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Proposta de instrumento para a avaliação fonológica da Língua Brasileira de Sinais: FONOLIBRAS

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(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

INSTITUTO DE LETRAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA

ROBERTO CÉSAR REIS DA COSTA

Proposta de Instrumento para a Avaliação Fonológica da Língua

Brasileira de Sinais: FONOLIBRAS

Salvador 2012

(2)

ROBERTO CÉSAR REIS DA COSTA

Proposta de Instrumento para a Avaliação Fonológica da Língua

Brasileira de Sinais: FONOLIBRAS

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Língua e Cultura da Universidade Federal da Bahia – UFBA, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Letras.

Orientadora: Profa. Dra. Elizabeth Reis Teixeira.

Salvador 2012

(3)

Sistema de Bibliotecas da UFBA

   

           

Costa, Roberto César Reis da.

Proposta de instrumento para a avaliação fonológica da língua brasileira de sinais : FONOLIBRAS / Roberto César Reis da Costa. - 2013.

231 f.: il.

Inclui apêndices e anexos.

Orientadora: Profª. Drª. Elizabeth Reis Teixeira.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Instituto de Letras, Salvador, 2012.

1. Língua de sinais. 2. Língua brasileira de sinais. 3. Linguagem e línguas - Avaliação. 4. Fonologia. I. Teixeira, Elizabeth Reis. II. Universidade Federal da Bahia. Instituto de Letras. III. Título.   CDD - 419 CDU - 81’221.24                                                                                                                                                                                                                          

(4)

Dedico este trabalho aos meus pais: Roberto de Jesus da Costa e Sônia Reis da Costa, meus mestres eméritos.

(5)

AGRADECIMENTOS

Agradeço, ubiquamente, a DEUS, o Autor da Vida, que tem me norteado em todas as etapas da

minha vida. A Ele tão-somente seja dada toda honra e toda glória para todo sempre.

Agradeço, profundamente, à minha orientadora, PROFA.DRA.ELIZABETH REIS TEIXEIRA, que

com suas experiências, parcimônia e presença me auxiliou no sentido da materialização desta Dissertação e, consequentemente, legou-me os princípios das teorias fonológicas que contribuíram, de maneira significativa, para a conclusão deste trabalho.

Agradeço, intimamente, à minha eterna amada, SHEILA BATISTA MAIA SANTOS, que, depois

de Jesus Cristo, tem sido a minha redentora, instruindo-me a não desistir facilmente e acreditar que a vida continua após os “tsunamis” momentâneos.

Agradeço, peremptoriamente, ao SURF, minha nova prática desportiva, que me salvou da

depressão, da impotência e da desesperança num momento crucial da minha vida. Nesse esporte, tenho descoberto que devemos buscar sempre um ponto de equilíbrio na vida e, além disso, a não deixar que o medo e falta de coragem nos desestimulem a enfrentar os gigantes que podem, casualmente, surgir para impedir ou conflitar a nossa caminhada.

Agradeço, especialmente, aos MEUS FAMILIARES E DEMAIS IRMÃOS EM CRISTO JESUS, que tem

me auxiliado a entender que as vicissitudes da vida funcionam como um estopim para o crescimento pessoal, espiritual e profissional.

Agradeço, intensamente, a todos os professores MESTRES E DOUTORES DO PROGRAMA DE

PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA DA UFBA, e, em especial, PROFA.DRA.EDLEISE

MENDES, PROFA. DR. ELIZABETE RAMOS, PROFA. DRA. LÍCIA HEINE, e PROF. DR. SÁVIO

SIQUEIRA, que me auxiliaram na reflexão dos aspectos teóricos e metodológicos que

culminaram na concretização desta Dissertação.

Agradeço, densamente, a minha ilustre mestra, PROFA.DRA.DESIRÉE DE VIT BEGROW, por

ter me legado os princípios da terapêutica fonoaudiológica numa vertente bilíngue. Agradeço-a, aindAgradeço-a, por ter sido o modelo de uma prática fonoaudiológica reflexiva.

Agradeço, principalmente, a todos os AMIGOS SURDOS, que foram os autênticos mestres para o

aprendizado da Língua Brasileira de Sinais, bem como para o entendimento do que está subjacente à cultura Surda e à Língua de Sinais. Que essa Dissertação possa fazer com que todos compreendam que a Língua de Sinais deve ser reconhecida, além do ponto de vista legal, como uma língua verdadeiramente rica, que representa o meio pelo qual os Surdos podem manifestar o seu pensamento e a sua forma de depreender a realidade.

Agradeço, especialmente, ao colega-pesquisador-professor, OMAR AZEVEDO BARBOSA, que

contribuiu de maneira significativa para a prática da pesquisa científica.

Aos COLEGAS DO CURSO DO MESTRADO EM LETRAS, serei eternamente agradecido pelos

momentos de companheirismo e profundas reflexões linguísticas. De fato, todos os momentos compartilhados foram de extrema relevância para o meu crescimento intelectual.

(6)

Aos COLEGAS DO CESS (Centro Educacional Sons no Silêncio), agradeço por terem me

ajudado a compreender que a teoria e a prática podem ser interdependentes. Afinal, devemos ter em vista que o nosso maior desafio sempre será praticar a teoria e teorizar a prática, a fim de se buscar, constantemente, um ponto de equilíbrio entre ambas.

Aos AMIGOS TRADUTORES-INTÉRPRETES DE LIBRAS, agradeço por terem me ensinado os

“sinais” de uma prática tradutória/interpretativa profissional. Com estes, tenho aprendido, a cada dia, que a interpretação não está acabada, mas ela se reconstrói à medida que nos despojamos do velho modo de interpretar e nos revestimos dos novos “sinais”.

Aos DEMAIS AMIGOS que, além de me auxiliarem na coleta de dados dessa pesquisa, sempre

me deram a força necessária para continuar, apesar das dificuldades e obstáculos.

Enfim, agradeço a todos aqueles que, silenciosa ou anonimamente, têm contribuído, de alguma maneira, para o meu crescimento pessoal ou profissional.

OBRIGADO A TODOS!

Obrigado a todos!

Obrigado a todos!

(7)

RESUMO

Essa Dissertação teve o objetivo principal de propor um instrumento para a avaliação fonológica da Língua Brasileira de Sinais (Libras). Adotou-se, como referencial teórico, o modelo prosódico aplicado à língua de sinais (BRENTARI, 1998), apesar de alguns modelos de análise fonológica para as línguas de sinais terem sido sucintamente apresentados. Baseando-se numa perspectiva qualitativa de análise, buscou-se, nos casos estudados, o escrutínio dos processos fonológicos prevalentes em crianças surdas em fase de aquisição da Libras como primeira língua. Participaram desse estudos 4 (quatro) crianças surdas, filhas de pais ouvintes, com faixa etária entre 6 (seis) e 12 (doze) anos, residentes da região metropolitana de Salvador/Bahia. O instrumento elaborado denominado “Proposta de Avaliação Fonológica da Língua Brasileira de Sinais – FONOLIBRAS” contém 50 (cinquenta) figuras, distribuídas nas categorias de: (1) animais; (2) brinquedos; (3) cores; (4) elementos da natureza; (5) frutas; (6) objetos familiares; (7) partes do corpo; (8) pessoas; (9) verbos (ação); e, (10) vestimentas. Esse instrumento utiliza-se da escrita da língua de sinais (SW) para transcrição dos dados. O FONOLIBRAS pontua os sinais eliciados da seguinte maneira: 0 – sinal não eliciado ou sinal “caseiro”; 1 – sinal diferente do esperado, mas pertencente ao mesmo campo semântico da imagem apresentada; 2 – sinal eliciado conforme o esperado, com ou sem processo(s) fonológico(s). Os processos fonológicos encontrados na Libras foram: a assimilação, a elisão, a epêntese e a metátese. Enfim, pôde-se constatar que alguns desafios perseveram no campo da fonologia das línguas de sinais: inventariar todas as possibilidades articulatórias para o parâmetro configuração de mão, a fim de se criar um alfabeto “fonético” para as línguas de sinais; e, consequentemente, convencionar a transcrição fonológica das línguas de sinais. Permanece, também, o desafio de se averiguar e distinguir os processos fonológicos quanto à normalidade e à atipia.

Palavras-chave: Libras (Língua Brasileira de Sinais). Língua de Sinais. Avaliação da linguagem. Fonologia. Processos fonológicos.

(8)

ABSTRACT

This work aims at proposing an instrument for the assessment of Brazilian Sign Language (Libras) phonology. The theoretical approach concerning “A prosodic model of sign language phonology” (BRENTARI, 1998) was adopted, although some models of phonological analysis applied to sign languages were briefly presented. Based on a qualitative approach, we sought through case studies the scrutiny of prevalent phonological processes in deaf children who are undergoing the process of acquiring in Libras as first language. Four (4) deaf individuals, children of hearing parents, ages from six (6) to 12 (twelve) years old, and residents in the metropolitan region of Salvador/Bahia participated in the study. The instrument developed, called "Proposal of Phonological Assessment of Brazilian Sign Language – FONOLIBRAS" contains 50 (fifty) stimulus pictures, distributed in the following categories: (1) animals, (2) toys, (3) colors, (4) elements of nature, (5) fruits, (6) familiar objects, (7) body parts, (8) people, (9) verbs (action), and (10) clothing. SignWriting (SW) was used as a methodology for data transcription. The FONOLIBRAS scores data elicited taking into account the following: 0 – no signal elicited or “homemade” signals, 1 – sign elicited was different from the expected, but the output belongs to the same semantic field of the displayed image; 2 – sign was elicited as expected, with or without simplifying phonological process(es). Phonological processes observed in Libras were: assimilation, elision, epenthesis and metathesis. Finally, it was noted that some challenges persevere in the field of sign language phonology: an articulatory inventory for all the possibilities concerning the handshape parameter is needed, in order to create a "phonetic" alphabet for sign languages, and, therefore, to make possible establishing a convention for the phonological transcription of sign languages. Nonetheless, the challenge of ascertaining and discriminating phonological processes in terms of normality and atypicality still remains

Keywords: Libras (Brazilian Sign Language). Sign Language. Language assessment. Phonology. Phonological processes.

(9)

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Sinal de CASA 20

Figura 2 Diferenças entre as Línguas Orais e as Línguas de Sinais 22

Figura 3 Sinal AMAR (GAMA, 1975) 25

Figura 4 Sinal AMAR (CAPOVILLA e RAPHAEL, 2001) 25

Figura 5 Sinal CAFÉ (GAMA, 1975) 25

Figura 6 Sinal CAFÉ (CAPOVILLA e RAPHAEL, 2001) 25

Figura 7 Sinal COPO (GAMA, 1975) 25

Figura 8 Sinal COPO (CAPOVILLA e RAPHAEL, 2001) 25

Figura 9 Sinal DIA (GAMA, 1975) 25

Figura 10 Sinal DIA (CAPOVILLA e RAPHAEL, 2001) 25

Figura 11 Sinal DIZER (GAMA, 1975) 25

Figura 12 Sinal DIZER (CAPOVILLA e RAPHAEL, 2001) 25

Figura 13 Sinal GORD@ (GAMA, 1975) 25

Figura 14 Sinal GORD@ (CAPOVILLA e RAPHAEL, 2001) 25

Figura 15 Sinal INTELIGENTE (GAMA, 1975) 26

Figura 16 Sinal INTELIGENTE (CAPOVILLA e RAPHAEL, 2001) 26

Figura 17 Sinal IR (GAMA, 1975) 26

Figura 18 Sinal IR (CAPOVILLA e RAPHAEL, 2001) 26

Figura 19 Sinal LEITE (GAMA, 1975) 26

Figura 20 Sinal LEITE (CAPOVILLA e RAPHAEL, 2001) 26

Figura 21 Sinal MAGR@ (GAMA, 1975) 26

Figura 22 Sinal MAGR@ (CAPOVILLA e RAPHAEL, 2001) 26

Figura 23 Sinal OBEDIENTE (GAMA, 1975) 26

Figura 24 Sinal OBEDIENTE (CAPOVILLA e RAPHAEL, 2001) 26

Figura 25 Sinal PROFESSOR (GAMA, 1975) 26

Figura 26 Sinal PROFESSOR (CAPOVILLA e RAPHAEL, 2001) 26

Figura 27 Sinal LARANJA/SÁBADO 40

Figura 28 Sinal ESTUDANTE em diferentes Línguas de Sinais 41

Figura 29 Quadro de Configurações de Mão da Libras (FERREIRA-BRITO, 1995) 42 Figura 30 CM inventariada pelo Grupo de Pesquisa da FENEIS 43

Figura 31 CM da Libras inventariada por Pimenta 44

Figura 32 Espaço de enunciação na Língua de Sinais 48

Figura 33 Locações segundo o Modelo de Stokoe 48

Figura 34 Pontos de articulação ancorados no corpo 50

Figura 35 Sinal GASTAR-CONSTANTEMENTE 51

Figura 36 Orientação da palma (Or) 53

Figura 37 Processo morfológico no sinal AJUDAR 54

Figura 38 Sinal SEXO (ato sexual) 55

Figura 39 Sinal MAGRO 55

Figura 40 Símbolos desenvolvidos por Stokoe para notação dos sinais da ASL 59 Figura 41 Exemplos de possíveis estruturas dos sinais no Modelo MH 62 Figura 42 Árvore da Configuração de Mão (HC – Hand Configuration) 64

Figura 43 Árvore da Locação (X – Location) 64

Figura 44 Modelo moraico representando os sinais DANCE, FALSE e GERMANY 65

Figura 45 Representação de sinais com 1-mão no Modelo FD 67

Figura 46 Esquematização dos cubos no Modelo da FV 68

Figura 47 Representação de FALSE no Modelo da FV 69

(10)

Figura 49 Sinal ‘SIT’ 72

Figura 50 Sinal ‘THROW’ 72

Figura 51 Sinal ‘SINCE’ 76

Figura 52 Sinal ‘REMEMBER’ 76

Figura 53 Sinal ‘TOUCH’ 76

Figura 54 Sinal monomórfico agramatical 76

Figura 55 Alfabeto manual da ASL 78

Figura 56 Alfabeto manual da Libras 79

Figura 57 Processo de nominalização 80

Figura 58 Sinal ‘DRIVE-TO’ 82

Figura 59 Sinal ‘HELP’ 82

Figura 60 Sinal ‘REQUEST’ 82

Figura 61 Uma forma polimórfica na ASL 84

Figura 62 A visão dos parâmetros no MP 88

Figura 63 Sinal ‘HAPPEN’ 90

Figura 64 Sinal ‘HAPPEN’ com elisão fraca 90

Figura 65 Sinal ‘ANALYZE’ 90

Figura 66 Sinal ‘ANALYZE’ com elisão fraca 90

Figura 67 Sinal ‘OPEN’ 91

Figura 68 Sinal ‘OPEN’ com elisão fraca 91

Figura 69 Sinal ‘QUIET’ 92

Figura 70 Input e outputs do sinal ‘QUIET’ 93

Figura 71 Forma dissilábica do sinal relativo ao pronome WE (nós) 95 Figura 72 Os planos de articulação contrastivos (x, y e z) 110 Figura 73 Superfície de realização dos traços de trajetória 116 Figura 74 Processo fonológico de epêntese (LIDDELL; JOHNSON, 1989) 163 Figura 75 Processo fonológico de elisão (LIDDELL; JOHNSON, 1989) 163 Figura 76 Processo fonológico de metátese (LIDDELL; JOHNSON, 1989) 164 Figura 77 Processo fonológico de assimilação (LIDDELL; JOHNSON, 1989) 165 Figura 78 Movimentos de extensão ou flexão, vertical ou horizontal 226

Figura 79 Movimentos de abdução ou adução 226

(11)

LISTA DE QUADROS E GRÁFICO

Quadro 1 Variações diacrônicas dos sinais na Língua Brasileira de Sinais 26 Quadro 2 Distribuição das CM segundo Faria-Nascimento (2009) 46 Quadro 3 Possíveis casos de alofonia entre as CM da Libras 46 Quadro 4 Pontos de Articulação segundo Brito e Langevin (1995) 49 Quadro 5 Classificação dos movimentos segundo Ferreira-Brito (1995) 51 Quadro 6 Alguns conceitos de processos fonológicos (LAMPRECHT, 2009) 56 Quadro 7 Diferentes classificações para os processos fonológicos 57 Quadro 8 Representação do sinal ‘WEEK’ (SEMANA) no modelo fonológico MH 61

Quadro 9 Estrutura dos sinais no Modelo MH 62

Quadro 10 Exemplos dos Sinais Tipos 1, 2 e 3, segundo Battison (1978) 76

Quadro 11 Distribuição dos gerúndios na ASL 81

Quadro 12 Exemplos das categorias de aspecto distribucional e temporal na ASL 83 Quadro 13 Definições de Traços Inerentes (TI) e Traços Prosódicos (TP) 86

Quadro 14 Formas dissilábicas com mudança espacial 94

Quadro 15 Exemplos de restrições que se referem à sílaba 97

Quadro 16 A estrutura do ramo Articulador (A) 100

Quadro 17 Argumentos a favor da M1 como núcleo 101

Quadro 18 Estrutura das sete juntas contrastivas na ASL 102

Quadro 19 Possibilidades de combinações para dedos selecionados 104 Quadro 20 Estruturas que permitem o movimento independente do polegar 105 Quadro 21 Especificidades da representação do polegar no MP 106

Quadro 22 A estrutura do ramo Ponto de Articulação (POA) 107

Quadro 23 Planos de articulação do sinal no espaço neutro 108

Quadro 24 Principais locais de oposição quanto ao POA 109

Quadro 25 Diferentes visões em relação ao parâmetro M 112

Quadro 26 A estrutura dos traços prosódicos (TP) 113

Quadro 27 Definição de sonoridade nas línguas faladas e nas línguas de sinais 119

Quadro 28 O que avaliar? 128

Quadro 29 Ilustrações para coleta de dados do FONOLIBRAS 137

Quadro 30 Inventário das CM do FONOLIBRAS por agrupamento 140

Quadro 31 Perfil dos sujeitos 141

Quadro 32 Desempenho dos sujeitos com base nos critérios de pontuação 142

Quadro 33 Transcrições Fonológicas de André (S1) 147

Quadro 34 Transcrições Fonológicas de Wilson (S2) 152

Quadro 35 Transcrições Fonológicas de Pedro (S3) 156

Quadro 36 Transcrições Fonológicas de Tiago (S4) 161

Quadro 37 Processo de assimilação dos traços da M1 168

Quadro 38 Processo de elisão da M2 concomitante ao apagamento do M 168

Quadro 39 Processo de elisão da M2 169

Quadro 40 Representação do sinal ‘ÁRVORE’ com e sem processo de elisão 170 Quadro 41 Processo de epêntese da M2 por assimilação dos traços da M1 171 Quadro 42 Representação do sinal ‘VACA’ conforme o padrão adulto 171

Quadro 43 Processo de metátese 172

(12)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ASL American Sign Language (Língua de Sinais Americana) CM Configuração(ões) da mão(s)

ELiS Escrita da Língua de Sinais (proposta por Mariângela Estelita) ENM Expressões não-manuais

FD Fonologia da Dependência

FENEIS Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos

FV Fonologia Visual

H1 O mesmo que M1 (do inglês Dominant Hand) H2 O mesmo que M2 (do inglês Non-dominant Hand)

HC Hand Configuration ou Configuração da mão

IALS Instrumento de Avaliação da Língua de Sinais

IF Inherent Feature ou Traço Inerente

INES Instituto Nacional de Educação de Surdos

IP Prosodic Feature ou Traço Prosódico

IPA International Phonetic Alphabet

L Locação ou PA

L1 Primeira Língua

L2 Segunda Língua

LGP Língua Gestual Portuguesa Libras Língua Brasileira de Sinais

LM Língua Materna

LP Língua Portuguesa

LS Língua(s) de Sinais

LSB O mesmo que Libras

LSF Língua de Sinais Francesa

M Movimento(s)

M1 Mão dominante ou ativa M2 Mão não-dominante ou passiva

MD Mão Direita ME Mão Esquerda MP Modelo Prosódico OD Orelha Direita OE Orelha Esquerda Or Orientação(ões) da mão/palma

OT Optimality Theory ou Teoria da Otimidade

PA Ponto de articulação ou L

POA Place of articulation (ponto de articulação) SSFPS Sujeito(s) Surdo(s) filhos(as) de pais surdos SSFPO Sujeito(s) Surdo(s) filhos(as) de pais ouvintes

SW SignWriting ou escrita da língua de sinais (proposta por Valerie Sutton) TI Traço(s) Inerente(s)

TM Trilled movement(s) ou movimento(s) vibrante(s) TP Traço(s) Prosódico(s)

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SUMÁRIO

PREÂMBULO 14

1 FONOLOGIA DA LÍNGUA DE SINAIS 30

1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS 30

1.2 HISTÓRICO DOS ESTUDOS EM FONOLOGIA DAS LÍNGUAS DE SINAIS 34 1.3 A ESTRUTURA FONOLÓGICA NAS LÍNGUAS VISO-GESTUAIS 39

1.3.1 O Sinal 39

1.3.1.1 Configuração de mão (CM) 41

1.3.1.2 Locação (L) 47

1.3.1.3 Movimento (M) 50

1.3.1.4 Orientação (Or) 52

1.3.1.5 Expressões Não-Manuais (ENM) 54

1.4 VISÃO GERAL SOBRE OS PROCESSOS FONOLÓGICOS 56

1.5 MODELOS FONOLÓGICOS DAS PESQUISAS EM LÍNGUAS DE SINAIS 56

1.5.1 Modelo Quirêmico 58

1.5.2 Modelo MH - “Movement-Hold” 60

1.5.3 Modelo HT - “Hand Tier” 63

1.5.4 Modelo Moraico 65

1.5.5 Modelo da Fonologia de Dependência 66

1.5.6 Modelo da Fonologia Visual 68

1.6 DESAFIOS FUTUROS 69

2 MODELO PROSÓDICO DA FONOLOGIA DA LÍNGUA DE SINAIS 70

2.1 INTRODUÇÃO ÀS ESTRUTURAS DOS SINAIS 71

2.1.1 Formas monomórficas: sinais simples com 1 mão 72

2.1.2 Formas monomórficas: sinais com 2 mãos 75

2.1.3 Formas monomórficas: datilologia e sinais lexicalizados 77

2.1.4 Formas polimórficas: formas nominais dos verbos 80

2.1.4.1 Nomes reduplicados 80

2.1.4.2 Gerúndios (activity nouns) 81

2.1.5 Formas polimórficas: formas de concordância 82

2.1.6 Formas polimórficas: sinais compostos 83

2.1.7 Formas polimórficas: derivados com afixos gramaticais 83

2.1.8 Formas polimórficas: classificadores predicativos 84

2.2 VISÃO GERAL DO MODELO PROSÓDICO 85

2.3 O PAPEL DAS TEORIAS FONOLÓGICAS NO MODELO PROSÓDICO 88

2.4 OS TRAÇOS INERENTES E PROSÓDICOS 98

2.4.1 A estrutura dos traços inerentes 99

2.4.1.1 A estrutura do ramo Articulador (A) 100

2.4.1.2 A estrutura do ramo Ponto de Articulação (POA) 106

2.4.1.3 A parâmetro Or e seu papel no MP 110

2.4.1.4 Os traços não-terminais 111

2.4.2 A estrutura dos traços prosódicos 112

2.5 CONTRIBUIÇÕES DO MODELO PROSÓDICO APLICADO AOS SINAIS 118

3 DELIMITAÇÃO DO ESTADO DA ARTE 120

3.1 DO DELINEAMENTO DO ESTUDO 120

(14)

3.3 DOS PROCEDIMENTOS DE COLETA E TRANSCRIÇÃO DOS DADOS 121

3.4 DA ANÁLISE DOS DADOS 124

3.5 DA LIMITAÇÃO METODOLÓGICA 125

4 AVALIAÇÃO FONOLÓGICA DA LIBRAS: FONOLIBRAS 126

4.1 O QUE, POR QUE E PARA QUÊ AVALIAR? 126

4.2 O INVENTÁRIO PARA ANÁLISE FONOLÓGICA DA LIBRAS (FONOLIBRAS) 130 4.3 COMO FOI CONSTITUÍDO E UTILIZADO O FONOLIBRAS 131

4.3.1 1º Passo: coleta dos dados 131

4.3.2 2º Passo: transcrição dos dados coletados 137

4.3.3 3º Passo: Análise dos dados a partir das transcrições fonológicas 138

4.4 INTERPRETANDO ALGUNS RESULTADOS 141

4.5 RECONHECENDO OS PROCESSOS FONOLÓGICOS DA LIBRAS 162

4.5.1 Os processos fonológicos e as línguas de sinais 162

4.5.2 Os processos fonológicos na língua brasileira de sinais 167

4.5.2.1 Assimilação 167

4.5.2.2 Elisão 168

4.5.2.3 Epêntese 170

4.5.2.4 Metátese 172

4.6 NOTAS FINAIS 172

5 À GUISA DA CONCLUSÃO: AS CONSIDERAÇÕES TRANSITÓRIAS 174

REFERÊNCIAS 177

Apêndice A – Carta de Anuência 191

Apêndice B – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 192

Apêndice C – Anamnese 193

Apêndice D – Endereço eletrônico das imagens utilizadas no FONOLIBRAS 195 Apêndice E – Quadro para Anotação/Transcrição de Dados (FONOLIBRAS) 197 Apêndice F – Glossário para os sinais da Língua Brasileira de Sinais 201 Apêndice G – Glossário para os sinais da Língua Americana de Sinais 207

Anexo A – Classificação dos TI e dos TP (BRENTARI, 1998) 224

Anexo B – Tipos de movimentos e as juntas de execução 226

(15)

PREÂMBULO

Seria incongruente antecipar a tese “Proposta de Instrumento para a Avaliação Fonológica da Língua Brasileira de Sinais: FONOLIBRAS” sem antes prefaciar sobre os aspectos linguísticos das línguas de sinais. Nessa perspectiva, escrevo esse exórdio com o intuito de discorrer, de maneira sucinta, a respeito do status linguístico das Línguas de Sinais, salientando-se, sobretudo, as especificidades linguísticas da Língua Brasileira de Sinais que têm sido constatadas a partir dos estudos realizados por diversos pesquisadores. Os pesquisadores das línguas de sinais costumam conclamar que: “se a linguística é uma ciência jovem (ou, alguns diriam, imatura), a linguística das línguas de sinais acabou de nascer” (CRASBORN; van der HULST; van de KOOIJ, 2000, p. 1, tradução nossa).1 Até o final da década de 1950, os estudos formais no âmbito da linguística não tomavam como objeto de estudo as línguas de sinais. Nessa perspectiva, Sacks (2010) destaca que:

Nenhum linguista, nenhum cientista deu atenção à língua de sinais até fins da década de 1950, quando William Stokoe, jovem medialista e linguista, encontrou seu caminho para o Gallaudet College. Stokoe pensava ter ido para ensinar Chaucer aos surdos, mas logo se deu conta de que havia caído, por sorte ou por acaso, num dos meios linguísticos mais extraordinários do mundo. A língua de sinais, naquela época, não era considerada uma língua propriamente dita, mas uma espécie de pantomima ou código gestual, ou talvez uma espécie de inglês estropiado expresso com as mãos. A genialidade de Stokoe foi perceber, e provar, que não era nada daquilo; que ela satisfazia todos os critérios linguísticos de uma língua genuína, no léxico e na sintaxe, na capacidade de gerar um número infinito de proposições (SACKS, 2010, p. 70).

No Brasil, o reconhecimento legal da Língua Brasileira de Sinais somente se deu com a promulgação da Lei nº 10.436 em 24 de abril de 2002, que é popularmente denominada “a lei da Libras”. De acordo com essa lei, no parágrafo único do artigo 1º, compreende-se que a Língua Brasileira de Sinais2 é:

[...] a forma de comunicação e expressão, em que o sistema lingüístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um                                                                                                                

1 Texto de partida: “If linguistics is a young (and, some would say, immature) discipline, then sign linguistics

has just been born.”

2 A língua brasileira de sinais ou língua de sinais brasileira pode ser denominada Libras ou LSB,

respectivamente. Nessa dissertação, optaremos pelo uso da sigla Libras, exceto quando fizermos citação direta de outras obras, nas quais tenha sido utilizada a sigla LSB. Há ainda uma outra denominação: LSCB (Língua de Sinais dos Centros Urbanos Brasileiros) (cf. BRITO, 1995). Esse último termo foi utilizado por essa pesquisadora, a fim de que houvesse a distinção em relação à língua de sinais utilizada pelos índios Urubu-Kaapor.

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sistema lingüístico de transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil (BRASIL, 2002).

A sanção da lei supramencionada não foi capaz de dar conta das principais problemáticas vivenciadas pelas pessoas surdas,3 principalmente no tocante à eliminação das barreiras comunicativas e à garantia da acessibilidade aos serviços públicos/privados de educação e saúde. Com a “pressão” das comunidades surdas brasileiras, bem como das instituições que visam a garantia dos direitos dos surdos, em 25 de dezembro de 2005, houve a regulamentação da Lei nº 10.436/2002 por intermédio do Decreto nº 5.626. A partir daí, alguns avanços significativos têm ocorrido: admissão do tradutor-intérprete para atuação nas salas de aulas e em algumas instituições públicas; inserção da disciplina Libras como componente curricular nos cursos de licenciatura, pedagogia e fonoaudiologia (nas instituições de ensino superior públicas e privadas); oferta de cursos básicos, intermediários e avançados de Libras; dentre outros.

Mais recentemente, houve a publicação da Lei nº 12.319, de 1º de setembro de 2010, que regulamenta a profissão de tradutor e intérprete de Língua Brasileira de Sinais. Visto que a Libras já é reconhecida legalmente e a profissão do tradutor-intérprete já foi regulamentada, é mister que os departamentos de letras das Instituições de Ensino Superior comecem a pensar na implantação do curso de graduação em Letras-Libras. Dessa forma, os futuros professores e/ou tradutores-intérpretes de Libras teriam a oportunidade de obter a formação mínima necessária, a fim de que pudessem atuar profissionalmente e de maneira adequada.

Todavia, a reflexão exaustiva a respeito da educação de surdos no nosso país ainda não conseguiu entrever as reais necessidades educacionais desse público. Além disso, os Surdos não têm sido convocados, na maioria das vezes, aos espaços de discussão das políticas públicas de acesso e de inclusão. O ponto mais emblemático disso tudo é que se tem suprimido as questões mais relevantes – importância da língua de sinais e barreira comunicativa/linguística – do bojo dessas discussões. É nessa perspectiva que se necessitaria considerar que

[...] a adoção da língua de sinais na educação de surdos deve ser acompanhada de uma mudança na concepção de sujeito e língua. O surdo deve ser representado como alguém que tem as mesmas possibilidades

                                                                                                               

3 Sempre utilizaremos os termos “surdo(s)” ou “pessoa(s) surda(s)” para nos referirmos àqueles sujeitos que, por

questões identitárias e culturais, se comunicam por meio de uma língua de sinais. O termo “deficiente auditivo” não nos é bem-vindo, uma vez que coloca em evidência o déficit ou converte o sujeito num ser patológico. “Como a comunidade surda brasileira tem manifestado, em vários eventos científicos, seu repúdio ao termo “deficiente auditivo”, pela conotação de “incapacidade” que o mesmo embute, resolveu-se, em respeito a eles, utilizar-se o termo surdo ao nos referirmos aos sujeitos que são portadores de uma perda de audição” (CÁRNIO; COUTO; LICHTIG, 2000, p. 45).

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de adquirir uma língua [...] é a Língua de Sinais uma língua visual-gestual, a que vai possibilitar que indivíduos surdos sejam inseridos no funcionamento lingüístico-discursivo da língua e possam se constituir como autores de seu dizer e não como meros repetidores de padrões lingüísticos aprendidos (PEREIRA, 2000, p. 20, grifos nossos).

No Brasil, além da Libras, verificou-se a existência de uma outra língua de sinais utilizada entre os índios Kaapor, que habitam a floresta amazônica. Os índios Urubu-Kaapor utilizam a Língua dos Sinais Urubu-Kaapor Brasileira (LSKB). Essa língua, que foi pesquisada por Ferreira-Brito (1995[2010]), não possui relação estrutural ou lexical com a Língua Brasileira de Sinais, já que não existe o contato entre ambas.

O sinais temporais da LSKB, por sua vez, apresentam uma estrutura diferente da estrutura encontrada para os sinais espaciais desta mesma língua, que, consequentemente, é diferente também da estrutura temporal da LIBRAS e da ASL. Os dados da LSKB parecem levar à conclusão de que os sinais temporais são especificidades da cultura, em oposição aos sinais espaciais, os quais são fortemente restringidos pela modalidade da língua e/ou por traços universais (FERREIRA-BRITO, 2010, p. 247-248).

Ultimamente, tem-se acirrado a discussão em torno do estatuto linguístico das Línguas de Sinais, as quais são utilizadas pelas comunidades Surdas. Do ponto de vista histórico, tinha-se uma ideia a respeito dos surdos que se baseava apenas em aspectos negativos. Esses aspectos negativos refletiam-se na concepção que as pessoas tinham em relação à língua de sinais. Na antiguidade, os surdos eram vistos de diversas formas: como pessoas dignas de piedade e compaixão, como pessoas castigadas pelos deuses, como pessoas enfeitiçadas; sendo, por essas razões, abandonados ou sacrificados. Desta forma, as pessoas surdas estavam fadadas ao isolamento e a ideia da impossibilidade de educá-las perdurou até o século XV, pois, até esse instante, acreditava-se que o surdo – visto como deficiente ou retardado – era uma pessoa primitiva, que vivia completamente à margem da sociedade e a quem nenhum direito deveria ser assegurado (LANE, 1984; MOURA, 2000; GOLDFELD, 2002; LANG, 2003).

Ora, apesar das pesquisas e do reconhecimento legal da Libras no Brasil, percebe-se que preconceitos e mitos ainda permeiam o discurso de muitas pessoas, inclusive o daquelas que possuem formação ou carreira acadêmica. Em virtude desses preconceitos que, na maioria das vezes, estão relacionados ao pré-conceito ou à ignorância linguística, muitas pessoas chamam a língua de sinais de “linguagem de sinais” ou “linguagem dos surdos-mudos”. Todavia, não se deve perder de vista que

Ao se atribuir às línguas de sinais o status de língua é porque elas, embora sendo de modalidade diferente, possuem também estas características em relação às diferenças regionais, sócio-culturais, entre outras, e em relação às

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suas estruturas porque elas também são compostas pelos níveis [...] [fonológico, morfológico, sintático, semântico-pragmático e discursivo] (FELIPE; MONTEIRO, 2008, p. 21).

Em relação à questão de se denominar linguagem, é relevante esclarecer que as línguas de sinais são línguas autônomas, já que cada uma delas organiza os seus elementos linguísticos de maneira idiossincrática e independente das línguas orais. Resta-nos entender que a linguagem

[...] não está limitada ao trato vocal e ouvidos. Existem também sistemas de comunicação simbólica, transmitida de uma geração de pessoas surdas para a outra, que se têm tornado em línguas autônomas não derivadas de línguas faladas. Essas línguas viso-gestuais dos surdos, com raízes profundas na modalidade visual, proporcionam um campo de testes para explicações em relação a: como o cérebro está organizado para a linguagem, como o cérebro passou a ser tão organizado, e como essa organização é modificável (POIZNER; KLIMA; BELLUGI, 1990, p. 1, tradução nossa).4

Quanto ao termo “surdo-mudo”, é bem provável que essa tenha sido a mais antiga denominação atribuída ao sujeito surdo, já que se tinha a ideia que o surdo por não poder falar era, consequentemente, mudo. Mas, ele é inadequado, tendo-se em vista que o fato de uma pessoa ser surda (possuir impedimento auditivo de grau severo a profundo) não determinará que esta mesma seja muda. Em geral, o mutismo é decorrente ou de transtornos do sistema nervoso central que afetam a capacidade de falar ou de distúrbios psicológicos, não estando, por conseguinte, cabalmente relacionado à surdez. Nos séculos passados, era comum o uso desse termo mesmo nas publicações didáticas e/ou acadêmicas, conforme pode-se testemunhar em Gama (1875) 5 e em Ramos (1906). Até em obra de um grande filósofo (FOUCAULT, 1978), encontra-se a utilização do termo “surdo-mudo” (sourd-muet), embora o seu objetivo não tenha sido reflexionar acerca do sujeito que está privado do sentido da audição. Atualmente, ainda é comum se observar a utilização, ainda que seja inadequada, dos termos “surdo-mudo” e “linguagem de sinais” na literatura de uma forma geral e sobretudo nos meios de comunicação (televisão, rádio, jornais, dentre outros). Logo, percebe-se que o                                                                                                                

4 Texto de partida: “Language, however, is not limited to the vocal tract and ears. There also exist systems of

symbolic communication, passed down from one generation of deaf people to the next, that have become forged into autonomous languages not derived from spoken languages. These visual-gestural languages of the deaf, with deep roots in the visual modality, provide a testing ground for competing explanations of how the brain is organized for language , how the brain came to be so organized , and how modifiable that organization is.”

5 É relevante registrar que Flausino Gama, ex-aluno do Instituto de Surdos (atual INES), publicou a primeira

obra sobre a Língua Brasileira de Sinais (cf. GAMA, 1975). Nessa obra, ele elencou os sinais utilizados pelos surdos daquela época. Não podemos afirmar convictamente o porquê da escolha pelo termo ‘surdo-mudo’. É bem provavel que, naquele tempo, não houvesse a discussão/reflexão sobre as implicações do uso de um ou outro termo para a área da Surdez.

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termo tradicionalmente utilizado prevalece ao que seria mais adequado, embora os estudos atuais advoguem o seu extermínio.

Ora, pensar que a forma de comunicação dos surdos seria simplesmente uma forma de “linguagem” recairia num dos mitos mais emblemáticos, já que reduziria a língua de sinais a uma forma de linguagem rudimentar à semelhança da “linguagem” animal.6 Tem-se verificado que as línguas de sinais são compostas de unidades mínimas distintivas que se combinam para formar os itens lexicais, os quais, por seu turno, se justapõem para estabelecer as sentenças e os enunciados. Já o modo de se comunicar presente em algumas espécies animais não poderia ser considerado uma linguagem (pensando-se na perspectiva da linguagem humana), mas um código de sinais. As características desse código embutem: fixidez de conteúdo; mensagem invariável; referência a uma única situação; o enunciado não se deixa analisar (natureza indecomponível); e a transmissão é unilateral (não há interação dialógica) (FROMKIN e RODMAN, 1993; BENVENISTE, 1995). As línguas de sinais, por sua vez, não comungam destas características citadas em relação à suposta “linguagem” animal.

Além do mito anteriormente exposto, valem-se destacar alguns outros: a língua de sinais seria um conjunto de gestos icônicos que somente é capaz de ilustrar elementos concretos; a língua de sinais seria uma representação da oralidade, i.e., os signos visuais são ancorados nos itens lexicais das línguas orais; a língua de sinais não possuiria gramática; e, a língua de sinais não seria capaz de enunciar pensamentos abstratos. Como não é o objetivo aqui esgotar a temática sobre os mitos, é relevante consultar os que foram expostos e outros que já foram relatados e contra-argumentados (cf. QUADROS e KARNOPP, 2004; GESSER, 2009). No que tange ao aspecto da veiculação de elementos abstratos, Ferreira-Brito (1993, p. 77) afirma que “as Línguas de Sinais não são menos abstratas que as orais. Tudo pode ser feito através dela: poesia, transmissão de sentimentos, reflexões filosóficas, linguísticas, lógicas. Enfim, são línguas completas e complexas como as orais.”

“Provavelmente nenhum tópico em linguística tenha sido submetido a tantas concepções equivocadas como a língua de sinais” (CRYSTAL, 2006, p. 159, tradução nossa).7 Os linguistas que têm se interessado pelas pesquisas das línguas de sinais têm

                                                                                                               

6 A “linguagem” animal aqui denominada refere-se à mesma concepção teórica previamente postulada por

BENVENISTE (1995).

7 Texto de partida: “Probably no topic in linguistics has been subjected to so many misconceptions as sign

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compreendido que o sistema linguístico dessas línguas possuem a mesma complexidade organizacional da língua falada/escrita (PINKER, 1995; CRYSTAL, 2006).

É pertinente salientar que as línguas de sinais não se baseiam na estrutura das línguas orais. Reconhecendo o estatuto linguístico das línguas de sinais, Pinker (1995) expõe que

Contrariamente aos equívocos populares, as línguas de sinais não são pantomimas e gestos, invenções de educadores, ou cifras da língua falada da comunidade circundante. Elas são encontradas onde quer que haja uma comunidade de pessoas surdas e cada uma constitui uma língua distinta, completa, que utiliza a mesma maquinaria gramatical encontrada nas línguas faladas por todo o mundo (PINKER, 1995, p. 36, tradução nossa).8

Stokoe (1960) foi o primeiro linguista a estudar formal e estruturalmente a língua de sinais, conforme será delineado mais adiante. Antes da pesquisa desse grande estudioso, os linguistas tinham a ideia de que os sinais eram meramente “gestos icônicos não-analisáveis” com pouca ou nenhuma organização interna, da mesma forma que os gestos que são utilizados juntamente com o discurso oral (WOLL, 1990; McNEILL, 1992; SCHEMBRI, 2001).

Ao discorrerem sobre o conceito de língua, Cunha, Costa e Martelotta (2009, p. 16) destacam que “o termo “língua” é normalmente definido como um sistema de signos vocais utilizado como meio de comunicação entre os membros de um grupo social ou de uma comunidade lingüística”. Esses autores, no entanto, registram em nota a seguinte ressalva:

Cabe registrar a existência da chamada língua dos sinais, utilizada pelos surdos, em que não há signos vocais, mas visuais. O sistema de comunicação dos surdos é considerado uma língua pela grande maioria dos autores, já que, embora não se constitua de sinais sonoros, apresenta as características básicas das línguas naturais (CUNHA; COSTA; MARTELOTTA, 2009, p. 29).

Mas afinal o que é uma língua?

Para nós, ela não se confunde com a linguagem; é somente uma parte determinada, essencial dela, indubitavelmente. É, ao mesmo tempo, um produto social da faculdade da linguagem e um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos. Tomada em seu todo, a linguagem é multiforme e heteróclita; o cavaleiro de diferentes domínios, ao mesmo tempo física, fisiológica e psíquica, ela pertence além disso ao domínio individual e ao domínio social; não se deixa classificar em nenhuma categoria de fatos humanos, pois não se sabe como inferir sua unidade (SAUSSURE, 2006, p. 17, grifos nossos).

                                                                                                               

8 Texto de partida: “Contrary to popular misconceptions, sign languages are not pantomimes and gestures,

inventions of educatiors, or ciphers of the spoken language of the surrounding community. They are found wherever there is a community of deaf people, and each one is a distinct, full language, using the same kinds of grammatical machinery found worldwide in spoken languages.”

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Parece que Saussure, ao delimitar as diferenças entre língua e linguagem, tinha como parâmetro de análise as línguas orais (aqui denominadas de orais-auditivas). Apesar disso, à luz das investigações das línguas de sinais, as generalizações linguísticas patenteadas pelos estudos clássicos poderão ora ser corroborados ora ser refutadas, retificadas ou repensadas.

Quanto à dicotomia língua/linguagem, conforme exorada por Ferdinand de Saussure, deve-se notar que não haverá quaisquer complicações na utilização desses termos para as línguas sinalizadas se pensarmos que: a observância do funcionamento das línguas de sinais têm demonstrado que a faculdade da linguagem está presente nos indivíduos surdos, independentemente do déficit na acuidade auditiva; a maioria dos sinais que são utilizados por esses indivíduos são convencionados ou arbitrários; e, enfim, todas as estruturas das línguas de sinais podem ser seccionadas para fins de análise linguística.

Em relação à questão da arbitrariedade do signo linguístico, defendida, outrossim, por Sausurre, há de se entender que não existe uma relação natural (motivada) entre o significante (imagem acústica) e o significado (sentido). Os signos linguísticos, por conseguinte, são constituídos ou convencionados culturalmente no âmbito de uma determinada comunidade linguística. Para exemplificar a concepção de arbitrariedade, Costa (2009) expõe que

A arbitrariedade do signo linguístico pode ser bem mais compreendida quando observamos a diversidade das línguas. Cada língua apresenta um modo particular de expressar conceitos: ninguém discute, por exemplo, se “livro” ou book se aproximam mais, ou menos, do conceito apresentado anteriormente. [...] Saussure observa ainda que o princípio da arbitrariedade do signo linguístico não implica a compreensão de que o significado dependa da livre escolha do falante. A língua [...] é social, não estando ao alcance do indivíduo nela promover mudanças (COSTA, 2009, p. 120). O conceito sausurreano de arbitrariedade do signo linguístico pode ser também aplicado à Libras. Apesar de ser uma língua viso-gestual, a maioria dos itens lexicais não está ancorada iconicamente nos seus respectivos objetos. Por exemplo, o sinal de CASA (representado na Fig. 1) parece ser icônico para a Libras, já que a imagem visual (análoga à imagem acústica, o significante) embute a ideia do formato de uma casa. Contudo, os significantes, em sua maior parte, são representados arbitrariamente.

Figura 1 – Sinal de CASA

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Conforme foi citado no início desse introito, um dos primeiros linguistas a investigar uma língua de sinais foi o norte-americano William Stokoe.9 Ele descreveu e analisou a Língua Americana de Sinais (ASL – American Sign Language), observando que a ASL deveria ser considerada uma língua natural por ser adquirida naturalmente por crianças surdas filhas de pais surdos. Ademais, ele considerou que essa língua, apesar da modalidade viso-gestual, possui a mesma complexidade das línguas orais-auditivas, bem como gramática e sintaxe autônomas. Em relação à modalidade viso-gestual, é pertinente expor que: “as línguas de sinais são denominadas gestual-visual (ou espaço-visual), pois a informação lingüística é recebida pelos olhos e produzida pelas mãos” (Fig. 2) (KARNOPP, 1999, p. 30).

As investigações acerca das semelhanças e das diferenças entre as língua de sinais e as línguas orais emergiram a partir da década de 90. Com isso, objetivou-se revisar ou enriquecer as teorias linguísticas, a fim de que os universais linguísticos até o momento instituídos fossem ratificados ou retificados. As semelhanças identificadas têm servido para atestar o estatuto linguístico das línguas de sinais, ao passo que as diferenças têm fomentado o repensar dos universais linguísticos ora estabelecidos.

Pesquisas realizadas por diferentes estudiosos no campo da linguística e/ou linguística aplicada têm evidenciado que a Língua Brasileira de Sinais é a língua natural10 dos sujeitos surdos, porquanto esta língua pode ser adquirida naturalmente por uma criança que esteja imersa num ambiente onde os sujeitos se comuniquem por essa modalidade11 de linguagem (FERNANDES, 1990; FERREIRA-BRITO, 1995; QUADROS, 1997; KARNOPP, 1999; QUADROS e KARNOPP, 2004; GESSER, 2009).

                                                                                                               

9 William Stokoe, em 1960, escreveu a obra Sign language structure (estrutura da língua de sinais). Em 1978,

publicou-se a segunda edição dessa obra, na qual foram revistos alguns conceitos e termos, conforme será visto em capítulo ulterior.

10 A fim de se esclarecer o conceito de língua natural que iremos utilizar, considere-se que: a língua natural “é

toda aquela que é adquirida naturalmente, sem necessidade de instrução ou intervenção formal e sistemática, mas através apenas da exposição do indivíduo a um meio linguístico específico (ou mais de um, no caso das situações de bilinguismo)” (TEIXEIRA, 1995, p. 1, grifos do autor).

11 Apesar de ter explicado de maneira sucinta anterioremente, é preciso esclarecer que, classicamente, as

modalidades de linguagem têm sido classificadas em: modalidade oral e modalidade escrita. A partir do instante em que as línguas de sinais entraram na arena das investigações linguísticas, constatou-se a importância de se delimitar uma outra modalidade de linguagem: a modalidade viso-gestual (ou visual-gestual ou espaço-visual).

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22 “Língua de sinais e língua oral apresentam semelhanças e diferenças do ponto de vista operacional, mas a comunicação em língua de sinais é tão eficaz quanto na língua oral.” ALMEIDA (2000:2). Apesar de Surdos e ouvintes terem Línguas diferentes é possível que vivam em comunidade sem tantos atritos na comunicação, desde que haja um esforço mútuo de aproximação pelo conhecimento das duas Línguas, tanto por parte dos ouvintes como dos Surdos.

No Brasil a comunicação oral-auditiva é realizada predominantemente em Língua Portuguesa e a comunicação espaço-visual em Língua de Sinais, no caso, a Língua de Sinais Brasileira, Libras. Comparativamente o esquema abaixo mostra um exemplo das principais diferenças entre as Línguas Orais e as Línguas de Sinais no processo de comunicação:

(e vice-versa)

(e vice-versa)

“Um destinador põe-se em relação comunicativa com um destinatário, construindo os elementos de um código (português, francês, etc.) uma mensagem que alude a um contexto e

COMUNICAÇÃO ORAL-AUDITIVA COMUNICAÇÃO ESPAÇO-VISUAL PESSOAS OUVINTES PESSOAS SURDAS EMISSOR

(OUVINTE) RECEPTOR (OUVINTE)

EMISSOR (SURDO)

RECEPTOR (SURDO)

O emissor transmite a mensagem pela fala (VOZ)

O receptor decodifica a mensagem através do ouvido

Canal de comunicação

Canal de comunicação

O emissor transmite a mensagem através das mãos (sinais)

O receptor decodifica a mensagem através do olhar

 

Figura 2 - Diferenças entre as Línguas Orais e as Línguas de Sinais. Fonte: TEMÓTEO, 2008, p. 18.

Segundo Quadros (1997, p. 22), “o próprio Chomsky (1995, p. 434), um lingüista que supõe o inatismo, menciona as línguas de sinais como possível expressão da capacidade natural para a linguagem.” Então, supõe-se que a faculdade de linguagem não é afetada no caso das perdas auditivas de ordem periférica. Em outros termos, diríamos que, independentemente da pessoa nascer surda ou ouvinte, a capacidade para se adquirir uma língua natural estará preservada. No caso das crianças ouvintes, a língua oral poderá ser naturalmente adquirida, ao passo que, para as crianças surdas, a língua de sinais poderá ser espontaneamente internalizada. O olhar em relação aos indivíduos surdos deve residir nas suas potencialidades e não no déficit, levando-se em consideração que

Se [...] enxergarmos o indivíduo nas suas capacidades, e não apenas no que ele não possui, como, no caso, a audição, veremos uma outra possibilidade para seu desenvolvimento. Uma delas é o canal espaço-visual para a aquisição da linguagem. Isto não como uma alternativa à falta de integridade do canal oral/auditivo, mas como uma outra modalidade de comunicação, como uma língua que utiliza os canais visuais e espacial dentro das

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possibilidades psicobiológicas humanas para a linguagem: a Língua de Sinais (OLIVEIRA, 1999, p. 80).

No que concerne aos aspectos lexicais e gramaticais, sabe-se que as línguas de sinais são dotadas de estruturas autônomas; isto quer dizer que a estrutura sentencial ou discursiva das mesmas não se ancora nas das línguas orais (QUADROS e KARNOPP, 2004; GESSER, 2009). Além disso, os aspectos formais encontrados nas diversas línguas que já foram analisadas pelos linguistas são também achados nas línguas de sinais. Nota-se que essas línguas viso-gestuais também possuem a estrutura básica dos sistemas linguísticos: a presença de sujeito, verbo e objeto na estrutura frasal. Analiticamente, tem-se percebido que os sintagmas (nominais, verbais, adjetivais, dentre outros) também estão presentes na disposição sentencial das línguas de sinais. É relevante lembrar ainda que a sintaxe das línguas de sinais é espacial (QUADROS; KARNOPP, 2004), e, por essa razão, os itens lexicais, seus respectivos referentes e a organização frasal “obedecem” à lógica espacial de colocação.

Partindo-se do pressuposto de que língua e cultura, em algum grau, são entidades indissociáveis (SAPIR, 1921; MANDELBAUM, 1949), deve-se presumir que os sujeitos surdos possuam alguns aspectos culturais distintos daqueles vistos nas pessoas ouvintes. De acordo com Lyons (1981), cultura deve ser compreendida em termos antropológicos, “sem nenhum julgamento de valor a priori quanto à qualidade estética ou intelectual da arte, literatura, das instituições etc. de determinada sociedade” (LYONS, 1981, p. 224). Pensando-se nessa acepção de cultura, pode-Pensando-se então intuir a existência da cultura surda no Pensando-sentido em que Strobel (2008) assevera:

Cultura surda é o jeito de o sujeito surdo entender o mundo e de modificá-lo a fim de se torná-lo acessível e habitável ajustando-os com as suas percepções visuais, que contribuem para a definição das identidades surdas e das “almas” das comunidades surdas. Isto significa que abrange a língua, as idéias, as crenças, os costumes e os hábitos do povo surdo (STROBEL, 2008, p. 24).

As identidades surdas, por seu turno, são instituídas dentro das representações possíveis da cultura surda. Essas identidades são modeladas de acordo com o maior ou menor receptividade cultural assumida pelo sujeito. E, ainda na esfera da receptividade cultural, emerge-se a luta política ou consciência oposicional, na qual o sujeito surdo representa a si mesmo, se defende da homogeneização, da sensação de invalidez, de inclusão entre os deficientes, de menos valia social (PERLIN, 2004).

As pessoas surdas gostariam de ser “escutadas” e, para que isso fosse possível, aos ouvintes caberia refletir nisto: “Contrário ao modo como a maioria das pessoas define a

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surdez [...] pessoas surdas definem-se em termos culturais e linguísticos” (WRIGLEY, 1996, p. 13, tradução nossa). 12

Ao considerarmos13 que os surdos possuem de fato uma cultura, não estamos querendo dizer que todos os surdos do mundo compartilham a mesma cultura em detrimento da perda auditiva. Devemos entender que “os surdos brasileiros são membros da cultura surda brasileira da mesma forma que os surdos americanos são membros da cultura surda norte-americana” (KARNOPP, 2006, p. 99). Já que esses grupos utilizam-se de diferentes línguas de sinais, obviamente irão compartilhar entre si experiências díspares, bem como experiências de vida distintas. Quiçá o único aspecto cultural que una todos os surdos independentemente de sua localização geográfica seja o artefato da experiência visual. Todavia, apesar de estarem “unidos” por esse artefato, a sua visão de realidade será moldada pelo contexto sócio-histórico-cultural do local onde este sujeito encontre-se imerso.

Ainda concernente às questões língua de sinais, cultura e identidade surdas, é pertinente pontuar que:

Os surdos formam uma comunidade lingüística minoritária caracterizada por compartilhar uma língua de sinais e valores culturais, hábitos e modos de socialização próprios. A língua de sinais constitui o elemento identitário dos surdos, é o fato de constituir-se em comunidade significa que compartilham e conhecem os usos e normas de uso da mesma língua já que interagem cotidianamente em um processo comunicativo eficaz e eficiente. Isto é, desenvolveram as competências lingüística e comunicativa – e cognitiva por meio do uso da língua de sinais própria de cada comunidade de surdos (SKLIAR, 1997, p. 102).

No que tange aos aspectos variacionais, é sabido que, da mesma forma que as línguas orais-auditivas, as línguas de sinais possuem variações de ordem lexical (fonológica ou morfológica), semântico-pragmática, dialética, social, dentre outras. No que se refere às variações diacrônicas, Souza e Segala (2009, p. 45) afirmam que “as Línguas de Sinais estão sujeitas às variações diacrônicas no sentido de que evoluem ao longo do tempo em suas funções sociais e em suas relações com determinada comunidade linguística.” Nessa Dissertação, frisar-se-á, em momento oportuno, as variantes de natureza fonológica,

                                                                                                               

12 Texto de partida: “Contrary to how the average individual defines deafness – that is, as an audiological

impairment – deaf people define themselves culturally and linguistically.”

13 Aqui não falo apenas por mim e pela minha orientadora, mas tornamos o nosso discurso polifônico ao

pensarmos em: Skliar (1997, 1998, 1999), Perlin (2004, 2005), Kelman (2005), Sá (2006), Strobel (2008), Gesser (2009), Sacks (2010). Utilizamos a expressão “cultura surda” num sentido genérico, mas acreditamos, outrossim, numa visão pós-estruturalista, que os surdos são dotados de múltiplas culturas, as quais são moldadas pelos fatores sociais, políticos, econômicos, históricos, dentre outros.

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pontuando-se as diferenças das mesmas em relação às variantes de ordem morfológica. No quadro abaixo (quadro 1), estão representados algumas variações diacrônicas da Libras.

ITEM LEXICAL “Iconographia dos Sinais dos Surdos-mudos”

“Dicionário Enciclopédico Ilustrado trilíngue”

AMAR

Figura 3 – Sinal AMAR. Fonte: GAMA, 1975, p. 26.

Figura 4 – Sinal AMAR.

Fonte: CAPOVILLA; RAPHAEL, 2001, p. 190.

CAFÉ

Figura 5 – Sinal CAFÉ. Fonte: GAMA, 1975, p. 6.

Figura 6 – Sinal CAFÉ.

Fonte: CAPOVILLA; RAPHAEL, 2001, p. 335.

COPO

Figura 7 – Sinal COPO. Fonte: GAMA, 1975, p. 6.

Figura 8 – Sinal COPO.

Fonte: CAPOVILLA; RAPHAEL, 2001, p. 465.

DIA

Figura 9 – Sinal DIA. Fonte: GAMA, 1975, p. 32.

Figura 10 – Sinal DIA.

Fonte: CAPOVILLA; RAPHAEL, 2001, p. 540.

DIZER

Figura 11 – Sinal DIZER. Fonte: GAMA, 1975, p. 28.

Figura 12 – Sinal DIZER.

Fonte: CAPOVILLA; RAPHAEL, 2001, p. 556.

GORD@

Figura 13 – Sinal GORD@. Fonte: GAMA, 1975, p. 16.

Figura 14 – Sinal GORD@.

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ITEM LEXICAL “Iconographia dos Sinais dos Surdos-mudos”

“Dicionário Enciclopédico Ilustrado trilíngue”

INTELIGENTE

Figura 15 – Sinal INTELIGENTE. Fonte: GAMA, 1975, p. 22.

Figura 16 – Sinal INTELIGENTE. Fonte: CAPOVILLA; RAPHAEL, 2001, p. 762.

IR

Figura 17 – Sinal IR.

Fonte: GAMA, 1975, p. 26. Figura 18 – Sinal IR.

Fonte: CAPOVILLA; RAPHAEL, 2001, p. 768.

LEITE

Figura 19 – Sinal LEITE.

Fonte: GAMA, 1975, p. 6. Fonte: CAPOVILLA; RAPHAEL, 2001, p. 806. Figura 20 – Sinal LEITE.

MAGR@

Figura 21 – Sinal MAGR@. Fonte: GAMA, 1975, p. 16.

Figura 22 – Sinal MAGR@.

Fonte: CAPOVILLA; RAPHAEL, 2001, p. 856.

OBEDIENTE

Figura 23 – Sinal OBEDIENTE. Fonte: GAMA, 1975, p. 20.

Figura 24 – Sinal OBEDIENTE. Fonte: CAPOVILLA; RAPHAEL, 2001, p. 965.

PROFESSOR

Figura 25 – Sinal PROFESSOR. Fonte: GAMA, 1975, p. 12.

Figura 26 – Sinal PROFESSOR. Fonte: CAPOVILLA; RAPHAEL, 2001, p. 1084. Quadro  1  –  Variações diacrônicas dos sinais na Língua Brasileira de Sinais.

Na perspectiva da aquisição da linguagem, os sujeitos surdos deveriam ser expostos desde cedo à língua de sinais. Uma vez que as línguas orais são de modalidade oral-auditiva e as línguas de sinais, de modalidade viso-gestual, tem-se questionado: há algum efeito da modalidade em relação à aquisição e ao desenvolvimento da linguagem? Pesquisas científicas têm revelado que, do ponto de vista aquisicional, a modalidade não tem efeito para a

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aquisição da linguagem, considerando que tanto as crianças ouvintes quanto às crianças surdas podem adquirir, respectivamente, a língua oral e a língua de sinais em idades e estágios análogos (PETITTO, 2000(a, b); QUADROS, 1997, 2006, 2009). Contudo, tem-se observado que a articulação diferençada e as características perceptuais das modalidades gesto-visual e oral-auditiva permitem pressupor que as duas modalidades de línguas podem apresentar restrições diferentes aos sujeitos em fase de aquisição, e podem oferecer estratégias diferentes para os mesmos. Essas diferenças estão relacionadas principalmente ao fato de que, diferentemente dos articuladores orais, os articuladores manuais são emparelhados (MEIER, 2008).

A aquisição precoce da língua de sinais não tem acontecido, haja vista que a maioria das crianças surdas pertence a ambiente linguístico em que os pais são ouvintes. Grannier (2007) aponta que a criança surda não consegue aprender naturalmente a língua oral falada pelos seus progenitores e irmãos devido ao fato de que a surdez se constitui como uma barreira física que bloqueia a ativação do dispositivo mental inato. É relevante frisar que essa barreira física só se constitui um verdadeiro obstáculo em termos de aquisição da linguagem oral. No caso da aquisição da linguagem viso-gestual, é pertinente expor o caso das crianças que estudam num internato em Fremont – California School for the Deaf:

Tendo adquirido a língua de sinais como língua nativa desde bebês, essas crianças nunca chegaram a vivenciar a tragédia da falta de comunicação com os pais, que costuma ser o destino dos profundamente surdos. Num internato, são sobretudo essas crianças cuja língua nativa é a língua de sinais que apresentam o mundo dos surdos e sua língua para as crianças surdas filhas de pais ouvintes [...] (SACKS, 2010, p. 57).

De fato, as crianças surdas filhas de pais ouvintes obtêm um retardamento (ou atraso) na aquisição da língua de sinais (KARNOPP, 1999; QUADROS, 1997). Nesse caso, haverá uma discrepância na utilização do código linguístico: enquanto os pais e/ou irmãos tendem a compartilhar a linguagem na modalidade oral-auditiva, o filho surdo tende a não adquirir essa modalidade linguística em detrimento do déficit auditivo. Esse déficit, entretanto, não necessariamente causará transtornos cognitivos aos sujeitos surdos, mas poderá afetar a aquisição da linguagem à medida em que eles não sejam expostos a uma língua viso-gestual: a língua de sinais (GESSER, 2009). Para a criança surda, a tentativa de se “adquirir”, ou melhor, aprender uma linguagem oral estaria num nível complexo,14 porquanto se estaria                                                                                                                

14 Para se entender melhor essa complexidade, é necessário considerar que: “Qualquer língua oral pode ser

ensinada às crianças surdas através de procedimentos formais, não espontâneos, o que pode ser de grande valia para elas. Porém é importante que isso seja reconhecido como um aprendizado, e não uma aquisição” (OLIVEIRA, 1999, p. 80).

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fomentando o aprendizado dessa modalidade de linguagem na ausência de uma base linguística prévia (a língua de sinais). A linguagem oral, nesse caso, não ocorreria de maneira natural, considerando-se que se tentaria estimular o aprendizado dessa língua por intermédio de diferentes técnicas de instrução ou oralização.

Diante do exposto, acreditamos que a aquisição da língua de sinais como língua materna ou primeira língua é de suma importância para o desenvolvimento cognitivo, emocional, intelectual e linguístico-cultural dos sujeitos surdos (QUADROS, 1997). Se, e somente se, essa língua for adquirida precocemente pela criança surda que vive no contexto brasileiro, a mesma terá a base linguística que possibilitará o aprendizado da modalidade escrita da língua portuguesa (como segunda língua) e, provavelmente, estará habilitada a aprender essa segunda língua na sua modalidade oral caso tenha o desejo.

Essa Dissertação nasceu do desejo de demonstrar que a Libras não é uma forma de linguagem “rudimentar” ou menos complexa que a língua portuguesa falada no Brasil. No decorrer das investigações realizadas, foi-se percebendo a complexidade estrutural dessa língua viso-gestual, vislumbrando-se, por conseguinte, o aspecto fonológico dela.

A questão primordial que norteou o presente estudo foi: “De que forma é possível analisar a estrutura fonológica da Língua Brasileira de Sinais?”. Como desdobramento dessa questão norteadora, surgiram outras perguntas: “O que é a fonologia da língua de sinais?”; “Quais princípios ou parâmetros estão imbricados na fonologia da língua de sinais?”; “Qual a ordem de aquisição dos parâmetros fonológicos da Libras?”; “Quais CM (Configurações de Mão), M (Movimentos), OM (Orientações) e L (Locações) são relevantes para análise e avaliação fonológica da Libras?”; “De que forma a análise fonológica da Libras pode contribuir para o escrutínio dos processos fonológicos dessa modalidade linguística?”; “Para qual nível de análise linguística as expressões não-manuais são relevantes?” É provável que nem todas essas questões sejam plenamente respondidas. No decorrer dessa Dissertação, tentaremos responder algumas delas e outras estarão subordinadas a futuras pesquisas.

No capítulo inicial, serão expostas as considerações inicias a respeito da fonologia de língua de sinais, enfatizando-se as seguintes temáticas: considerações iniciais sobre o campo da fonologia da língua de sinais; retrospectiva histórica dos estudos em fonologia das línguas de sinais; a estrutura fonológica dos sinais; os modelos fonológicos propostos por pesquisadores das línguas sinalizadas; e, fecharemos o capítulo abordando os desafios futuros no que tange aos estudos em fonologia das línguas de sinais.

No segundo capítulo, será exposta a fonologia da língua de sinais à luz do Modelo Prosódico (MP) proposto por Diane Brentari (1998). Além de serem apresentadas as unidades

Referências

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