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O FAZER E O PENSAR DO PROFESSOR NA PERSPECTIVA DA COMPLEXIDADE

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Academic year: 2021

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KLAMMER, Celso Rogério – PUC-PR/ UP-PR

crk@up.edu.br

BEHRENS, Marilda Aparecida – PUC-PR

marilda.aparecida@pucpr.br

Área Temática: Profissionalização docente e formação Agência Financiadora: Não contou com financiamento

Resumo

Neste artigo partiu-se do pressuposto que a ação do professor em sala de aula consiste num conjunto de atitudes que revelam o seu fazer e o seu pensar pedagógico. Sendo assim, optou-se por um processo de pesquisa-ação realizado por vinte e um professores envolvidos na disciplina Paradigmas Educacionais na Prática Pedagógica. Durante o processo da pesquisa, por meio de leituras críticas, discussões e produções individuais e coletivas, foi possível pesquisar até que ponto os referenciais teóricos dos paradigmas pedagógicos inovadores podem contribuir para uma revisão do fazer e do pensar pedagógico do professor universitário de maneira que oportunize uma aprendizagem significativa, crítica, criativa e transformadora. Para tanto procurou-se enfocar os referenciais teóricos à luz dos paradigmas newtoniano-cartesiano e da complexidade e nesse viés contextualizar a ação pedagógica do professor. Assim, utilizando-se da pesquisa-ação, o grupo de vinte e um professores universitários buscaram subsídios metodológicos para a reflexão e superação do paradigma cartesiano que caracterizavam as ações docentes conservadoras.

Palavras-chave: Paradigma newtoniano cartesiano; Paradigma da complexidade; Professor.

Marco teórico

Acredita-se que a ação do professor em sala de aula consiste num conjunto de atitudes

que revelam o seu fazer e o seu pensar pedagógico seja no processo de seleção de conteúdo, na sua proposta de avaliação, na sua concepção de sujeito que pretende formar, na sua metodologia de ensino.

Neste sentido entende-se que além do domínio do conteúdo técnico e científico que se propõe a ensinar, o professor deve ser comprometido politicamente com o que faz. É neste compromisso que ele revela seu projeto de sociedade e de sujeito que pretende formar através da sua forma de organizar a realidade e as suas ações diárias. Quando o professor não elabora

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um sentido específico para a sua ação, ele apenas assegura a manutenção do ritual tradicional da docência: transmissão do conteúdo; controle da disciplina e rigorosos instrumentos de avaliação para que os alunos reproduzam o que foi ensinado.

Por este viés Masetto (2002, p. 23) afirma que

O professor, ao entrar na sala de aula para ensinar uma disciplina, não deixa de ser um cidadão, alguém que faz parte de um povo, de uma nação [...] Ele tem uma visão de homem, de mundo, de sociedade, de cultura e de educação que dirige suas opções e suas ações mais ou menos conscientemente. Ele é um cidadão, um ‘político’, alguém comprometido com seu tempo, sua civilização e sua comunidade, e isso não desprega de sua pele no instante em que ele entra em sala de aula. Pode até querer omitir esse aspecto em nome da ciência que deve transmitir, e que, talvez ingenuamente, ainda entenda que possa fazê-lo de forma neutra. Mas o professor continua cidadão e político e, como profissional da docência, não poderá deixar de sê-lo.

Contudo, ao estudar a ação pedagógica do professor, particularmente da Educação Superior, na convivência com os vinte e um participantes do processo da pesquisa-ação, na disciplina de Paradigmas Educacionais na Prática Pedagógica do Programa de Pós Graduação – Mestrado e Doutorado de uma universidade particular de grande porte, constatou-se nas elaborações e discussões, que o fazer e o pensar desse docente, tende para uma postura pautada no paradigma newtoniano-cartesiano. Esse paradigma marcou, de forma contundente, a ciência do século XIX e boa parte do século XX.

As transformações vividas no mundo contemporâneo, trazidas pelas tecnologias da informação, passam a invadir o cotidiano dos indivíduos. Todos os segmentos sociais têm acesso à televisão, ao rádio, ao vídeo cassete, que transmitem informações a uma velocidade meteórica. O acesso a essas informações reformulam as regras de convivência, gerando novos hábitos e novas formas de pensar e agir, além de traçar um novo perfil de trabalhador com maior escolaridade e cultura mais sofisticada.

Neste contexto, a escola não pode ser um espaço em que apenas se transmitam informações, mas um lugar de análise crítica da informação, onde, por meio do conhecimento elaborado, a ela dê significado. Numa sociedade em que as pessoas têm facilidade de acesso à televisão, ao rádio, a escola deve formar o aluno para pensar de modo reflexivo e flexível para poder selecionar informações. Neste sentido, cabe a contribuição de Kenski (1996, p. 143), que alerta:

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As informações vêm de forma global e desconexa através dos múltiplos apelos da sociedade tecnológica. A escola precisa aproveitar essa riqueza de recursos externos, não para reproduzi-los em sala de aula, mas para polarizar essas informações, orientar as discussões, preencher as lacunas do que não foi aprendido, ensinar os alunos a estabelecer distâncias críticas com o que é veiculado pelos meios de comunicação.

No que diz respeito à atual educação escolar, defende-se que somente com o uso de cadernos e do quadro de giz a difusão do saber escolar, não terá muito significado para o jovem aluno, pois a tecnologia tem um impacto cada vez maior na vida de todos os indivíduos. O professor não é mais o único meio de acesso às informações, pois

(Os alunos) aprendem em múltiplas e variadas situações. Já chegam à escola sabendo muitas coisas, ouvidas no rádio, vistas na televisão, em apelos de outdoors e informes de mercados e shopping centers que visitam desde bem pequenos. Conhecem relógios digitais, calculadoras eletrônicas, video games, discos a laser, gravadores e muitos outros aparelhos que a tecnologia vem colocando à disposição para serem usados na vida cotidiana. Estes alunos estão acostumados a aprender através dos sons, das cores; através das imagens fixas das fotografias, ou em movimento, nos filmes e programas televisivos... As novas gerações têm um relacionamento totalmente favorável e adaptativo às novas tecnologias de informação e de comunicação e um posicionamento cada vez mais aversivo às formas tradicionais de ensino. (KENSKI, 1996, p. 133)

Na visão de Charlot (2001, p. 36)

a escola é o principal lugar de convivência social [...] alguns professores queixam-se de que, para muitos dos jovens, a escola é ‘apenas um ponto de encontro’ [...] No entanto, o encontro é uma das condições necessárias para que as relações de ensino/aprendizagem sejam realmente frutíferas.

Porém, pode-se afirmar que o paradigma newtoniano-cartesiano, de caráter conservador, impregnou a concepção moderna de ciência desencadeando a fragmentação do pensamento e a unilateralidade na análise dos fenômenos. Essa tendência é perceptível nas diferentes áreas do conhecimento como a medicina, a farmacologia, a psicologia, entre outras. Weil (1991) afirma que o paradigma newtoniano-cartesiano tem afetado também a medicina e o conceito de saúde. Nessa área de conhecimento, o paciente é considerado como objeto de estudo e o corpo como uma máquina a ser consertada. No entanto, numa visão complexa, a

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constituição do ser humano agrega corpo e mente, razão e emoção, objetividade e subjetividade, entre outras dualidades.

Na educação, em especial na prática pedagógica, a fragmentação e a unilateralidade na análise dos fenômenos também se faz presente por intermédio de determinações imperativas, propostas pelo professor, como: leia, escute, copie, reproduza, decore, repita. Como afirma Moraes (2004, p. 34)

O determinismo da ciência clássica está também muito presente no cotidiano da escola e se traduz na visão unilateral e reducionista a respeito do processo de construção do conhecimento, determinismo este que também se manifesta ao deixar prevalecer o valor da homogeneidade sobre a singularidade, da objetividade sobre a intersubjetividade, bem como da uniformização sobre a diferenciação.

No contexto da escola humanista tradicional, a instituição escolar tinha um aluno que vinha de uma estrutura familiar patriarcal, rigidamente hierarquizada, para ouvir, obedecer e reproduzir. Assim,

[...] a escola era uma continuação da família em tudo que se referia à socialização da moral e aos estilos de vida. A escola transformava a criança naqueles aspectos que fortaleciam a coesão social: adesão à nação, aceitação da disciplina e dos códigos de conduta, etc (TEDESCO, 1998, p. 36-37)

Esta pedagogia vinha ao encontro às demandas de uma sociedade pautada na rigorosa divisão entre o trabalho manual e o intelectual e de uma tecnologia de base rígida, por meio de máquinas eletromecânicas que não exigiam muitas habilidades. Bastava memorizar os movimentos necessários a cada operação e repetir à medida que precisasse. Para desempenhar esta atividade, não era necessária outra formação escolar e profissional que não fosse memorizar conhecimentos.

A escola também se organizou nesta mesma perspectiva. Os conteúdos eram organizados de forma linear e fragmentada, por meio do método expositivo e a habilidade cognitiva fundamental era a memorização. O acesso ao conhecimento estava centrado no livro didático e no professor. Este concebiao conhecimento como um saber pronto, fechado em si mesmo, organizado e estruturado que devia ser transmitido por tópicos menores. Esse docente ensinava na certeza do paradigma conservador.

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Hoje, com as mudanças da sociedade

a profundidade do processo de mudança social que ocorre atualmente nos obriga a reformular as perguntas básicas sobre os fins da educação, sobre quem assume a responsabilidade de formar as novas gerações, e sobre qual legado cultural, quais valores, qual concepção de homem e de sociedade desejamos transmitir. (TEDESCO, 1998, p. 23)

Ou seja, acredita-se que as instituições que outrora assumiam um papel de disciplinamento, socialização e moralização, sofreram uma profunda transformação, inibiram-se ou perderam inibiram-seu significado. No que diz respeito a escola, ela também mudou. No dizer de Enguita (2004, p. 66)

Se antes ela ocupava apenas um lugar discreto na vida das pessoas (4 a 6 anos para a maioria, menos ou nada para muitos, e mais do que isso apenas para alguns poucos encaminhados às profissões liberais e burocráticas), passou a absorver praticamente a infância, a adolescência e boa parte da juventude [...] É desnecessário dizer que esse tempo a mais na escola é tempo a menos na família, na comunidade e no trabalho, o que por si só, já justifica um papel maior da escola na moralização das crianças.

Acredita-se que a sociedade contemporânea diante das tecnologias da informação, passa a exigir um indivíduo de novo tipo. Não mais o bom orador com ótima cultura geral formado pela escola humanista, mas um cidadão com capacidade de inovar e aprender cada vez mais, compreender o mundo que participa, desenvolver a capacidade de resolver problemas e saber operacionalizar e interpretar as informações adquiridas. Numa sociedade em que as pessoas têm facilidade de acesso às informações, a escola deve formar o aluno para pensar de forma reflexiva para poder selecionar as informações.

Segundo Behrens (2005), a partir do século XX a ciência que se sustentava em certezas entrou em crise questionando posições cristalizadas como por exemplo a concepção positivista, a unilateralidade do pensamento. Nesse momento histórico, vislumbrava-se uma visão mais ampliada e imbricada de vida e de mundo em que o sujeito se percebe como sujeito atuante numa teia de relações sociais, políticas, econômicas e culturais.

Neste sentido, busca-se um novo paradigma numa perspectiva inovadora e diferenciada de mundo. Para Behrens (2006), essa busca demanda uma revisão na visão de mundo, de sociedade e de homem.

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Capra (1996, p.25), afirma que esse novo paradigma pode ser chamado de

uma visão de mundo holística, que concebe o mundo como um todo integrado, e não como uma coleção de partes dissociadas. Pode também ser denominado de visão ecológica, [...] numa percepção profunda que reconhece a interdependência fundamental de todos os fenômenos, e o fato de que, enquanto indivíduos e sociedade, estamos todos encaixados nos processos cíclicos da natureza.

Para Morin (2006, p.89), na busca de um novo paradigma, é necessário “substituir um pensamento que isola e separa por um pensamento que distingue e une, um pensamento disjuntivo e redutor por um pensamento complexo, no sentido originário do termo complexus: o que é tecido junto”.

Nesse novo paradigma Morin (1995) afirma que a complexidade é efetivamente o tecido de acontecimentos, ações, interações, retroações, acasos, desordem, ambigüidade e incertezas. Neste contexto as contradições são vistas como “descoberta de uma camada profunda da realidade que nossa lógica seria incapaz de dar conta [...]” (MORIN, 2003, p.44).

Por esse viés, deve-se superar a visão reducionista e estanque que a mentalidade clássica incutiu nos seres humanos, para uma visão dialógica e questionadora entre unidade e diversidade, quantidade e qualidade que contribua para a transformação na maneira de pensar, de se relacionar e integrar novas perspectivas nas ações cotidianas.

Como bem afirma Moraes (2004, p. 129)

Pensar o complexo é ser capaz de unir conceitos divergentes e que normalmente são catalogados de maneira fechada e com visão limitada. É ter um pensamento capaz de pensar o contraditório, de analisar e sintetizar, de construir, desconstruir e reconstruir algo novo.

Na educação, essa concepção inovadora exige novas reflexões e atitudes que incluem, o questionamento constante, a dúvida e a incerteza num enfoque globalizador e interdisciplinar do conhecimento. Nesse viés busca-se a superação de uma visão mecânica e fragmentada de mundo para uma visão dinâmica e integrada; de uma perspectiva reducionista para a sistêmica e interconectada num grande elo de relações; do isolamento e individualismo para a partilha e à construção coletiva.

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Sendo assim, o modelo tradicional do paradigma newtoniano-cartesiano entra em crise atingindo a sociedade como um todo. Nesse contexto a instituição escolar não pode ficar alheia a essas transformações. Ela deve estar aberta para incorporar a constante instabilidade da sociedade emergente, e manter-se aberta às discussões e vivenciá-las com seus atores pedagógicos por meio de uma proposta democrática, crítica, participativa e decisiva na formação dos cidadãos. Estar aberta, significa também rever o papel do professor e do aluno; as concepções de avaliação, metodologia e da escola propriamente dita.

No que diz respeito ao professor, acredita-se que a sua ação em sala de aula consiste num conjunto de atitudes que revelam o seu fazer e o seu pensar pedagógico seja no processo de ensino propriamente dito, na avaliação, na seleção de conteúdos ou no uso de recursos tecnológicos. Como afirmar Pimentel (1994, p. 37) “significa questionar profundamente as próprias posições filosóficas, epistemológicas, políticas e ideológicas; significa entender-se como ser histórico e perguntar-se sobre suas intencionalidades [...]”.

Sobre o professor, pode-se afirmar que existe a exigência de uma nova postura na sua relação com o conhecimento e com o processo cognitivo de aprendizagem de seus alunos. Esse professor, deve estar preocupado com a aprendizagem e desenvolver seu trabalho baseado na incerteza do paradigma da complexidade.

[...] o professor deverá ultrapassar seu papel autoritário, de dono da verdade , para se tornar um investigador, um pesquisador do conhecimento crítico e reflexivo [...] precisa saber que pode romper barreiras mesmo dentro da sala de aula, criando possibilidades de encontros presenciais e virtuais que levem o aluno a acessar as informações disponibilizadas no universo da sociedade do conhecimento. [...] precisa servir-se da informática como instrumento de sua prática pedagógica [...] (BEHRENS, 2006 a, p. 71-74)

O paradigma da complexidade exige uma articulação entre múltiplas visões. Por essa vertente,

a prática pedagógica do professor precisa desafiar os alunos a buscarem uma formação humana, crítica e competente, alicerçada numa visão holística, com uma abordagem progressista, e num ensino com pesquisa que levará o aluno a aprender a aprender. O aprendizado deve ser impulsionado pela curiosidade, pelo interesse, pela crise, pela problematização e pela busca de soluções [...] (BEHRENS, 2006 a, p. 84).

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Por esse viés o aluno deve ser formado para a autonomia, como um ser complexo, que vive num mundo de relações, que está em constante construção e que busca infinitas possibilidades para sua realização.

Desenvolver um trabalho nessa perspectiva, torna-se necessário ao docente fazer opções metodológicas que favoreçam a construção de uma prática pedagógica calcada com os princípios e finalidades da Educação Superior e com a formação do novo tipo de ser humano numa visão inovadora.

As opções metodológicas na visão inovadora favorecem a formação do indivíduo como ser histórico cuja prática se encaminhe dialeticamente através da ação/reflexão/ação pautada no diálogo e no trabalho coletivo. Nesta direção, contempla-se um trabalho de parceria entre professor e aluno, numa prática pedagógica crítica, reflexiva e transformadora.

No paradigma da complexidade, a avaliação permeia todo o processo educativo. Assume um caráter contínuo e transformador, estimulando a construção do conhecimento e o crescimento gradativo do aluno, a unidade na diversidade e tem no erro a possibilidade de encontrar novos caminhos.

Tendo em vista a tentativa de caracterização dos paradigmas conservadores e inovadores na educação, e considerando a crise que se instala nesse início de século, acredita-se que não há como o professor acredita-se iacredita-sentar do desafio que acredita-se coloca: rever o acredita-seu fazer e o acredita-seu pensar pedagógico por meio dos referenciais teóricos e práticos que a contemporaneidade coloca.

Contudo, destaca-se a necessidade do professor estar atento à sua prática e ao seu pensar para transformá-los numa práxis educacional verdadeiramente comprometida com a transformação da sociedade para melhor e em formar um ser holístico, assim como afirma Cardoso (1995, p. 47)

Hoje, ser holístico é saber respeitar diferenças, identificando a unidade dialética das partes no plano da totalidade. A atual abordagem hoslística na educação não pretende ser uma nova verdade que tenha a chave única das respostas para os problemas da humanidade. Ela é essencialmente uma abertura incondicional e permanente para o novo, para as infinitas possibilidades de realização do ser humano.

Neste sentido, levando em conta o período de crise vivenciado na sociedade do conhecimento, urge que metodologias inovadoras, parcerias colaborativas e diálogo constante

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tornem-se prerrogativas indispensáveis na relação professor-aluno. Para tanto, trilhar os caminhos da pesquisa e da leitura são varáveis fundantes na construção da competência docente e discente.

Contudo, convém ressaltar que para promover essa mudança, além da competência técnica, é premente que os agentes desse processo estejam convencidos da necessidade do seu envolvimento. Defende-se que para esse envolvimento é necessário comprometimento político e ter paixão pelo que se faz. Estar comprometido politicamente significa compreender a sociedade em que se vive e ter clareza daquilo com que a sua ação está comprometida. E sobre a paixão pelo que se faz, Gramsci (1991) lembra que os intelectuais, na maior parte das vezes esquecem-se do sentimento em suas atividades. O processo educativo exige também envolvimento afetivo. Um professor que faz da sua atividade algo neutro, sem envolvimento, dificilmente será um professor comprometido com a emancipação dos seus alunos. Portanto, além do compromisso teórico e político é preciso também ter compromisso afetivo com o que se faz.

Problematização

Entende-se que o professor deve estar constantemente ocupado consigo mesmo em rever, analisar e inventariar a sua concepção de mundo. Deve estar atento aquilo que dá sustentação à sua ação docente, para torná-la a cada dia mais unitária, coerente e consistente. Nessa dimensão deve pensar e executar seu projeto de sociedade e de aluno que pretende formar ciente que a contemporaneidade, passa a exigir um indivíduo de novo tipo com capacidade de inovar e aprender cada vez mais, compreender o mundo que participa e desenvolver a capacidade de resolver problemas.

Como afirma Gramsci (1986, p.12)

Criticar a própria concepção do mundo, portanto, significa torná-la unitária e coerente e elevá-la até o ponto atingido pelo pensamento mundial mais desenvolvido. Significa, portanto, criticar, também, toda a filosofia até hoje existente, na medida em que ela deixou estratificações consolidadas na filosofia popular. O início da elaboração crítica é a consciência daquilo que somos realmente, isto é, um ‘conhece-te a ti mesmo’ como produto do processo histórico até hoje desenvolvido, que deixou em ti uma infinidade de traços recebidos sem benefício no inventário. Deve-se fazer, inicialmente, este inventário.

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Nesse contexto defende-se que o professor deve dar sentido e significado à sua ação. No entanto, considera-se que o docente deve estar preparado

[...] para assumir novas perspectivas filosóficas, que contemplem visões inovadoras de ensino e escola, aproveitando-se das amplas possibilidades comunicativas e informativas das novas tecnologias, para a concretização de um ensino crítico e transformador de qualidade. (KENSKI, 2006, p. 73)

Levando em conta esse contexto e considerando a importância da pesquisa como característica fundante de um programa de pós graduação e do compromisso que move a ação dos alunos do mestrado e doutorado, colocou-se, no processo da pesquisa-ação, dentro da disciplina, o desafio de se investigar: Até que ponto os referenciais teóricos dos

paradigmas pedagógicos inovadores podem contribuir para uma revisão do fazer e do pensar pedagógico do professor universitário de maneira que oportunize uma aprendizagem significativa, crítica, criativa e transformadora? Quais os referenciais que caracterizam o paradigma da complexidade e como aplicá-lo na prática pedagógica na Educação Superior?

Assim, buscou-se na produção acadêmica, subsídios que desse sustentação a uma prática pedagógica inovadora dos professores universitários.

Na busca de um caminho: pesquisa -ação

Por conta da proposta de trabalho pedagógico apresentada, o enfoque da pesquisa será qualitativo, tomando como referência a abordagem de Lüdke e André (1986, p. 11-13) com as seguintes características básicas: o contato direto e prolongado do pesquisador com o ambiente e a situação investigada; a descrição de situações; ao estudar um determinado problema o pesquisador deve verificar como ele se manifesta nas atividades, nos procedimentos e nas interações cotidianas.

Segundo Polit; Beck e Hungler (2001) essa abordagem permite um delineamento flexível de estudo numa perspectiva holística para a compreensão do todo, além de permitir o uso de várias estratégias para coleta de dados. Além disso exige um intenso envolvimento do pesquisador que torna-se o próprio instrumento da pesquisa. Neste movimento exige também uma análise contínua e constante dos dados.

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Para dar conta dessa abordagem, optou-se pelo método de pesquisa-ação. Thiollent (2000) afirma que trata-se de um método ou de uma estratégia de pesquisa.

[...] a pesquisa- ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo. (THIOLLENT, 2000, p. 14; 19)

Portanto, o desafio que se colocou para os professores universitários, foi o de buscar uma prática pedagógica inovadora. Acredita-se que a construção de um espaço coletivo para discussões dos pressupostos teóricos e práticos, possibilitou a reflexão individual e coletiva para uma opção metodológica, crítica, criativa e inovadora.

Para o desenvolvimento da pesquisa-ação, contou-se com a participação de 21 mestrandos e doutorandos em Educação, de uma universidade particular de grande porte, que conviveram na disciplina de Paradigmas Educacionais na Prática Pedagógica. Cabe ressaltar que a proposta da disciplina foi idealizada e discutida com o objetivo de oferecer um processo de formação continuada dos professores, dentro do stricto sensu, para refletir, produzir e alicerçar uma prática pedagógica que atenda as exigências do paradigma da complexidade. Esses participantes são professores universitários oriundos de diversas áreas do conhecimento (sociais aplicadas, humanas, biomédicas e tecnológicas) e que atuam em universidades públicas (estaduais e federais); universidades particulares e faculdades isoladas.

Para estimular a pesquisa, foi apresentada uma proposta de trabalho para que os professores investigassem os quadros de referências sobre os paradigmas inovadores. A proposta referia-se a produção de conhecimento, leituras, discussões, produção individual e coletiva. Os sujeitos ouviram, leram, discutiram, questionaram e entenderam como se desencadearia todo o processo, mesmo porque eles seriam os agentes que fariam os trabalhos individuais e coletivos, as discussões e a pesquisa como um todo. Enfim, como afirma Thiollent (2000, p. 15), “na pesquisa-ação os pesquisadores desempenham um papel ativo no equacionamento dos problemas encontrados, no acompanhamento e na avaliação das ações desencadeadas [...]”

Sendo assim, deu-se início à pesquisa com a participação dos docentes como sujeitos do processo, na crença de que o professor pode produzir seu próprio conhecimento. A pesquisa foi dividia em cinco etapas.

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A primeira etapa consistiu na apresentação de um contrato didático com destaque à problematização que nortearia as reflexões dos professores universitários na busca de referenciais para repensarem a ação docente numa perspectiva do paradigma da complexidade.

A segunda etapa optou-se pela leitura e reflexão crítica de textos e artigos que contemplassem a proposta. Nessa fase, adotou-se a produção individual para a construção de um quadro sinóptico. O propósito era sistematizar os pressupostos dos paradigmas conservadores da abordagem tradicional, escolanovista e tecnicista e dos paradigmas inovadores da complexidadade da abordagem progressista, holística e do ensino com pesquisa. Para compor o referido quadro foram eleitas as seguintes categorias: aluno, professor, metodologia, escola e avaliação acreditando-se que esses são os conceitos fundamentais na relação do professor com a sala de aula e que passaram a nortear a pesquisa.

A terceira etapa consistiu na discussão dos referenciais pesquisados. A cada quadro construído, nas diferentes abordagens acima referenciadas, houve discussão e partilha das experiências, dificuldades e avanços vivenciados pelos professores. E assim, pela diversidade, incerteza e unidade refletiu-se sobre as contribuições desses referenciais no sentido de se rever o fazer e o pensar do professor universitário em sala de aula e a possibilidade de incrementar a sua força articuladora de agente transformador da sociedade.

Encontrando guarida em Thiollent (2000, p. 26) organizou-se a quarta etapa, pois para o autor

[...]no desenvolvimento da pesquisa-ação, os pesquisadores recorrem a métodos e técnicas de grupos para lidar com a dimensão coletiva e interativa da investigação [...] Trata-se de um método [...] que se estabelece uma estrutura coletiva, participativa e ativa ao nível da captação da informação.

Nesse sentido, a partir do aprofundamento teórico e prático das pesquisas, buscou-se inserir as produções individuais num trabalho coletivo. Portanto, a partir da organização de pequenos grupos de três integrantes, procurou-se construir quadros sinópticos que refletissem as reflexões individuais. Esse trabalho seguiu-se de apresentação e discussão dessas sistematizações e ainda apontando alternativas para um aprofundamento da prática pedagógica do professor universitário na dimensão dos paradigmas inovadores.

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A quinta etapa, com base nos referenciais estudados, os mestrandos e doutorandos produziram textos próprios. Primeiro individualmente e após a troca em grupo, houve a produção coletiva de elaboração de artigos em trios. A proposta foi elaborar um texto que contemplasse uma reflexão acerca da prática pedagógica à luz do paradigma inovador.

Considerações Finais

A vivência desse trabalho trouxe muitos aspectos positivos. Um aspecto relevante, foi a discussão do processo por todo o grupo, a cada passo. Desde a elaboração dos quadros sinópticos até a produção final do texto.

A partir das reflexões teóricas e práticas, buscou-se despertar no grupo o espírito crítico e de investigação, a autonomia intelectual e a criatividade como características a serem analisadas e exigidas dos alunos e professores contemporâneos. Assim, numa dimensão dialética, ao mesmo tempo que procuravam entender a produção teórica-prática da ação do professor, em meio a acertos e erros, angústias e resoluções satisfatórias, buscavam subsídios para a sua própria experiência enquanto acadêmicos do stricto-sensu..

Neste sentido pode-se afirmar que os docentes envolvidos, encontram significados para suas reflexões; aprenderam enquanto alunos envolvidos na formação continuada e como profissionais da educação superior, puderam repensar suas atividades cotidianas de sala de aula.

Além disso, destaca-se que os mestrandos e doutorandos são oriundos de diferentes áreas do conhecimento possibilitando uma maior convivência com a diversidade de pensamento e nessa diversidade busca-se a unidade pois um empresta para o outro a sua vivência, caracterizando a riqueza do trabalho.

Porém, é importante questionar, até que ponto os mestrandos e doutorandos, a partir desses estudos, mudaram sua prática pedagógica. Considerando a participação desses docentes no processo investigativo, acredita-se que houve uma reflexão consistente acerca da sua ação docente. Optar por uma mudança de paradigma, depende do grau de convencimento e do compromisso estabelecido por cada um. Como foi abordado anteriormente, o professor deve estar constantemente ocupado consigo mesmo em rever, analisar e inventariar a sua concepção de mundo, ou seja, aquilo que dá sustentação à sua ação docente, para torná-la a cada dia mais unitária, coerente e consistente. Ao pensar em seu projeto de sociedade, deve também se dar conta que a sociedade contemporânea, passa a exigir um indivíduo de novo

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tipo com capacidade de inovar e aprender cada vez mais, compreender o mundo que participa e desenvolver a capacidade de resolver problemas.

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