PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULOSEGUNDO TRIBUNAL DE ALÇADA CIVIL Décima Câmara
APELAÇÃO SEM REVISÃO Nº 589.578-0/5 - GUARULHOS Apelante: Helvidio Pereira Lima
Apelado : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
CERCEAMENTO DE DEFESA. Não ocorrência. O julgador sentiu-se habilitado à entrega da prestação jurisdicional diante da prova existente e que lhe ofereceu elementos de convencimento. A alegada necessidade da produção de outras provas deveria evidenciar um âmbito, ou uma extensão de imperiosidade, suficiente para aferir-se sobre a possibilidade de ser alijada a prova já produzida. DOENÇA DO TRABALHO. HÉRNIA ABDOMINAL INCISIONAL. NEXO CAUSAL. CONCAUSA. As provas não permitem concluir, com segurança, que o trabalho exercido pelo Apelante agiu como concausa no agravamento da doença, nem admitem a aplicação do princípio in dubio pro misero. Em infortunística o que se repara, em forma de prestações mensais, é a incapacidade resultante do acidente ou da doença profissional e não o fato em si mesmo considerado.
Voto nº 4.273 Visto.
HELVIDIO PEREIRA LIMA ingressou com Ação de Prestações por Acidente do Trabalho contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, qualificação e caracteres das partes nos autos, alegando que, no exercício de suas funções “... em data de 21/3/94, devido ao excesso de peso (...) teve sua hérnia estourada, ficando afastado de 21/3/94 a 25/4/94 (...) retornou ao trabalho e novamente sua hérnia teve problemas ...” (folha 2).
Encartados o laudo pericial e o parecer do Assistente Técnico do Réu e vencida a instrução, houve entrega da prestação jurisdicional sendo julgada improcedente a pretensão (folha 148 e verso).
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Recorreu o Autor. Persegue a reforma da decisão. Argüiu em preliminar o cerceamento de defesa por indeferimento da prova oral. No mérito insiste:
“... foi sumetido a uma cirurgia, sendo que desta resultou, o surgimento da patologia em questão, em decorrência de pesos manuseados no labor. A inicial narra as condições agressivas que o mesmo estava sujeito no desempenho de seu labor diário, o que com certeza agiu como causa ou mesmo concausa para o surgimento da ‘hérnia’ ...” (folha 153).
O INSS apresentou contra-razões sustentando o acerto da decisão (folhas 158/160)).
A PROMOTORIA DE JUSTIÇA e a PROCURADORIA DE JUSTIÇA inferiram pelo não provimento do recurso.
É o relatório, adotado no mais o da r. sentença.
Não houve cerceamento de defesa de qualquer ordem. O julgador sentiu-se habilitado à entrega da prestação jurisdicional diante da prova existente e que lhe ofereceu elementos de convencimento. A alegada necessidade da produção de outras provas deveria evidenciar um âmbito, ou uma extensão de imperiosidade, suficiente para aferir-se sobre a possibilidade de ser alijada a prova já produzida. As questões receberam a devida apreciação na r. sentença.
A doença profissional ou do trabalho assenta-se nos requisitos de causalidade, de prejudicialidade e do nexo etiológico. Causalidade porque, em princípio, não há dolo. Prejudicialidade em razão da lesão corporal ou perturbação funcional que pode causar a morte, ou a perda, ou a redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho. A configuração do nexo etiológico ou causal, aliado aos demais elementos caracterizadores, conduz, inevitavelmente, à procedência da pretensão que for deduzida em Juízo .
NEXO, do latim nexu, significa vínculo ou ligação. ETIOLÓGICO refere-se à etiologia, do grego
aitologia, que pode ser entendido em infortunística como o
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latim causale, é o que se relaciona com a causa. É essencial para o reconhecimento do acidente e da doença profissional ou do trabalho, a relação de causa e efeito, o nexo etiológico ou causal.
A teoria da concausa é admitida pela lei e pode ser definida como sendo o elemento que concorre com outro, formando o nexo entre a ação e o resultado, entre o acidente e/ou doença profissional ou do trabalho e o trabalho exercido pelo empregado. Deste modo, prescinde-se do nexo causal direto e exclusivo entre o dano e o trabalho, para a configuração do acidente ou da doença profissional ou do trabalho.
A perícia concluiu:
“... Exame físico do abdomên -
Apresenta extensa cicatriz cirúrgica (22,0 cm), longitudinal mediana supra-umbelical, com presença de saco herniário em orifício palpável através de cicatriz cirúrgica. A redução da hérnia só é possível no decúbito dorsal ...” (folha 96).
“... O Autor é portador de Hérnia abdominal incisional, provocada por falha de fechamento das estruturas abdominais após cirurgia de úlcera. Não há nexo causal (ou concausal) com as atividades laborativas de Soldador ...” (folha 98).
Prestando esclarecimentos, disse o perito:
“... Hérnia Incisional representa exatamente o aparecimento de hérnia sobre uma incisão anterior; no caso, a incisão é decorrente da cirurgia para correção de úlcera gástrica, donde conclue-se que a origem da lesão herniária foi a incisão cirúrgica, necessária à correção da úlcera (...) Além disso, deve-se esclarecer que a lesão herniária não é definitiva ou permanente, pode ser operada para corrigir a eventração da parede abdominal, sem que restem seqüelas anatômico-funcionais ...” (folha 111/112).
A vistoria no local de trabalho revelou:
“... Pelos informantes foi relatado que o Autor fazia soldas em geral na peças que o setor de Caldeiraria produzia; basicamente o setor é de reforma, manutenção e construção de carrocerias para caminhões coletores de lixo;
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tanques e caçambas basculantes.
O Autor (...) participava do processo de reforma/ manutenção/construção fazendo as soldas das peças; usava equipamento de solda elétrica, montando sobre o carrinho.
(...)
Apurou-se que não executava tarefa específica; cabia-lhe soldar qualquer peça que lhe destinassem ...”.
“... Essas tarefas exigem polimorfismo postural sem adoção de postura fixa; a observação da atividade, revela obreiro trabalhando em várias posições não-fixas, movimentando-se junto às peças que estão sendo soldadas e realizando poucos movimentos com o tronco. Entretanto, não se observa elevação/transporte de pesos...”.
Na verdade, pesos em geral (...) são elevados/transportados por empilhadeiras e ponte-rolante ...”.
“... A vistoria não encontrou atividade/função potencialmente lesiva para lesões herniárias. Assim vem o perito reiterar a conclusão do laudo pericial, no sentido de que a atividade de Soldador não determinou a lesão herniária, nem agravou e, portanto, não há nexo causal nem concausal entre as atividades de Soldador e a lesão herniária constatada ...” (folhas 112/113).
Instado a responder novos quesitos, o perito esclareceu:
“... podem surgir hérnias abdominais incisionais em razão de aumento da pressão intra-abdominal, por: - abdômen avantajado
- esforços para tossir, espirrar, ...” (folha 121).
“... o obreiro executava trabalho manual, de características técnicas (...) não há nenhum registro de evento danoso ao seu organismo decorrente da realização de esforços físicos.
Aqui, deve-se ter em mente que as Hérnias Abdominais decorrentes de esforços físicos são de aparecimento imediato (após o esforço), assim, entende-se que nenhum obreiro executa esforços na fábrica e vai desenvolver hérnia na residência, quando está repousando ...”.
“... a concausalidade argüida não decorre posteriormente ao suposto evento de esforço físico; sua ocorrência dá-se imediatamente após o esforço ...” (folha 129).
O Autor alega na inicial ter sido afastado do trabalho por duas vezes em decorrência da hérnia. Quanto ao primeiro período, de 21/3/94 a 25/4/94, consta que ele
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recebeu auxílio-doença (folha 7), mas não há prova nos autos
que esse benefício tenha sido concedido em razão daquela doença. Na ficha médica foi registrado com data de 21/2/94 o diagnóstico de “hérnia incisional”.
Com relação ao segundo período, de 24/8/94 a 5/9/94, conforme informação prestada pelo INSS, o Segurado não foi afastado do trabalho “... permanecendo em
situação de simples assistência médica ...” (folha 88), sendo
diagnosticado “déficit auditivo não enquadrável” (folha 89).
Está constitucionalmente garantido que todo dano decorrente de acidente do trabalho deve ser reparado, e que esse dano é coberto pelo seguro obrigatório acidentário a cargo do INSS. Dano, derivado do latim
damnun, de forma genérica quer dizer todo o mal ou ofensa
sofrido por alguém. No sentido jurídico é apreciado em razão do efeito que produz. É o prejuízo causado.
Não há demonstração indene de dúvida de que a Hérnia abdominal incisional, da qual o Autor é portador, seria de origem ocupacional. A provas não permitem concluir, com segurança, que o trabalho exercido pelo Apelante agiu como concausa no agravamento dessa doença e não admitem a aplicação do princípio in dubio pro misero.
Em infortunística o que se repara, em forma de prestações mensais, é a incapacidade resultante do acidente ou da doença profissional e não o fato em si mesmo considerado.
O ressarcimento ou compensação reclama a demonstração do dano, da incapacidade dele decorrente e do nexo causal. Não caracterizado o trinômio não existe incapacidade por indenizar nem direito à prestação acidentária.
“O pressuposto do reconhecimento do direito ao benefício acidentário é a incapacidade e a prova de que ela resultou do trabalho1”.
Em face ao exposto, rejeitada a matéria preliminar, nega-se provimento ao recurso.
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IRINEU PEDROTTI Relator