• Nenhum resultado encontrado

Debênture com destino certo

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Debênture com destino certo"

Copied!
5
0
0

Texto

(1)

Títulos de dívida de projeto se revelam uma

opção de financiamento promissora para os

investimentos em infraestrutura

Por Luciana Tanoue

Debênture com

destino certo

capa

(2)

E

las são bastante usadas em países como Estados Unidos, Austrália, Canadá e Reino Unido. No Brasil, a despeito do crescimento do mercado de capitais nos últimos anos, as debêntures de sociedades de propósito específico (SPEs) — ou “project bonds”, como são conhecidas em inglês — capitalizam pouquíssimos empreendimentos. Na última década, apenas duas emissões brasileiras desse tipo de título se destacaram: a da Companhia Petrolífera Marlim, SPE administrada pela Petrobras, com volume de R$ 1 bilhão; e a da Concessionária Rota das Bandeiras, de R$ 1,1 bilhão. Mas esse cenário pode mudar. No fim do ano passado, o então presidente Lula anunciou um pacote de medidas para incentivar o mercado de capitais a fornecer crédito de longo prazo para empreendi-mentos de infraestrututura. Com a proximidade da Copa de 2014 e da Olimpíada de 2016, o Brasil precisa urgentemente tirar da gaveta projetos vitais para o desenvolvimento do País. Por oferecer dinheiro barato, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é a primeira fonte de crédito procurada pelos empreendedores. No entanto, o banco estatal deixou claro que não tem caixa suficiente para financiar todas as grandes obras que o Brasil terá de construir, e é aí que o mercado de capitais pode ganhar terreno. Não por acaso, o governo está se mexendo. Em seu pacote, reduziu a zero a alíquota do imposto de renda sobre os rendimentos de debêntures de SPEs adquiridas por investidores pessoas físicas e estrangeiros. No caso das pessoas jurídi-cas, a alíquota caiu de 34% para 15%. Até o momento, não foram lançados títulos de dívida de projetos desenhados para receber esse benefício fiscal. “Mas temos recebido muitas consultas sobre o assunto”, garante Alexandre Barreto, sócio do Souza Cescon.

(3)

Não é qualquer tipo de debên-ture de SPE que poderá receber os incentivos fiscais. Primeiro, o projeto tem de ser considerado prioritário pelo Poder Executivo Federal. Depois, a emissão deve ser estruturada de acordo com as características descritas na Me-dida Provisória 517/10. De acordo com a MP, as debêntures precisam, dentre outras coisas, ter prazo mé-dio superior a quatro anos e pagar taxa de juros prefixada vinculada a um índice de preço. Para ofere-cer liquidez aos papéis, o governo se comprometeu a estimular a

for-mação de um mercado secundário. A proposta é que até três pontos percentuais do recolhimento compulsório sobre depósitos a prazo das insti-tuições financeiras sejam destinados para a cria-ção de um fundo de liquidez para esses títulos.

A Concessionária Rota das Bandeiras fez sua emissão no ano passado, meses antes de o gover-no anunciar o pacote de incentivos. Criada pela Odebrecht TransPort para explorar a concessão do Corredor D. Pedro I, conjunto de cinco rodo-vias que liga Jacareí à região metropolitana de Campinas, em São Paulo, a SPE conseguiu ven-der R$ 1,1 bilhão em debêntures pagando uma remuneração equivalente à variação da inflação medida pelo IPCA mais 9,57% ao ano até 2022. Apesar de um prazo de vencimento longo para os padrões de ofertas brasileiras, o preço da debên-ture saiu no teto da faixa prevista, surpreendendo até mesmo os bancos coordenadores, que estima-vam um piso de R$ 600 milhões para a oferta.

O dinheiro permitiu à concessionária quitar integralmente um empréstimo-ponte com venci-mento de 18 meses feito em maio de 2009, com um conjunto de cinco bancos. Os recursos obti-dos serviram para custear a outorga fixa da con-cessão, cujo valor não pode ser financiado pelo BNDES. “Com o que captamos, conseguimos an-tecipar o pagamento dessa dívida para outubro de 2010”, conta Lucas Cive Barbosa, diretor financei-ro da Rota das Bandeiras. Isso representou uma boa economia para a concessionária. Na época da operação, o empréstimo-ponte custava 15,92% ao ano, enquanto as debêntures saíram a 14,87%.

Márcio Lutterbach, sócio da área de finanças corporativas da KPMG no Brasil, acredita que as debêntures podem servir, principalmente, para as SPEs suprirem a carência de crédito que têm na fase inicial do projeto, quando não costumam

contar com o financiamento do BNDES. “Dependendo do caso, a liberação dos recursos pelo ban-co estatal pode demorar até dois anos”, afirma o executivo. No caso da Rota das Bandeiras, a ajuda do banco estatal veio em julho de 2010, praticamente um ano e meio depois de a empresa ter vencido o leilão para explorar a concessão. As garantias dadas ao BNDES foram as mesmas oferecidas aos debenturistas. “Esse foi um dos grandes atrativos da operação”, enfatiza Barbosa. Assim, em caso de default, tanto o banco estatal quanto os investidores têm direitos iguais, sem preferência de um sobre o outro. Em uma eventu-al inadimplência, eles podem penhorar as ações da SPE e usufruir os direitos creditórios decor-rentes da prestação dos serviços de exploração, operação, conservação e construção da malha rodoviária do Corredor Dom Pedro I. Além disso, podem se beneficiar dos direitos emergentes da concessão, inclusive os relativos a indenizações a serem pagas pelo poder concedente no fim do contrato.

riscoisolado — A captação da Rota das

Bandei-ras é um exemplo típico de financiamento “non-recourse”. Isso significa que as garantias ofere-cidas pela empresa patrocinadora — no caso da Rota, a Odebrecht TransPort — está limitada aos ativos e recebíveis da SPE. “O risco do projeto fica isolado na sociedade de propósito específico, que tem uma pessoa jurídica diversa das sócias que dela participam”, diz Eduardo Lima, responsável pela área de infraestrutura e financiamento de projetos do Lefosse Advogados. Isso faz com que a constituição de uma SPE seja interessante, por exemplo, em situações na qual o risco da empresa patrocinadora não é tão bom, mas o do projeto é.

E se o projeto falhar e as garantias oferecidas pela SPE não forem suficientes para quitar a dí-vida com os credores? “Nesses casos, o comum é haver o refinanciamento do projeto, com o alongamento do prazo para pagamento da dí-vida”, explica Barreto, sócio do Souza Cescon. “A última coisa que o financiador quer ver é o projeto morrer. Afinal, esse é o principal meio de ele conseguir se pagar”, analisa o advogado. Em projetos que envolvem serviços de utilidade pública, lembra Barreto, não há nem como vender os ativos. Entrar na seara da desconsideração

A Rota das

Bandeiras fez sua

emissão no ano

passado, meses

antes de o governo

anunciar o pacote

capa

(4)

A SPE é

interessante

quando o risco da

patrocinadora não

é bom, mas o do

projeto é

da personalidade jurídica com o intuito de atacar o patrimônio dos sócios do projeto também n ão é u m c a m i n ho pr ovável. “Os credores só teriam esse direito se houvesse indício de operação fraudulenta”, esclarece Erik Oioli, sócio do escritório Vaz, Barreto, Sh i nga k i & Oiol i Advogados.

Por isso é importante o investi-dor avaliar bem onde está pisando antes de se tornar credor de uma SPE. É preciso ficar atento a quem são os patrocinadores por trás do projeto e qual será a empresa res-ponsável por fazer a construção das

obras, porque atrasos podem complicar o fluxo de pagamentos. Além disso, projetos que ainda não foram erguidos (denominados, em inglês, de green-field) costumam ser mais arriscados do que aqueles já executados. Na seção de fatores de risco do pros-pecto, é possível ter uma boa ideia dos problemas que os debenturistas podem enfrentar. A Rota das Bandeiras alerta os investidores, por exemplo, para o fato de as ações da SPE dadas em garantia não terem liquidez. Registrada na Comissão de Valo-res Mobiliários (CVM) como companhia aberta de categoria B, as ações da concessionária não podem ser negociadas em mercados regulamen-tados de valores mobiliários. “É uma mudança de paradigma, na qual o investidor deixa de analisar companhias e começa a analisar projetos”, observa Diego Carneiro Barreto, professor de finanças na pós-graduação da Fundação Getulio Vargas (FGV).

garantia acessória — Apesar de o financiamento

do tipo “non-recourse” ser o mais habitual, nada impede que os patrocinadores do projeto emitam debêntures com uma garantia acessória, como uma fiança, com o objetivo de deixar os credores

mais confortáveis. Foi o que fez a concessionária Ecopistas, sociedade de propósito específico montada pela Ecorodovias Concessões para admi-nistrar e operar o Sistema Ayrton Senna/Carvalho Pinto, ligação da região metropolitana de São Paulo com o Vale do Paraíba. Em sua emis-são de debêntures realizada no mês passado, a Ecopistas captou R$ 350 milhões para refinanciar uma emis-são de notas promissórias. Os títulos têm vencimento de cerca de 12 anos. Diferentemente da emissão da Rota das Bandeiras, cujas garan-tias eram limitadas ao projeto, a oferta da Ecopistas prevê uma fiança temporária oferecida pela Ecorodovias Concessões, patro-cinadora do empreendimento. A fiança deve ser liberada quando a Ecopistas tiver cumprido com cláusulas financeiras restritivas de alavanca-gem por um período de 24 meses consecutivos. Segundo projeções da Moody’s, agência de rating que classificou o risco da oferta, a Ecopistas não será capaz de cumprir essas obrigações antes de 2015, devido aos investimentos elevados que precisa fazer. Após esse período, o crescimento esperado nos volumes de tráfego deve fortalecer a geração de caixa da empresa e diminuir sua alavancagem.

Oferecer uma garantia acessória é uma ma-neira de aumentar o rating dessas emissões. A Moody’s, em seu relatório, destaca que as no-tas Ba1, na escala global, e Aa2.br, na nacional, atribuídas aos R$ 350 milhões em debêntures seniores emitidos pela Ecopistas estão um nível acima da avaliação da própria SPE para refletir a fiança solidária da Ecorodovias Concessões. A Moody’s afirma que o histórico limitado dessa concessão recém-adquirida, o elevado nível de

7kZ_jeh_W?dZ[f[dZ[dj[ 7kZ_jeh_W?dj[hdW 7kZ_jeh_W[9edikbjeh_WZ[J? 9edikbjeh_WJh_Xkj|h_W =[ij€eZ[9ecfb_WdY[[9edjheb[i?dj[hdei ;ijhkjkhW‚€eZ[<kdZeiZ[?dl[ij_c[djei

I[cfh[fh[i[dj[

:fe]`XeZ\8l[`kfi\j@e[\g\e[\ek\j

JfGXlcf((,'++$'-/*

nnn%Zfe]`XeZ\Xl[`k%Zfd%Yi

:FE=@8E:<

(5)

endividamento e os altos investi-mentos nos próximos cinco anos limitam o rating da Ecopistas, as-sim como a forte competição com uma rota alternativa, a Rodovia Presidente Dutra, operada pela NovaDutra.

Considerando as melhorias que precisa rão ser feit a s na s rodovias existentes e a constru-ção de novas pistas, a Moody’s estima que a Ecopistas terá um custo de cerca de R$ 600 mi-lhões nos seis primeiros anos de concessão. O BNDES deverá fi-nanciar aproximadamente 60 %

das necessidades de investimento. No fim de 2010, o banco aprovou um empréstimo de longo prazo de R$ 355,4 milhões, que compar-tilhará as mesmas garantias das debêntures. O diretor financeiro da Rota das Bandeiras lembra que conseguir um rating alto nessas emis-sões é fundamental quando os investidores-alvo da oferta são fundos de pensão. “As fundações não podem adquirir papéis com qualquer classifi-cação de risco. Há um rating mínimo que precisa ser respeitado”, diz Barbosa. Os fundos de inves-timento, as entidades de previdência privada e as seguradoras foram os principais compradores da oferta da concessionária. Segundo o diretor, o pagamento de taxa de juros prefixada, vinculada a índice de preço, caiu como uma luva tanto para as fundações, que têm sua meta atuarial corri-gida pelo IPCA, quanto para a Rota das

Bandei-ras, cujo contrato de concessão é reajustado por esse mesmo fator. Sergio Bronstein, sócio do Veirano Advogados, firma que assessorou a Rota das Bandeiras na emissão de debêntures, reve-la que, atualmente, possui dois clientes interessados em montar debêntures similares à da conces-sionária. Para que esse mercado floresça, é preciso, antes de tudo, que oferta e demanda se encon-trem. Uma política econômica capaz de reduzir as taxas de juros dos títulos públicos é vital para o mercado de dívida privado ganhar atratividade entre os investidores. O governo, contudo, já sinalizou que o combate à inflação deve exigir uma alta dos juros. Desde o início do ano, a Selic aumentou 1 ponto percentual. Considerando o cronograma acelerado de projetos que terão de ser cumpridos nos próximos anos, é quase impensável o mercado de capitais não ajudar o BNDES na tarefa de financiar novas obras. A Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústria de Base (Abdib) calcula que, até o fim do governo Dilma, o Brasil precisará inves-tir R$ 160 bilhões por ano em infraestrutura. “O BNDES sempre vai ter um papel relevante no financiamento de projetos dessa natureza. Mas o mercado de capitais tem capacidade de oferecer crédito em quantidade muito maior que o banco estatal. Estamos falando da poupança pública do País todo”, ressalta Barreto, do Souza Cescon.

Oferecer uma

garantia acessória

é uma maneira de

aumentar o rating

das emissões

Sob certas condições

Conheça as características que as debêntures de projeto precisam ter para usufruir o pacote do governo

• Captar recursos para áreas tidas como prioritárias pelo Poder Executivo Federal. Por exemplo: energia, transporte, água e saneamento;

• Ser emitida até dezembro de 2015;

• Ter remuneração por taxa de juros prefixada, vinculada a índice de preço ou a taxa referencial (TR); • Prazo médio superior a quatro anos;

• Vedação à recompra do papel pelo emissor nos dois primeiros anos após a sua emissão; • Inexistência de compromisso de revenda assumido pelo comprador;

• Se houver prazo de pagamento periódico de rendimentos, os intervalos devem ser, no mínimo, de 180 dias; • Demonstrar o objetivo de alocar os recursos captados em empreendimentos de infraestrutura. De acordo com a Resolução, os projetos devem trazer uma descrição que explicite: seu objetivo; o prazo estimado para o seu início e fim ou, para os projetos em curso, a descrição da fase em que se encontram e a estimativa do encerramento; o volume estimado dos recursos financeiros necessários para sua realização; e o percentual que se estima captar com a emissão dos títulos ou valores mobiliários, frente às necessidades de recursos do projeto.

Fonte: MP 517/10 e Resolução 3.947

capa

Referências

Documentos relacionados

Sobretudo recentemente, nessas publicações, as sugestões de ativi- dade e a indicação de meios para a condução da aprendizagem dão ênfase às práticas de sala de aula. Os

Obedecendo ao cronograma de aulas semanais do calendário letivo escolar da instituição de ensino, para ambas as turmas selecionadas, houve igualmente quatro horas/aula

A disponibilização de recursos digitais em acesso aberto e a forma como os mesmos são acessados devem constituir motivo de reflexão no âmbito da pertinência e do valor

José Arno Appolo do Amaral, Prefeito Municipal, no uso de suas atribuições legais e de acordo com o Processo nº 2808/2020 da Secretaria Municipal de

 A combinação desta referência com a referência do mandato, permitirá ao Banco do devedor fazer uma análise à instrução de cobrança antes de proceder ao

Objetivo: Identificar critérios de seleção para a rizotomia dorsal seletiva (RDS) na paralisia cerebral (PC), analisar os instrumentos de avaliação e descrever as características

Lista de preços Novembro 2015 Fitness-Outdoor (IVA 23%).. FITNESS

os atores darão início à missão do projeto: escrever um espetáculo para levar até as aldeias moçambicanas para que a população local possa aprender a usufruir e confiar