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Uma análise semiótica da informação ecológica

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Academic year: 2021

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Uma análise semiótica da informação ecológica

_______________________________________________

Kátia Batista Camelo Pessoa1 PROEX Thaisa Albuquerque Reino2

Resumo:

O objetivo principal de nosso trabalho será analisar a natureza ontológica da Informação entendida enquanto processo envolvido na manutenção da vida. Para tanto, desenvolvemos uma abordagem filosófica da ação prática em paralelo com a semiótica elaborada por Peirce (1974), tendo como subsídio para nossos estudos a análise do conceito Peirceano de informação realizado por De Tienne (2005). A partir de uma análise semiótica da informação emergente do processo co-evolutivo entre organismos e ambiente, analisamos a relação entre antecipação e raciocínio abdutivo proposto por Peirce.

Palavras-chave: Informação. Semiótica. Antecipação. Abdução.

A co-evolução dos organismos com o ambiente propicia uma análise semiótica da informação registrada no continuum da história natural. Tal informação foi estudada originalmente por Peirce (1974), no âmbito das possibilidades de ação para um agente, sendo considerada informação genuína o processo que, além de carregar novidades, possui um significado verdadeiro. Como ressalta De Tienne, em sua análise do conceito Peirceano de informação: quando um evento não se manifesta como uma novidade, ou não pode ser compreendido por uma mente, ele não trará informação genuína (DE TIENNE, 2005, p. 159).

De Tienne ressalta também que há em Peirce uma lógica organizadora da informação disponível no mundo, entendida como o produto da multiplicação de uma dinâmica que se recicla num continuumsemiótico e não pode ser considerada, apenas, como uma soma de quantidades (DE TIENNE, 2005, p. 150). Essa lógica diz respeito às antecipações de resultados da ação mediante os desdobramentos de uma realidade implicada na compreensão de algum agente, tornando-a explicitada.

1

Graduando em Filosofia da Universidade Estadual Paulista – UNESP – Campus de Marília. navevida@yahoo.com.br. Orientadora: Profª. Dra. Maria Eunice Quilici Gonzalez.

2 Pós-Graduando em Filosofia pelo Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade Estadual

Paulista – UNESP – Campus de Marília. thaisareino@yahoo.com.br. Orientadora: Profª. Dra. Mariana Cláudia Broens.

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No contexto de um nicho ecológico, a realidade explicitada pode ser entendida como o conjunto de informação disponível aos organismos que, utilizando seus recursos perceptuais, desdobram e atualizam eventos ecológicos. A análise semiótica de eventos ecológicos em sistemas auto-organizados admite que todos os seres vivos são inteligências que se comunicam em seus diversos nichos. Esse viés sistêmico, diferente daquele proposto pela biologia tradicional, não estuda os órgãos dos seres isoladamente, mas, antes, o funcionamento de organismos (co) relacionados (entre si) e com o nicho ecológico.

Os seres vivos inseridos num mesmo ambiente instanciam hábitos geradores de padrões que podem ser observados no plano da ação. No viés ecológico, Bateson (1986) considera que as ações dos organismos ocorrem num contexto significativo. Ele ressalta em sua abordagem ecológica a importância de observarmos o “padrão que liga” a história de vida dos vários organismos, como se existisse um elo entre os sistemas biológicos inseridos nos diversos nichos ecológicos (BATESON, 1986, p. 16). Os padrões possuem um ritmo significativo que deixa marcas no ambiente, uma memória instanciada que será atualizada por espécies no futuro.

Se, no contexto da análise semiótica, admitirmos que tais padrões podem ser geradores de signos, também, será possível afirmar que os signos são entidades interdependentes de quem os desvela. Veremos que esses padrões podem permanecer imperceptíveis e, dependendo da necessidade de certos sistemas, apenas serem captados em momentos oportunos à ação dos mesmos.

Segundo Bateson, a realidade ecológica, repleta de oportunidades de ação, não pode ser reduzida à realidade física, material, pois embora seja material, ela é, também, informacional na medida em que é intrinsecamente significativa. Tal realidade informacional está imbricada nos padrões, na medida em que eles possibilitam a ação e a comunicação no meio ambiente e, transportam, ainda, informações para agentes no futuro. Segundo De Tienne (2005, p. 161): A informação é pragmaticamente significativa em razão da necessidade de explicitar uma realidade a algum interpretante no plano prático da ação. Caso tal realidade não seja compreensível a alguma mente, ela não poderá, como já mencionado, subsistir como candidata a informação genuína.

O desdobramento do plano informacional ocorre na relação entre os agentes com o meio semiótico; mas se tal plano não afetar alguma mente enquanto informação genuína, esta permanecerá encapsulada. Uma vez explicitada a algum agente, como uma

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informação (genuína), este será um multiplicador, portador de uma verdade conectada com a realidade que será transportada, gerando interpretantes futuros (DE TIENNE, 2005, p. 160-161).

Muitas informações podem estar em potência no ambiente e os seus desdobramentos (em ações significativas) dependerão dos estados disposicionais para a ação. Tais estados são encontrados tanto no ambiente quanto no próprio aparato perceptual de cada espécie e direcionam os organismos, estabelecendo critérios de relevância para a ação no seu próprio contexto bio-histórico cultural (ANDRADE, 2006, p. 101).

Nesse viés semiótico, eventos ecológicos não podem ser fundamentados apenas numa perspectiva fisicalista de causa e efeito; ainda que necessitem de uma forma material, eles não se reduzem à matéria. Os eventos informacionais emergem de uma realidade implicada disponível aos agentes incorporados e situados. Assim, explicações mecanicistas e reducionistas não são suficientes para responder aos questionamentos dessa abordagem ecológica que busca, nos pressupostos teóricos da auto-organização3 e da semiótica, fundamentar o conceito de Informação Ecológica.

Segundo o paradigma da Auto-Organização, a informação pode ser compreendida “como um processo auto-organizado que permite o estabelecimento de padrões de ação para organismos situados em ambientes governados por relações compartilhadas de ordem” (GONZALEZ, 2004, p. 215). Ruídos muitas vezes interrompem o fluxo contínuo da dinâmica de tais sistemas, rompendo a sua rede de conexões informacionais. Quando incorporados, tais ruídos provocam uma quebra de antigos hábitos gerando novas condições para a formação de outros hábitos. Desse modo, as informações imbricadas, ao incorporarem os ruídos, podem tanto elevar o grau de complexidade dos sistemas quanto provocar uma desestabilização que, no limite, os destruirá.

3 Não é objetivo desse trabalho realizar um estudo detalhado acerca da teoria da Auto-Organização; as

seguintes definições propostas por Michel Debrun, em seu trabalho A idéia de Auto-Organização, nos auxiliarão na compreensão de tal conceito:

a) “Há auto-organização cada vez que o advento ou a reestruturação de uma forma, ao longo de um processo, se deve principalmente ao próprio processo – a características nele intrínsecas -, e só em grau menor às suas condições de partida, ao intercâmbio com o ambiente ou à presença eventual de uma instância supervisora” (p. 4)

b) Auto-Organização Secundária “No concernente ao que ocorre no organismo diremos que há auto-organização secundária quando esse organismo consegue passar, a partir de suas próprias operações, exercidas sobre ele próprio, de determinado nível de complexidade – corporal, intelectual, existencial – para um nível superior. A Auto-organização é aqui secundária à medida que ela não parte de simples elementos, mas de um ser ou sistema já constituído” (p. 10).

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Entendemos que, quando agentes situados e incorporados conseguem ampliar a sua rede de conceitos, desdobrando informações em seu ambiente, eles estão, também, antecipando ações futuras; em alguns casos, as antecipações originadas no presente alteram resultados futuros. Compreendemos a antecipação realizada por um tal agente como um desdobramento de informações que se encontram apenas potencialmente no ambiente. Tais informações possuem uma dimensão teleológica, nelas mesmas, na medida em que incorporam novos signos e, nos seus sucessivos desdobramentos, admitem novos interpretantes.

Segundo (DE TIENNE, 2005, p. 156-157), no processo semiótico, a informação é inerentemente processual, pois os signos se constituem numa dinâmica, por meio da qual, ao serem instanciados, adotam uma forma condicional que tem a característica de enunciar o que poderá acontecer no futuro. Ao antecipar uma interpretação, tal processo semiótico se desloca em duas direções no tempo: no presente, ele envolve algo do passado que, ao sinalizar por meio de intenções, remete ao futuro; e do futuro para o presente, ao orientar os eventos presentes pela representação do futuro. Podemos prever e, em certo sentido alterar acontecimentos no mundo, antecipando o futuro no presente, por nos constituirmos como parte integrante desse mesmo futuro.

Há um aspecto explícito e publico da informação que pode ser imediatamente percebido por um agente, porém há camadas mais implicadas da realidade que contém informações ainda encapsuladas. Através da ação, vários desdobramentos sucessivos de informações permitem ampliar a rede informacional e aumentar a complexidade dos nichos ecológicos. Tendo em vista que tais redes informacionais se instanciam por um percurso histórico, mantendo o que nelas ainda não é obsoleto, é possível aceitá-las como padrões estabelecidos que ativam uma memória no contexto semiótico. Tais memórias podem permanecer encapsuladas num nicho ecológico e, através da ação, ser atualizadas em dado momento, permitindo uma co-evolução entre o organismo e meio, ampliando a rede que mantém o sistema em funcionamento. Esse processo semiótico, ininterrupto, de desdobramento de informação no tempo pode ser compreendido através de diagramas gerados pela relação triádica dos signos que permitem antecipar ações de agentes situados em um contexto ecológico.

No contexto semiótico, a “informação é pragmaticamente significativa” (De Tienne, 2005, p. 161), sendo que a capacidade de imaginar hipoteticamente como procederá uma inteligência “científica” permite a antecipação de condutas e atitudes.

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Como nos lembra SILVEIRA (2007, p. 26-27), para Peirce toda inteligência é “científica”; ela apreende os objetos a partir da experiência, na qual está implícito o diagrama formado por tríades. A inteligência “científica”, através de uma dinâmica triádica (e não por uma relação diádica de causa e efeito) se utiliza de signos que organizam a realidade. Assim, podemos pensar que a inteligência científica consegue desdobrar informações encapsuladas modificando hábitos obsoletos de conduta, refinando as suas habilidades em vista a uma permanência mais elaborada dentro de um contexto semiótico. Na semiótica não importa tanto saber como devem ser os signos, mas sim compreender, mesmo que hipoteticamente, como deve proceder uma inteligência em seu ato de pensar e, quanto mais conseguir compreender esse ato, melhor se alcançará o que se pretende conhecer (SILVEIRA, 2007, p. 26).

O desdobramento de informações propicia também a existência da abdução, que, segundo Peirce (PEIRCE, 1974, p. 57) expressa um tipo de raciocínio falível, no qual o acaso tem um peso significativo. Entendemos que há uma relação frutífera entre o processo de antecipação de possibilidades de ação e o raciocínio abdutivo proposto por Peirce. Em particular, a informação (genuína), quando expressa na forma de um conjunto de proposições lógicas representativas de fatos, possibilita prever eventos futuros com certo grau de confiabilidade.

Em síntese, a informação genuína fornece indicações do que poderia acontecer no futuro, caso sejam antecipadas certas condições no presente. Contudo, é a percepção integrada do agente, regida por critérios significativos de relevâncias, que antecipa as interpretações possíveis. Tal dinâmica de antecipações de eventos semióticos não apenas favorece a permanência dos agentes em seus ambientes naturais, mas parece propiciar as condições fundamentais para a manutenção da vida.

Referências

ANDRADE, R. S. C. Conhecimento sensorial: uma abordagem ecológica via realismo informacional. 2006. Dissertação (Mestrado em Filosofia) – Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2006.

BATESON, G. Mente e natureza. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1987. ______. Os homens são como a planta. In: THOMPSON, I. W. (Org.). Gaia: uma teoria do conhecimento. São Paulo: Gaia, p. 35-43, 1987

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BOHM, D. A totalidade e a ordem implicada: uma nova concepção da realidade. São Paulo: Cultrix, 1980.

DEBRUN, M. A idéia de auto-organização. In: DEBRUN, M.; GONZALEZ, M. E.Q.; PESSOA JR., O. (Org.). Auto-Organização: estudos interdisciplinares. 1. ed.Campinas-SP: (Coleção CLE, v. 18), p. 3-23, 1996.

DE TIENNE, A. Information in formation: a peircean approach. Cognitio, São Paulo: EDUC, v. 6, n. 2, p. 149-165, 2005.

GONZALEZ, M. E. Q.; MORAIS, S. R. Contribuições do pragmatismo para a

compreensão do conceito de informação ecológica. Cognitio, São Paulo: EDUC, v. 8, n. 1, p. 93-104, 2007.

GONZALEZ, M. E. Q.; ANDRADE, R. S. C.; OLIVEIRA, L. F. Complexidade e ordem implicada: uma investigação acerca do processo criativo. In: GUERRINE, I. A. (org.). Nas asas do efeito borboleta: o despertar do novo espírito científico. Botucatu: FEPAF, v. p. 89-105, 2006.

GONZALEZ, M. E. Q.; NASCIMENTO, T. C. A.; HASELAGER, W. F. G.

Informação e conhecimento: notas para uma taxonomia da informação. In: FERREIRA, A.; GONZALEZ, M. E. Q.; COELHO, J. G. Encontro com as ciências cognitivas. São Paulo: Cultura Acadêmica, v. 4, p. 195-220, 2004.

PEIRCE, C. S. Escritos coligidos. Seleção de Armando Mora D’Oliveira. 3. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1974. (Os Pensadores).

SANTAELLA, L. O método anticartesiano de C. S. Peirce. São Paulo: Ed. da UNESP, 2004.

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