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A proteção jurídica das águas

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Academic year: 2021

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UNIJUI - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

VITOR HUGO ROYER

A PROTEÇÃO JURÍDICA DAS ÁGUAS

Três Passos (RS) 2016

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VITOR HUGO ROYER

A PROTEÇÃO JURÍDICA DAS ÁGUAS

Monografia final do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Monografia.

UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais

Orientador: Dr. Daniel Rubens Cenci

Três Passos (RS) 2016

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Dedico este trabalho aos meus pais e esposa, que me deram ensinamentos, educação e apoio para que conseguisse chegar à universidade e concluir esse trabalho.

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AGRADECIMENTOS

Ao meu orientador pelo apoio na elaboração deste trabalho.

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“A água é a seiva do nosso planeta. Ela é a condição essencial de vida de todo ser vegetal, animal ou humano. Sem ela não poderíamos conceber como são a atmosfera, o clima, a vegetação, a cultura ou a agricultura.”

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso trata da importância da água e a análise do direito como ferramenta de proteção desse recurso natural através da Política Nacional de Recursos Hídricos. Muitas pessoas acreditam que somente os recursos naturais não renováveis podem acabar, mas atualmente mais de um quarto da população mundial não tem acesso à água potável. Inicialmente aborda o conceito de água e a sua importância para a vida no planeta e também para o desenvolvimento econômico. A seguir aborda a atual crise hídrica que se instala no planeta, enquanto em alguns países a água ainda não falta, em outros, milhões de pessoas não tem a quantidade mínima de água para satisfazer necessidades básicas. A pesquisa também aborda os aspectos jurídicos através da análise da evolução da legislação de proteção da água como recurso ambiental desde o descobrimento do Brasil até os dias atuais. Nesse momento o trabalho entra na pesquisa da Política Nacional de Recursos Hídricos que criou um modelo de gestão que institucionaliza os comitês de bacia hidrográfica, as agências de água e ainda os conselhos nacional e estaduais de recursos hídricos, nos quais se prevê a participação efetiva dos diversos usuários de água, do poder público e da sociedade civil de uma bacia hidrográfica no processo decisório. Por fim, a pesquisa passa a analisar o funcionamento desses instrumentos previstos na Política Nacional de Recursos Hídricos, onde observamos a arrecadação de recursos da cobrança pelo uso da água e seu investimento na bacia. Conclui-se com a pesquisa que até então tem se conseguido melhorar muito os índices de coleta e tratamento de esgoto, reflexo de investimento no setor. Mas ainda temos que avançar nos aspectos da qualidade e disponibilidade da água, ampliando a cobrança no país, reajustando o valor cobrado pelo uso da água, e melhorando o fluxo de repasse de recursos para as agencias de água.

Palavras chave: Proteção Jurídica da Água. Crise da Água. Política Nacional de Recursos Hídricos. Cobrança pelo Uso da Água.

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ABSTRACT

The present work of conclusion of course deals with the importance of water and the analysis of the right as a tool of protection of this natural resource through the National Policy of Water Resources. Many people believe that only nonrenewable natural resources can end, but currently more than a quarter of the world's population does not have access to safe water. Initially it addresses the concept of water and its importance for life on the planet and also for economic development. The next is the current water crisis that is set in the planet, while in some countries water is not lacking, in others, millions of people do not have the minimum amount of water to meet basic needs. The research also addresses legal aspects by analyzing the evolution of water protection legislation as an environmental resource from the discovery of Brazil to the present day. At that moment, the work is part of a research on the National Water Resources Policy that created a management model that institutionalizes river basin committees, water agencies, and national and state water councils, in which effective participation of various water, public and civil society users of a river basin in the decision-making process. Finally, the research starts to analyze the functioning of these instruments foreseen in the National Policy of Water Resources, where we observe the collection of resources from the collection for the use of water and its investment in the basin. It concludes with the research that until then has been able to greatly improve the rates of collection and treatment of sewage, reflection of investment in the sector. But we still have to make progress in the aspects of water quality and availability, increasing collection in the country, readjusting the amount charged for water use, and improving the flow of resources to water agencies.

Keywords: Legal Protection of Water. Water Crisis. National Policy on Water Resources. Charge for the use of water.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...09

1 ASPECTOS SOCIOAMBIENTAIS E IMPACTOS NA ÁGUA...11

1.1 Importância da Água...11

1.2 Crise da Água...13

1.3 Causas da Crise da Água...15

1.3.1 Aumento da População Mundial...16

1.3.2 Poluição...17

1.3.3 Desperdício...19

2 ASPECTOS JURÍDICOS E DE GESTÃO DAS ÁGUAS...21

2.1 A evolução Histórica da Legislação...21

2.2 Da Política Nacional de Recursos Hídricos...24

2.2.1 Fundamentos...25

2.2.2 Objetivos...28

2.2.3 Instrumentos...29

2.3 O Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos...35

2.3.1 O Conselho Nacional de Recursos Hídricos – CNRH...36

2.3.2 A Agência Nacional de Águas...37

2.3.3 Os Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos...38

2.3.4 Os Comitês de Bacia Hidrográfica...38

2.3.5 As Agências de Água...38

3 SITUAÇÃO DA COBRANÇA PELO USO DE RECURSOS HÍDRICOS NO PAÍS...40

3.1 Locais onde a Cobrança foi Implementada...40

3.2 Situação Atual dos Recursos Hídricos ...43

3.2.1 Situação nas Bacias PCJ...43

3.2.2 Avaliação da Implementação da Cobrança pelo uso de Recursos Hídricos de Domínio da União na Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul...45

3.2.3. Situação do Desembolso dos Recursos Arrecadados...48

CONCLUSÃO...51

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho trata da importância da água e da crise de disponibilidade e qualidade da mesma, fazendo uma análise do direito como possível ferramenta de proteção desse recurso natural através da Política Nacional de Recursos Hídricos. A presente pesquisa é de cunho bibliográfico e tem como método a analise de informações obtidas em livros de diversos autores dentre eles Wellington Pacheco Barros, Eduardo Coral Viegas e Édis Milaré. A pesquisa também se utiliza de dados obtidos nos sites das Agências de Água que são os braços executivos das bacias hidrográficas, fazendo uma analise qualitativa dos resultados.

Muito recentemente, todo país acompanhou a seca histórica que atingiu a região metropolitana de São Paulo. O nível da água do Sistema Cantareira, formado por cinco represas que abastecem nove milhões de pessoas, chegou ao menor nível de sua história. Quando a situação começava a ficar desesperadora, as chuvas vieram e começaram a melhorar os níveis dos reservatórios. Sabemos que a natureza é cíclica no que diz respeito ao clima, mas o crescimento descontrolado da população, poluição, consumo e desperdício excessivo de água têm colaborado em muito para os problemas na disponibilidade e qualidade da água.

Nesse sentido, a discussão sobre a água ganha a cada dia mais importância, principalmente na esfera do Direito, onde podemos e devemos encontrar ferramentas para inicialmente, reconhecendo que a água é finita, garantirmos esse recurso natural tão essencial para toda e qualquer vida no planeta para as presentes e futuras gerações. É nesse aspecto do Direito como ferramenta de proteção da água, que se apoia o principal pilar do presente trabalho, pois como bem nos lembra Cristiane Derani, a tarefa do Direito no ramo do direito ambiental é fazer com que as normas jurídicas possam orientar as ações humanas,

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influenciando seu conteúdo, no sentido de um relacionamento consequente com o meio ambiente.

No primeiro capítulo a pesquisa aborda o conceito de água e a sua importância para a vida no planeta e também para o desenvolvimento econômico. Em seguida visualizamos a crise hídrica que se instala no planeta, enquanto em alguns países a água ainda não falta, em outros, milhões de pessoas não tem a quantidade mínima de água para satisfazer necessidades básicas. No segundo capítulo aborda os aspectos jurídicos através da análise da evolução da legislação de proteção da água desde o descobrimento do Brasil até os dias atuais, chegando na Lei das Águas, lei 9.433 de 1997 que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos. A Lei cria um novo modelo de gestão que institucionaliza os Comitês de Bacia Hidrográfica, as Agências de Água e ainda os Conselhos Nacional e Estaduais de Recursos Hídricos. A lei fomenta a participação efetiva dos diversos usuários das águas, do Poder Público e da sociedade civil de uma bacia hidrográfica no processo decisório, e cria ferramentas importantes como a outorga dos direitos de uso e a cobrança pelo uso de recursos hídricos. A cobrança pelo uso da água objetiva incentivar o uso racional e se torna essencial para, com os recursos arrecadados, recuperar as bacias hidrográficas e consequentemente a qualidade e disponibilidade de água.

Por fim, no terceiro capítulo a pesquisa passa a analisar o funcionamento desses instrumentos previstos na Política Nacional de Recursos Hídricos, onde observamos a arrecadação de recursos advindos da cobrança pelo uso da água e seu investimento nas bacias hidrográficas na intenção de recuperar a qualidade e disponibilidade de água nas mesmas.

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1 ASPECTOS SOCIOAMBIENTAIS E IMPACTOS NA ÁGUA

Nas ultimas décadas o mundo vem enfrentando muitas transformações, mas dentre as mais importantes estão com certeza às relacionadas ao meio ambiente e disponibilidade de água. No Brasil enfrentamos recentemente problemas sérios no tocante a água, como a grave seca no estado de São Paulo no ano de 2014 e o rompimento de uma barragem de rejeitos de mineração em Minas Gerais no ano passado, considerado o maior desastre socioambiental da história brasileira. Desse modo se torna preocupante a situação da água, e de extrema importância discutirmos esse assunto. Assim, neste capítulo abordaremos a importância da água, a atual crise que a envolve no planeta, e as suas possíveis causas.

1.1 A importância da água

O que nos vem à cabeça quando se fala em Água? Talvez para a maioria de nós o líquido incolor, inodoro e sem sabor que sacia a nossa sede, ou sua fórmula química de dois átomos de Hidrogênio ligados a um átomo de Oxigênio, H2O, mas ela é muito mais. A água é elemento essencial para a vida humana, e para qualquer tipo de vida no planeta.

Sobre a importância da água para os organismos, nas suas funções biológicas e químicas nos diz Milaré (2000, p. 126):

[...] ela participa com elevado potencial na composição dos organismos e dos seres vivos em geral, e suas funções biológicas e bioquímicas são essenciais, pelo que se diz simbolicamente que a água é elemento constitutivo da vida. Dentro do ecossistema planetário, seu papel junto aos biomas é múltiplo, seja como integrante da cadeia alimentar e de processos biológicos, seja como condicionantes dos diferentes habitats.

A água está presente em muitas atividades do ser humano, desde o abastecimento doméstico e público, até a indústria, agricultura e geração de energia elétrica. No mesmo sentido expõe Viegas ( 2005, p. 24):

[...] a água compartilha dos processos ecológicos essenciais, como o da fotossíntese, o da quimiossíntese e o da respiração. Funciona como hábitat e nicho ecológico de inúmeros organismos e espécies animais e vegetais. Ou seja, a permanência da vida na Terra - tida como “Planeta Água”, porquanto 70% da superfície de nosso planeta é coberta pelo líquido – está intrinsecamente ligada à disponibilidade de recursos hídricos em qualidade e

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quantidade suficientes à satisfação das necessidades básicas dos seres vivos que nela habitam.

Apesar de a superfície do nosso planeta ser formada por cerca de 70% de água, a grande maioria dela está nos oceanos e até o presente momento não há formas economicamente viáveis para consumi-la. Como nos lembra Wellington P. Barros (2005), apenas 3% da água do planeta é doce, ou seja, própria para o consumo humano. De toda a água doce do planeta, estimasse que 77% se encontra em forma de gelo nas calotas polares, e só a pequena parte restante esteja disponível em rios e lagos.

A água pode ser encontrada no planeta nos estados físicos sólido, gasoso, e líquido, e segundo Amorim (2009), sendo estes também os três estágios da água no chamado ciclo hidrológico, princípio unificador de todos os processos naturais referentes à água em nosso planeta. Tundisi (apud AMORIM, 2009, p. 45), expõe sobre o ciclo hidrológico:

O ciclo hidrológico é movido pela radiação solar – que promove a evaporação – e pelos ventos, que transportam o vapor d’água. Sua velocidade varia de uma era geológica para a outra como também a proporção total de águas doces e águas oceânicas nele envolvidas, o que tem influenciado a história da vida no planeta e condicionado a ocorrência, surgimento e viabilidade desta ao ciclo hidrológico. De maneira bastante resumida, o ciclo hidrológico opera da seguinte forma: através da evaporação dos mais diversos tipos de reservatórios de água (rios, lagos artificiais ou naturais, mares), a água, então em seu estado gasoso, sobe à atmosfera, onde se junta àquela proveniente da transpiração de animais e vegetais e condensa-se na forma de nuvens, sofrendo a influência dos ventos e da pressão atmosférica; sob esta influência, a água retorna à superfície do planeta, precipitada sob o efeito de chuva ou neve, onde volta a se integrar, diretamente ou através de percolação ou do consumo de animais e vegetais, às fontes de onde evaporou.

Além de ser indispensável para a manutenção básica de nossos organismos e ecossistemas, a água também é vital para os empreendimentos da vida do ser humano em sociedade. Em nossas casas, além de usar a água para beber, sem ela não conseguimos realizar tarefas simples como lavar as mãos, cozinhar, tomar banho, fazer nossas necessidades fisiologias, lavar a roupa e a louça, limpar a casa, e etc. Também a água é essencial no abastecimento público, como em hospitais, escolas, comércio, irrigação de parques e praças dentre outros.

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Importante também o papel da água na agricultura, com a irrigação, matar a sede dos animais na pecuária, geração de energia elétrica e nos processos industriais. Assim a água também alavanca o desenvolvimento, como nos lembra Amorim (2009, p. 41):

A água sempre foi ponto de intercessão comum entre todas as civilizações. E não somente pela sua importância biológica, mas por ser pedra de torque do desenvolvimento cultural, agrícola, militar e religioso das diversas

civilizações que habitaram e habitam o planeta, desde as mais remotas eras.

Por fim, é fácil percebermos que a água possui varias utilidades e valores, mas mesmo todos nós sabendo de sua vital importância, ela ainda vem passando por uma crise em todo o mundo, e é isso que veremos a seguir.

1.2 Crise da água

Pessoas que vivem em regiões onde a quantidade de água é abundante, que ela esta disponível na torneira, limpa e potável, a um custo irrisório, talvez não percebam ou se importem com a atual crise hídrica que se passa em grande parte do planeta. Nos países ricos, basta girar uma torneira para ter água potável e instalações sanitárias privadas e higiênicas. As crianças não morrem por falta de um copo de água potável e doenças transmitidas pela água só fazem parte de livros de história, não de enfermarias de hospital.

Mas nos países pobres a situação é bem diferente, segundo o Relatório de Desenvolvimento Humano de 2006, publicado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, cerca de 1,1 mil milhões de pessoas nos países em desenvolvimento não têm acesso a uma quantidade mínima de água potável. Se as necessidades básicas variam, o limite mínimo é de cerca de 20 litros por dia. A maioria dos 1,1 mil milhões de pessoas sem acesso a água potável utiliza cerca de 5 litros por dia. Em média, na Europa as pessoas utilizam mais de 200 litros, e nos Estados Unidos mais de 400 litros. Quando um europeu puxa o autoclismo ou quando um americano toma banho utiliza mais água da que é disponibilizada a centenas de milhões de indivíduos que vivem em bairros degradados ou zonas áridas do mundo em desenvolvimento.

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A necessidade por água vem aumentando rapidamente, em países como o Brasil onde a água é abundante não damos a sua devida importância, mas quase metade da população do planeta não tem acesso à água limpa, como nos explica Amorim (2009, p. 125):

A demanda mundial por água dobra a cada 21 anos. Aproximadamente, 40% da população mundial não possui acesso à água limpa e 230 milhões de pessoas vivem em área de escassez hídrica. Mais de dois bilhões de pessoas não possuem saneamento básico adequado e a cada hora mais de 600 pessoas morrem por causa de água contaminada, imprópria para o consumo ou inexistente.

Os dados revelam previsões alarmantes sobre crise no abastecimento de água dentro de poucos anos, com projeção de 7% da população do planeta enfrentando escassez de água em 2025, como nos mostra Barros ( 2005, p. 41);

[...] prevê que haverá crise de abastecimento, e estima que no ano 2000, 3% dos habitantes da terra (6 bilhões) já se ressentiam da falta d’água potável, e, ainda, em projeção feita para 2025, com uma população de 7,82 bilhões, a escassez da água atingirá o percentual de 7%, com 62% de risco.

O Brasil é rico em disponibilidade de água, mas em muitos países a situação é bem crítica, como na Arábia Saudita e Emirados Árabes onde até processos de dessalinização de água do mar são utilizados. Sobre a aparente riqueza de água no Brasil nos lembra Barros (2015, p. 14):

Todavia, a riqueza de água é apenas aparente, pois onde a população é mais escassa, como na região da Amazônia, ela é abundante, enquanto no litoral, nas regiões Sudeste e Nordeste, que detêm 70% da população, já se enfrenta dificuldade de abastecimento, circunstância agravada com a previsível mudança de clima (aquecimento global) gerado pela crescente emissão de dióxido de carbono (CO²) e de outros gases de efeito estufa pela queima de combustíveis ou por outras atividades, fazendo com que a atmosfera terrestre retenha mais calor do Sol perto da superfície, aumentando a temperatura das massas de ar acima dela e com isso alternando o sistema de ventos e tempestades, possibilitando as estiagens mais frequentes em algumas regiões e inundações em outras.

Além de situações de indisponibilidade de água, o consumo de água de baixa qualidade também pode gerar muitos problemas, muitas pessoas morrem em decorrência desse problema como nos lembra Sirvinskas (2011, p. 301) sobre a conferência Internacional

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A conferência Internacional sobre Água e Desenvolvimento Sustentável, realizada em Paris, em 1998, constatou que um quarto da população mundial não tem acesso a água potável, mais de 50% da população mundial carece de saneamento básico (esgoto) e a baixa qualidade da água e a falta de higiene figuram entre as causas de enfermidade e morte. Calcula-se que 33% dos óbitos são causados por problemas atinentes à qualidade dos recursos hídricos, nos países em desenvolvimento.

Devido a água ser tão elementar para nosso organismo, ela está diretamente ligada com a nossa saúde. Nesse sentido, segundo o Relatório de Desenvolvimento Humano de 2006, publicado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, o não acesso a água potável e saneamento gera anualmente 5 bilhões de casos de diarréia nos países em desenvolvimento. A diarréia tira, anualmente, a vida de 1,8 milhão de crianças menores de 5 anos, é a segunda principal causa de morte na infância só atrás de infecções respiratórias.

Nos últimos anos temos presenciado vários surtos epidêmicos de dengue espalhados pelo país, e se não bastasse os graves sintomas e risco para nossa vida, pesquisas comprovaram a ligação do vírus em mulheres gestantes ao desencadeamento de microcefalia em seus bebes. Todos estes problemas de saúde também têm relação com a água como nos lembra Milaré (2011, p. 264):

As patologias ligadas à água, no caso da saúde humana, representam a impressionante maioria de 80% das doenças que se instalaram no mundo. São as conhecidas doenças de veiculação hídrica. Tal periculosidade não é exclusiva da água ingerida, O elemento hídrico, em outro contexto, aninha mosquitos, vetores ou transmissores, responsáveis por endemias e epidemias, onde ocorrem águas paradas e enchentes, particularmente em regiões tropicais e subtropicais. Este é, por exemplo, o caso da dengue que, infelizmente, tem evoluído para surtos epidêmicos.

Após entendermos a importância da água em nossas vidas e como a disponibilidade e qualidade da mesma se encontram em situação delicada, passaremos a analisar no próximo tópico as causas da crise da água.

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1.3 Causas da crise da água

Inúmeras são as razões que levaram o mundo ao estágio atual da crise que enfrenta pela escassez de recursos hídricos, segundo Viegas (2005), ao lado da escassez natural e histórica da água em determinadas regiões, existe também aquele provocada pela ação do homem como o desperdício, poluição, aumento da população, como vamos passar a verificar agora.

1.3.1 Aumento da população mundial

A população de seres humanos que habitam o planeta vem crescendo muito, tanto que nos últimos 50 anos, o número de habitantes no mundo mais que duplicou, “passando de 2 bilhões e 500 mil em 1950 e atingindo 7 bilhões em 2011.” (População). Antigamente quando a população era relativamente pequena á disponibilidade de água não chegava a ser um problema, mas isso vem mudando, como nos lembra Barros (2005, p. 40):

A situação de escassez de água no mundo é resultado do uso desordenado desse recurso durante várias gerações. Esse desordenamento passou desapercebido enquanto a população do planeta era relativamente pequena e distribuída em diversas áreas.

No momento em que se inicia no mundo um novo modelo de desenvolvimento com bases antiecológicas, que visa a natureza apenas como fonte geradora de recursos econômicos, vemos o inicio da crise, segundo nos mostra Weissheimer (Apud BARROS, 2005, p.41):

Demarca-se a Revolução Industrial como ponto de partida da crise ambiental. Ocorrida nos fins do Século XVIII, proporcionou a criação se sistemas econômicos gerados em bases nitidamente antiecológicas, quando a natureza passou a ser vista apenas como fonte geradora de recursos.

Se levarmos em consideração todo século passado, observamos a população mundial triplicar, e com o novo modelo de desenvolvimento econômico aumenta também a produção industrial e produção de alimentos, pressionando ainda mais o meio ambiente, como nos explica Victorino (2007, p. 17):

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O problema está no aumento da população mundial. Só no século passado este aumento triplicou o que ocasionou o aumento de fábricas, mais desperdício e mais irrigação nas lavouras. De acordo com o Banco Mundial, cerca de 80 países enfrentam hoje problemas de abastecimento. A situação mais crítica está na Ásia onde, 60% da população vive com apenas 32% da água doce disponível. O crescimento da população mundial e da produção, associado ao consumo insustentável, impõe pressões cada vez mais intensas sobre o meio ambiente.

São inúmeras as necessidades exigidas por um sistema econômico em pleno crescimento, os recursos hídricos são uma das principais. Assim o demasiado crescimento populacional multiplica o consumo de água e poluição desta, como nos explica Viegas (2005, p. 32):

Na medida em que um maior número de pessoas passa a consumir água, e ainda aumenta a poluição dos recursos hídricos, é inevitável que a escassez se ampliará. Estima-se, por isso, que, neste século, a água potável terá a mesma importância – dada a incidência da lei da oferta e da procura – que o petróleo teve no Século XX, e, o que é pior, a elevados custos, tornando-se algo de uso elementar e indispensável em produto elitizado, que estará ao alcance de poucos, os quais, por incoerência do sistema, terão sido os maiores causadores dessa situação, posto que os detentores do capital são os proprietários das indústrias poluidoras, das embarcações que geram derramamentos de óleo, etc.

Assim, como visualizado, figura o aumento populacional como uma das principais causas da escassez e poluição das águas no planeta, podendo transformar esse recurso natural em alvo de cobiça como foi considerado o petróleo no século passado.

1.3.2 Poluição

Como já lemos anteriormente a água é essencial para qualquer tipo de vida no planeta. Mas não basta a disponibilidade de água, se não for possível consumi-la. Deste modo, a qualidade da água é determinante para sua utilização mesmo nas necessidades mais básicas dos seres vivos, e a poluição desta, limita muito seu uso, como explica Grassi (2004):

Como o estado físico e a qualidade são determinantes da possibilidade de aproveitamento para cada uso (por exemplo, para o abastecimento humano ou para balneabilidade a condição qualitativa é bastante restritiva), não basta ter água disponível, em determinado lugar, em grande quantidade: é preciso que tenha a qualidade compatível com os usos que se quer. Pode-se ter,

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portanto, a escassez produzida pela falta de qualidade adequada a determinados usos.

Como sabemos, a revolução industrial que teve inicio na Grã-Bretanha em meados do século XVIII, se estendeu ao resto do mundo no inicio do século XIX e gerou um aumento na produção de muitas coisas. Esse aumento de produção gerou um crescimento desordenado do consumo de recursos hídricos, e no Brasil, assim como em outros países, o reflexo dessa revolução também chegou. Atualmente, a maioria dos rios que cruzam grandes cidades está poluída por lançamento de resíduos como nos expõe Viegas (2005, p. 27):

Inegavelmente a poluição ambiental é o principal fator da crise da água, na medida em que, ao longo da história de desenvolvimento dos povos, e sobretudo a partir da Revolução Industrial, a preocupação da humanidade centrou-se fundamentalmente na produção, sem maiores cuidados com a preservação do meio ambiente e, consequentemente, de seus recursos. Tanto é assim que, nos dias de hoje, a maioria dos principais rios que banham cidades importantes, independentemente do continente onde se situem, é considerada tecnicamente poluída, o que decorre, além de outros motivos, da falta de saneamento básico, do lançamento dos resíduos industriais diretamente nas águas correntes, do despejo nestas também de produtos tóxicos utilizados na agricultura.

O destino dos esgotos domésticos e industrial é um problema sério no Brasil, como nos lembra Milaré (2011, p. 262), “jogamos sistematicamente, há décadas, cerca de 90% de nosso esgoto doméstico e cerca de 70% das descargas industriais nos rios, lagos e represas, contaminando o solo, a água de superfície e as águas subterrâneas.” Paremos para pensar, para onde vai todo o esgoto de nossas casas, ou para fossas, ou para a rede de esgoto na rua, que se direciona, na esmagadora maioria dos casos, para os rios. Nesse sentido Victorino (2007, p. 22) nos fala:

A impressão que se tem é de que em todos os lugares as águas superficiais estão sendo poluídas com uma variedade assustadora de resíduos urbanos, industriais e agrícolas. Mesmo em países industrializados, onde vigora a legislação sobre a qualidade da água, a poluição ainda é um problema que incomoda. Nos Estados Unidos, descobriu-se que 60% dos lagos pesquisados estão poluídos por nutrientes de fertilizantes e dejetos animais, o que vem causar a morte quase que maciça de peixes, além da degradação da qualidade da água. No Canadá, 20 mil lagos são atingidos por chuvas ácidas.

Infelizmente, a consciência da população a esse respeito é baixa. Por esse motivo nossos governantes investem muito pouco em captação e tratamento de esgoto. Essa coleta e

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tratamento demandam grandes investimentos que não são visíveis aos nossos olhos, o que por sua vez retroalimenta esse circulo vicioso de a população não cobrar e os governantes não investirem. Ainda sobre a poluição por esgoto urbano, nos explica Barros (2015, p. 38):

No Brasil, um dos maiores problemas ambientais é a poluição por esgotos. O censo do INGE revela que cerca de um quarto das residências do país não conta com serviço de água potável e quase metade não tem serviço de esgoto. A ausência deste saneamento básico é a causa de 80% das doenças e de 65% das internações hospitalares, e, segundo dados do Sistema Único de Saúde, a cada R$ 1,00 investido em saneamento, as cidades economizariam R$ 5,00 em medicina curativa da rede de hospitais e ambulatórios públicos.

Outro grande poluidor das águas é a agricultura. A agricultura é muito importante para produção de alimentos a nível mundial, mas se por um lado produz alimentos, também contamina as águas, como nos explica Barros (2015, p. 38):

A agricultura contamina a água com fertilizantes, inseticidas, fungicidas, herbicidas e nitratos que são carregados pela chuva ou infiltrados no solo, contaminando os mananciais subterrâneos e os lençóis freáticos. A água da chuva se contamina com a poluição constante no ar, como, por exemplo, arsênico, chumbo, entre outros.

Nesse sentido, visualiza-se que mesmo o ser humano tendo criado tanta tecnologia ainda continua cometendo erros primários ao descartar grande parte dos esgotos domésticos e indústrias em rios que são fontes de água, recurso tão importante para sua sobrevivência. Assim a poluição dos recursos hídricos figura como mais uma causa agravante para a escassez de água potável.

1.3.3 Desperdício

Além do crescimento populacional que traz um aumento natural na demanda de água, e por consequência sua maior poluição, também vemos o desperdício dos poucos recursos hídricos ainda disponíveis e com qualidade. Assim nos lembra Viegas (2005, p. 33):

Alguns exemplos do cotidiano das pessoas mostram que a soma de pequenas – ou de grandes – perdas d’água contribuem substancialmente para o implemento da já referida crise. Assim ocorre quando se lava a calçada com a mangueira, em vez de se fazer uso de menores quantidades de água limpado-se o chão com o auxilio de vassoura; escovam-se os dentes ou faz-se a barba com água corrente; vala-faz-se o carro com a mangueira faz-sempre aberta, quando se poderia utilizar um balde e fechar a torneira durante a

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esfregação do veículo; tomam-se banhos demorados; regam-se plantas em horário impróprio, com consumo de água muito superior ao necessário, porquanto é sabido que, no começo da manha e no entardecer, o aproveitamento da irrigação é superior pelos vegetais, pois há menos evaporação; não se percebe ou deixa-se de tomar providencias diante de vazamentos contínuos; dentro outros.

Muita água também é desperdiçada nas redes de distribuição, ou seja, a água limpa que já passou por todo processo de bombeamento e tratamento se perde nos canos entre a distribuidora de água e as casas dos consumidores. Segundo Matar (2013):

Em média, 37% da água tratada é perdida – um a cada três litros. Isso significa que, se não houvesse essas perdas, o brasileiro médio, que vive 73,5 anos, poderia viver até os 100 sem necessidade de aumentar o volume de água tratada. E, portando, sem necessidade de investimentos em estações de tratamento de água. Bastaria que as concessionárias de água cuidassem de suas redes.

São Paulo e a sua região metropolitana foram afetadas pela seca no ano de 2015, mas mesmo assim, no mês de janeiro, foram registrados altos índices de consumo. De acordo com a Sabesp, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo, 23% dos clientes tiveram a média de consumo acima do normal, a aplicação de multas foi de 14%, o mais alto desde que a cobrança passou a ser aplicada. Um dos principais reservatórios da região metropolitana de São Paulo, o Sistema Cantareira operou no volume morto durante 19 meses e apenas em dezembro de 2015 chegou ao volume normal.

Dessa maneira, o aumento populacional, a poluição e o desperdício, cominam para a atual e crescente crise da água. Nós, como seres humanos, que temos a água como recurso vital para a nossa sobrevivência, devemos nos munir de instrumentos que garantam a conservação e utilização sustentável dos recursos hídricos para atuais e futuras gerações, e é sobre isso que falaremos no capitulo seguinte.

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2 ASPECTOS JURÍDICOS E DE GESTÃO DAS ÁGUAS

Passarem a abordar a partir desse capítulo a evolução histórica da legislação que prevê a proteção dos recursos hídricos no Brasil até chegarmos a umas das ferramentas mais importantes nesse contexto de proteção da água, a Política Nacional dos Recursos Hídricos.

2.1 Evolução Histórica da Proteção das Águas no Brasil

Embora a degeneração da natureza tenha se intensificado com o aperfeiçoamento dos meios de produção durante a revolução industrial, essa degradação se inicia, no Brasil, desde o descobrimento pelos portugueses.

Por séculos após o descobrimento do Brasil em 1500 viveu-se uma fase de exploração feroz do meio ambiente, pois o que hoje é um país independente era uma área totalmente preservada e desconectada de um sistema econômico. O descobrimento do Brasil pelos portugueses mudou drasticamente o meio ambiente do nosso país, que virou colônia e passou a ser visto como uma grande fonte de recursos.

Nos anos 1500, a legislação que vigorava no Brasil eram as Ordenações Afonsinas, sucedidas pelas Ordenações Manuelinas, que em nada protegiam a água. Tais ordenações foram uma das primeiras leis da era moderna, como lembra WAINER (1999, p. 4):

Vigentes ao tempo em que o Brasil foi descoberto, as Ordenações Afonsinas (legislação portuguesa à época do rei D. Afonso V), primeiro Código legal europeu e cujo trabalho de compilação foi concluído em 1446, é composta por cinco livros. As fontes básicas foram os Direitos Romano e Canônico, além das leis promulgadas desde D. Afonso II, as determinações e

resoluções das Cortes, celebradas a partir de D. Afonso IV e as concordatas dos reis antecessores, D. Diniz, D. Pedro e D. João.

As ordenações Filipinas vigentes em meados do século XVII, que resultaram das reformas do código Manuelino, foram precursoras na proteção das águas como lembra Almeida (2002, p. 2):

O parágrafo 7º do Título LXXXVIII das Ordenações Filipinas retrata o caráter precursor na proteção das águas ao fornecer o conceito de poluição. Foi expressamente proibido a qualquer pessoa jogar material que pudesse

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matar os peixes e sua criação ou sujar as águas dos rios e das lagoas: ‘pessoa alguma lance nos rios e lagoas, em qualquer tempo do anno ..., cocca, cal, nem outro algum material, com que fe o peixe mata’[sic].

Dois séculos depois, a Constituição imperial do Brasil que foi promulgada em 25 de março de 1824, não fez referência à matéria ambiental, apenas proibindo indústrias contrárias à saúde do cidadão em seu art. 179. A carta imperial determinou a realização de um Código Civil e Criminal, pois mesmo o Brasil já tendo decretado independência do Reino de Portugal as Ordenações Filipinas ainda vigoravam.

Vemos a preocupação com as águas no Código Penal de 1890, que em seu Art. 162 menciona que corromper ou conspurcar água potável de uso comum ou particular tornando-a impossível de beber ou nociva à saúde gera pena de prisão um a três anos. Mais tarde, o Código Civil de 1916 regulou o direito de uso das águas, o usuário poderia utilizar as águas como quisesse, desde que fossem respeitados os direitos de vizinhança.

Em 1934 vemos o Código das Águas, Decreto 24.634, que pela abundância de recursos naturais disponíveis à época, basicamente permitia ao poder público controlar e incentivar o aproveitamento industrial das águas, assim, as águas foram tratadas como produto do desenvolvimento.

Entre o Código Civil e o Código de Águas vemos uma diferença básica, “enquanto este enfoca as águas como recursos dotados de valor econômico para a coletividade e, por isso mesmo são merecedores de atenção especial do Estado, aquele não reconhecia o real valor econômico deste recurso e a sua regulamentação fundava-se principalmente no direito de vizinhança.” (ALMEIDA, 2002).

A Lei nº 4.771 de 1965, o Código Florestal, criou as áreas de preservação permanente e acabou indiretamente protegendo a vazão e a qualidade das águas ao determinar, no art. 2º, a preservação das florestas e das matas ciliares situadas ao longo dos cursos d’água, nascentes, lagos, lagoas ou reservatórios.

A partir do final do século XX, começamos a observar um pensamento jurídico ambiental no sentido de realmente preservar o meio ambiente. Em 1981 temos o advento da

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lei 6.938 que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, e como nos menciona Almeida (2002):

[...] esta lei lançou bases para a busca do desenvolvimento sustentável e estabeleceu princípios protetivos e garantidores do meio ambiente, instituiu objetivos e instrumentos da política nacional, consolidou o Estudo de Impacto Ambiental, adotou a Teoria da Responsabilidade Civil Objetiva como forma de responsabilização do agente pelo dano causado ao meio ambiente e a terceiros afetados por suas atividades.

A mesma lei também conferiu ao Ministério Público da União e dos Estados a legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente. Em se tratando de proteção constitucional do meio ambiente, desde a independência do Brasil até 1988, todas as constituições foram omissas, como explica Milaré (2011, p. 183):

As Constituições que precederam a de 1988 jamais se preocuparam com a proteção do meio ambiente de forma específica e global. Nelas, nem mesmo uma vez foi empregada a expressão meio ambiente, dando a revelar total inadvertência ou, até, despreocupação com o próprio espaço em que vivemos.

Na constituição de 1988 vemos claramente a mudança no tratamento do meio ambiente, a carta ganha um capítulo especifico para o tema, e o Art. 225 passa a mencionar que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Assim nos lembra Antunes (2000, p. 370):

A água foi caracterizada como um recurso econômico de forma bastante clara e importante, como se depreende da leitura dos artigos 20, § 1º; 21, XII, b e XIX; 43, § 2º, IV e § 3º; 176 caput e § 1º, todos da CF/88. Uma das alterações mais significativas foi a extinção do domínio privado da água, previsto no Código das Águas. Agora todos os corpos d’água são de domínio público, seja da União, seja dos Estados. Mas essa definição não desobriga o trato holístico do bem natural água, a indissociabilidade das águas integrantes do ciclo hidrológico deve ser considerada, pois, verifica-se a existência de rios federais com afluentes estaduais e vice-versa. Observa-se uma evolução no tratamento normativo dos rios, compreendidos a partir do conceito de bacia hidrográfica, ao passo que, nas cartas anteriores, eram tidos como elementos geográficos isolados – o que permite uma gestão racional e integrada dos recursos hídricos.

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Após quase 10 anos depois da constituição de 1988, a lei nº 9.433/97 trouxe importantes contribuições para o aproveitamento dos recursos hídricos, adequando a legislação aos conceitos de desenvolvimento sustentável. Para tanto, instituiu a Política Nacional dos Recursos Hídricos e o seu gerenciamento, regulamentou o inciso XIX do art. 21 da CF/88, normatizou a utilização dos recursos hídricos, tudo com o fim de garantir a preservação e a disponibilidade das águas.

Fechando o círculo da regulação legal, foi aprovada a Lei nº 9.605/98 – Lei dos Crimes Contra o Meio Ambiente – onde há a previsão de sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.

2.2 Da Política Nacional de Recursos Hídricos

Como observamos no tópico anterior, a Constituição Federal de 1988 foi pioneira na proteção do meio ambiente, e uma de suas atribuições mais importes na proteção das águas foi, como menciona o Art. 21, inc. XIX, instituir o sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de uso. Dessa maneira, em 08 de janeiro de 1997 entrou em vigor a lei 9433, conhecida como a “Lei das Águas”, para instituir a Política Nacional de Recursos Hídricos e criar o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos como estabeleceu a constituição. Passaremos a abordar nesse tópico os fundamentos, objetivos e instrumentos pelos quais a “Lei das Águas” pode efetivamente proteger os recursos hídricos.

2.2.1 Fundamentos

Iniciaremos a abordagem dos fundamentos da Política Nacional de Recursos Hídricos pelo artigo 1º da lei 9.433/97:

I - a água é um bem de domínio público;

II - a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico;

III - em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais;

IV - a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas;

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V - a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;

VI - a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades.

Em seu inciso I, a lei esclarece que a água é um bem de domínio público, pois a água é um bem comum ao qual todos tem direito, e é por isso que é preciso controlar e regulamentar seu uso para garantir água de qualidade para a presente e futuras gerações. Nesse mesmo pensamento afirma Maria Luiza Machado Granzierais (2001, p. 88):

Quanto maior a importância de um bem à sociedade, maior a tendência a sua publicização, com vista na obtenção da tutela do Estado e da garantia de que todos poderão a ele ter acesso, de acordo com os regulamentos estabelecidos. No que se refere às águas, as coisas não passam de forma diferente.

A água, é talvez o recurso natural que mais deva ser usado utilizado por todos de forma igualitária, por estar diretamente ligado a manutenção da vida e saúde, se trata de um direito fundamental da pessoa humana. Por todas essas razões, como nos lembra Viegas (2005), é plenamente justificável que os recursos hídricos integrem o patrimônio estatal, como bem de uso comum do povo, pois compete ao poder público empreender esforços no sentido de garantir à coletividade e a cada integrante dela a efetivação desses direitos humanos fundamentais.

No inciso II, a Lei das Águas menciona a água como recurso natural limitado e dotado de valor econômico. Como observamos anteriormente, até meados do século XX a água era vista como recurso inesgotável, mas, apesar de a quantidade de água no planeta ser sempre a mesma dentro de sua condição cíclica, vários fatores influenciam na sua disponibilidade como nos expõe Luiz Antonio Timm Grassi (2004):

Hoje com o crescimento demográfico e econômico, multiplicam-se os usos das águas e crescem rapidamente suas demandas, embora a quantidade global disponível seja sempre a mesma. Abastecimento humano, dessedentação de animais, indústria, agricultura, navegação, geração de energia elétrica, pesca, esportes, diluição e biodegradação de esgotos urbanos e industrias, e outros mais, são os usos que estão se intensificando cada vez mais tanto global quanto localizadamente.

Fica claro que é assertivo declarar a água como recurso limitado, reconhecendo também, devido sua condição de escassez, seu valor como bem econômico. Sabendo dessa

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condição, e da importância da água nos processos industriais e no desenvolvimento econômico, não lhe conferir um valor compatível com sua importância seria incentivar sua hiperexploração. Nesse mesmo sentido, nos explica Viegas (2005) que a importância econômica que teve o petróleo no Século XX está reservada aos recursos hídricos no Século em curso. E é justamente baseado nesse fundamento que o art. 1º, II, da Lei das Águas possibilita a cobrança pelo uso da água.

No Inciso III da lei 9433/97, visualizamos que em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais. Sobre a abrangência do que seria exatamente consumo humano e dessedentação de animais nos esclarece Paulo Affonso Leme Machado (2000, p. 428):

Consumo humano compreende somente o uso para as necessidades mínimas de cada pessoa, isto é, água para beber, para comer e para higiene, enquanto que dessedentação animal é estrita, não incluindo-se utilização de água para o abate e o processo de comercialização de animais.

A lei permite em seu artigo 15, inciso V, que a outorga de direito de uso de recursos hídricos poderá ser suspensa, sendo assim, instrumento para garantir os usos prioritários em situação de escassez.

No inciso IV da referida lei observa-se o uso múltiplo das águas. Esse fundamento é importante, pois existem alguns privilégios concedidos ao setor hidroelétrico. Além de a água ser essencial a vida do ser humano, ela também desempenha papel impar nas atividades industriais, agrícolas e comerciais. Assim, segundo Barros (2005, p. 74) “o poder público responsável pela concessão de outorgas está proibido de conceder outorgas que favoreçam um uso em

detrimento dos demais”. No mesmo sentido nos fala Milaré, que “no Brasil,

tradicionalmente, o setor elétrico vem comandando o processo de gestão dos recursos hídricos superficiais, criando uma assimetria de tratamento, com inegáveis prejuízos para outros setores usuários.” (2011, p. 604).

O inciso V do artigo 1º da Lei 9.433/97 trata da Bacia Hidrográfica como unidade territorial, mas antes de falarmos sobre tal fundamento, importante é tomarmos um conceito sobre o que é bacia hidrográfica, que segundo André L. L. da Silveira (2001, p. 40) “deve ser

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entendida como a área de captação natural da água da precipitação que faz convergir os escoamentos para um único ponto de saída, seu exutório”.

Desta forma entendemos que a bacia hidrográfica é uma região na terra em que o escoamento superficial das águas se direciona para um único ponto e a partir da lei 9433/97 a gestão dos recursos hídricos passou a ser por bacias hidrográficas, e não mais como era feito até então, dividida por fronteiras administrativas e políticas dos estados do país.

Nesse sentido, Milaré (2011, p. 604), nos lembra que “de fato, considerando-se que o perímetro da área a ser planejada é definido pelos limites da bacia, fica mais fácil fazer-se o confronto entre as disponibilidades e as demandas, essenciais para o que se denomina balanço hídrico”.

O inciso VI, o último dos fundamentos da Política Nacional dos Recursos Hídricos, prevê que para o sucesso da gestão, é fundamental a participação popular, pois a Lei das Águas previu a criação de Comitês de Bacias Hidrográficas e as Agências de Águas. Assim, Milaré (2011, p. 604) nos expõe:

O modelo de gestão proposta pressupõe a institucionalização dos Comitês de Bacia, das Agências de Água e ainda dos Conselhos Nacional e Estaduais de Recursos Hídricos, nos quais se prevê a participação efetiva dos diversos usuários das águas, do Poder Público e da sociedade civil de uma bacia hidrográfica no processo decisório.

No mesmo sentido, Sirvinskas nos explica que é o comitê da bacia hidrográfica que estabelece as prioridades sobre a gestão o consumo, a recuperação ou o tratamento dos recursos hídricos de determinada região.

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2.2.2 Objetivos

A lei das águas, lei 9.433 de 1997, instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos, regulamentando o que ordena o artigo 21, XIX, da Constituição Federal, que atribui a União instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso. No seu artigo 2º, a Lei das Águas delimita os objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos:

I - assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos;

II - a utilização racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo o transporte aquaviário, com vistas ao desenvolvimento sustentável;

III - a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos recursos naturais.

Assim, os objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos visam basicamente o uso sustentável dos recursos hídricos, como nos explica Barros (2005, p. 40):

Com a leitura atenta destes dispositivos se extrai que a lei nº 9.433/97 tem por fim maior a manutenção do desenvolvimento sustentável dos recursos hídricos, já que a própria Constituição brasileira, em seu art. 225, caput, assegura a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo ao Poder Público a obrigação de instaurar o desenvolvimento sustentável.

Vários Estados já haviam antecipado à União e editado leis para gerir as águas de seu domínio, assim, como nos demonstra Édis Milaré, “agora a lei federal reflete várias disposições das leis estaduais, equalizando-as e dando alcance nacional às formulações legais e experiências gerenciais que foram acertadas em âmbito estadual”.

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2.2.3 Instrumentos

Passaremos a analisar agora os instrumentos instituídos pela lei 9.433/97 para servirem de suporte ao modelo de gestão dos recursos hídricos. Tais instrumentos estão enumerados no artigo 5º da referida lei e passaremos a analisarmos a partir de agora.

2.2.3.1 Os Planos de Recursos Hídricos;

Como podemos observar no artigo 6º da referida lei, Os Planos de Recursos Hídricos são planos diretores que visam a fundamentar e orientar a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e o gerenciamento dos recursos hídricos. O artigo 7º da lei 9.433/97 determina os conteúdos mínimos para seus projetos e programas:

I - diagnóstico da situação atual dos recursos hídricos;

II - análise de alternativas de crescimento demográfico, de evolução de atividades produtivas e de modificações dos padrões de ocupação do solo; III - balanço entre disponibilidades e demandas futuras dos recursos hídricos, em quantidade e qualidade, com identificação de conflitos potenciais; IV - metas de racionalização de uso, aumento da quantidade e melhoria da qualidade dos recursos hídricos disponíveis;

V - medidas a serem tomadas, programas a serem desenvolvidos e projetos a serem implantados, para o atendimento das metas previstas;

VIII - prioridades para outorga de direitos de uso de recursos hídricos; IX - diretrizes e critérios para a cobrança pelo uso dos recursos hídricos; X - propostas para a criação de áreas sujeitas a restrição de uso, com vistas à proteção dos recursos hídricos.

Sobre a importância dos Planos de Recursos Hídricos, fica evidente no momento em que as decisões sobre o que fazer na bacia hidrográfica tem que ser vinculadas aos planos e não de forma casual em cada caso, como nos lembra Milaré (2000, p. 396):

A gestão hídrica depende do planejamento institucionalizado, não podendo o uso das águas ser condicionado apenas a planos setoriais e, o que é pior, à decisão de cada caso concreto, sem vinculação com o planejamento de uso do recursos hídricos da bacia. O Plano visa, entre outras coisas, a evitar ou coibir casuísmo.

A criação dos Planos é atribuição das Agências de Água, conforme artigos 44, X e 38, III da lei nº 9.433/97, mas em locais que as mesmas ainda não existam, o Conselho Nacional

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de Recursos Hídricos editou a Resolução nº 17, que em seu artigo 3º explica que enquanto não for criada a Agência de Água e não houver delegação, os Planos de Recursos Hídricos poderão ser elaborados pelas entidades ou órgãos gestores de recursos hídricos, de acordo com a dominialidade das águas, sob supervisão e aprovação dos respectivos Comitês de Bacias. Sobre a elaboração dos Planos nos explica Machado (2000, p. 437):

Estes planos serão elaborados por bacia hidrográfica, por Estado e para o País e devem ser devidamente integrados, surgindo, primeiramente, nas bacias hidrográficas, demonstrando sincronia com o restante da lei, uma vez que estas são a unidade de planejamento da Política Nacional de Recursos Hídricos, para depois serem elaborados nos Estados levando-se em consideração as prioridades apontadas nos planos de bacia e, enfim, o Plano Nacional de Recursos Hídricos, que agregara as prioridades estaduais.

2.2.3.2 O enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os usos preponderantes da água

Segundo o Art. 9º da lei 9.433/97, o enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os usos preponderantes da água, visa a assegurar às águas qualidade compatível com os usos mais exigentes a que forem destinadas e diminuir os custos de combate à poluição das águas, mediante ações preventivas permanentes.

A classificação das águas é regrada pela Resolução CONAMA nº 357 de 2005, e assim, segundo Wellington Pacheco Barros, cada um desses tipos de água é dividido em classes de qualidade requerida para seus usos preponderantes.

2.2.3.3 A outorga dos direitos de uso de recursos hídricos

Prevista nos artigos 11º a 18º da lei 9.433/97, a outorga dos direitos de uso é o instrumento o Poder Público confere a terceiros a disponibilidade de água para fins determinados, por um período de tempo. Conforme artigo 11 da referida lei, o regime de outorga de direitos de uso de recursos hídricos tem como objetivos assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos direitos de acesso à água.

Se torna adequado analisarmos o conceito de direito de uso, que seria o poder público atribuir a outrem o direito de uso de um bem público, como lembra Barros (2005, p. 85):

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Direito de uso é o instituto jurídico de direito administrativo pelo qual o poder público, União, Estados ou o Distrito Federal, atribui a outrem, ente púbico ou privado, o direito de uso do bem público água de forma onerosa. O uso da água pelo terceiro impõe a obrigação de que este a destine para sua própria finalidade que, no entanto, pode ser limitada pela Administração Pública, porém nunca desvirtuada de seu fim natural. Portanto, no âmbito de exação da outorga não está o direito de disposição, circunscrevendo-se apenas ao simples direito de uso, conforme preconiza o art. 18, da lei nº 9.433/97.

No art. 12º da mesma lei, vemos quais os usos que estão sujeitos a outorga, que são a derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo de água para consumo final, inclusive abastecimento público, ou insumo de processo produtivo; extração de água de aquífero subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo; lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final; aproveitamento dos potenciais hidrelétricos; outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de água. Esse ultimo uso sujeito a outorga é genérico, como explica Milaré (2011, p. 610):

Qualquer uso não expressamente definido, mas que altere o regime hídrico, está sujeito a outorga. Entram neste caso, as obras hidráulicas em geral e outras que possam afetar as águas, como a construção de pontes por exemplo.

Os usos que são isentos de outorga estão previstos no art. 12, §1º, o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural; as derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes; as acumulações de volumes de água consideradas insignificantes. Sobre as isenções de outorga nos explica Milaré (2011, p. 610):

As definições e os limites dessas isenções serão estabelecidos nos Planos de Bacia Hidrográfica, e não em regulamento. Cabe, no entanto, ponderar que, sob o ponto de vista social, deve ser preservado o abastecimento de populações carentes, porquanto indispensável à sobrevivência dessas mesmas comunidades. Há um princípio constitucional que resguarda o direito à vida, no art. 5º, caput, da Lei Maior.

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2.2.3.4 Cobrança pelo uso da água

Nesse tópico explanaremos se o aumento do valor cobrado pela água pode ser um instrumento para diminuir seu consumo. Inicialmente vamos analisar o que menciona sobre o assunto a Lei dos Recursos Hídricos, que em seu artigo 19, lista os objetivos na cobrança pelo uso da água. Dentre os objetivos estão reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor, incentivar a racionalização do uso da água e obter recursos financeiros para o financiamento dos programas e intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos, havendo assim três objetivos principais, o primeiro é didático, o segundo é reduzir o uso e o terceiro o financiamento de recuperação ambiental dos recursos hídricos.

É certo que todo aquele bem que é útil e escasso têm valor econômico, e, quanto maior a sua utilidade e escassez, maior será o seu valor. No Brasil, a impressão de abundância e regularidade de abastecimento estimula a sua qualificação como bem inferior, sem que seu valor real seja percebido pelos usuários. Nesse sentido nos explica Motta (2000, p. 27) que “a teoria econômica diz: se o uso do recurso (bem público) não causa dano a ninguém, não se cobra por isso; causando dano a alguém, gerando essa externalidade, um impacto a terceiro, temos de cobrar.”

Se reconhecer a água como bem econômico pode ser uma forma de reduzir seu consumo, seu atual valor não incentiva um uso racional, visto que é um dos recursos naturais mais baratos e mais esbanjados. De acordo com vários autores, a cobrança pela água é essencial para garantir a água para as gerações futuras, de acordo com Aldo da Cunha Rebouças (2003, p. 39):

Não obstante, como a experiência nos países desenvolvidos, principalmente, tem mostrado que a parte mais sensível do corpo humano é o bolso, uma das recomendações do Banco Mundial (BM) e da Organização das Nações Unidas (ONU) para reduzir o desperdício e a degradação da qualidade da gota d’água disponível em níveis nunca imaginados, é considerá-la como um recurso natural de valor econômico, ou seja, uma mercadoria com preço de mercado, como estabelece, aliás, o terceiro princípio da Lei Federal nº 9.433/97.

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Cada forma de utilização da água, por mais benéfica ou essencial que possa ser, traz consigo uma série de consequências negativas, podemos observar que muitos de nossos principais rios e açudes estão degradados.

A água não é um bem particular, ela é um bem comum ao qual todos têm direito, e é por isso que é preciso controlar e regulamentar seu uso para garantir água de qualidade para a presente e futuras gerações. Nesse mesmo pensamento afirma Maria Luiza Machado Granzierais (2001. p. 88):

Quanto maior a importância de um bem à sociedade, maior a tendência a sua publicização, com vista na obtenção da tutela do Estado e da garantia de que todos poderão a ele ter acesso, de acordo com os regulamentos estabelecidos. No que se refere às águas, as coisas não passam de forma diferente.

É preciso planejar e realizar programas eficientes para a recuperação e preservação dos nossos corpos d’água. Dessa maneira, a lei 9433 determina que todo aquele que utilizar a água para sua atividade econômica, causando impacto sobre a quantidade ou a qualidade da água, deve obter autorização para isso, que é a Outorga de Direito de Uso da Água e poderá ter que pagar por esse uso, que seria a Cobrança pelo Uso da Água.

Quanto a cobrança, é importante não confundi-la com multa ou imposto, ou mesmo com as tarifas cobradas pelas distribuidoras de água das cidades. A cobrança pelo uso da água prevista na Política Nacional de Recursos Hídricos é uma remuneração pelo uso de um bem público natural, cobrado de quem utiliza a água diretamente dos rios ou outros corpos d’água, e serve como fonte de recursos para financiar a recuperação e preservação dos mesmos. Assim sendo, quem usa e polui mais, paga mais, estimulando o uso consciente da água.

Toda vez que falamos em cobrança por uso de um bem ouviremos criticas, até porque vivemos num país ontem a carga tributária é altíssima. Mas nesse sentido, a Lei das Águas prevê usos que independem de cobrança, como nos lembra Barros (2005, p. 98):

A fixação deste instituto levará em conta, consoante o art. 20 da Lei nº 9.433/97, a outorga de uso dos recursos hídricos, na medida em que só serão cobrados àqueles usos que dependem de autorização pelo Poder Público. Assim sendo, usos insignificantes, estabelecidos pela Lei das Águas, Resolução nº 16 do CNRH, além do Decreto Estadual do Rio Grande do Sul nº 37.033/96, que independem de outorga, não serão objeto de cobrança.

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A Lei das Águas distribui as competências sobre a gestão das águas entre vários órgãos e instituições, o preço a ser cobrado pelo uso da água é proposto pelos Comitês de Bacias Hidrográfica, a partir de um consenso entre os usuários, a sociedade civil e o poder público. A Resolução n.º 48, de 2005, do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, delimita os critérios gerais para a cobrança de uso dos recursos hídricos nas bacias hidrográficas, cabendo aos Comitês de Bacia sobre os valores e a sua forma de aplicação.

As Agências de Águas são os braços executivos dos comitês de Bacia Hidrográfica, que devem administrar os recursos arrecadados na recuperação de Bacias Hidrográficas em que são gerados, estimulando investimentos em despoluição, reuso, proteção, conservação e utilização de tecnologias limpas.

Compete à Agência Nacional de Águas - ANA, criada pela Lei nº 9.984/00, arrecadar e repassar os valores arrecadados à Agência de Água da bacia, ou à entidade delegatária de funções de Agência de Água, conforme determina a Lei nº 10.881/04.

As Agências de Água da bacia ou entidade delegatária de suas funções é instituída mediante solicitação do Comitê de Bacia Hidrográfica e autorização do CNRH, cabendo a ela desembolsar os recursos arrecadados com a Cobrança nas ações previstas no Plano de Recursos Hídricos da bacia e conforme as diretrizes estabelecidas no plano de aplicação, ambos aprovados pelo CBH.

2.2.3.5 O Sistema De Informações Sobre Os Recursos Hídricos - Sirh

No que diz respeito as informações sobre os recursos hídricos a Lei 9433/97 fez bem ao abordar o tema, porque sem informação não se fará uma Política de Recursos Hídricos do interesse de todos. O Sistema foi criado para a realização de coleta, tratamento, armazenamento e recuperação de informações sobre os recursos hídricos e fatores relevantes na sua gestão, agregando dados gerados pelos órgãos do SNGRH, para formar o Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos.

Segundo o artigo 26 da Lei 9433/97, são princípios básicos para o funcionamento do Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos, a descentralização da obtenção e produção de dados e informações, coordenação unificada do sistema e o acesso aos dados e informações

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garantidos a toda sociedade. Sobre a importância desse sistema de informações, nos esclarece o autor Machado (2000, p. 470):

Ao criar um ‘Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos’ a lei está procurando articular as informações, para que não fiquem dispersas e isoladas. Os organismos integrantes do Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos terão obrigações de fornecer os dados ao Sistema de Informação sobre Recursos Hídricos (art. 25, parágrafo único, da Lei 9.433/97). Não haverá, portanto, informações privilegiadas e secretas nos órgãos de recursos hídricos, nem que os mesmos estejam submetidos a regime de Direito Privado”.

Os objetivos do sistema de informações são reunir, dar consistência e divulgar os dados e informações sobre a situação qualitativa e quantitativa dos recursos hídricos no Brasil. Também objetivam atualizar permanentemente as informações sobre disponibilidade e demanda dos recursos hídricos e fornecer subsídios para a elaboração dos Planos de Recursos Hídricos, como descreve o artigo 27 da lei das águas.

2.3 O Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos

Os sistemas de gerenciamento de recursos hídricos, tanto nacionais como também os estaduais, são os instrumentos de realização efetiva da Política Nacional de Recursos Hídricos. Esse sistema de gerenciamento é realizado em três níveis, ou seja, por órgãos de três níveis da federação, como nos explica Milaré (2011, p. 617):

O Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos – SINGREH, analogamente ao que ocorre com o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA, é nacional e não federal, já que integrado por órgãos dos três níveis da federação. A estruturação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos manifesta uma verdadeira arquitetura político-administrativa, que avalia pesos e valores específicos, consagrando o que cabe a cada um dos órgãos que o integram.

O sistema é organizado em níveis, e cada um com sua competência e unidade de comando. Desse modo, a União pode definir o funcionamento apenas dos órgãos federais, ou seja, nos órgãos estaduais cada Estado tem competência exclusiva. Passaremos agora a entender os órgãos e entidades pertencentes do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.

Referências

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