Romantismo no BRasil. PRimeiRa geRação:
liteRatuRa e nacionalidade
>> Leia atentamente os textos a seguir e responda às questões de 1 a 3.
Texto 1
Um índio
Um índio descerá de uma estrela colorida brilhante De uma estrela que virá numa velocidade estonteante
E pousará no coração do hemisfério sul na América num claro instante Depois de exterminada a última nação indígena
E o espírito dos pássaros das fontes de água límpida Mais avançado que a mais avançada das tecnologias Virá
Impávido que nem Muhamad Ali Virá que eu vi
Apaixonadamente como Peri Virá que eu vi
Tranquilo e infalível como Bruce Lee Virá que eu vi
O axé do afoxé filhos de Ghandi Virá
VELOSO, Caetano. Álbum Circulado vivo, Universal Music Brasil, 1992. (Fragmento).
Texto 2
O Guarani
O rosto do selvagem iluminou-se; seu peito arquejou de felicidade; seus lábios trê- mulos mal podiam articular o turbilhão de palavras que vinham do íntimo da alma.
— Peri quer ser cristão! disse ele.
D. Antônio lançou-lhe um olhar úmido de reconhecimento.
— A nossa religião permite, disse o fidalgo, que na hora extrema todo homem possa dar o batismo. Nós estamos com o pé sobre o túmulo. Ajoelha, Peri!
O índio caiu aos pés do velho cavalheiro, que impôs-lhe as mãos sobre a cabeça.
— Sê cristão! Dou-te o meu nome.
Peri beijou a cruz da espada que o fidalgo lhe apresentou, e ergueu-se altivo e sobran- ceiro, pronto a afrontar todos os perigos para salvar sua senhora.
ALENCAR, José de. O guarani. São Paulo: Ática, 1995. (Fragmento).
Texto 3
I-Juca Pirama
Meu canto de morte, Guerreiros, ouvi:
Sou filho das selvas, Nas selvas cresci;
Guerreiros, descendo Da tribo tupi.
Da tribo pujante, Que agora anda errante Por fado inconstante, Guerreiros, nasci:
Sou bravo, sou forte, Sou filho do Norte;
Meu canto de morte, Guerreiros, ouvi.
DIAS, Gonçalves. Gonçalves Dias: poesia e prosas completas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1998.
(Fragmento).
1. O índio sempre foi um personagem presente em nossa literatura, desde o fim do Ar- cadismo. Até hoje, como o comprova o texto 1, essa temática continua presente, com algumas alterações. Qual a imagem de índio que se pode extrair dos textos 2 e 3? Justifique sua resposta.
2. Por que o índio é de fundamental importância na literatura romântica brasileira em sua primeira fase?
3. O texto de Caetano Veloso apresenta algumas semelhanças e algumas diferenças na abordagem da temática indianista. Aponte-as e explique-as.
>> Leia, atentamente, o trecho a seguir, de autoria de Sérgio Buarque de Holanda, e respon- da às questões 4 e 5.
Pode-se dizer que foi a maneira natural de traduzir em termos nossos a temática da Idade Média, característica do Romantismo europeu. Ao medievalismo dos franceses e portugueses, opúnhamos o nosso pré-cabralismo, aliás, não menos preconcebido e falso do que aquele.
HOLANDA, Sérgio Buarque. “Prefácio de 1939”. In: MAGALHÃES, José Domingos Gonçalves de.
Suspiros poéticos e saudades. 6 ed. Brasília: Editora da UnB, 1999. (Fragmento).
4. Como deve ser entendida, em termos históricos e literários, a passagem em que o autor fala de “nosso pré-cabralismo”?
5. Sérgio Buarque de Holanda conclui suas observações dando a entender que tanto o medievalismo dos românticos europeus quanto o pré-cabralismo dos brasileiros não correspondia a um resgate histórico do passado. Explique por quê.
>> Leia o texto e responda às questões 6 e 7.
Segundos Cantos
A pátria é onde quer que a vida temos Sem penar e sem dor;
Onde rostos amigos nos rodeiam, Onde temos amor:
Onde vozes amigas nos consolam Na nossa desventura, Onde alguns olhos chorarão doridos Na erma sepultura;
A pátria é onde a vida temos presa:
Aqui também há sol!
Também a brisa corre fresca e leve Da manhã no arrebol!
Aqui também a terra produz flores, Também os céus têm cor;
Também murmura o rio, e corre a fonte, E os astros têm fulgor!
Aqui também se arrelva o prado, o monte, De mimoso tapiz;
Nas asas do silêncio desce a noite Também sobre o infeliz!
DIAS, Gonçalves. In: Poesia e prosa completas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1998. (Fragmento).
Doridos: que têm ou expressam alguma dor.
Arrebol: cor avermelhada do crepúsculo (entre a noite e o nascer do sol), alvorada.
Tapiz: extensão de terreno coberta de flores, relva.
Estreme: puro.
6. O texto de Gonçalves Dias é tipicamente romântico, sobretudo de acordo com o modo como retrata seu país.
4 Como a pátria é descrita no poema?
4 Qual característica do Romantismo essa descrição revela?
7. Provavelmente o texto mais conhecido de Gonçalves Dias é a Canção do exílio. Pode-se dizer que este famoso poema do autor é semelhante ao texto aqui transcrito? Em que momentos os textos se parecem?
>> Durante o regime militar (1964-1985), o Brasil viu nascer uma nova onda de “ufanis- mo” patrocinada pelos novos governantes do país. Naquele momento, surgiram canções de cunho extremamente nacionalista que lembravam, e muito, a Canção do exílio de Gonçalves Dias. Um bom exemplo disso é a canção a seguir.
Eu te amo meu Brasil!
As praias do Brasil ensolaradas O chão do meu país se elevou A mão de Deus abençoou
Mulher que nasce aqui tem muito mais amor!
O céu do meu Brasil tem mais estrelas O sol do meu país mais esplendor A mão de Deus abençoou
Em terras brasileiras vou plantar amor!
Eu te amo meu Brasil — Eu te amo!
Meu coração é verde, amarelo, branco, azul, anil!
Eu te amo meu Brasil — Eu te amo!
Ninguém segura a juventude do Brasil!!!
As tardes do Brasil são mais douradas Mulatas tocam cheias de calor
A mão de Deus abençoou
Eu vou ficar aqui porque existe amor!
No Carnaval os Gringos querem vê-las Num colossal desfile multicor
A mão de Deus abençoou
Em terras brasileiras vou plantar amor!
Adoro meu Brasil de madrugada As horas que eu estou com meu amor A mão de Deus abençoou
A minha amada vai comigo aonde eu for!
As luzes do Brasil têm mais beleza Aurora chora de tristeza e dor Porque a Natureza assopra
E ela vai-se embora enquanto eu planto o Amor!
DOM. Os Incríveis e seus maiores sucessos, RCA Victor, 1994.
8. Transcreva os trechos da música que se assemelham a versos presentes na Canção do exílio.
9. Compostas em momentos bastante diversos, Eu te amo meu Brasil! e a Canção do exílio apresentam diferenças também quanto à repercussão que tiveram. Após a composição e divulgação da música, seu autor e seus intérpretes foram acusados de defenderem o regime ditatorial dos militares. Por que uma canção ufanista po- deria ser vista como negativa naquele momento e não o era na época de Gonçalves Dias?
>> Leia o texto.
Os Timbiras
Introdução [...]
As festas, e batalhas mal sangradas Do povo Americano, agora extinto, Hei de cantar na lira. — Evoco a sombra Do selvagem guerreiro!... Torvo o aspecto, Severo e quase mudo, a lentos passos, Caminha incerto, — o bipartido arco Nas mãos sustenta, e dos despidos ombros Pende-lhe a rota aljava... as entornadas, Agora inúteis setas, vão mostrando A marcha triste e os passos mal seguros De quem, na terra de seus pais, embalde Procura asilo, e foge o humano trato.
DIAS, Gonçalves. In: Poesia e prosa completas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1998. (Fragmento).
Aljava: espécie de estojo sem tampa em que se guardavam e transportavam as setas, e que era car- regado nas costas, pendente do ombro.
Embalde: inutilmente.
10. Quem é o “povo Americano, agora extinto” ao qual se refere o eu lírico? Qual é a “terra de seus pais”?
11. Gonçalves Dias notabilizou-se por incorporar à sua poesia uma exaltação à pátria e aos valores nacionais mais particulares da terra brasileira. Partindo dessa premissa, procure explicar por que o poeta canta “o selvagem guerreiro”.
>> Agora leia o texto a seguir e responda às questões 12 e 13.
Índios
Quem me dera, ao menos uma vez, Ter de volta todo ouro que entreguei A quem conseguiu me convencer Que era prova de amizade
Se alguém levasse embora até o que eu não tinha Quem me dera, ao menos uma vez,
Esquecer que sempre acreditei que era por brincadeira Que se cortava sempre um pano de chão
De linho nobre e pura seda.
Quem me dera, ao menos uma vez,
Explicar o que ninguém consegue entender:
Que o que aconteceu ainda está por vir E o futuro não é mais como era antigamente Quem me dera, ao menos uma vez,
Provar que quem tem mais do que precisa ter
Quase sempre se convence de que não tem o bastante E fala demais por não ter nada a dizer.
Quem me dera, ao menos uma vez,
Que o mais simples fosse visto como o mais importante Mas nos deram espelhos
E vimos um mundo doente.
Quem me dera, ao menos uma vez,
Entender como um só Deus ao mesmo tempo é três E esse mesmo Deus foi morto por vocês –
É só maldade então, deixar um Deus tão triste.
RUSSO, Renato. Legião Urbana. Dois, EMI-Odeon, 1986. (Fragmento).
12. O trecho da canção revela um momento anterior ao que é descrito na Introdução de Os Timbiras transcrito na questão anterior. Que momento é esse?
13. A situação do guerreiro indígena mostrada por Gonçalves Dias é fruto do que houve no momento histórico mostrado pela canção do grupo Legião Urbana? Explique.
>> O texto a seguir é um trecho do Prólogo de Gonçalves Dias a seu livro Primeiros cantos.
Nele, podemos perceber características essenciais da estética romântica. Leia-o atenta- mente e responda às questões de 14 a 18.
Dei o nome de Primeiros cantos às poesias que agora publico, porque espero que não serão as últimas.
Muitas delas não têm uniformidade nas estrofes, porque menosprezo regras de mera convenção; adotei todos os ritmos da metrificação portuguesa, e usei deles como me pare- ceram quadrar melhor com o que eu pretendia exprimir.
Não têm unidade de pensamento entre si, porque foram compostas em épocas diver- sas — debaixo de céu diverso — e sob a influência de impressões momentâneas. […] Escre- vi-as para mim, e não para os outros; contentar-me-ei, se agradarem; e se não… é sempre certo que tive o prazer de as ter composto.
Com a vida isolada que vivo, gosto de afastar os olhos de sobre a nossa arena política para ler em minha alma, reduzindo à linguagem harmoniosa e cadente o pensamento que me vem de improviso, e as ideias que em mim desperta a vista de uma paisagem ou do oceano — o aspecto enfim da natureza. Casar assim o pensamento com o sentimento — o coração com o entendimento — a ideia com a paixão — cobrir tudo isto com a imaginação, fundir tudo isto com a vida e com a natureza, purificar tudo com o sentimento da religião e da divindade, eis a Poesia — a Poesia grande e santa — a Poesia como eu a compreendo sem a poder definir, como eu a sinto sem a poder traduzir.
DIAS, Gonçalves. Poesia completa e prosa. (Fragmento).
14. No segundo parágrafo do texto, Gonçalves Dias fala a respeito da forma utilizada em seus poemas.
4 O que diz ele a respeito de seus versos?
4 Como sua postura reflete os ideais do Romantismo?
FundaCão BiBlioteCa naCional,RJ
A exuberância da natureza brasileira é apresentada para as cortes europeias por alguns dos artistas que por aqui passaram. Embouchure de La Riviere Caxoera — Prancha 26, estampa reproduzida da litografia de Johann Moritz Rugendas.
15. Segundo o autor, os poemas “não têm unidade de pensamento entre si”.
4Explique essa afirmação, de acordo com o texto.
4O que tal afirmação sugere a respeito do processo de criação poética no Roman- tismo?
16. Ao dizer, sobre as poesias, “Escrevi-as para mim, e não para os outros”, Gonçalves Dias incorre num paradoxo.
4Qual seria esse paradoxo?
4Que traço romântico se evidencia por essa contradição?
17. Uma das características românticas mais notáveis é a idealização, o descompromisso com a retratação fiel do real. Em alguns momentos do texto, Gonçalves Dias refere-se, implicitamente, a essa característica.
4 Transcreva duas dessas passagens.
4 Explique de que maneira essas passagens indicam a tendência à idealização.
18. O Romantismo, com frequência, e principalmente na primeira geração, apresentou ten- dências nacionalistas. No Brasil, em particular, tais tendências foram mais notáveis, pois esse é o primeiro movimento após a Independência do país. O texto de Gonçalves Dias não é um manifesto nacionalista; no entanto, é possível depreender dele o elemento que foi mais fortemente explorado pelo Romantismo brasileiro como constituidor da identidade nacional.
4 Qual é esse elemento?
4 A partir das características românticas que você conhece, elabore uma hipótese a respeito de como esse elemento é apresentado pelos autores brasileiros.