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irregulares, pois grupos insurgentes, organizações terroristas e facções armadas romperam o pretenso monopólio estatal sobre a guerra, protagonizando

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Academic year: 2021

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Prefácio

A guerra irregular é a forma mais antiga de se combater e, desde meados do século passado, também, a mais usual. Analistas políticos e militares esti-mam que esse tipo de luta deverá predominar sobre os tradicionais métodos de beligerância durante, pelo menos, as primeiras décadas do século xxi.

Terrorismo, guerrilha, insurreição, movimento de resistência, combate não convencional e conflito assimétrico, por exemplo, são alguns dos con-ceitos ou práticas abarcados pelo conjunto de ideias, mais amplo e muito pouco compreendido, denominado guerra irregular.

Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, ocorreram mais de oitenta guerras de natureza assimétrica. Noventa e seis por cento dos con-flitos transcorridos durante a década de 1990 foram assimétricos. Somente no biênio 1999-2000, especialistas registraram cerca de cinquenta incidentes possíveis de serem qualificados como “ações de guerra não convencional”. Um breve olhar sobre as áreas de tensão e as áreas conflagradas em torno do planeta reforçará a ideia de supremacia das práticas qualificadas como

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“irregulares”, pois grupos insurgentes, organizações terroristas e facções armadas romperam o pretenso monopólio estatal sobre a guerra, protago-nizando os principais conflitos da atualidade.

A onipresença da mídia, o assédio de organizações humanitárias e a influência da opinião pública sobre a tomada de decisões políticas e mili-tares têm caracterizado um cenário onde exércitos nacionais permanentes, com orçamentos dispendiosos e moderna tecnologia, parecem ineficazes e antiquados. Porquanto, rebeldes, guerrilheiros e terroristas subsistem a despeito de todos os esforços para erradicá-los. Nas sombrias selvas da América do Sul, nas magníficas montanhas da Ásia Central e, sobretudo, nos centros urbanos superpovoados dos países pobres ou em desenvolvi-mento, o estado vem se defrontando com ameaças difusas e complexas, as quais não consegue extinguir. A guerra no século xxi tem assumido, de fato, a feição do combate irregular.

Tais considerações já bastariam para realçar a importância do tema des-te livro. entretanto, convém destacar o desconhecimento que o cerca, em especial o laicismo da opinião pública, que, apesar de desempenhar um papel decisivo nesse modo de beligerância, ignora por completo os aspec-tos elementares de sua natureza. Diariamente, sem que tenham a exata no-ção do tipo de fenômeno político, social e militar que constitui o combate não convencional, os órgãos de imprensa e o público em geral veiculam e têm acesso a uma torrente de informações sobre os conflitos irregulares em curso ao redor do mundo.

A guerra irregular, com grande frequência, se desenvolve sem que seja declarada, reconhecida ou sequer percebida. Por vezes, é oculta. Mas é in-variavelmente incompreendida pelo estado (incluindo parcela considerável de suas forças armadas) e por diferentes segmentos da sociedade civil.

Se, desde meados do século passado, a guerra irregular é a forma de conflito mais comum e se as perspectivas são de que continue assim, é de se surpreender, portanto, que a sociedade se mostre, ainda, tão vulnerável a esse tipo de ameaça. A questão central reside no fato de que, sem co-nhecimento, a sociedade se torna mais suscetível, tanto à propaganda e ao proselitismo de facções extremistas, quanto ao uso de métodos violentos de coerção e intimidação física e psicológica.

Na verdade, a partir da segunda metade do século xx, a guerra ir-regular tem sido objeto de uma atenção cada vez maior, pois as prá-ticas de terrorismo, subversão e guerrilha difundiram-se de tal

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for-ma que afetaram, direta ou indiretamente, em for-maior ou menor grau, a quase totalidade das nações do globo, incluindo o Brasil. Com o tér-mino da Guerra fria, criaram-se infundadas expectativas de que o sec-tarismo fratricida alimentado pelo radicalismo ideológico que afligia o Terceiro Mundo teria um fim. Não tardou para que os atentados ter-roristas perpetrados contra os estados Unidos em setembro de 2001 e as subsequentes campanhas militares desencadeadas pela Casa Branca no Afeganistão e no iraque renovassem o interesse pela guerra irregu-lar, proporcionando-lhe inigualável destaque na literatura especializada. Muitas são as obras que versam sobre o tema e, pela relevância que ora adquire, muitas outras ainda virão. Porém, a maior parte delas pertence a autores estrangeiros e, infelizmente, não se encontra traduzida para o por-tuguês. Portanto, não será este livro que esgotará um assunto tão amplo e controverso, nutrindo a descabida ambição de constituir-se em “uma obra definitiva” – se é que existe ou existirá alguma. Seu objetivo é bem mais modesto, qual seja, introduzir o leitor ao tema da guerra irregular e cola-borar com a reflexão e a formação de um melhor juízo acerca do conflito assimétrico. Compreender sua natureza e suas peculiaridades é imprescin-dível para que a sociedade exija, discuta e apoie políticas governamentais de defesa, quase sempre impopulares, dispendiosas e de longo prazo, que se anteponham às ameaças ditas de “Quarta Geração”. entender melhor o combate irregular é, obviamente, um pré-requisito para que a sociedade se torne, de fato, menos vulnerável a ele.

este livro proporciona ao leitor meios para ampliar sua compreensão acerca das questões afetas à segurança. enfocando a guerra como fenôme-no social, ajuda a romper o rígido estereótipo, ainda tão arraigado na opi-nião pública, da confrontação militar formal, caracterizada pelo genocídio de infantes, duelos de artilharia e emprego de grandes formações blindadas.

Guerra irregular: terrorismo, guerrilha e movimentos de resistência facilita o entendimento de fatos históricos relacionados à prática da guer-ra irregular – um aspecto que merece especial atenção, pois muito se tem escrito sobre luta armada, guerrilha e terrorismo na história recente do Brasil. Porém, apesar de farta documentação, de minuciosa pesqui-sa e da reconhecida dedicação de seus autores, dificilmente o tema é tratado, em sua essência, como o que de fato foi: um conflito armado, uma forma peculiar de beligerância, com seus princípios e métodos es-pecíficos, mas que, mesmo assim, parafraseando Clausewitz, constituiu-se, como qualquer guerra, em um ato de violência mútuo, perpetrado por duas forças antagônicas que pretendiam submeter uma à outra.

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os militares, também, podem se beneficiar com esta leitura, pois a his-tória nos tem revelado que o “modo castrense de pensar” não se adapta perfeitamente às peculiaridades do combate irregular. É curioso obser-varmos, por exemplo, que nenhum grande líder guerrilheiro do século xx foi um soldado profissional. T. e. lawrence, Michael Collins, Joseph Broz Tito, Mao Tsé-tung, fidel Castro, Vo Nguyen Giap ou Ahmad Shah Mas-soud, para citar apenas alguns nomes, foram todos civis. A resoluta obses-são pelos tradicionais padrões doutrinários e a lógica cartesiana que têm distinguido os militares pouca ou nenhuma serventia têm em uma guerra em que prevalecem fatores de ordem política, cultural e psicológica em detrimento do poder relativo de combate das partes beligerantes. Não foram poucas as forças convencionais que, mesmo dotadas de liderança e dos meios necessários, tornaram-se impotentes ou sofreram grandes reve-zes diante de pequenos contingentes guerrilheiros ou células terroristas. Porém, para um restrito segmento das forças armadas, o presente livro não passa de um mero roteiro para reflexão. refiro-me às forças especiais, cujos membros são rigorosamente selecionados, treinados e orientados para atender às exigências do combate irregular.

iniciar ou mesmo limitar a abordagem da guerra irregular por seus prin-cípios gerais ou fundamentos teóricos resultaria em um texto por demais abstrato. Por outro lado, escrever um “manual de guerrilha” ou um “guia prático de terrorismo” nunca foi, nem poderia ser, o objetivo do autor. Desse modo, recorremos a estudos de casos, com o intuito de respaldar e ilustrar as ideias apresentadas no corpo da obra.

o capítulo “Da Antiguidade às torres gêmeas” aborda a evolução da guerra irregular segundo uma perspectiva histórica. No capítulo “os princi-pais conflitos e campanhas irregulares do século xx”, são apresentados, de forma bem sucinta, alguns dos principais conflitos e campanhas irregulares do século passado. foram tantos que mencioná-los todos desviaria este livro de seu propósito. os dez eventos selecionados contribuem, de algum modo, para sistematizar e dotar a guerra irregular de uma metodologia específica. Ainda assim, conflitos importantes como a contrainsurgência britânica na Malásia ou as guerras de independência na África Subsaariana, por exemplo, não são diretamente abordados.

o leitor poderá surpreender-se, também, com as raras alusões feitas à luta armada no Brasil durante as décadas de 1960 e 1970. Seus parcos resultados e a esmagadora derrota imposta pelos órgãos de repressão do

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estado desqualificam-na como evento útil aos objetivos deste livro, exceto, é claro, pelos seus grandes equívocos.

Muitos especialistas no assunto citam com frequência o famoso

Minima-nual do guerrilheiro urbano, escrito por Carlos Marighella – insigne revolucio-nário brasileiro. Trata-se de uma cartilha “traduzida para mais de 15 idiomas em todo o mundo”, contendo um conjunto de ideias elementares, que confe-riu a seu autor reputação internacional. o nome de Marighella, por exemplo, aparece nada menos do que 67 vezes no transcorrer da interessante obra de Von Der Heydte, A guerra irregular moderna em políticas de defesa e como

fe-nômeno militar. Paradoxalmente, sua estoica trajetória como líder revolucio-nário foi marcada pelo insucesso. Por esse motivo, pouco recorremos a Mari-ghella e ao período da história brasileira do qual se tornou o maior expoente. No capítulo “Pressupostos teóricos da guerra irregular”, é apresentada a “teoria da guerra irregular”, propriamente dita. Graças ao seu caráter informal, dinâmico e flexível, persiste uma grande dificuldade em estabe-lecer conceitos e classificações doutrinárias abrangentes acerca desse tipo peculiar de conflito armado. Porém, sua essência não muda. A redação de conceitos formais é muito extensa, entretanto sua real utilidade é bastante limitada. Assim sendo, o emprego de definições doutrinárias, neste livro, foi até onde sua abordagem prática permitiu. Nessa oportunidade, também são tecidas algumas considerações sobre os óbices à aplicação do Direito inter-nacional Humanitário nos conflitos irregulares, algo que, hoje mais do que nunca, constitui um dos grandes desafios para os juristas em todo o mundo.

Nos dois capítulos seguintes, “Terrorismo” e “Narcoguerrilha e narcoter-rorismo”, são analisadas, pela relevância atual que o tema adquire, algumas questões afetas ao terrorismo e ao narcoterrorismo, incluindo uma impor-tante abordagem sobre a escalada da violência urbana nas grandes cidades brasileiras. o último capítulo, “Vencendo a guerra irregular”, dedica-se aos preceitos básicos da contrainsurgência, algo que, por razões óbvias, tem se tornado uma das principais preocupações entre militares e agentes de segurança do estado.

Boa parte dos assuntos que aqui serão tratados é, no mínimo, controversa. Portanto, sugiro ao leitor que esteja despido de preconceitos e que se mos-tre acessível a novas abordagens. Vale a pena lembrar que a dialética con-temporânea perde-se na dicotomia existente entre “o mundo como ele é” e “como ele deveria ser”. Admito ter despendido um grande esforço no sentido de atribuir coerência e imparcialidade a este livro. espero ter obtido êxito.

Referências

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