psicopedagogia clínica, enquanto a

SED

procurava encaminhar algumas discussões, pelo

menos

teóricas, na perspectiva

do

materialismo histórico. Tal pressuposto norteava o

documento

da proposta curricular, de conhecimento da rede desde 1988.

A

partir desses argumentos, a

SED

posiciona-se pela extinção

do

serviço, encaminhando orientações à rede de ensino neste sentido.

A

FCEE

adota posição

contrária à decisão tomada, apesar de considerar que o

número

excessivo de alunos matriculados

no

serviço revelava

um

fracasso escolar

em

massa,

camuflado

sob a indicação de

uma

necessidade especial. Entretanto, considerava que nessa população havia efetivamente alunos

com

necessidades educativas especiais

que

legitimavam o

serviço.

Sua

extinção comprometeria

o

processo de integração iniciado

em

1988,

com

possível retorno desses alunos para a escola especial.

Com

base nessas preocupações, a equipe da

FCEE

procurou manter conversações

com

a Secretaria e,

no

segundo semestre de 1994, reiniciavam-se as discussões que

resultaram na redefinição

do

serviço, a partir da elaboração conjunta

do documento

8

O

documento Processo de desenvolvimento do Serviço de apoio pedagógico na Unidade de

Educação Integrada da

FCEE

(1990) enfatizava que o referido serviço destinava-se “aos alunos

com

dificuldades de aprendizagem, decorrentes de fatores intemos ao individuo,

bem

como aos alunos com

fracasso escolar, decorrentes de fatores de ordem externa”. Tal encaminhamento contribuiu para a legitimação do atendimento a

uma

grande clientela que não necessariamente precisava de serviços

(17)

Redejinição

das

Diretrizes

para

estruturação e

funcionamento

do

Serviço de

Apoio

Pedagógico

no

ensino

fundamental

(I “

à

4 asérie)

no Estado

de Santa Catarina.

No

decorrer de 1995,

com

a

mudança

de

govemo

e das equipes nas

CREs,

o trabalho da

FCEE

e da

SED

voltou-se para a capacitação dos profissionais das equipes

regionais de educação, segundo os princípios que norteavam a redefinição

do

serviço,

bem como

foram encaminhadas negociações

com

o

novo

Secretário da

Educação

com

vista à contratação de professores para o serviço na redeg.

Somente

em

1996 foi

autorizada a estruturação de

um

serviço por região e encaminhadas orientações às

CREs

para levantamento

da

clientela (alunos

com

história de deficiência mental) matriculada nas escolas

da

região.

As

orientações enfatizavam a observância aos critérios explicitados

no documento

citado.

Das

vinte e duas regiões educacionais, quatro apresentaram relatório de

encaminhamento

de alunos à

SED

(169

no

total) para estruturação

do

pólo de

atendimentom

As

orientações de criação

do

serviço, segundo o documento, exigiam: “1) oficio de

encaminhamento

para

SED/DIFM/GEENF;

2) justificativa; 3) relatório síntese da avaliação (produzido pelo professor e/ou especialista) sobre: a dinâmica de trabalho

desenvolvida

em

sala de aula, a relação

do

aluno

com

o conhecimento e a história evolutiva dos alunos; 4) relação

com

o

nome

dos alunos; 5)

nome

do

professor; 6) parecer da equipe regional”(Santa Catarina, 1994, p.29).

Assim, observa-se que o período

de1993

a

1996

evidencia, questões relevantes

do

ponto de vista

da

política de integração das pessoas

com

necessidades educativas

especiais, das relações entre as instituições, das concepções sobre as necessidades educativas especiais, das congruências e incongmências

no

atendimento a essas necessidades.

As

evidências se

mostram

nas pistas e sinais impressos nos documentos.

São

discursos que

produzem

efeitos de sentido

em

muitas direções, “que dizem e silenciam” (Orlandi, 1990).

9

A

partir de 1995, assume o govemo do

PMDB,

em

substituição ao govemo do PFL, passando a ocupar o cargo de Secretário da Educação o professor Deputado João Batista Mattos e como Diretor Geral da

FCEE

o Dr. Zalmi Luiz Fabre.

10 Considera-se pólo

uma

escola que centralize o atendimento recebendo alunos de outras escolas próximas.

É

necessário esclarecer ainda que foram cinco as regiões que manifestaram interesse pela estruturação do Serviço (Tubarão, Laguna, Jaraguá do Sul, Xanxerê e Itajaí), no entanto, não foram encontrados nos arquivos da

SED

os documentos do processo da região de Itajaí.

(18)

17

É

importante analisar que as ações desencadeadas nesse período,

no

Estado de Santa Catarina,

com

vistas à integração de pessoas

com

necessidades educativas

especiais na

Rede

Regular de Ensino, são a expressão localizada de políticas mais amplas, desencadeadas

em

nível mundial e nacional. Isso se dá principalmente a partir de

1994,

quando

o Ministério de

Educação

e Cultura, orientado por organismos internacionais, implementa sua política educacional, mediante a publicação de

documentos

orientadores, encaminhando ações

que

visavam à integraçao de alunos

com

necessidades especiais, nas escolas regulares. Esses

documentos

defendiam,

como

principal política pública para a Educação.Especial, a integração dos portadores de necessidades especiais na

Rede

Regular de Ensino.

U

Todavia, cabe esclarecer

que

o

movimento

pela integração

tem

inicio muito antes

dessa data, e

em

decorrência das grandes guerras mundiais,

do

fortalecimento dos

movimentos

sociais pelos direitos humanos,

bem como

dos avanços científicos ocorridos na época.

No

final

da

década de 50, por exemplo, já havia sido

promulgada

uma

lei, na

Dinamarca, que defendia a “normalização”,

ou

seja, a criação de condições de vida nos padrões considerados normais para essa parcela da população, assim

como,

nos demais países da Europa, na década de 60, observa-se essa

mesma

orientação na regulamentação de suas leis (Santos, 1995).

Porém

é a partir de 1994,

quando

ocorreu a Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais, na Espanha, que a integração

assume

maior peso na definição das políticas públicas para a Educação.

Nessa

Conferência foi aprovada a

Declaração

de

Salamanca

de Principios, Políticas e Práticas das Necessidades Educativas Especiais.

A

partir dessas diretrizes “passou-se a se considerar a

inclusão dos alunos

com

necessidades educativas especiais

em

classes regulares

como

a forma mais avançada de democratização das oportunidades educacionais” (Bueno, 1998, s.p.).

A

partir de 1996, na esteira das políticas neoliberais para a educação,

temos

acesso

à

nova

LDB

que no

Capítulo V,

define

três artigos, entre eles o artigo 58,

que

situa a

11 Este encarrrinlramento das políticas públicas

vem

sendo traçado pelas políticas neoliberais e pode ser

observado nos documentos orientadores do Banco Mundial, da Comissão Econômica para a América

Latina e Caribe (CEPAL) e da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura

(19)

educação especial

como

a modalidade de ensino destinada aos educandos portadores de necessidades especiais, preferencialmente, na rede regular de ensino. 12

Com

base

no

exposto, defini o periodo de 1993 a

1996

como

foco de

minha

investigaçao,

devendo

analisar o conjunto de

documentos

(aqui

tomados

como

textos dos discursos) que encaminha alunos para o Serviço de

Apoio

Pedagógico nesse

período. 13

A

investigação foi organizada

em

tomo

do

seguinte roteiro:

1 - Escolha dos textos produzidos nesse período, tendo

como

critério específico o

fato de tratarem de alunos que apresentam supostas histórias de deficiência e/ou de dificuldades para aprender, vinculados a essa modalidade de atendimento.

2 - Consulta e levantamento de informações presentes nos textos escolhidos:

a)

busca de

um

conjunto de elementos que permitissem situar os textos quanto aos autores, datas, escolas,

números

de alunos, idade, série e outros dados de identificação; b)

uma

primeira aproximação de agrupamentos dos textos de acordo

com

a regularidade de enunciados,

denominados

de classificadores,

que

evidenciassem elementos úteis à

constmção

de hipóteses relativas ao conteúdo dos textos.

A

escolha dos discursos para análise recaiu sobre o conjunto dos quatro processos solicitando estruturação

do

Serviço de

Apoio

Pedagógico, encaminhados

em

1996, pelas escolas das seguintes Coordenadorias Regionais de

Educação

-

CRES:

2”

(Tubarão), 20” (Laguna), 19” (Jaraguá

do

Sul), e 17” (Xanxerê), e arquivados, desde então, na

SED.

Para localizar o conjunto desses

documentos

recorri à

DIEF

- Diretoria de Ensino

Fundamental da

SED,

tendo sido atendida pela coordenadora

do

Serviço de

Apoio

Pedagógico

no

Estado, que disponibilizou para pesquisa todo

o

material ali registrado e

arquivado.

Como

já citei anteriormente, naquele ano

também

a 13”

CRE

(Itajai) solicitou

12 Lei n° 9394/96, de 20 de dezembro de 1996.

13 Tomar 0 documento como texto significa dizer que ele é

um

objeto histórico no sentido atribuído por Eni Orlandi: “[...] quando afirmo que

um

texto não é

um

documento, mas

um

discurso, estou produzindo algo mais ftmdamental; estou instalando na consideração dos elementos submetidos à análise - no

movimento contínuo entre descrição e interpretação - a memória.

Em

outras palavras, os dados não têm

memória, são os “fatos” que nos conduzem à memória lingüística” (1998, p.58). Mas, qual a distinção que a análise de discurso estabelece entre discurso e texto? “Eles se equivalem, mas

em

niveis

conceituais diferentes. Isto significa que o discurso é tomado como,conceito teórico e metodológico e o

(20)

l9

a instalação desse Serviço na região, todavia

o

processo não se encontrava registrado e

arquivado na

SED.

Deste

modo,

os

documentos

desta região não farão parte

do

conjunto que será estudado

no

presente trabalho

Os

quatro processos encaminhados pelas escolas das quatro regiões

do

Estado

compõem-se

de:

a) relatório

com

parecer da equipe

da

CRE

sobre a estruturação

do

Serviço de

Apoio

Pedagógico na sua região;

b) relatório

do

diretor e/ou

do

especialista, justificando e solicitando a estruturação

do

serviço na sua escola;

c) relatório pedagógico elaborado pelos professores e especialistas sobre os alunos que consideram apresentar história de deficiência, totalizando 169 relatórios;

d)

em

alguns casos (duas regiões), relatórios de observação da dinâmica

em

sala de aula

elaborado pelo especialista.

O

conjunto de textos, provenientes das escolas,

pode

nos oferecer

um

quadro rico e vivo das concepções de

mundo,

da multiplicidade de textos existentes, possíveis e imaginários, dos sujeitos e da situação.

A

partir deles

poderemos

alcançar outros dizeres,

outros sentidos possíveis, ,outros textos.

Para empreender esta tarefa o trabalho foi organizado da seguinte forma:

nd

primeiro capítulo indico os

caminhos

teórico-metodológicos escolhidos e apresento os autores

com

os quais mantive interlocução sistemática

no

sentido de estabelecer

um

diálogo

com

as evidências;

no

capítulo II apresento:

Ojogo

e seus jogadores,

como

uma

primeira aproximação aos sentidos e significados que

vão

constituindo os sujeitos que

participam desse diálogo social ininterrupto sobre o “não aprender”. Procuro descrever os sujeitos sobre os quais se escreve,

ou

seja, os alunos, suas experiências na escola e fora dela, e os sentidos que atribuem ao não aprender

em

face destas experiências.

Realizo

também

algumas reflexões sobre as experiências dos professores que, na produção dos textos sobre seus alunos, significam

também

a si próprios, constituindo-se

como

sujeitos na intersubjetividade.

No

capítulo III procuro realizar a análise das

marcas

e propriedades dos discursos manifestas nos textos,

no

caso os relatórios pedagógicos das escolas que

encaminham

alunos para

o

Serviço de

Apoio

Pedagógico,

no

sentido de apreender a

multiplicidade de sentidos presentes nos discursos sobre

o

“não aprender”, suas formas sedimentadas e suas possibilidades emergentes.

(21)

Com

o propósito de identificar e discutir a díalogicidade (Bakhtin, 1998) presente nos discursos

em

estudo,

no

capítulo

IV

, examinei o

modo como

se interpõem

nas falas dos professores e especialistas os discursos de outrem, discursos “alheios”

que

dialogam e se constroem penetrados por idéias gerais, por pontos de vista, por

apreciações de outros, por produções da ciência, pela ideologia.

No

último capítulo, ao qual atribui o título de

As

metamorƒoses

da

desfiliação: suas manifestações

no

ensinar e

no

aprender , apresento

um

estudo sobre os processos de

desenvolvimento da desfiliação

ou

da invalidação social, unidade de análise que permeia o produção dos discursos sobre o não aprender, ou, mais propriamente, sobre os alunos pobres considerados

como

incapazes para tal. Mediante a análise dos resíduos vivos que

unem

o presente e

o

passado procuro compreender as formas

de

produção e de manifestação desse processo social,

numa

tentativa de pensar o presente

como

história e de procurar a relação

que

existe entre os “inúteis para a sociedade”

no

passado e os

“inúteis para a sociedade” hoje, os “incapazes de aprender” para a escola de

ontem

e os “incapazes de aprender” para a escola de hoje.

(22)

21

CAPÍTULO

1

OS

INTERLOCUTORES

E

OS

PERCURSOS

:

um

esboço teórico-metodológico

da

pesquisa

Em

cada

um

dos pontos do diálogo que se desenrola, existe uma multiplicidade inumerável, ilimitada de sentidos esquecidos, porém, num determinado ponto, no desenrolar do diálogo, ao sabor da sua evolução, eles serão rememorados e renascerão numa forma renovada (num contexto novo).

(Bakhtin, Estética da criação verbal)

O

eixo

que

tem

noiteado

meus

estudos centra-se na busca de aportes teóricos e metodológicos que subsidiem a definição de alguns conceitos suscitados pela temática de investigação e

que

viabilizem

um

procedimento

adequado

na leitura dos discursos que constituem a empiria desta pesquisa.

Conceitos

como

diferença/deficiência, linguagem/discurso/ideologia, pertencimento/exclusão/desfiliação, experiência humana/determinação, intimamente articulados e compreendidos

em

sua dimensão histórico-cultural, constituem

o

arcabouço central da temática. Para compreendê-los procuro aprofilndar,

no

decorrer da pesquisa, o diálogo

com

alguns interlocutores

como

Vygotsky, Bakhtin,

Thompson

e Castel articulando suas idéias

com

outros autores, alguns

do

campo

da

educação especial, que

têm

desenvolvido estudos sobre a deficiência

como

construção, a partir de processos

histón`co-culturais que

produzem

formas de inclusão/exclusão.

Poderia situar previamente

um

conjunto de autores que, neste

campo,

de maneira ampla

ou

específica,

aprofundam

o

estudo destas formas de inclusão/exclusão,

manifestas

ou

implícitas,

no

âmbito das políticas, das relações na escola,

no

trabalho e

em

outros grupos sociais. Autores

como:

Lígia

Assumpçao

do Amaral

(1998), Eniceia Gonçalves

Mendes

(1985), José Geraldo Silveira

Bueno

(1993),

Sadao

Omote

(1991),

(23)

Lucidio Bianchetti e outros (1998),

Rós

(1997), Carneiro (1996) apresentam contribuições nesse sentido.

O

estudo da linguagem, na perspectiva de autores

como

Vygotsky

e Bakhtin, que compartilham a

mesma

herança intelectual marxista, não

pode

estar separado da prática social que a produz, isto é, dos processos que entram

em

jogo na constituição da

linguagem, quais sejam, os processos histórico-sociais. Então, os interlocutores, a situação, o lugar de

onde

falam os interlocutores, as representações dessas circunstâncias

concretas constituem as condições de produção de

um

discurso.

Neste sentido, tanto

Vygotsky

quanto Bakhtin enfatizam a existência de

uma

unidade dialética entre sujeito e objeto e analisam a experiência dos

homens

simultaneamente

em

sua totalidade e

em

sua singularidade. Falam, portanto, de

um

sujeito histórico, datado, concreto,

marcado

por sua cultura. Partindo da concepção

dialética,

ambos

constroem

uma

visão da realidade, não fragmentada,

mas

enraizada na

história, que busca compreender o

homem

constituído

no

conjunto das relações sociais.

A

linguagem,

no

sentido atribuído por Marx, é a consciência real, prática, que se produz

com

a necessidade dos intercâmbios

com

os outros homens.

“Onde

existe

uma

relação ela existe para

mim”

(1998, p.25). Desta forma, para apreender o que expressa a consciência

humana

de

um

determinado

momento

histórico é preciso tomar

em

conta as relações sociais que determinam essa consciência. Parte-se dos

homens

realmente ativos, pois “é a partir de

um

processo de vida real que representamos

também

o desenvolvimento dos reflexos e das repercussões ideológicas desse processo vital”

(1998, p.19).

Com

base

no

pressuposto de que o

homem

não existe dissociado da cultura,

Vygotsky, em. suas obras, desenvolveu suas idéias principais sobre a “mediação simbólica”, a “linguagem” e o “papel

do

outro”

no

desenvolvimento e aprendizagem

do

ser

humano.

Essas idéias oferecem

um

referencial interessante para a compreensão dos fatores determinantes na produção histórica da linguagem,

fenômeno

que possibilita a interação

humana

e a constituição da consciência e

do

pensamento.

De

acordo

com

Vygotsky

(1993, p. 132),

O

pensamento e a linguagem, que refletem a realidade de

uma

forma diferente daquela da percepção, são a chave para a compreensão da natureza da consciência hurnana. As

(24)

23

palavras desempenham

um

papel central não só no desenvolvimento do pensamento, mas também na evolução histórica da consciência como

um

todo.

Vemos

emergir, assim, a dimensão sígnica da palavra na produção da consciência. Através dela o

homem

não só se das`mais diversas produções culturais,

como também

compreende

sua própria consciência

como

um

ato de pensamento,

como

atividade mental. Para ele, todo conhecimento é construído inicialmente entre pessoas, através da linguagem,

em

interação social, e só depois este conhecimento se intemaliza, quer dizer, se

toma

intrapessoal.

A

consciência individual não é nada mais que

“um

contato consigo

mesmo

a partir dos outros” (Vygotsky, 1993).

As

concepções de

Vygotsky abrem

perspectivas

também

para a redefinição

do

conceito de deficiência ao desenvolver trabalho teórico e aplicado junto a crianças

com

deficiências fisicas, sensoriais e mentais de origem orgânica. Seus estudos

em

“Defectologia” indicam que

a idéia de soma de defeitos como

uma

linritação puramente quantitativa do desenvolvimento, indiscutivelmente, se encontra

em

afinidade ideológica

com

a teoria

peculiar do preformismo paidológico, de acordo

com

o qual o desenvolvimento extra-

uterino da criança se reduz exclusivamente ao crescimento quantitativo e ao aumento das funções orgânicas e psicológicas. (...)

A

defectologia luta atualmente pela tese

fundamental

em

cuja defesa esta vê a única garantia de sua existência como ciência.

É

precisamente a tese que desenvolve: a criança, cujo desenvolvimento está complicado por

mn

defeito, não é sensivelmente menos desenvolvida que seus coetâneos normais, é

uma

criança, porém, desenvolvida de outro modo (Vygotsky, l989b, p.3). [Tradução minlra].

O

autor propõe que, dada a plasticidade

do

cérebro

humano,

pessoas

com

limitações orgânicas

podem

compensá-las por

meio

da construção de caminhos altemativos de desenvolvimento, isto é, aproveitam órgãos, processos e

mecanismos

integros para processar, por outras vias sua aprendizagem.

Se

um

cego ou

um

surdo alcança no desenvolvimento o

mesmo

que urna criança normal, então as crianças com deficiências o alcançam de modo diferente, por outra via,

com

outros meios e para o educador é muito importante conhecer a peculiaridade da via pela qual ele deve conduzir a criança (Vygotsky, `1989b, p.7). [Tradução minlra].

(25)

Estes e outros conceitos

em

Vygotsky

constituem-se

num

campo

fértil para o

entendimento dos processos de aprendizagem/desenvolvimento das pessoas

com

história

de deficiência e

ou

dificuldades de aprendizagem,

bem como

para a

compreensão

das condições de produção da linguagem.

Analisando as obras de

Vygotsky

e Bakhtin, observa-se que,

embora

partindo de objetivos diferentes -

o

primeiro da formulação de

uma

psicologia histórico-cultural e o

segundo da construção de

uma

concepção histórica e social da linguagem -, muitos são

os pontos de encontro entre suas idéias (Freitas, 1997).

Bakhtin,

numa

abordagem

epistemologicamente próxima da de Vygotsky, oferece importantes contribuições para entendermos a linguagem a partir

do

campo

da

lingüística e da filosofia da linguagem.

Como

Vygotsky, vê

o

homem

não

como

um

ser

biológico abstrato,

mas

histórico e social, historicizando a linguagem na existência dos homens. Entretanto,

complementa

essa idéia introduzindo a detemtinação das marcas ideológicas nas práticas de significação,

tomando

possível discutir a diversidade

individual e cultural.

Ao

chamar

a atenção sobre a impossibilidade de interagir

com

a linguagem

como

se ela fosse

um

“sistema abstrato de normas”, Bakhtin (1990)

afirma

que:

Não são as palavras que pronunciamos ou escutamos, mas verdades ou mentiras, coisas

boas ou más, importantes ou triviais, agradáveis ou desagradáveis, etc.

A

palavra está

sempre carregada de

um

conteúdo ou de

um

sentido ideológico ou vivencial (p. 85).

E

acrescenta:

É

preciso fazer urna análise profimda e aguda da palavra como signo social para compreender seu funcionamento como instrumento da consciência.

É

devido a esse papel excepcional de instrumento da consciência que a palavra funciona como elemento

essencial que acompanha toda a criação ideológica (p. 37).

Para esse autor, ideologia é a representação

do

real que possui

um

determinado sentido,

um

espaço de construção e de contradição e não apenas de “ocultamento”

ou

“falseamento”. Representa, desse

modo,

a maneira

como

os

membros

de

um

determinado grupo social

vêem

o

mundo.Tudo

que é ideológico possui

um

significado e

(26)

26

pessoas, até as interações mais amplas entre enunciados.

Toda

enunciação é

um

diálogo

(mesmo

as produçoes escritas) “socialmente dirigido”.

Antes de mais nada, ela é determinada de maneira mais imediata pelos participantes do

ato da fala, explícitos ou implícitos,

em

ligação

com

uma

situação

bem

precisa. (...)

A

situaçao e os participantes mais imediatos determinam a forma e o estilo ocasionais da enunciação. Os estratos mais profundos da sua estrutura são determinados pelas pressões

sociais mais substanciais e duráveis a que está submetido o locutor (Bakhtin, 1990,

p. 1 14).

Bakhtin enfatiza que existe

uma

forma importante da comunicação ideológica que não está diretamente vinculada a

uma

esfera ideológica particular

(como

a científica, a moral

ou

a religiosa por exemplo): trata-se da comunicação na vida cotidiana,

que

é

extraordinariamente rica e importante, e cujo material privilegiado é a palavra. Trataremos

com

mais detalhe dessa questão, que é a ideologia

do

cotidiano,

no

decorrer

do

trabalho.

Tanto Bakhtin quanto

Vygotsky

desenvolveram importantes formulações que revelam a importância

do

outro.

Sem

ele

o

homem

não penetra na cultura, não se

desenvolve, não

tem

acesso às funções psicológicas superiores, não forma sua

consciência,

enfim

não

se

toma

sujeito. Suas palavras resultam da incorporação das

palavras de outrem.

“A

palavra

do

outro se transforma, dialogicamente, para tomar-se palavra- pessoal-alheia

com

a ajuda de outras palavras

do

outro, e depois palavra pessoal

(com

poder-se-ia dizer, a perda das aspas)” (Bakhtin, 1997, 405- 406).

Minha

experiência de aproximação analítica às evidências

demandou também

a necessidade de recorrer a outros estudos de natureza teórico-metodológica que oferecessem

um

suporte consistente

no

modo

de conduzir

meu

trabalho de investigação.

Tomando

como

ponto de partida e referência os aportes de

Vygotsky

(l989a;1989b;l993; 1995) e Bakhtin (1990; 1997;1998)

com

base nas teses

do

papel

ativo da linguagem

no

processo

do

conhecimento e da produção desta na prática social,

procurei expandir as possibilidades de análise, estabelecendo articulações

com

estudos

no

campo

da história, ou, mais especificamente,

com

as contribuições metodológicas de Ginzburg (1998, 1991) e de

Thompson

(1981, 1997, 1988, 1989),

bem como com

estudos

no

campo

da sociologia (Castel, 1998) e da análise

do

discurso.

A

partir dos

(27)

em

interação,

ou

seja, aquele

em

que se considera a linguagem

em

relação às suas condições de produção” (Orlandi 1996 a).

Que

articulações se

pode

estabelecer entre esses autores: lingüistas, psicólogos, historiadores, sociólogos que, de diferentes fronteiras,

num

entrecruzamento de tempos,

nos

propõem

um

modo

de pensar a prática

humana?

Onde

suas vozes se encontram e que interlocuções são possíveis? Pode-se delinear

uma

analogia entre seus

métodos

de investigação? Estas e outras perguntas foram

permeando

meu

estudo,

como

indagações que

compõem

parte das preocupações de

uma

pesquisadora

que

busca se apropriar de

um

método adequado

à investigação histórica. Preocupações que se circunscrevem

também

pelo cuidado

em

guardar

uma

certa vigilância,

uma

certa coerência epistemológica.

“O

gosto pelo detalhe revelador” (Ginzburg, 1991) é

o

que orienta profundamente o trabalho desses pesquisadores e é, na

minha

compreensão, justamente

um

dos pontos essenciais

do

eixo vital que os aproxima e que

me

permite

me

aproximar

deles.

Vemos,

em

seus trabalhos, a concepção

bem

marcada

de

que

fatos aparentemente carentes de importância, desconectados, insignificantes, negligenciáveis, revelam sinais significativos para a

compreensão

da totalidade

do

fenômeno

histórico que se quer estudar.

Para aprofundar esse ponto de vista, vejamos mais de perto as discussões levantadas por

Vygotsky

nas

Obras

Escogidas III (1995), ao abordar

o método

de investigação.

O

autor

afirma

que a partir “dos resíduos

do

mundo

dos fenômenos”,

numa

expressão que atribui a Freud, é possível revelar

“como

se manifesta

o

grande

no

mais pequeno” . Para ele o todo se faz presente

no

fragmento, quer dizer, seu conteúdo se faz

forma nesse fragmento:

O

zoólogo, pelo resto insignificante de

um

osso de animal fóssil, reconstrói seu esqueleto

e, inclusive, seu modo de viver.

Uma

moeda antiga, que carece de todo valor real muitas vezes dá a conhecer ao arqueólogo

um

complexo problema histórico.

O

historiador, que

decifra

um

hieroglifo traçado

em

uma

pedra, penetra nas profimdezas dos séculos desaparecidos.

O

médico estabelece o diagnóstico da enfermidade com base

em

uns poucos sintomas. Somente nestes últimos anos, vai superando a psicologia o temor antea valorização cotidiana dos fenômenos e aprende por minúcias insignificantes [...] a

descobrir com freqüência importantes documentos psicológicos” (1995, p.64). [tradução minha]

(28)

28

Ginzburg,

em

A/Iitos, emblemas, sinais (1991) discute essa

mesma

idéia

afirrnando que existe

uma

profunda e estreita relação entre

fenômenos

aparentemente

superficiais. '

A

representação das roupas esvoaçantes nos pintores florentinos do Sec. XV, os neologismos de Rabelais, a crua dos doentes de escófula pelos reis da França e da Inglatena são apenas alguns entre os exemplos sobre o modo como, esporadicamente, alguns indícios mínimos são assumidos como elementos reveladores de fenômenos mais

gerais: a visão de

uma

classe social, de

um

escritor, ou de toda

uma

sociedade” (p. 178).

Neste

movimento

contraditório, particularidade/totalidade, fragmento/todo, pequeno/grande,

vemos

revelar-se

um

importante pressuposto

que

fundamenta o trabalho destes pesquisadores, qual seja, os princípios

do

materialismo histórico.

Ao

afinnar a necessidade de observar o real, “a valorização cotidiana dos fenômenos” que existem e se

mostram

aparentemente desconexos, indiciários, e de se buscar as relações

desses

fenômenos

com

a totalidade que os torna concretos, estão explicitando os elementos centrais que norteiam

o

método

marxista de investigação.

Para Marx, “a pesquisa

tem

de captar detalhadamente a matéria, analisar as suas

várias formas de evolução e rastrear sua conexão íntima.

depois de concluído esse trabalho é que se

pode

expor

adequadamente

o

movimento

real” (1983, p.20). Esses

pressupostos,

Marx

explicita

no

estudo

da

história,

mas

podem

estender-se para outros

campos

de investigação, isto é,

podem

ser considerados pressupostos metodológicos

gerais. Eles nos ensinam

que

desvendar a totalidade

no fenômeno

implica partir de sua

análise

no

concreto, nas práticas

humanas

e suas determinações, para a partir dessa

análise

recompor o

fenômeno, desta vez

como

um

concreto pensado, isto é,

um

produto

do

trabalho

do

conhecimento

humano.

Neste sentido

Marx

(1998, p.37), faz

uma

crítica:

Até agora toda concepção histórica deixou completamente de lado essa base real da

história, ou então a considerou como 'algo acessório, sem qualquer vínculo com a marcha

da história.

É

por isso que a história foi e sempre será escrita segundo tuna norma

situada fora dela.

A

produção real da vida aparece na origem da história ao passo que aquilo que é propriarnente histórico aparece como separado da vida

comum

como extra e supra terrestre.

(29)

Vemos

esse raciocínio manifesto nas posições assumidas por

Vygotsky

(1995) ao fazer

uma

crítica aos que interpretam a psicologia histórica identificando-a

com

o passado, fazendo

uma

cisão entre

o

estudo histórico e

o

estudo de manifestações

presentes, atuais. “Estudar algo historicamente significa estudá-lo

em

movimento”

(p.

67). Isto quer dizer que qualquer investigação

pode

ser histórica, desde

que

os

fenômenos

sejam estudados

como

um

processo

em

movimento

e mudança, buscando-se conhecer sua gênese e transformação.

Quer

dizer, procurando compreender os processos que o produzem, as relações que o alimentam e que determinam que se

movimente

deste

modo.

“A

luz

da

história ilumina o presente e nos encontramos simultaneamente

em

dois planos: o que é e o que foi” (1995, p.65).

Essas proposições suscitaram algumas indagações

no

decorrer da

minha

pesquisa:

como

se expressam nos discursos atuais sobre os alunos

que

“não

aprendem”

esses vestígios históricos que indicam formas de condutas petiificados

em

relação a diferença/deficiência?

Como

essas “pegadas” se

mostram no

texto?

Bakhtin,

no

seu estudo sobre a linguagem,

também

afinna

que “o melhor sistema para esclarecer

um

fenômeno

é observa-lo

em

seu processo de formação e desenvolvimento”

(apud

Freitas, 1997, p.315).

Mas

o

estudo

do

desenvolvimento não

significa que se

analisá-lo de maneira linear, evolutiva, fragmentada. Seu desenvolvimento é causado por elementos contraditórios que coexistem na totalidade

do

fenômeno.

Em

face desta

compreensão

Bakhtin,

em

sua concepção dialógica de linguagem, coloca

em

diálogo simultâneo e interdependente: falante e ouvinte, eu e outro, linguagem e consciência, passado e presente, ideologia

do

cotidiano e ideologia

dominante.

Também

Vygotsky

assim procede

quando

estuda pensamento e linguagem, aprendizagem e desenvolvimento, plano interpessoal e plano intrapessoal, forma e conteúdo (Freitas, 1997).

Os

pressupostos

do

materialismo histórico

fundamentam

também

as proposições de

Thompson

sobre o

método

histórico de investigação.

Na

sua obra

A

miséria

da

teoria

ou

um

planetário de erros (1981) encontramos importantes contribuições de

ordem

teórica sobre o método. Nele, o autor,

“em

defesa

do

materialismo histórico”, discute algumas proposições para compreender a lógica de investigação

adequada

aos

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