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FILÊMON: LIBERTAÇÃO! BRASIL: ESCRAVIDÃO ANÁLOGA

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ra um desafio enfrentar a questão que girava em torno do apelo à liberdade, quando o cerne econômico do império romano era baseado no modo de produção escra-vagista (BRADLEY, 1987). Todo o império que ia dos Rios Tigre e Eufrates até a Península Ibérica, desde o Norte da África até a atual Inglaterra, tendo o Mar Mediterrâneo, o Mare Nostrum, como o ícone da grandeza romana, tudo girava em torno do modo de produção que escravizava mais de dois terços daquela vasta sociedade (WENGST, 1991). As contradições econômicas, militares, políticas, ideológicas e sociais eram pontiagudas (ROSTOVTZEFF, 1967; GIORDANI, 1981; GRANT, 1960). Roma governava, a partir do imperador, com as forças militares, com o senado e com o patronato (CHOW, 2004, p. 111-29). Pequenos grupos, em diversas partes do império, começaram a anunciar a novidade de Jesus Cristo. Dentre aqueles grupos originários, surgiu, também, o grupo de Paulo, um recém-convertido que abraçou, para valer, a causa missionária.

* Recebido em: 06.09.2018. Aprovado em: 29.10.2018.

** Pós-Doutor pela Georgetown University de Washington DC. Doutor pela UMESP. Professor na PUC Goiás. E-mail: joelantônioferreira@hotmail.com

FILÊMON: LIBERTAÇÃO!

BRASIL: ESCRAVIDÃO

ANÁLOGA*

JOEL ANTÔNIO FERREIRA**

DOI 10.18224/frag.v28i3.6538

ARTIGOS

ARTIGOS

Resumo:em Filêmon, abordam-se questões tensas na literatura sagrada: a questão da escravidão e a proposta da Palavra de Deus, na busca da liberdade1. Com este Bilhete a Filêmon, veem-se

como as primeiras comunidades ajudaram, na linha social, a criar uma identidade transformadora, e como, a partir da religião, portanto, da fé, aqueles grupos emergentes, junto a Paulo, entenderam-se como agentes de uma nova identidade. No Brasil, a libertação dos escravos nunca terminou. Após a Lei Áurea, nunca houve, totalmente, liberdade para todos. A escravidão análoga, aqui, neste momento, é um dos dados mais vergonhosos da história do Brasil.

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O grupo de Paulo teve uma interessante experiência ao proclamar o Evangelho ao universo dos estrangeiros, ou seja, para os étnicos. O líder daquele grupo, Saulo de Tarso, agora, Paulo, conheceu nas suas experiências de missionário itinerante, um hino batismal que era cantado por comunidades anteriores a ele. Ele ficou tão impressionado com o hino que o colocou no centro da Epístola aos Gálatas (Gl 3,26-28). Aquele hino dizia que, a partir de Cristo Jesus, não havia mais “judeu e grego, escravo e livre, homem e mulher”. Era um cântico batismal que proclamava a superação de várias contradições do império romano (FERREI-RA, 2005, p. 88-102).

O Apóstolo e seu grupo, ao assumirem a radicalidade daquele programa que era um hino batismal, por muitas vezes, viveram as experiências da “Bem Aventurança da persegui-ção”1. Nessas, tantas vezes, foram detidos e presos.

FILÊMON: LIBERTAÇÃO

Parece que o Bilhete a Filêmon escrito por Paulo na cadeia, tinha acontecido em uma cela da cidade de Colossos. O texto, tão curto, reflete a presença de vários líderes cristãos, no início e no fim da missiva. De fato, foi uma pequena carta que envolveu uma comunidade na cadeia ou próxima a ela para uma comunidade que se reunia na casa de um certo Filêmon.

A estrutura do texto é tão simples: Bem no início (introdução), após as saudações a toda ekklesía, há uma apresentação e aí já aparece a palavra fundamental agápe (amor: v. 1-8). Em seguida (v.9-13), o bilhete aponta as contradições sociais que envolveram Onésimo que tinha sido escravo de Filêmon. O v. 14 mostra a habilidade do remetente Paulo para conven-cer Filêmon a dar a liberdade e receber Onésimo como alguém da família e da igreja. Os ver-sos 15-17 apontam os conflitos Filêmon/Onésimo e, imediatamente, assinala a fraternidade que vencerá o modo de produção escravagista. Um conflito forte foi o econômico: a questão credor/devedor devia ser superada (v. 18-22), na ekkesía, pelo fato de Filêmon e Onésimo serem filhos de Paulo, pela fé e o amor: portanto, ambos eram irmãos. No final, aparecem os nomes de Epafras e Timóteo que, parece, estavam, também, presos. Porém, não está claro se Marcos, Aristarco, Demas e Lucas eram prisioneiros ou apoiadores fora da cadeia. O versículo 25 reflete o entusiasmo da igreja que lutava pela liberdade.

O fato interessante é que Paulo estava preso por anunciar, destemidamente, a Boa Nova. Ele, além daqui, já tivera, antes, a experiencia do encarceramento (Fl 1,13-14; 2 Cor 11,23; Rm 16,7) Por coincidência, também foi colocado na mesma cela um escravo, chama-do Onésimo. Um foi preso por ser missionário e que, no anúncio, proclamava o hino que pre-tendia acabar com as assimetrias e com as desigualdades. O outro, pelo que sugere o Bilhete, foi preso por ter furtado alguma coisa do seu patrão, chamado Filêmon.

Os dois estão juntos na cadeia. Horas intermináveis juntos. O que conversavam? (FERREIRA, 2016, p. 377-401). Precisamos supor que, do lado de Paulo, falava-se sobre Jesus Cristo e sua mensagem libertadora para os étnicos, para os escravos e para as mulheres (Gl 3,26-28). Supõe-se, que, do lado de Onésimo, o assunto mais pontual fosse a questão da escravatura romana e, localizadamente, a sua escravidão na sua cidade. É de se supor, tam-bém, que o escravo falasse de seus sentimentos, emoções e de suas indignações contra o modo de produção escravagista e contra o seu ex patrão Filêmon3.

Quer-se, nesta comunicação, abordar somente dois temas que se manifestam no Bilhete: as questões da escravatura e a perspectiva econômica (dívida do escravo).

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Escravatura

Havia várias categorias de escravos, no sistema governamental romano, espalhado por todo o império: 1) Os que trabalhavam nas grandes propriedades agrícolas, habitual-mente, moravam perto das sedes; 2) Os que trabalhavam nas minas e nas pedreiras: viviam em situações piores que os demais escravos; 3) Os “escravos públicos”: dentre esses, haviam aqueles que eram até pedagogos e, por vezes, estavam em bom nível intelectual ou cultural; 4) os “funcionários” da cidade ou do imperador: serviam em atividades bem variadas. Se al-guns, de bom nível, trabalhavam em funções administrativas, outros desenvolviam trabalhos pesados, como a manutenção dos banhos públicos e dos aquedutos. 5) Os “escravos domés-ticos”: dependiam muito do humor dos seus senhores e das tarefas que lhe eram confiadas (FERREIRA, 2005, p. 109-10)4.

No direito romano, a condição de escravo podia ser o castigo de certos crimes (HOPKINS, 1978). Quem eram os escravos? Havia vários tipos: 1) Escravos por nascença; 2) Por serem prisioneiros de guerra; 3) Vendidos por seus pais; 4) Por se venderem para pagar dívidas. Em todo o império havia mercado de escravos (FERREIRA, 2005, p. 109).

Não dá para saber em que nível Onésimo atuava na casa de Filêmon. Supõe-se que ele era um tipo de escravo de propriedade agrícola ou “escravo doméstico”.

A Dívida de Onésimo

Os vv. 18-19 deixam transparecer uma tensão econômica. O Paulo abordou, no Bilhete, um problema que expressava conflitos no império: ser “credor-devedor”. Essa bi-polaridade era um dos motores que moviam o império. Por exemplo, as colônias estavam, sempre, debaixo do esquema do “débito” para com o centro do poder. Essa visão econômica estraçalhava as colônias. Então, quando Paulo falou a Filêmon que se Onésimo tivesse alguma dívida, ele, Paulo, pagaria pelo escravo. Ao usar esse termo, o Apóstolo estava reproduzindo o modo de pensar econômico romano. Escravo não podia dever. Onésimo era endividado e, assim, teria que continuar. Qual teria sido a dívida do escravo?

Os livres negociavam a dívida. Era o normal. No entanto, entre o “senhor” e o “escravo” não havia conversa. O senhor não se nivelava por baixo. Parece que Onésimo havia furtado alguma coisa (COMBLIN, 1987, p. 68). Seria por necessidade? No Bilhete, Paulo apresentou uma solução. Ele pagaria a dívida do escravo.

Se Paulo, no futuro, de fato, pagasse a dívida do escravo, ele estaria conivente com a lógica do “escravagismo” e seu modo de produção. Quando ele escreveu que quitaria a dívida (“eu pagarei”: v.19), ele estava no patamar do “lucro” e a relação “credor-devedor” continuaria. Filêmon receberia o prejuizo, o escravo continuaria escravo e tudo continuaria na normalidade escravagista.

Paulo, entretanto, deu um salto. O “devedor” econômico foi substituído pelo “de-vedor” existencial (v. 19c). Como assim? O patrão Filêmon, em outro nível, era, também “devedor” a Paulo. Ele era seu filho na fé. Mudou tudo. O patamar da economia dá lugar ao viés eclesiástico. Não se deve ficar no nível do lucro e do castigo. É preciso saltar para o estágio da comunidade: Filêmon convertido precisava saltar para a visão da comunidade igualitária, na perspectiva do Evangelho. Conhecer e aderir a Jesus Cristo devia significar a superação da assimetria econômica e aí, devia entrar um outro conceito: “perdão”. Se Filêmon devia a

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Paulo, no nível da nova existência, ele precisaria, agora, perdoar o Escravo pela ninharia do prejuízo econômico. Filêmon convertido não poderia continuar com o esquema piramidal romano. Ele deveria perdoar o escravo Onésimo. E agora, mais ainda! Deveria receber, de volta, Onésimo não mais como escravo, porém, como irmão.

Portanto, o “lucro” estava dando lugar à experiência do amor. Aí estava se realizan-do a “justiça” tão querida realizan-dos cristianismos originários. Onésimo era livre.

• O Bilhete a Filêmon retratou a resistência contra a escravidão romana. Questões tensas como a escravidão e a proposta da Palavra de Deus, na busca da liberdade, são fortes no texto. Pedindo que Filêmon tratasse Onésimo como irmão, Paulo mostrou que o Evange-lho punha fim às diferenças entre os seres humanos e esvaziava completamente o estatuto da escravidão.

Brasil: escravidão análoga

Oficialmente, em 13 de maio de 1888 (130 anos de abolição), a escravidão no Bra-sil foi extinta5. Oficiosamente, os transgressores, de um modo ou outro, mantiveram o siste-ma e usiste-ma cultura escravagista (COMISSÃO PASTORAL DA TERRA, 2003). A exploração, com o passar dos tempos, passou, além dos negros, a atingir os mais pobres não negros e os estrangeiros (DE ALMEIDA, 2017). O artigo 149 do Código Penal, que está em vigor desde 2003, afirma que quatro elementos podem configurar trabalho em condições análogas às de escravos: a) servidão por dívida; b) trabalhos forçados; c) condições degradantes; d) jornada exaustiva. Além desses quatro, ainda se estão apresentando mais situações que denunciam essa situação dolorida: restrição de locomoção; vigilância ostensiva; retenção de documentos; irregularidades trabalhistas e precarização do trabalho (MIRAGLIA, 2008). Houve um mo-mento de resistência jurídica em nível governamental e em níveis de organizações populares e religiosas nos dois últimos governos. Porém, no atual, aliado às forças ruralistas, a escravidão análoga tornou-se uma das maiores tensões vividas pelos brasileiros. O atual governo, espe-cialmente o executivo, tem demonstrado, incisivamente, principalmente no nível do campo que está de mãos dadas com aqueles que exploram a escravidão.

CONCLUSÃO

Filêmon: se se olha o Antigo Testamento, pela perspectiva social, vê-se que a Palavra bíblica, nas diversas linhas e segmentos, diante da escravidão foi um apelo de superação das profundas assimetrias sociais. Percebe-se, também, que os grupos da “margem” tinham os seus clamores voltados para Yahweh, o Deus dos pobres. Desde o Êxodo, passando por diver-sos salmos e outros livros sapienciais, até os profetas, o grito contra as injustiças sociais foram uma marca dos hebreu/israelitas. Paulo conhecia bem essa trajetória. Na sua conversão a Jesus Cristo e, na prática pastoral, dentro do império escravagista, ele compreendeu que deveria, sempre, estar do lado dos pequeninos.

Antes do texto a Filêmon, Paulo foi amadurecendo a questão de anunciar o Evan-gelho e proclamar a liberdade em pleno império romano. Em Gálatas (Gl 3,28b), ele disse que não havia mais “escravos e livres”. Em 1 Coríntios (1 Cor 7,22-23), ele afirmou: “não vos torneis escravos dos homens”. Ainda em 1 Coríntios (1 Cor 11,17-34), ele chamou a atenção para as desigualdades sociais e religiosas, mostrando que na “Ceia do Senhor” não pode haver

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escândalos: ricos se alimentando e bebendo e trabalhadores alijados (FERREIRA, 2013, p. 135-42). Ou seja, a igreja de Corinto não podia reproduzir o costume dos banquetes (deip-noi) romanos. Em 2 Coríntios (2 Cor 8,13-14) ele mostrou, concretamente, como se deve agir com igualdade: houve uma proposta e uma prática social, de verdade, ao organizar uma grande coleta para socorrer os habitantes de Jerusalém. Ele disse (2 Cor 14): “No presente momento, o que para vós sobeja, suprirá a carência deles, a fim de que o supérfluo deles venha um dia a suprir a vossa carência. Assim haverá igualdade”.

O Bilhete a Filêmon foi a concretização mais clara da desautorização da prática es-cravagista romana. A partir de Jesus Cristo, não poderia, pelo menos nas experiências cristãs, haver escravidão.

Se se vê o Bilhete a Filêmon, a partir do modelo dialético/contradição pela leitura sociológica, percebem-se contradições fortes na sociedade, principalmente, do império roma-no escravagista. Também, são vistas na comunidade cristã algumas assimetrias: por exemplo, o cristão Filêmon tinha, pelo menos, um escravo. Isso contradizia o apelo do Hino Batismal (Gl 3,26-28) que afirmava que, a partir de Jesus Cristo, não deveria haver mais “escravo e livre”.

Na prisão, convivendo e ouvindo o encarcerado Onésimo, Paulo deve ter sido mui-to questionado na sua prática. Provavelmente, Onésimo interrogou bastante o Apósmui-tolo so-bre a questão da liberdade (Gl 5,1.13) e o problema da escravidão (Gl 3,28). Certamente, o Apóstolo ouviu do escravo interrogações sobre o seu ex-senhor, Filêmon, que sendo cristão, tinha escravo.

Se os presos (Paulo e Onésimo) se entenderam, a partir da fé, então, deveria sair alguma proposta. Esta veio. O evangelizador, agora, não mais fazendo pregações teóricas, mas vendo Jesus Cristo no escravo Onésimo, fez um apelo concreto à casa de Filêmon. Era preciso acolher Onésimo, não mais como escravo, mas como se fosse o próprio Paulo (v. 17). O grito de Paulo à casa de Filêmon, um grito influenciado pelo preso, o escravo Onésimo, foi um clamor de quem, na concretude aviltante da prisão, queria porque queria que o Evangelho fosse vivenciado e a escravidão deveria acabar. O Bilhete foi um apelo de libertação. O Bilhete a Filêmon, com algumas diplomacias, por parte do autor, foi um verdadeiro manifesto de um grupo - Timóteo e Paulo (v. 1), Epafras, Marcos, Aristarco, Demas, Lucas (v. 23)-, contra uma escravidão particular e contra o modo de produção escravagista romano que oprimia milhares e milhares de pessoas. Foi um manifesto de fé e de amor, por causa da justiça.

Brasil: ao contrário da experiência de Filêmon, no Brasil do Séc. XXI, após 130 anos da abolição “oficial”, a escravidão análoga nunca terminou. Os transgressores, no imenso Brasil, de um modo ou outro, mantiveram o sistema e uma cultura escravagista. A exploração, com o passar dos tempos, passou, além dos negros, a atingir os mais pobres não negros e os es-trangeiros marginalizados. Nos ante-penúltiplos e penúltimos governos do Brasil, houve um significativo avanço para diminuir ou debelar a escravidão análoga no Brasil. Entretanto, no atual governo (estamos em 2018), com as forças empresariais e com a “bancada ruralista” em conluio com outras linhas políticas e jurídicas, o recrudescimento das tensões escravagistas voltou a tomar espaço. Relatos pela imprensa alternativa apontam, novamente, que milhares de pessoas, em todo o país, estão vivendo como escravos ou no campo ou nas grandes cidades.

Resistências: no entanto, tem havido, também no universo jurídico e nas pastorais cristãs, movimentos de resistência contra a vergonha sistêmica da escravatura. No nível jurí-dico, proveniente dos governos anteriores, tem desenvolvido um mecanismo de proteção para

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proteger todos os trabalhadores do país (brasileiros e estrangeiros), das condições análogas à escravatura. Em nível legal, há uma consciência de que não se podem cometer injustiças con-tra os con-trabalhadores. Tanto o Ministério do Trabalho e Emprego (MPTE, art. 626, da CLT), como o Ministério Público do Trabalho, a Justiça do Trabalho têm leis muito claras na prote-ção dos trabalhadores. No centro do combate à escravizaprote-ção da mão de obra no Brasil está o Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM), ligado à Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Ele é formado por auditores fiscais do trabalho – que coordenam as operações de campo –, policiais federais e procuradores do Mi-nistério Público do Trabalho (MPT).

Apesar da força econômica da “bancada ruralista” e suas estratégias políticas para manter o campo debaixo do seu poder, em nível federal, foram elaboradas “medidas de as-sistência e inclusão do trabalhador”, onde o trabalhador, em situação análoga à escravidão, deve ser protegido com socorro imediato, com garantia de sustento imediato, qualificação profissional e inserção social, sempre sob a supervisão do Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM).

Esse Grupo Especial é composto por várias instituições (oito equipes) que, ao atuar em conjunto, tenta combater o trabalho escravagista. Foi nesse contexto da nova legislação de proteção aos trabalhadores injustiçados que se criou o cadastro de empregadores infratores que mantêm trabalhadores em condições análogas à de escravo (Portaria n. 540 de 2004): “Lista de Transparência sobre Trabalho Escravo Contemporâneo” ou “lista suja” da escra-vidão por parte dos latifundiários que tem legiões de escravos análogos6.

Deve-se ressaltar, nesse combate ao trabalho escravo, a atuação da justiça do traba-lho. Juízes do trabalho, com abnegados esforços, em unidades móveis, nas Varas Itinerantes, entregam a prestação jurisdicional, por vezes, até no local do trabalho escravagista, com sen-tença imediata, assinatura da CTPS e todos os direitos que o empregado tiver direito.

No nível das pastorais, especialmente das igrejas cristãs, tem havido muita resis-tência contra a escravidão análoga. Várias iniciativas dos movimentos populares e das igrejas comprometidas com os trabalhadores injustiçados ou em condições análogas à escravidão, apesar das repressões, têm surgido no Brasil. Esses movimentos cristãos têm consciência de que nesse país, onde por séculos, vigorou a chaga da escravidão de modo legalizado, há o dever de repudiar qualquer retrocesso ou ameaça à dignidade e liberdade da pessoa humana. Os grupos de resistência continuam conclamando a sociedade a dizer mais uma vez um não ao trabalho escravo.

Portanto, assim como Paulo Apóstolo e seu grupo disseram um não ao escravagis-mo romano, também, alguns segmentos jurídicos nacionais e forças cristãs e populares brasi-leiras têm sido o braço forte na defesa da liberdade de milhares de brasileiros que ainda estão vivendo em condições análogas à escravatura no Brasil.

FILÊMON: RELEASE! BRAZIL: ANALOG SLAVERY

Abstract: in Filemmon, tense questions are addressed in sacred literature: the question of slavery and the proposal of the Word of God, in the search for freedom1. With this Ticket to Philemon, one sees how the first communities helped, in the social line, to create a transforming identity, and how, from the religion, therefore, of the faith, those emerging groups, together with Paul, understood themselves as agents of a new identity. In Brazil, the liberation of the slaves never ended. After the

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Golden Law, there was never, totally, freedom for all. Analog slavery, here, right now, is one of the most shameful facts in Brazilian history.

Keywords: Slavery. Freedom. Social Injustias.

Notas

1 Este pequeno texto é fruto de um GT do IX Congresso Internacional em Ciências da Religião da PUC Goiás (2018) que teve o conceito “Justiças” como o tema central do evento.

2 Dois personagens do grupo de Paulo acenam que o Evangelho era algo que o sistema romano não suportava. Ao se referir a Arquipo (v. 2) como “companheiro de lutas” e a Epafras, meu “companheiro de prisão por causa de Cristo Jesus”, percebe-se, por parte do autor, que o anúncio de Jesus Cristo incomodava as forças imperiais.

3 No último Congresso de Ciências da Religião da PUC Goiás (2018), em uma mesa-redonda, este autor teve a oportunidade de desenvolver, com suspeição, as possíveis reações do escravo “silenciado” por Paulo. Sobre este momento, o IX CONGRESSO publicou um livro sobre “As Justiças”. Ali se pode ler, de modo amplo, as possíveis palavras e reflexões do escravo Onésimo, em um dos capítulos do livro (FERREIRA, 2018, p. 278-291).

4 São interessantes essas informações jurídico-sociais, porque nós, do Brasil, anacronicamente, podemos olhar os escravos romanos com o olhar das experiências ignominiosas da escravatura brasileira, quando, para aqui vieram, milhares de seres humanos provenientes da África.

5 No GT 07 do IX Congresso Internacional em Ciências da Religião teve-se a oportunidade de apresentar, com mais tranquilidade, a questão aviltante da escravatura no Brasil, em pleno ano de 2018.

6 O Senado federal, por liderança de Eunício de Oliveira, conseguiu aprovar uma lei em que a “Lista Suja” deveria ser deletada. Assim, jamais seriam anunciados os nomes dos escravizadores análogos do Brasil. Porém, as reações em quase todas as camadas da sociedade foram tão contundentes que as instâncias superiores ao Congresso vetaram o intento do Senado federal. Fica de pé, apesar da “bancada ruralista”, a lista de transparência sobre Trabalho Escravo Contemporâneo.

Referências

BRADLEY, K. R. Slaves and Masters in the Roman Empine: a study in social control. New York, Oxford: Oxford University Press, 1987.

COMISSÃO PASTORAL DA TERRA. Campanha de prevenção e combate ao trabalho escravo de olho aberto para não virar escravo. CPT, 2003. Disponível em: <http://www. cptnac.com.br/?system=news&action=read&id=1107&eid=46>. Acesso em: 27 fev. 2010. CHOW, J. K. Patronato na Corinto Romana. In: HORSLEY, R. A. (Org.) Paulo e o Impé-rio: religião e poder na sociedade imperial romana. São Paulo: Paulus, 2004, p. 111-129. COMBLIN, J. A Mensagem da Epistola de São Paulo a Filemon. Estudos Bíblicos, Petrópo-lis, n. 2, p. 66-70, 1987.

DE ALMEIDA, André Henrique. Mecanismos de combate ao trabalho escravo contempo-râneo. Rio Grande: 2017. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index. php?artigo_id=11299&n_link=revista_artigos_leitura>. Acesso em: 07 dez. 2017.

FERREIRA, Joel A. Primeira Epístola aos Coríntios. São Paulo: Fonte Editorial, 2013. FERREIRA, Joel A. Gálatas: A Epístola da Abertura de Fronteiras. São Paulo: Loyola, 2005. FERREIRA, Joel A. Onésimo: um personagem silencioso no Bilhete a Filêmon? Horizonte, Belo Horizonte, v. 14, n. 42, p. 377-401, 2016.

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Val-mor da (Org.). Justiças. Goiânia: Espaço Acadêmico, 2018, p. 278-291. GIORDANI, M. C. História de Roma. Petrópolis: Vozes, 1981.

GRANT, Michel. O Mundo de Roma. Rio de Janeiro: Arcádia, 1960.

MIRAGLIA, Lívia Mendes Moreira. Trabalho escravo contemporâneo: conceituação à luz do princípio da dignidade da pessoa humana. 2008. Dissertação (Mestrado) - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Programa de Pós-graduação em Direito, Belo Hori-zonte.

ROSTOVTZEFF, M. História de Roma. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1967. WENGST, K. Pax Romana. São Paulo: Paulinas, 1991.

Referências

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