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Criticidade e responsabilidade socioambiental a partir da temática lixo urbano

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Academic year: 2020

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159 REnCiMa, v. 11, n.3, p. 159-175, 2020 doi.org/10.26843/rencima eISSN: 2179-426X

CRITICIDADE E RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL A PARTIR DA

TEMÁTICA LIXO URBANO

CRITICALITY AND SOCIO-ENVIRONMENTAL RESPONSIBILITY FROM URBAN GARBAGE THEMATIC

Darling Katiuscia de Goes Borges

Universidade Federal do Amazonas /Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática/dkgborges@gmail.com

http://orcid.org/0000-0002-4687-0832

Sidilene Aquino de Farias

Universidade Federal do Amazonas /Departamento de Química/ sidilene.ufam@gmail.com http://orcid.org/0000-0003-3866-207X

Katiuscia dos Santos de Souza

Universidade Federal do Amazonas /Departamento de Química/ katy_souza@yahoo.com.br http://orcid.org/0000-0001-9837-9335

Resumo

Este trabalho investiga como a aprendizagem de atitudes são promovidas no ensino de Química, sob o enfoque da interrelação entre Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) e Educação Ambiental, a partir da percepção acerca das responsabilidades que envolvem o descarte do lixo urbano. Participaram da pesquisa, treze (13) alunos do 1º ano do Ensino Médio, de uma escola pública estadual, em um bairro do município de Manaus construído sobre um antigo lixão. A investigação foi conduzida por meio da pesquisa-ação, com uma abordagem puramente qualitativa em um contexto educacional apoiado na Pedagogia de Projetos. O procedimento de análise baseou-se na Análise de Conteúdo. Os resultados revelaram que inicialmente os alunos tendiam colocar a culpa em terceiros, mas ao final das atividades e das análises desenvolvidas, constatou-se elementos que caracterizam uma maior sensibilização para a responsabilidade de cada cidadão quanto ao tratamento adequado do lixo urbano. Com isso, evidencia-se a importância de associar as diferentes dimensões da aprendizagem de Química com questões sociais e ambientais, destacando possibilidades promissoras para um ensino de Química mais significativo a partir da valorização da opinião e do contexto real dos alunos.

Palavras-Chave: Educação Ambiental; CTS; Ensino-Aprendizagem.

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160 REnCiMa, v. 11, n.3, p. 159-175, 2020 Abstract

This work investigates how the learning of attitudes are promoted in the teaching of Chemistry, focusing on the interrelationship between Science, Technology and Society (STS) and Environmental Education, from the perception about the responsibilities involved the disposal of urban garbage. Thirteen (13) students from the 1st year of High School, from a state public school, in a neighborhood of the municipality of Manaus built on an old dump participated in the research. The research was conducted through action research, with a purely qualitative approach in an educational context supported in Project Pedagogy. The analysis procedure was based on Content Analysis. The results revealed that initially the students tended to put the blame on third parties, but at the end of the activities and analyzes developed, there were elements that characterize a greater awareness of the responsibility of each citizen regarding the appropriate treatment of urban garbage. With this, it is evident the importance of associating the different dimensions of the learning of Chemistry with social and environmental issues, highlighting promising possibilities for the teaching of Chemistry more significant from the valuation of the opinion and the real context of the students.

Keywords: Environmental Education; STS, Teaching-Learning. Introdução

Muitos desafios necessitam ser enfrentados para que a Educação Básica, especialmente o Ensino Médio, assegure um conhecimento comum indispensável para o exercício da cidadania. Entende-se que a escola é uma das instituições da sociedade com papel a contribuir para esta formação cidadã (SANTOS; SCHNETZLER, 2010).

Entretanto, para tornar esse preparo possível, é importante repensar o currículo, as formas como os conteúdos são abordados no Ensino Médio, de modo que sejam mais atuais e próximos da realidade dos estudantes. Para tanto, o processo formativo do professor, tanto inicial como continuado, também precisa ser repensado. Tendo em vista, a cultura escolar de estudos voltados somente para o acesso ao Ensino Superior, mesmo que desconsidere outras questões relevantes do progresso de ensino-aprendizagem, deste modo:

Estamos fugindo do fim maior da educação básica, que é assegurar ao indivíduo a formação que o habilitará a participar como cidadão na vida em sociedade. Isso implica um ensino contextualizado, no qual o foco seja o preparo para o exercício consciente da cidadania (SANTOS; SCHNETZLER, 2010, p. 49).

Esta busca por um ensino mais reflexivo e contextualizado tem estreita relação com o enfoque Ciência-Tecnologia-Sociedade (CTS), que também busca, objetivos como o preparo de cidadãos conscientes e críticos, capazes de interagir com a sociedade (ADAMS; ALVES; SANTOS, 2016; PAIVA; ARAÚJO, 2016).

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O enfoque CTS

O Movimento CTS (Ciência-Tecnologia-Sociedade) surge num contexto de crítica ao “modelo linear de desenvolvimento”, caracterizado por Bazzo, Von Linsingen e Pereira (2003), onde, + ciência = + tecnologia = + riqueza = + bem-estar social, evidenciando a necessidade de reflexão sobre a ciência e a tecnologia na sociedade moderna.

O enfoque CTS no campo educacional, busca a reflexão sobre o desenvolvimento da ciência e tecnologia e sua relação com o contexto social, para um julgamento independente com um senso de responsabilidade crítica, com atitudes e práticas democráticas sobre as questões de importância social. Características que se alinham com a Educação Ambiental, já que ambos estudos, possibilitam o entendimento da realidade de vida e atuação responsável de seus atores sociais (ADAMS; ALVES; SANTOS, 2016; LEITE; ROGRIGUES, 2018).

A partir desse contexto surge a pergunta “Como ensinar criticidade e responsabilidade socioambiental?” Segundo Zabala (1998), “os conteúdos de aprendizagem” (conceitual, procedimental e atitudinal) possibilitam o desenvolvimento de capacidades motoras, afetivas, de relação interpessoal e de inserção social, não considerando apenas disciplinas tradicionais, contribuem para desenvolver, a luz da concepção do enfoque CTS, responsabilidades sociais, ambientais e criticidade.

Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, a história da escola está indissoluvelmente ligada à efetiva ação do indivíduo para com a sociedade. Os componentes curriculares estão repletos de valores, que buscam promover condutas e atitudes, e atrelados ao conhecimento escolar ajudam a desenvolver habilidades intelectuais e comportamentos necessários à vida em sociedade (BRASIL, 2013). Então, observa-se nos documentos oficiais, a inclusão dos conteúdos de aprendizagem nos currículos o que permite refletir o saber, o saber fazer e o saber ser, tão importantes em um processo de ensino e aprendizagem (POZO; CRESPO, 2009; ZABALA, 1998). Cabe destacar um trecho das Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (OCNEM),

[...] podem servir de subsídios à escola e sistemas de ensino, na definição de seleção e ordenação de conteúdo, procedimentos, atitudes e valores que concretizam os caminhos a serem trilhados nessa etapa conclusiva da educação básica (BRASIL, 2006, p. 19).

Partindo do princípio de que a sociedade está alheia ao que o desenvolvimento científico e tecnológico pode causar, a democratização de conhecimentos baseado no enfoque CTS é considerada fundamental para o desenvolvimento do indivíduo.

Vivemos em um país pautado pela democracia e, por isso, cada cidadão deveria ter a capacidade de entender as problemáticas que o cercam e assim emitir opiniões, pela qual as decisões de seus representantes poderiam lhe afetar (AULER, 2007; BAZZO; VON LINSINGEN; PEREIRA, 2003).

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162 REnCiMa, v. 11, n.3, p. 159-175, 2020 Em diversos artigos o objetivo central do ensino, principalmente de Ciências é formar cidadãos críticos que possam tomar decisões na sociedade (AIKENHEAD, 2003; AULER, 2007, SANTOS; SCHNETZLER, 2010; ADAMS; ALVES; SANTOS, 2016), ressaltando o seu papel na educação básica, focando na formação de cidadãos críticos, com conhecimentos, habilidades, valores éticos e morais necessários para tomar decisões responsáveis sobre questões de ciência e tecnologia na sociedade e atuar na solução de tais questões.

Assim, existe uma preocupação de como alcançar os objetivos educacionais propostos, por isso o Ensino Médio tem configurado com papel de destaque nas discussões sobre educação brasileira, procurando contextualizar o conhecimento científico com sua realidade atual, tentando responder a importância da aprendizagem em ciências, pois se percebem que as condições atuais, continuam predominantemente disciplinares, com visão linear e fragmentada do conhecimento, não atendendo às necessidades dos alunos, quanto aos objetivos desta etapa de ensino (BRASIL, 2013).

Deste modo, os temas socioambientais têm sido amplamente utilizados como proposta educacional que auxilia na “formação de sujeitos críticos e reflexivos, favorecendo uma compreensão da realidade e participação social” (BUFFOLO; RODRIGUES, 2015).

Lixo urbano como tema socioambiental

A inclusão de questões sociais no currículo escolar já foi incorporada pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para educação básica como forma de compor um conjunto articulado, flexível e aberto a novos temas que podem ser priorizados e contextualizados de acordo com as diferentes realidades locais e regionais (BRASIL, 2013; ADAMS; ALVES; SANTOS, 2016).

Considera-se que o lixo produzido desde os primórdios da civilização, torna-se um problema socioambiental de relevância, quando no Brasil, o prazo final dado pelo governo federal, para que os municípios se adequassem a Lei nº 12.305/2010, que instituiu a PNRS (Política Nacional de Resíduos Sólidos), na qual todos os aterros a céu aberto, sem qualquer tratamento adequado deveriam ser extintos, não ocorreu em muitos municípios do Brasil, seja por falta de interesse dos governantes ou falta de recursos (BRASIL, 2010; MUCELIN; BELLINI, 2008).

Lixo é definido como “restos de atividades humanas, julgados como sem utilidade por seus geradores, ou seja: aquilo que não serve mais e jogamos fora” (BRASIL, 2010) e considerando que a principal destinação dos resíduos gerados no Brasil, ainda são os depósitos a céu aberto, ocasionando a contaminação do solo, rios, lençóis freáticos, transmissão de vetores, além da poluição visual e mau cheiro (MUCELIN; BELLINI, 2008, ADAMS; ALVES; SANTOS, 2016). Não há como não discutir a temática nas escolas.

Desse modo, a compreensão de temáticas socioambientais como lixo urbano é fundamental por proporcionar ao cidadão a reflexão sobre o seu papel como integrante do contexto social e embasar seus posicionamentos.

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163 REnCiMa, v. 11, n.3, p. 159-175, 2020 E a partir da relação entre os conhecimentos do percurso do lixo, dos malefícios que o mesmo pode causar, associados aos conceitos químicos que irão auxiliar na compreensão de vários aspectos que envolvem os problemas ambientais (ADAMS; ALVES; SANTOS, 2016) esse trabalho investiga como a discussão da temática lixo urbano, sob o enfoque CTS, promove criticidade e responsabilidade socioambiental em alunos de ensino médio?

Com o objetivo de suscitar debates que direcionem os estudantes para uma postura crítica e de responsabilidade socioambiental, promovendo aprendizagem de atitudes, a partir da percepção acerca das responsabilidades que envolvem o descarte do lixo urbano.

Percurso metodológico

A pesquisa pautou-se na abordagem qualitativa, por assumir que as ações são melhores compreendidas a partir do desenvolvimento em um ambiente natural, com fonte direta para coleta de dados, enfatizando mais o processo do que resultados e a preocupação em retratar a perspectiva dos participantes, pois o comportamento humano é significativamente influenciado pelo contexto e interpretação que as pessoas fazem deste (BOGDAN; BIKLEN, 1982; MALHEIROS, 2011).

O procedimento metodológico para coleta de dados desta pesquisa foi baseado na pesquisa-ação, que tem por premissa a intervenção no fenômeno estudado. (MALHEIROS, 2011; THIOLLENT, 2011). E na concepção das atividades pedagógicas e educacionais possui uma dimensão sensibilizadora. Esse processo de sensibilização é associado à própria geração de dados, sob forma de questionamento a partir do qual são levantados e discutidos os vários aspectos da realidade, dos objetivos, dos critérios de transformação e tem a possibilidade de incentivar atitudes mais positivas em relação ao trabalho, ou modificar o sistema de valores dos alunos em relação a alguns aspectos da vida (THIOLLENT, 2011; MOREIRA; CALEFFE, 2008).

Essa ação na realidade busca identificar problemas a serem resolvidos de modo cooperativo e participativo (MALHEIROS, 2011; THIOLLENT, 2011). Este artigo discute uma parte do processo de intervenção desenvolvido com o Projeto Lixo Urbano, sob o enfoque CTS, utilizando o lixo como problema socioambiental.

Contexto, sujeitos da pesquisa e ações didáticas

A escolha pela temática Lixo Urbano foi motivada em primeiro lugar, pela escola onde a pesquisa ocorreu situar-se num bairro periférico da cidade de Manaus, que foi um local destinado a deposição de lixo na década de 70, como citado nos trabalhos de Rocha e Horbe (2006), Aniceto (2008) e Giatti et al (2010). O outro ponto é que a pesquisadora atua como professora da escola e conhece com propriedade a realidade dos estudantes e do local, o que favoreceu direcionamentos que indicassem como a temática poderia afetar o cotidiano da escola e da sociedade.

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164 REnCiMa, v. 11, n.3, p. 159-175, 2020 A pesquisa aconteceu com 13 estudantes da primeira série do Ensino Médio, que participaram de forma voluntária, no contraturno escolar, em espaço cedido pela escola. Os sujeitos pesquisados foram identificados por códigos alfanuméricos, por exemplo: A1= Aluno 1, para assegurar aos envolvidos, que os dados coletados seriam preservados e destinados exclusivamente a fins educacionais, garantindo confiabilidade e anonimato aos alunos participantes, conforme aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa – CEP – UFAM.

Os instrumentos utilizados para coleta de dados foram debates, registros audiovisuais, leitura, interpretação e produção de textos.

Nas ações didáticas elaboradas pretendeu-se desenvolver e ampliar nos estudantes, o entendimento para as questões sociais, ambientais, éticas e culturais, que pudessem proporcionar o desenvolvimento da criticidade e responsabilidade socioambiental, representado neste artigo no formato de enxertos de CTS. A tabela 1 sintetiza como se desenvolveram as atividades nas etapas 1, 2 e 3.

Tabela 1: Síntese das etapas 1, 2 e 3 do Projeto Lixo Urbano

Etapa/Duração Atividade Estratégia Didática

1 (2h)

História do Bairro Novo

Israel e Lixo Urbano

Discussão inicial acerca do lixo urbano. Roteiro de entrevista com moradores e relatório fotográfico do lixo.

2 (3h) Leitura do texto sobre o Bairro Novo Israel. Abordagem discursiva e dialogada sobre o lixo e resíduo sólido.

3 (3h) Responsabilidade sobre o lixo

Debate sobre a responsabilidade sobre o lixo.

Elaboração de um texto dissertativo. Fonte: Adaptado de Borges, 2017.

Etapa 1 – Ocorreu uma discussão superficial, com o intuito de verificar os hábitos e a percepção dos alunos relacionados à temática lixo. De modo a motivar para a realização da etapa seguinte, onde se forneceu um roteiro de entrevista, a realizar com moradores antigos do bairro, bem como elaborar um relatório fotográfico dos lixos produzidos pelas pessoas no bairro.

Perguntas do roteiro: Há quanto tempo você mora no bairro? Você sabe o que havia aqui antes de se formar o bairro? Qual a procedência da água para beber de sua casa? Você consome algum alimento proveniente de plantação em casa? Já tiveram algum problema de saúde, que consideram o lixo como causador?

Etapa 2 – Foi feita a leitura do texto sobre a História do Bairro, baseado nos trabalhos de Rocha e Horbe (2006), Aniceto (2008) e Giatti et al (2010), para auxiliar na percepção sobre o “lixão” precedente a existência do bairro onde a escola se encontra, complementarmente fez-se uma exposição dialogada, com recursos multimídia, trabalhando-se questões como a definição de lixo e resíduo sólido, bem como o destino

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165 REnCiMa, v. 11, n.3, p. 159-175, 2020 do lixo produzido, finalizando a atividade com a seguinte questão: De quem é a responsabilidade sobre o lixo: empresa, governo, população?

Etapa 3 – Debate sobre a responsabilidade do lixo, Esta atividade iniciou-se novamente com o questionamento: O que é lixo e resíduo sólido? Os estudantes puderam expor suas ideias acerca deste assunto. A mediação ocorreu pelos questionamentos: Como cuidamos do nosso lixo? Damos o tratamento adequado? Por quê? Como as empresas, a população e o governo tratam da coleta de lixo e tratamento do lixo? Quem é o maior responsável? Quem está mais preparado? Ao final, os alunos elaboraram um texto dissertativo, expressando suas opiniões e o conhecimento adquirido sobre o que é lixo, resíduo sólido, tratamento adequado para cada tipo de lixo, os malefícios a saúde e a responsabilidade sobre o lixo.

Os dados coletados a partir do texto dissertativo, áudios e vídeos foram analisados com base nos pressupostos da análise de conteúdo de Bardin (2011). As categorias formadas emergiram da fala (discurso), do conteúdo das respostas dos estudantes e implicam de constante ida e volta entre o material de análise e a teoria. A teoria que contribuiu para esta discussão foi baseada nas ideias de Santos e Schnetzler (2010) e Freire (1967), relativos às concepções críticas. Foram criadas 3 categorias: julgamento ingênuo, julgamento crítico e o julgamento político.

Apresenta-se, a seguir, a discussão dos resultados obtidos no contexto do desenvolvimento das ações didáticas, procurando verificar as evidências que direcionassem para a promoção da criticidade e responsabilidade socioambiental.

Análise e discussão dos resultados

Na abordagem inicial relativa à história do bairro onde se localiza a escola, apenas 4 (quatro) estudantes afirmaram saber que todo local foi um “lixão”. Evidenciando que mesmo numa sociedade em que a informação acontece de forma rápida, muitas vezes, o conhecimento de questões que podem afetar o cotidiano coletivo, não chegam à maioria dos indivíduos de forma interessante ou que desperte curiosidade, muito menos criticidade.

Durante as entrevistas realizadas pelos estudantes participantes da pesquisa, com os moradores locais, especialmente os mais jovens, pode-se verificar que muitos desconhecem que o bairro onde moram foi um depósito de resíduos sólidos na década de 70. Como resultado da entrevista realizada com 29 moradores, aproximadamente 62% desconhecem a origem de onde moram mesmo pessoas que vivem desde o início do bairro, em 1986, afirmaram não conhecer que seu surgimento se deu a partir da ocupação por indivíduos que trabalhavam no antigo “lixão”, ou seja, sempre estiveram alheias as condições sanitárias e ambientais do local.

Em relação ao consumo de água, 14% dos entrevistados utilizam água de poço artesiano e, os demais, água encanada ou mineral. Considerando que a maioria das substâncias nocivas encontradas no bairro Novo Israel, de acordo com as pesquisas de Rocha e Horbe (2006) e Aniceto (2008) não pode ser eliminada por tratamentos comuns,

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166 REnCiMa, v. 11, n.3, p. 159-175, 2020 mesmo tendo a preocupação de desinfecção por fervura ou métodos cotidianos, nem mesmo os tratamentos empregados pela companhia de água da cidade seriam eficientes para tornar esta água potável, devido à contaminação com metais potencialmente tóxicos (MPT), deve haver uma preocupação com relação aos locais e infraestrutura desses poços.

Como houve investimentos na infraestrutura do bairro, hoje, as residências são abastecidas por água da rede de abastecimento. Uma das soluções para minimizar a possiblidade de consumo de uma água contaminada, seria a oferta de água de qualidade a essa população, seja mineral e comprada ou a partir do fornecimento de água encanada e tratada, captada de um manancial seguro pela companhia de abastecimento. Como água de poços artesianos e cacimbas próprias carecem de testes para evidenciar a presença de MPT, é preferível que o consumo de água provenientes destes locais, seja evitado. É isso que esta pesquisa durante o desenvolvimento das ações didáticas procurou esclarecer, visto que culturalmente as pessoas consideram a água de boa qualidade devido a sua aparência estética (COSTA, WAICHMAN; SANTOS, 2003).

Foi comum a negativa para o questionamento sobre problemas de saúde, considerando o lixo como causador. Para Ravetz apud Giatti et al. (2010, p. 339), “os efeitos da exposição de humanos a poluentes ambientais se manifestam, geralmente, a

longo prazo, sendo mascarados por outras causas”.

É interessante num processo que busca a criticidade, o contato dos indivíduos participantes com a sociedade, neste caso os moradores do bairro, permite envolvê-los mais proximamente com fatos e dados da problemática em questão saindo do abstrato para o dia-dia, podendo despertar questionamentos e responsabilidades.

O objetivo da atividade com os alunos foi atingido por despertar a curiosidade dos participantes acerca do lixo e mostrar sua percepção a respeito do lixo na comunidade como um todo. Todos se mostraram cientes dos malefícios causados pelo lixo e que ele realmente é uma problemática do dia-dia demandando atenção.

No relatório fotográfico, apresentado pelos participantes A6, A7, A9 e A10 que visava à percepção sobre o lixo produzido, bem como o tratamento dado ao lixo, esclareceu que o lixo é uma problemática na vida das pessoas em suas comunidades, como mostram os fragmentos do texto dos participantes:

“Perto da igreja Madureira, uma lixeira cheia de lixo dentro e ao redor dela, lixos espalhados em sacos rasgados igual a lixeira que fica no canto da escola. [...] o cachorro vem e rasga, e fica o lixo espalhado, como: prato, copo, colher, [...] fica um fedor insuportável, [...] os vizinhos não tem coragem de cuidar de seu próprio lixo, preferem perturbar os outros com seus problemas. Prejudicando o pessoal me frente à igreja e os que lá congregam” (A10).

“Ao lado da escola e supermercados vemos o descarte incorreto do lixo sólido e orgânico [...] causando mal odor e doenças e proliferando germes, além de casar acidente” (A6).

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“O lixo da ladeira do Antogildo fica todo espalhado e rasgados os sacos e fica um odor ruim [...] os cachorros e gatos rasgam o lixo e fazem uma bagunça [...] por isso o lixeiro não leva o lixo. Já é tanto lixo que os moradores não tiram o lixo desse buraco, por medo de assaltante ou algum tipo de agressão naquele mato” (A9).

Das falas dos participantes é possível verificar que estes não ficaram indiferentes as seguintes situações: que os moradores locais realmente costumam jogar “seus problemas” para terceiros. Em vários pontos do bairro acontece o mesmo problema. As residências não possuem lixeiras. Escolha de locais inadequados para se tornarem lixeira comunitária. Na lixeira da escola mostrada nas Figuras 1 e 2, não é feito o acondicionamento adequado para descarte do lixo, permitindo que animais possam rasgar as sacolas, impossibilitando uma coleta eficiente. Odores e doenças que podem advir do lixo.

O que evidencia o início de uma sensibilização e criticidade em relação aos problemas ocasionados pelo lixo.

Figura 1- Lixeira externa da escola

Fonte: as autoras

Pelas fotografias é possível ver que o tipo de material descartado é variado, que vai desde os resíduos domésticos até móveis, galhos de árvores, louça sanitária, malas, apresentados na figura 2A (esquina da escola) e 2B (ladeira do Antogildo).

Figura 2 - Lixo depositado na esquina da escola e ladeira do Antogildo

A B

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168 REnCiMa, v. 11, n.3, p. 159-175, 2020 Apesar de o objetivo ter sido alcançado, a partir da exposição dos relatórios fotográficos, a atividade mostrou também que ao realizar ações como está, é importante considerar as variáveis locais para minimizar as causas de insucesso, pois dos 13 participantes, 09 não realizaram a atividade alegando não possuir celular ou máquina fotográfica ou por medo de assaltos, já que ocorreria em área de vulnerabilidade social.

Responsabilidade sobre o lixo

Esta atividade foi iniciada com questões levantadas pela pesquisadora: Como cuidamos do nosso lixo? De quem é a responsabilidade pelo destino e tratamento do lixo? E ao final do debate, foi produzido um texto dissertativo.

Foi interessante observar, pelas falas dos participantes durante o debate, que a maioria não se sentia responsável pelo lixo.

Em um primeiro momento todos ficaram calados, tímidos. Quando se deu as opções entre empresas, população e governo, começaram a se manifestar e por suas falas foi possível obter as categorias apresentadas no Quadro 1, baseado nos pensamentos de Canivez (1991) e Santos e Schnetzler (2010). Esses autores sugerem que cidadania significa a participação dos indivíduos nas decisões da cidade, e como cidadãos, somos cogovernantes e isso implica a necessidade do desenvolvimento da faculdade de julgar, assim, ser crítico. Os dados obtidos com o debate e o texto dissertativo foram analisados a partir da análise de conteúdo, a qual permitiu estabelecer 3 (três) categorias: julgamento ingênuo, crítico e político.

Quadro 1: Faculdade de julgamento UNIDADES DE ANÁLISE CATEGORIAS NÚMERO DE UNIDADES DE ANÁLISE Responsabilidade sobre o lixo

1. Julgamento ingênuo A5, A6, A8 2. Julgamento crítico A1, A7, A13 3. Julgamento político A2, A3, A4

Categoria 1 - julgamento ingênuo

A categoria sobre o julgamento ingênuo foi criada a partir dos dois tipos de juízos, o crítico e o político, citados por Canivez (1991). Nesta categoria estão os participantes que possuem uma percepção limitada da realidade em que vivem, semelhante a consciência ingênua, defendida por Freire (1967, p. 105),”[...] a consciência ingênua se crê superior aos fatos, dominando-os de fora e, por isso, se julga livre para entendê-los conforme melhor lhe agradar.”

Nas respostas abaixo os participantes consideram em seus julgamentos, o governo como único responsável pelo lixo, não percebendo a responsabilidade de cada um:

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“Não adianta separar o lixo, se o governo não concede locais para acondicionamento. Depois de coletado deveria ter um carro para cada tipo de lixo específico para ser destinado a um local certo [...]” (A6).

“[...] a empresa é só um intermediário entre a população e o governo. A população paga o que o governo faz” (A6)

“A senhora pode ir no centro, perto da praça dos bilhares. Pode ver que tem um fiscal da prefeitura (ele está se referindo ao gari), recolhendo o lixo [...]. Porque nós fazemos nossa parte e jogamos o lixo na lixeira, mas o governo faz o contrário, misturam tudo” (A8).

“Botamos o lixo na lixeira e o "au au" (termo usado para se referir a um cachorro) vai lá e rasga o saco. Então, qual é a dos lixeiros? Está certo, rasgou o saco, mas a obrigação dele é levar o lixo que estar lá” (A5).

Para a realização de um julgamento adequado, é necessária a aquisição de informações, conhecimento das leis para os atos corriqueiros da vida. A participante A5 acha que a obrigação de retirar o resíduo de calçadas e ruas que um animal possa ter rasgado, deve ser do governo, representado pelo gari, o que demonstra que a aluna não possui o conhecimento sobre a responsabilidade compartilhada, encontrada no artigo 3º, inciso XVII da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que é:

“[...] conjunto de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos [...]” (BRASIL, 2010).

De acordo com o relatório da Secretaria Municipal de Limpeza e Serviços Públicos - SEMULSP (2015), apenas 12 (doze) bairros da cidade de Manaus são atendidos pelo programa porta a porta (coleta seletiva) e, em geral com localizações consideradas mais centrais. Demonstrando representar uma parcela pequena da cidade e justificando o sentimento da participante A1, que apenas as áreas nobres são beneficiadas, o que caracteriza uma desigualdade social.

Como o cidadão não enxerga um posicionamento por parte das instituições, ele prefere acreditar naquilo que lhe agrada e não faz sua parte, como os participantes A6 e A8.

Categoria 2 - julgamento crítico

No julgamento crítico os critérios estão estabelecidos e, portanto, para sua realização, só é necessário o conhecimento das leis e dos princípios éticos e universais, relacionados ao princípio da igualdade e do respeito à vida (CANIVEZ 1991; SANTOS; SCHNETZLER, 2010). Nesta categoria existem dois grupos, um que critica a população (A7) e outro o governo (A1 e A13).

“Tem gente que joga lixo na rua e não está nem aí, não pensa que pode lhe trazer doenças e para os próximos” (A7).

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“Não adianta ter aquelas lixeiras coloridas, pois quando passam o lixeiro, eles misturam tudo. Porque são poucos os pontos de coleta de lixo reciclado. Por exemplo, aqui no bairro, acho que não vi nenhum” (A13). “O governo só coloca ponto de coleta para as zonas nobres” (A1).

“Tem um vizinho meu que tinha colocado lixo lá, e o lixeiro não queria levar, só se o vizinho pagasse. Eles não deveriam pedir dinheiro [...]” (A1).

A participante A7 que defende a população como responsável, apesar de não fazer citação à lei, está considerando princípios morais e éticos de respeito ao próximo.

Interessante perceber, que apesar do grupo considerar o governo como único responsável, existe um posicionamento crítico, mesmo que aparentemente, ele não se sinta um cidadão, pois não adianta a população fazer sua parte fazendo a coleta seletiva do lixo, se o governo não disponibiliza meios para a coleta adequada. Tem a percepção que é necessária “lixeiras coloridas” e sente-se preterido. Pois, como se verificou anteriormente, o programa de coleta porta a porta atende principalmente bairros nobres da cidade de Manaus. Já se percebe um incomodo nas falas, mesmo que de modo raso. Pois, de acordo com Danczak, Thompson e Overton (2017) o bom pensador crítico é habitualmente disposto a se envolver e encorajar os outros para se engajar no julgamento crítico.

Categoria 3 - julgamento político

O julgamento político diz respeito à discussão da pluralidade de ideias para encaminhamentos de possíveis soluções a um problema. Os critérios não se limitam apenas aos critérios jurídicos e morais. Trata-se de tomar decisões que se destinam a resolver os problemas. Os estudantes devem ser preparados para o debate, o que implica a necessidade do conhecimento de informações básicas (CANIVEZ, 1991; SANTOS; SCHNETZLER, 2010).

Esses participantes já têm um julgamento crítico, pois conhecem de leis e princípios e estão desenvolvendo a capacidade de julgamento político. É neste ponto que a educação contribui para a formação crítica e responsabilidade socioambiental. Apenas os participantes A2 e A4 consideram que a responsabilidade sobre o lixo é da empresa, da população e do governo:

“A responsabilidade é dos 3, né professora? Eu acho que principalmente da população, porque devemos nos conscientizar, muita gente joga o lixo no meio da rua, na hora que vai recolher seu lixo da própria casa não sabe onde jogar, joga em qualquer canto, e o governo tem a responsabilidade de mandar “os carinhas” (termo usado pra representar os garis), para juntar lixo, mas também eles não são pagos para ir no quintal da tua casa juntar seu lixo para poder deixar a cidade mais limpa, né, por favor!” (A2). “Mas a população também tem que fazer a sua parte, não é não professora? E as empresas também. Colocando em cada tipo de ambiente os lixos, ajudando” (A4).

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171 REnCiMa, v. 11, n.3, p. 159-175, 2020 Santos e Schentzler (2010) concluem que o julgamento político se assenta no princípio moral de adoção de ações que correspondam aos interesses da comunidade, o que necessariamente passa pela discussão pública. Neste sentido, a educação tem um papel importante de preparar o indivíduo para fazer opções e adotar o modelo resultante das discussões das diferentes ideias.

Acerca da participação ativa dos indivíduos na sociedade, destaca-se além da educação para o conhecimento e o exercício do direito, por meio do desenvolvimento da capacidade de saber julgar, que é necessária uma sensibilização dos alunos quanto aos deveres na sociedade. A educação tem o papel de desenvolver nos alunos o interesse pelos assuntos que o rodeiam em sociedade, de forma que ele assuma uma atitude de compromisso na busca conjunta de solução para os problemas existentes (SANTOS; SCHENTZLER, 2010). De modo a combater a segmentação do conhecimento, em todos os níveis de Educação, democratizando o conhecimento científico e tecnológico, integrado de maneira produtiva no cotidiano da sociedade (ADAMS; ALVES; SANTOS, 2016; PEZARINI; MACIEL, 2018).

Durante o debate também foi possível perceber que a maioria dos participantes desconhece seus deveres enquanto cidadãos para com o devido acondicionamento de seus resíduos, com exceção da participante A2, mas demonstram possuir conhecimento sobre normas, ao citarem a corrupção dos “garis”. Em suas falas, destacamos, pela ordem do debate:

“Tem um vizinho meu que tinha colocado lixo lá, e o lixeiro não queria levar, só se o vizinho pagasse. Eles não deveriam pedir dinheiro [...] era folha, galhos, que quase não passa caminhão para juntar, então ele pediu para o lixeiro levar. Aí o lixeiro cobrou” (A1).

“Extorsão” (A3).

“Eles não juntam porque tem gente que acondiciona de maneira inadequada” (A2)

“É verdade o que a ** falou, quando é muito lixo, eles cobram” (A4).

“Também (expressão de indignação) os governos não pagam o trabalhador lixeiro bem, lá nos Estados Unidos, só para te vê, o lixeiro ganha 25 mil dólares, só para juntar o lixo e aqui no brasil é um salário mínimo” (A8).

Observa-se que o participante A1 possui valores, sugerindo compreender as regras de comportamento que devemos seguir. Segundo Zabala (1998, p. 47), “as normas constituem a forma de realizar certos valores compartilhados por uma coletividade e indicam o que se pode fazer e o que não se pode fazer em um grupo”. Mas quando questionado de que tipo de lixo se tratava, a aluna respondeu que era lixo de poda, restos de construção, móveis usados.

Neste momento foi discutido o acondicionamento adequado do lixo e os responsáveis por cada tipo de lixo, esclarecendo que as empresas responsáveis pela coleta de lixo, precisam cumprir a lei orgânica do município de Manaus, que determina qual o linho deve ser recolhido pelas empresas e qual é recolhido por outros órgãos.

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172 REnCiMa, v. 11, n.3, p. 159-175, 2020 Realmente como foi mostrado da figura 1 e 2, é hábito dos moradores locais acondicionar o lixo de forma inadequada, achando que a coleta é apenas obrigação do governo. A participante A1 afirmou que os lixeiros não deveriam cobrar, mas o vizinho também não deveria pagar. Basta compreendermos que a responsabilidade pelo lixo produzido é de cada cidadão, como prevê a PNRS (BRASIL, 2010).

Esses resultados estão de acordo com as ideias de Santos e Schnetzler (2010) ao afirmar que é uma questão cultural de nossa sociedade, construída no modelo patriarcal, imprimindo atitudes do “famoso jeitinho” brasileiro de driblar a lei. Tais atitudes desenvolvem um espírito de dependência e passividade que contraria todos os princípios morais de constituição de uma cidadania que constrói o coletivo, o interesse comum, por meio da discussão de ideias. Então, mesmo a indignação do participante A8 por salários baixos no Brasil, não é justifica a cobrança ou o pagamento indevido de propina.

Os estudantes também produziram um texto acerca das discussões e o percebido é que agora todos tinham uma definição para resíduo sólido, e sabiam a responsabilidade de cada um sobre o lixo.

“É quando determinado material, sendo seco ou orgânico, ainda terá serventia para a sociedade” (A6).

“É tudo que dá para reaproveitar ou reciclar como garrafas PET, pneu, etc” (A8).

A participante A5, citou 3 aspectos da política dos 5 erres (R’s),

“A ideia de diminuir o consumo, reaproveitar e reciclar os materiais gera benefícios sociais, pois muitas famílias dependem do “lixo” para sobreviver. Estes processos economizam energia e recursos naturais e contribuem para o aumento da vida útil do aterro sanitário” (A5).

Na sociedade brasileira é comum não nos sentirmos responsabilizados por nossas atitudes, isso é percebido quando em vez de procurar soluções, procuram-se culpados. Dentre os participantes, inicialmente, aproximadamente 50% atribuíram a responsabilidade do lixo a terceiros, ou seja, a responsabilidade é sempre do governo, do vizinho, nunca nossa, mas durante as atividades, essa percepção foi amadurecendo, com depoimentos sem receio de julgamentos.

Pode-se perceber que a estratégia de debates ou discussões, como aula dialogada contribui significativamente no desenvolvimento dos conteúdos de aprendizagem, proporcionando um efeito positivo no entendimento racional do tema, com isso favorece o desenvolvimento da criticidade e responsabilidade socioambiental. Esses dados corroboram com o trabalho de Xavier, Silva e Almeida (2016).

Houve o desenvolvimento de conhecimentos de fatos e conceitos, do que seriam lixo e resíduo sólido, o conhecimento de leis como a obrigatoriedade da lixeira e o acondicionamento adequado de cada tipo de lixo, contribuindo para o julgamento crítico (SANTOS; SCHENTZLER, 2010); bem como de procedimentos, ao participarem, falarem, observarem, sem medo de julgamentos (ZABALA, 1998); e questões relacionadas as

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173 REnCiMa, v. 11, n.3, p. 159-175, 2020 atitudes, encontram-se em desenvolvimento, mas de acordo com as definições de Zabala (1998), podemos observar o respeito entre os colegas, a vontade de participar do debate e a vontade de fazer diferente, percebendo o papel de cada um neste processo.

Considerações finais

Os resultados dessa investigação mostraram-se pertinentes quanto à promoção da criticidade e responsabilidade socioambiental dos estudantes frente às discussões sobre o lixo urbano.

A partir do posicionamento dos estudantes foi possível trabalhar a questão da responsabilidade compartilhada prevista no PNRS; das regras de acondicionamento de resíduos de acordo com a legislação local; a obrigatoriedade de lixeiras, contribuindo para o julgamento crítico e político, percebendo o desenvolvimento da capacidade de julgamento, a vontade de fazer diferente e o papel de cada um neste processo.

O debate orientado fez prevalecer o respeito e as opiniões controversas, contribuiu no desenvolvimento crítico e reflexivo deste estudante, principalmente quando é levado em consideração o contexto cultural e socioambiental em que este está inserido, tornando evidente a promoção de aprendizagem atitudinal.

Por fim, a inserção de um tema socioambiental contribuiu como caminho no processo de ensino e iniciação do processo de reflexão sobre as questões ambientais e bem-estar social, a partir do momento que desenvolveu atividades que aliam conhecimentos conceituais ao cotidiano, auxiliando na mudança de atitudes, reflexão e nesse caso responsabilidade socioambiental.

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Figura 2 - Lixo depositado na esquina da escola e ladeira do Antogildo

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