A ESCOLA E A DESIGUALDADE
1Ana Celuta Fulgêncio Taveira2 Edna Lemes Martins Pereira3 Eliézer Marques Faria4
O autor Juan Casassus é um estudioso da educação e um dos especialistas do Laboratório Latino-Americano de Avaliação da Qualidade da Educação da UNESCO e coordenador de uma pesquisa que apresenta resultados e reflexões acerca da qualidade e equidade na educação da região da América Latina.
A pesquisa tomou como base documental os dados fornecidos pelos governos da Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Equador, Guatemala, Honduras, México, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Venezuela, e contou com a participação de múltiplas equipes de especialistas e colaboradores de diferentes países.
O autor foi encarregado de dirigir o Primeiro Estudo Internacional Comparativo em Linguagem, Matemática e Fatores Associados para Alunos de Terceira e Quarta Séries do Ensino Fundamental entre os anos de 1995 e 2000, cujo propósito era melhorar a compreensão sobre os fatores que influem no desempenho dos alunos para poder criar, com maior conhecimento, um conjunto de políticas destinadas a melhorar a qualidade e a equidade na educação.
A questão norteadora do livro é a de como melhorar a qualidade e alcançar a equidade na educação, tendo como foco de análise principal os mecanismos que geram e perpetuam a desigualdade no âmbito da educação, visando alcançar efeitos positivos na qualidade de vida e na redução das desigualdades sociais.
Durante a década de 1960 foram iniciados e continuam sendo realizados em alguns países desenvolvidos, estudos comparativos que produziram conhecimentos sobre as variáveis que afetam o rendimento escolar que deram origem à elaboração
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Resenha crítica da obra: CASASSUS, Juan. A escola e a desigualdade. 2 ed. Brasília: Líber, UNESCO, 2007. 204 p.
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Mestre em Direito e Doutora em Educação pela PUC Goiás. Professora da Faculdade Alfredo Nasser. E-mail: anaceluta@yahoo.com.br
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Doutora em Educação pela PUC Goiás. Professora da Faculdade do Norte Goiano (FNG) e da UEG – Campus de Porangatu E-mail: ednapgtu@hotmail.com.
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Doutor em Educação pela PUC Goiás. Professor do Instituto Federal de Goiás. E-mail: eliezerfaria@gmail.com.
de políticas educacionais nestas regiões. Na década de 1990, mesmo que os países da América Latina tenham mostrado melhora significativa nos indicadores econômicos, a má distribuição de renda e a pobreza continuaram assolando grande parte da população destes países.
Este primeiro estudo internacional de âmbito latino-americano sobre os fatores ligados ao sucesso de alunos do ensino fundamental levando em conta o seu rendimento em provas de linguagem e matemática e as condições sobre as quais se produziu a aprendizagem prende-se ao propósito de informar políticas e reformas sociais.
Nesta pesquisa foram aplicadas provas de linguagem e matemática a estudantes de terceiras e quartas séries; questionários a alunos, pais ou responsáveis, professores, diretores, bem como a coleta de informações sobre os estabelecimentos escolares.
Ficou comprovado que há, na América Latina, um currículo comum, constatação esta que evidencia uma base cultural comum na região, fator que facilita a comparação das condições em que são transmitidos os conteúdos pelos sistemas escolares.
A obra divide-se em três partes, compreendendo cinco capítulos: a primeira parte debate o marco conceitual que é referência para o estudo, a segunda fornece dados e análises relacionados ao desempenho dos alunos e a terceira contém um conjunto de conclusões que indicam tendências e caminhos possíveis de serem trilhados a partir das evidências e conclusões encontradas. Tais caminhos podem servir de pistas capazes de alterar o sentido comum subjacente à formulação das políticas públicas de educação nos últimos tempos.
Orientadas por este enfoque, as reformas educacionais dos anos 90 foram estruturadas tendo por base um modelo de insumo-produto direcionado para melhorar a qualidade da educação e não para superar a desigualdade. Ao final de dez anos de reforma, observa-se uma pequena melhoria no rendimento escolar, mas há persistência da distância entre as escolas.
Procurou-se, também, identificar, numa perspectiva sociológica, os fatores que influem no desempenho escolar: família, contexto econômico, social, cultural bem como as variáveis das escolas e seu comportamento em relação à diferença entre as escolas e não intra-escola, uma vez que a constituição social, cultural e econômica das escolas é semelhante.
A partir deste ponto, o texto expõe as características de escolas que podem favorecer um melhor desempenho: contam com prédios adequados; dispõem de materiais didáticos e quantidade suficiente de livros e recursos na biblioteca; têm autonomia na gestão; docentes com formação pós-médio; poucos alunos por professor; docentes com autonomia profissional e responsabilidade em relação ao sucesso/fracasso dos alunos; avaliação de forma sistemática; nenhum tipo de segregação; pais envolvidos com a comunidade escolar; ambiente emocional favorável à aprendizagem etc.
O capítulo 1 aborda o estudo da desigualdade evidenciando que a América Latina é a região que tem a maior desigualdade de renda do mundo. Tal fator possui grande peso no acesso e permanência na educação das pessoas que vivem ali. Durante a década de 1980 foram promovidos debates nacionais e internacionais acerca da qualidade da educação e seus reflexos em uma sociedade. Surge, então, a necessidade de “medir” a qualidade da educação. O primeiro passo para tornar visível a educação, do ponto de vista qualitativo, foi recorrer a instrumentos para dimensionar, “medir” a qualidade.
Primeiramente, foram elaboradas hipóteses sobre fatores “materiais” que determinam o resultado. Em seguida, formularam-se hipóteses sobre fatores imateriais, como as expectativas e interações que acontecem dentro das escolas ou no lar. Mas, finalmente, a atenção acabou se fixando no seu foco atual, que é a observação e medição do sucesso acadêmico.
O capítulo 2, intitulado “Um Modelo de Análise da Desigualdade: a interação dos diversos fatores explicativos”, o autor fala sobre a complexidade dos processos educacionais e que é preciso perceber as relações que existem entre a escola e fatores cultural, econômico e social, além das inter-relações com o que ocorre dentro da própria escola.
As análises feitas levaram a resultados que foram interpretados usando-se os métodos de análise de gradientes (análise dos fatores socioeconômicos e socioculturais), o de funções de produção, relativo a fatores internos à escola e a análise multinível, mediante a técnica de análise hierárquica multinível (HLM), que permite ver os impactos dos fatores internos e externos à escola.
O autor acredita que, com o conjunto desses instrumentos, é possível chegar a uma melhor compreensão sobre como os processos internos à escola
(práticas pedagógicas, gestão etc.) fazem que os contextos (família, comunidade) e os insumos (livros, equipamentos etc.) atuem de uma maneira positiva ou negativa.
No capítulo 3 há uma abordagem acerca da Medição da Desigualdade: Notas, Sucessos e Desempenhos. Foram observadas poucas diferenças de desempenho entre os países da América Latina, exceto Cuba. Pois os estudantes cubanos obtiveram altas notas em Linguagem e Matemática, o que os situa a uma distância considerável em relação aos dos outros países participantes do estudo. É necessário ressaltar, ainda, que os índices de repetência em Cuba são extremamente baixos.
A maioria dos países, com baixo sucesso, tem altas taxas de repetência. Foi verificado, também, que o nível de sucesso dos alunos é baixo no âmbito da Linguagem. Em matemática, os resultados são ainda mais inferiores e não são uniformes para toda a região.
O Brasil é o único país que apresenta a dupla faceta de ter um tópico particularmente forte (identificar o conteúdo da mensagem de um texto) e um tópico particularmente fraco (identificação de que tipo de texto se trata).
Cuba é o país que obteve os melhores resultados. Neste país, pode-se afirmar que os alunos conseguem desenvolver, de forma adequada, as competências exigidas para realizar processos inferenciais com relação à linguagem escrita.
O capítulo 4, Casassus ressalta os fatores que influem no sucesso escolar. A dimensão sociocultural é um dos fatores que tem grande influência no desempenho dos estudantes, e, portanto, desequilíbrios neste aspecto afetam negativamente o sucesso de uma educação de equidade. Com o objetivo de estudar a incidência da dimensão sociocultural, foram analisadas variáveis relacionadas com o contexto familiar do aluno.
A análise de quatro indicadores do contexto familiar do aluno forma o status sociocultural (SSC), são eles: nível de educação dos pais; tempo em que os pais permanecem em casa nos dias de trabalho; os livros e as revistas existentes em casa e a estrutura do núcleo familiar (se a família é uni ou biparente).
Pode-se notar que os países com melhor nível de rendimento escolar são os que apresentam melhor nível de SSC. É possível que um país tenha uma situação econômica deficitária, mas ao mesmo tempo, tenha uma boa educação.
O capítulo 5 se intitula “Integrando Perspectivas”. Ao analisar todas as informações oferecidas Casassus conclui que o desempenho em educação é “resultado de uma multiplicidade de efeitos combinados” em que cada fator exerce certa influência sobre a vida escolar dos alunos.
Essa diversidade nos resultados é característica da América Latina e também é notada em sociedades em que as diferenças sociais são consideráveis e tendem a aumentar. Pode-se concluir, portanto, que nos países da América Latina, que, no geral, adotam basicamente a mesma grade curricular nas suas escolas, as diferenças nos resultados dos desempenhos se devam a fatores que interferem na aprendizagem.
Assim, Casassus apresenta-nos a premissa de que a escola é geradora de equidade porque atenua o impacto negativo do contexto sociocultural dos alunos. Como consequência, é fundamental manter a área da educação como alta prioridade social nos países da América Latina para que se reduza a desigualdade social. Outra conclusão do pesquisador é que os acontecimentos intra-escola nos países da América Latina têm uma influência maior do que o que ocorre fora das escolas, motivo pelo qual é relevante ter uma maior compreensão do que acontece neste ambiente para que ocorram adequações que possam potencializar e melhorar as possibilidades das crianças atingidas negativamente pelas condições exteriores à escola.
Partindo das abordagens supracitadas torna-se necessário ressaltar que a descoberta mais importante do livro se refere ao ambiente emocional favorável, que possui peso maior do que todos os outros fatores reunidos.