XXIV Jornada de Física Teórica
MINI-CURSO:
Tópicos Especiais de Dinâmica da Atmosfera
Professor:
Carlos Frederico Mendonça Raupp (IFT-UNESP)
Introdução
Atmosfera: constitui um invólucro fluido em torno do planeta que está em incessante movimento devido, em última instância, ao aquecimento diferenciado pelo sol sobre a Terra;
Escoamento atmosférico: caracterizado por movimentos que
estendem-se desde escalas milimétricas até às escalas comparáveis com o próprio tamanho do planeta movimentos de escala planetária;
Fluidos geofísicos: escoamento é significativamente afetado pela rotação do planeta;
Movimentos na atmosfera: devem ser descritos por um conjunto acoplado de equações que representam as leis da hidrodinâmica e da termodinâmica; Hipótese do Contínuo
Perfil vertical idealizado de temperatura de acordo com a atmosfera padrão. Fonte: Wallace e Hobbs (1977).
MODELO DE ÁGUA-RASA COM ROTAÇÃO
Para os movimentos de grande-escala na atmosfera tem-se que L >> H, sendo L a escala típica de comprimento horizontal dos movimentos e H a escala de altura típica da troposfera;
Para esses movimentos, em primeira aproximação, a equação da
continuidade pode ser escrita como , enquanto a equação do movimento vertical pode ser aproximada pelo balanço hidrostático; Dessa forma, vários “ingredientes dinâmicos” desses movimentos podem ser descritos por um modelo de uma camada de fluido
homogêneo e hidrostático modelo de água-rasa;
v 0Equações de Navier-Stokes para uma camada de fluido homogêneo (densidade constante), hidrostático e sobre a Terra em rotação:
x p f z u w y u x u u t u 1 v v (1a) y p fu z w y x u t 1 v v v v v (1b) g z p (1c) 0 v z w y x u (1d)
Onde V = (u, v, w)T vetor velocidade
p pressão hidrostática; densidade (constante)
Fig. 1: Representação esquemática do modelo de água rasa aplicado à atmosfera. (Fonte: Matsuno, 1966)
Se = const (fluido homogêneo, tomando a derivada em x ou em y da equação hidrostática, tem-se que:
0
x
p
z
0
y
p
z
(1.2)Logo, u e v também não dependem de z.
) ( v ) , 0 , , ( ) , , , ( v 0 0 h H y x u t y x w t h H z y x w dz y x u dz z w h H H h
(1.3) Condições de fronteira: (i) w(x,y,0,t) = 0 (sem topografia)(ii) y h x h u t h dt dh H h z w ) v ( 0 v v v y x u h y x u H y h x h u t h (1.4)
Integrando a equação hidrostática em uma coluna de altura h, tem-se: g z p p g h x x h g x p x h g x p x lim 0 p g h y y h g y p y h g y p y lim 0 (1.5a,b) 0 v v x f y u x u u t u
Substituindo nas equações (1.a,b), obtém-se:
0 v v v v y fu y x u t 0 v v v 2 y x u y x u c y x u t (1.6a) (1.6b) (1.6c) = gh perturbação do geopotencial gH
Simular o efeito da convecção térmica inclusão de uma fonte de
massa F na equação da continuidade (1.6c) pode também representar o efeito do aquecimento associado à liberação de calor latente na
atmosfera: u y u x u u x f t u v v v v v v v y x u y fu t F y x u y x u y x u c t v v v 2 (1.7a) (1.7b) (1.7c)
onde é o coeficiente de dissipação do tipo “Rayleigh” e de resfriamento Newtoniano
Linearizando em relação a um estado básico em repouso: u x f t u v v v y fu t F y x u c t v 2 (1.8a) (1.8b) (1.8c)
onde é o coeficiente de dissipação do tipo “Rayleigh” e de resfriamento Newtoniano
DERIVAÇÃO DO MODELO DE ÁGUA RASA VIA SOLUÇÃO DO MODELO DE EQUAÇÕES PRIMITIVAS POR SEPARAÇÃO DE
VARIÁVEIS
Modelo de equações primitivas linearizado em relação a um estado básico em repouso usando a pressão como coordenada vertical:
0 v u x f t 0 u v y f t 0 v u p y x p C J P R p t (1.9a) (1.9b) (1.9c) (1.9d)
Onde: geopotencial
velocidade vertical em coordenada-p
J termo de aquecimento/resfriamento diabático R constante dos gases para o ar seco
Cp calor específico a pressão constante
Parâmetro de estabilidade estática do estado básico
T = T (p) temperatura do estado básico
dp T d pC T R p R p
Fazendo 1/ / p (1.9d), obtém-se: p J p C R y x u p p t p v 1 (1.10)
Supor inicialmente o caso adiabático, i.e., J 0 (analisar os modos normais do sistema):
0
v
u
x
f
t
0 u v y f t 0 v 1 y x u p p t (1.11a) (1.11b) (1.11c)) 12 . 1 ( ) ( ) , , ( ˆ t) y, (x, vˆ ) , , ( ˆ v G p t y x t y x u u
Fazendo a seguinte separação de variáveis:
0 ˆ vˆ uˆ G x f t 0 ˆ uˆ vˆ G y f t 0 vˆ ˆ 1 ˆ G y x u dp dG dp d t
(1.13a) (1.13b) (1.13c)) 14 . 1 ( 1 vˆ ˆ ˆ 2 c dp dG dp d G y x u t De (1.13c), segue que:
c constante de separação (tem dimensão de velocidade) Logo, a estrutura horizontal é governada por:
0 ˆ vˆ ˆ x f t u 0 ˆ ˆ vˆ y u f t 0 vˆ ˆ ˆ 2 y x u c t (1.15a) (1.15b) (1.15c)
Equação da Estrutura Vertical
De (1.14) segue que a estrutura vertical é governada pela seguinte equação: ) 16 . 1 ( 0 1 1 2 G c dp dG dp d
Supondo como condições de fronteira para o sistema (1.9) = 0 em p = 0 (topo)e em p = p0 (superfície), tais condições são escritas como:
dG / dp = 0 em p = 0 (1.17a)
dG / dp = 0 em p = p0 (1.17b)
A eq. (1.16) com as condições de fronteira (1.17a,b) constitui um problema de Sturm-Liouville.
Supondo ainda que é constante com a pressão, tem-se que (1.16) torna-se: 0 2 2 2 G c dp G d Equação Característica: ) 18 . 1 ( 0 2 2 c Solução Geral: ip c ip c Be Ae p G ) ( (1.20) ) 19 . 1 ( i c
Aplicando a condição de fronteira (1.17a) em p = 0, tem-se que A = B. Aplicando a condição de fronteira (1.17b) em p = p0, tem-se:
0 0 0 i c p p c i e e i c m p c ou p c sin 0 0 0 (1.21) m = 0, 1, 2, 3, ... Logo: 0 p m c m (1.22) Autovalores p c p G m m cos ) ( (1.23) Autofunções
m cm (ms-1) 0 1 40,02 2 20,2 3 13,5 4 10,1
Tabela .11: Autovalores cm da equação da estrutura vertical (1.16) com as condições de fronteira (1.17a,b) para p0 = 1000hPa e = 1,6 x 10-6 m4 s2 Kg-2.
Soluções de Ondas Lineares das Equações da Água Rasa
Vamos considerar caso do plano -equatorial:
f = y (2.1) Onde = 2/a Parâmetro de Rossby
0
v
x
y
t
u
0
v
y
yu
t
0
v
2
y
x
u
c
t
(2.2a) (2.2b) (2.2c)É conveniente transformar as equações para a forma adimensional, utilizando as escalas:
2 1 c L
2 1 1 c T (2.3)Fig. 2.1: Número de unidades de tempo adimensionais por dia (escala da esquerda) ou escala de tempo [T] em dias (escala da direita) como função de c = (gH)1/2. (Fonte: Silva Dias e Schubert, 1979)
Fig. 2.2: Número de unidades de comprimento adimensionais por 1000Km (escala da esquerda) ou escala de comprimento [L] em
quilômetros (escala da direita) como função de c = (gH)1/2. (Fonte: Silva Dias e Schubert, 1979)
Usando c como escala para u e v e c2 = gH como escala de , tem-se: 0 v x y t u 0 v y yu t 0 v y x u t (2.4a) (2.4b) (2.4c) Condições de fronteira: ) , , ( v ) , , ( v x L y t u t y x u x (2.5a)
0
)
,
,
(
v
lim
x
y
t
u
y
(2.5b)Buscando soluções na forma de ondas planas (Ansatz de ondas planas): t i ikx k k k
e
u
u
kv
v
(2.6)0
v
k
k k ku
y
ik
i
0 v k dy d yu i k k k0
dy
v
k
iku
d
i
k
k k (2.7a) (2.7b) (2.7c)Na forma vetorial:
(ikI + k)k = 0 (2.8)
k número de onda zonal k = [uk, vk, k]T autovetor
k freqüência temporal (autovalor)
0
0
0
dy
d
ik
dy
d
y
ik
y
k (2.9)Operador linear (anti-hermitiano)
É possível reduzir o sistema (2.7) a uma única equação diferencial ordinária em vk, dada por
0 vˆ -vˆ 2 2 2 2 2 k k k k y k k dy d
vk 0 quando |y| Solução: ) ( ) ( v 2 k 2 y H e y n y Desde que seja satisfeita a relação de dispersão abaixo:
1 2 - 2 2 k n k k k , n = 0, 1, 2, .... (2.10)
Fig. 2.3: Diagrama de dispersão de algumas ondas lineares permitidas pelo modelo (2.5). (Fonte: Silva Dias e Schubert, 1979).
Fig. 2.4: Diagrama da velocidade de grupo das ondas lineares permitidas pelo modelo (2.5). (Fonte: Silva Dias e Schubert, 1979).
As autofunções são dadas por:
2 y 1 n r n, k, 1 n r n, k, n 2 2 r n, k, 1 n r n, k, 1 n r n, k, r n, k, 2 e (y) k)H in(ω (y) k)H (ω 2 i (y) H k ω (y) k)H in(ω (y) k)H (ω 2 i (y) ξ (2.11) Para n > 0 2 y 0 0 1,3 k, 2e
(y)
H
0
(y)
H
(y)
ξ
(2.12) Para n = -1 (Kelvin)Estas autofunções formam um conjunto ortogonal e completo no espaço das funções de quadrado integrável em (-, + ).
Fig. 2.5: Estrutura espacial dos campos do vento e do geopotencial associada às ondas de Rossby para n = 1. (Adaptado de Raupp, 2002.)
Fig. 2.6: Estrutura espacial dos campos do vento e do geopotencial associada às ondas de gravidade-inerciais para n = 1. (Adaptado de Raupp, 2002.)
Fig. 2.7: Estrutura espacial dos campos do vento e do geopotencial associada às ondas mistas de Rossby-gravidade (n = 0). (Adaptado de Raupp, 2002.)
Fig. 2.8: Estrutura espacial dos campos do vento e do geopotencial associada à onda de Kelvin (n = -1). (Adaptado de Raupp, 2002.)
Solução Geral das Equações da Água Rasa Através do Método Espectral
Modelo de equações primitivas forçado por um perfil de aquecimento diabático dado por J(x,y,p,t).
u x y t v u v u v y y t p p p J p c y x u p p t p 1 v 1 (3.1a) (3.1b) (3.1c)
coeficiente de dissipação de momento e de resfriamento Newtoniano.
Dado que a equação da estrutura vertical (1.16), com C.F. (1.17a,b) constitui um problema de Sturm-Liouville:
J j j j x y t G p u t p y x u 1 ) ( ) , , ( ) , , , (
J j j j x y t G p t p y x 1 ) ( ) , , ( v ) , , , ( v
J j j j x y t G p t p y x 1 ) ( ) , , ( ) , , , (
J j j j x y t G p p J p 1 ) ( ) , , ( q (3.2)Onde os coeficientes de expansão são dados por:
0 0 ) ( ) , , , ( ) , , ( p j x y t u x y p t G p dp u
0 0 ) ( ) , , , ( v ) , , ( v p j x y t x y p t G p dp
0 0 ) ( ) , , , ( ) , , ( p j x y t x y p t G p dp
0 0 ) ( ) , , ( p j G p dp p J p t y x q (3.3)Substituindo (3.2) em (3.1), multiplicando as equações resultantes por Gm(p), usando a equação da estrutura vertical (1.16) para cada um dos modos verticais, integrando as equações resultantes no intervalo [0,p0] e usando a ortogonalidade das autofunções Gj(p) obtém-se:
j j j
u
x
y
t
u
jv
j jv
v
y
yu
t
j j
j j
j j j j q c y x u c t
2 v j 2 (3.4a) (3.4b) (3.4c) F t
Escrevendo na forma adimensional, usando as mesmas escalas usadas anteriormente:
(3.5) Onde = [u(x,y,t), v(x,y,t), (x,y,t)]T
0 0 0 y x y y x y (3.6) F = [0, 0, F]T com F = q (c5)-1/2 (3.7)
Dado que as autofunções k,n,r(y) formam um conjunto ortogonal e
completo em (-<y<)e que as funções trigonométricas complexas eikx formam um conjunto ortogonal e completo no intervalo [-Lx,Lx]:
k n r ikx r n k r n k t y e g t y x G 1 3 1 , , , , ( ) ( ) ) , , ( (3.8)gk,n,r(t) = < Gk(y,t) k,n,r(y)> (3.9) , onde
g y t u y g y t y g y t u y g y t y
dy y t y Gk knr
k knr k knr k knr k knr ( ) ( , ) ( ) ( , )v ( ) ( , ) ( ) ( , ) ( ) ) , ( , , 1 *, , 2 , , 1 *, , 3 *, , (3.10)
x x L L ikx x k G x y t e dx L t y G ( , ) 1 ( , , ) (3.11)(x,y,t) = ck,n,r(t) k,n,r(y)eikx k n 1r 3 1
F(x,y,t) = fk,n,r(t) k,n,r(y)eikx k n 1r 3 1
Dessa forma, as variáveis de estado e a forçante podem ser expressas por suas respectivas expansões em série:
(3.12)
Substituindo a equação (3.12) em (3.5), multiplicando escalarmente por *s,m,l(y)e-isx , integrando a expressão obtida no domínio todo e usando a relação (2.8) e a ortogonalidade das autofunções k,n,r(y)eikx no domínio [-Lx,Lx] X (-<y<): ) ( ) ( ) ( ) ( , , , , , , , , , , t c t f t c i dt t dc r n k r n k r n k r n k r n k (3.13) para cada k, n, r.
A solução geral é dada por:
ds
e
s
f
e
c
t
c
i s t t r n k t i r n k r n k r n k r n k ( )( ) 0 , , ) ( , , , , , , , ,)
(
)
0
(
)
(
Previsão de tempo Previsão climática
1
] [ ) 0 ( ) ( ( ) , , , , , , , , , , , , t i r n k r n k r n k r n k r n k t r n k i e i f e c t c No caso de uma forçante estacionária, a solução é dada por:
(3.14)
Para = 0, ocorre ressonância com os modos geostróficos zonalmente simétricos (k = 0 e = 0): 1 , , 0 n,1 k, t iω n,1 k, 0 1 , , 0
iω
)
e
(1
f
lim
)
(
n,1 k, 1 , , n nt
tf
c
n k
(3.16a) 3 , 1 , 0 k,-1,3 t iω k,-1,3 0 3 , 1 , 0iω
)
e
(1
f
lim
)
(
k,-1,3 3 , 1 ,
tf
t
c
k (3.16b)Um dos mecanismos que mantém a circulação média zonal da atmosfera
t r n k r n k
t
f
t
e
f
, ,(
)
ˆ
, ,
3 2 No caso de uma forçante explosiva, i.e., cresce inicialmente, atinge um máximo e passa a decrescer com o tempo
(3.17)
A solução é dada, na ausência de dissipação (=0), por:
k nr i k n r k n r i t r n k r n k r n k r n k e t i t i e f i t c , , 2 2 , , , , , , , , , , 3 , , 2 1 1 1 ˆ ) ( (3.18)Referências
MAJDA, A. J. Introduction to PDEs and Waves for the Atmosphere and Ocean. Volume 9. American Mathematical Society, 2003. ISBN: 0-8218-2954-8.
HOLTON, J. An introduction to dynamic meteorology. 4th Edition. Elsevier Academic Press, 2004.
A. E. GILL. Atmosphere-Ocean Dynamics. Volume 30. International Geophysics Series. Editora: Academic Press (1982). ISBN: 0-12-283520-4
J. PEDLOSKY. Geophysical Fluid Dynamics – Second Edition. Editora: Springer. ISBN: 0-387-96387-1. ISBN: 3-540-96387-1.
LEMES, M. A. M.; A. D. MOURA. Fundamentos de dinâmica aplicados à
Meteorologia e Oceanografia. 2ª Edição. Holos Editora Ltda-ME, 2002. ISBN: 85-86699-33-0.
HALTINER, G. J.; R. T. WILLIAMS. Numerical prediction and dynamic meteorology. Second Edition, 1980. Editora: Wiley. ISBN: 0471059714, 477 pp.
SILVA DIAS, P.L.; W. H. SCHUBERT. The dynamics of equatorial mass-flow adjustment. Atmospheric Science Paper No. 312 (Department of Atmospheric Science Colorado State University), Fort Collins, Colorado, USA, 1979.
RAUPP, C. F. M. (2002). Efeitos de processos não lineares na influência
inter-hemisférica de fontes de calor. São Paulo, 2002. p. [Dissertação de Mestrado. Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas/Universidade de São Paulo].
MATSUNO, T. Quasi-geostrophic motions in the equatorial area. J. Meteor. Soc. Japan, 44, 25-43, 1966.
John M. Wallace & Peter V. Hobbs. Atmospheric Science. First Edition: An Introductory Survey, Editora: Academic Press, 1a edição (1977)