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Repositório Institucional UFC: Tem a família poliafetiva direito à proteção?

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

GRADUAÇÃO EM DIREITO

HELOISE CHAVES ALVES DE OLIVEIRA

TEM A FAMÍLIA POLIAFETIVA DIREITO À PROTEÇÃO?

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HELOISE CHAVES ALVES DE OLIVEIRA

TEM A FAMÍLIA POLIAFETIVA DIREITO À PROTEÇÃO?

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à disciplina monografia jurídica do Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientadora: Profa. Dra. Raquel Cavalcanti Ramos Machado

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca Universitária

Gerada automaticamente pelo módulo Catalog, mediante os dados fornecidos pelo(a) autor(a)

O47t Oliveira, Heloise Chaves Alves de.

Tem a família poliafetiva direito à proteção? / Heloise Chaves Alves de Oliveira. – 2017. 45 f.

Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2017.

Orientação: Profa. Dra. Raquel Cavalcanti Ramos Machado.

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HELOISE CHAVES ALVES DE OLIVEIRA

TEM A FAMÍLIA POLIAFETIVA DIREITO À PROTEÇÃO?

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à disciplina Monografia Jurídica do Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Aprovada em: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Profa. Dra. Raquel Cavalcanti Ramos Machado (Orientadora)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Prof. Dr. William Paiva Marques Júnior

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Mestranda Vanessa de Lima Marques Santiago

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A Deus.

Aos meus pais, Orley e Eloisa.

A minhas irmãs, Bárbara e Clara Luiza.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por ter me concedido o sonho de estudar na UFC e perceber que tudo tem sua hora, tem o momento certo de acontecer e que esse momento nem sempre é igual ao nosso. Por ter permitido que eu chegasse até aqui e por todas as demais conquistas que se somaram e se somarão a esta. Obrigada por ser o meu tudo em todos os momentos da minha vida, por me dar forças, coragem e me mostrar que sempre posso mais, quando nem eu mesmo acredito.

Aos meus pais, Orley e Eloisa, por serem sempre meu apoio, por estarem sempre do meu lado acreditando em mim, comemorando minhas vitórias, muitas vezes até mais do que eu. Deus não poderia ter me presenteado com pais melhores, vocês são perfeitos em tudo. Obrigada pela abdicação de vocês ao longo da minha jornada, pela paciência e dedicação comigo e com minhas irmãs. Obrigada por serem exemplo de fé, amor, companheirismo, dedicação. Vocês são meus melhores presentes.

As minhas irmãs, Bárbara e Clara Luiza, vocês são as coisas mais preciosas que nossos pais me deram, em vocês sei que posso encontrar o amor, a compaixão, a humildade e o carinho para superar qualquer coisa. Obrigada por estarem comigo em todos os momentos, por serem minha fonte de risadas, de preocupação, mas principalmente de amor. Vocês me inspiram a cada dia em querer ser alguém melhor, alguém em quem vocês possam confiar sempre.

Ao meu avô, João Chaves, por ser sempre luz na minha vida e que, mesmo não estando aqui, me deixou ensinamentos que levarei por toda a vida, sendo uma das pessoas que mais amo. O senhor me ensinou qual a verdadeira riqueza da vida: o amor e dedicação a família, e que tudo devemos fazer com humildade e de coração. O senhor foi uma daquelas pessoas que Deus colocou na terra

Á minha Avó Iraci Chaves, por ser meu referencial de fé, força, resiliência, dedicação… a senhora é minha fortaleza, nunca vi mulher tão forte em momentos adversos, pronta para amparar a quem for preciso. Sua determinação e coragem me inspiram. Te amo com todo meu coração, você é um presente dos céus na nossa família, sem a senhora não seriamos tão nós como somos hoje. Você e o vovô João sempre serão meus seres humanos favoritos, que desde de criança me ensinaram o que é amar, o que é dividir a vida com o outro, o que é construir uma família, o que é se importar com o outro. Os amo mais que tudo nessa vida.

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que muito do que o papai é hoje é por conta do senhor, pelo amor incondicional que o senhor tinha por ele. Onde quer que o senhor esteja, saiba que te amo muito, o senhor foi uma das pessoas mais humildes, simples e de coração puro que conheci, peço a Deus que me permita ser pelo menos 1% do que o senhor foi.

Aos meus tios, tias, primos e primas, por sempre acreditarem e torcerem por mim, essa vitória também é para vocês. Cada um, com seu jeito especial toca meu coração e me ensina alguma lição que levarei para a vida toda. Por mais que não demonstre sempre, tenho um carinho e amor imenso por todos vocês. Foram vocês que fizeram minha infância ser memorável, que me protegeram como quem protege a um irmão, que me mostraram que meu sonho de ter um irmão mais velho havia se realizado por meio de vocês. O que sou hoje tem um pouco de cada um de vocês em minha essência.

Aos meus amigos de uma vida, meu “Aí Agrega”, que acompanharam essa jornada antes mesmo dela começar, que trouxerem e trazem alegria e cor para a minha vida, vocês são o retrato de amigos de infância que quero levar para toda a vida. Com vocês aprendi o que é amizade de verdade. Vocês me mostraram que o tempo nem a distância é capaz de nos afastar. Vocês são meus presentes do C7S para a vida, os amo imensamente Thomas, Brenda, Bárbara, Monique, Yara, Carol, Laene, Eduardo.

Aos Missionários da Fé, por me ajudarem a voltar para mais perto de Deus, quando eu não me encontrava em nenhum grupo de oração, por me fazerem perseverar na fé!!! Vocês são muito especiais, cada um, a sua maneira, me ensina algo e me acolhe com muito carinho e amor!!

À minha Equipe de Jovens de Nossa Senhora, uma graça que chegou na minha vida sem avisar e que desde então me enche de alegria, fé, força, perseverança, amizade. Vocês me mostram a cada dia que nossa amizade tem como base o amor de Deus, e que vocês estarão sempre ao meu lado, me apoiando e confiando em mim. Eu os amo muito e já não sei como seria minha vida sem vocês.

Aos meus amados Pigmeus, que me receberam na Faculdade de Direito com todo carinho do mundo, que me aceitaram sem nem me conhecer direito, que fizeram dos meus dias na UFC mais felizes, repleto de risadas, histórias, saídas e brincadeiras, que deram cor aos meus dias. Sem vocês eu não sei se teria chegado até aqui, pois por muitas vezes vocês foram os únicos que entenderam o que se passava na minha cabeça indecisa e que me motivaram para seguir em frente, e ser quem eu sou.

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Ao Professor William Marques, por ser um sinônimo de dedicação e amor ao que faz. O senhor é um exemplo de profissional, pois o senhor não só exerce seu trabalho com maestria, como também faz de tudo para ajudar todos ao seu redor, sempre de bom humor e disponível. A coordenação não é a mesma sem sua alegria, sua dedicação e amor. Professor, o senhor transforma cada lugar que passa, contagiando todos ao seu redor com seu jeito especial de ser, com uma luz que só o senhor tem!!!

À Vanessa, por sua disponibilidade em aceitar tão prontamente e sem titubear participar da banca da minha monografia. Muito obrigada por ter sido tão legal, simpática e receptível.

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“família (s.f.)

é o nosso conjunto de laços mais querido. Não precisa ter o mesmo sangue, basta sentir o mesmo amor. é quem cuida da gente quando a gente tá doente. é quem sabe que somos mais do que defeitos e qualidades. é quem aceita nossas mais. é quem tá do nosso lado nos momentos difíceis. é ohana.

“e Ohana quer dizer família, e família quer dizer nunca abandonar ou esquecer.”

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RESUMO

As entidades familiares vêm passando por diversas transformações ao longo dos anos, o que ocasionou o surgimento de vários tipos de famílias, dentre elas as famílias poliafetivas. Diante disso, o presente trabalho tem o objetivo de analisar este tipo familiar, classificando-o de fato como família, por atender a características presentes nos demais núcleos familiares, além de analisar a importância do afeto na formação das famílias multissubjetivas. Ao reconhecer tal classificação, defende a necessidade de um mínimo de proteção as famílias poliamorosas, a fim de assegurar a dignidade da pessoa humana dos integrantes deste núcleo familiar e da própria família, além de garantir outros direitos básicos do ser humano, como a liberdade. Pondera, ainda, acerca da relação existente entre o Direito e o amor, e as consequências dessa relação para as famílias polissubjetivas. Ademais, identifica que ainda não é pacífico nos tribunais o reconhecimento de uniões paralelas, isto é, das famílias poliamorosas. Diante dessa realidade, reconhece a necessidade do direito e seus operadores aplicarem as normas jurídicas de maneira mais humana, tendo como base as situações fáticas e suas peculiaridades, a fim de que a legislação seja empregada de forma mais compatível com as particularidades de cada caso e concedendo tratamento semelhante a todos os tipos familiares.

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ABSTRACT

Family entities have been undergoing several transformations over the years, which has led to the emergence of several types of families, among them the polyphonic families. Therefore, the present study aims to analyze this family type, classifying it as a family, attending to characteristics present in the other family nuclei, and analyzing the importance of affection in the formation of multisubjective families. Recognizing this classification, he defends the need for a minimum of protection for polyamorous families, in order to ensure the dignity of the human person of the members of this family nucleus and of the family itself, as well as guarantee other basic human rights, such as freedom. It also considers the relation between law and love, and the consequences of this relationship for polissubjective families. In addition, it identifies that the recognition of parallel unions, that is, of the polyamorous families, is not yet peaceful in the courts. In view of this reality, it recognizes the need for law and its operators to apply the legal norms in a more humane way, based on factual situations and their peculiarities, so that legislation is employed in a way that is more compatible with the particularities of each case and granting treatment similar to all family types.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 13

2. CONCEITO DE FAMÍLIA, SUA EVOLUÇÃO NO TEMPO E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS ... 15

2.1 Evolução histórica... 15

2.2 Princípios constitucionais regentes do Direito de Família ... 18

2.3 Conceito de família e os diversos tipos de arranjos familiares ... 23

3. A FAMÍLIA POLIAFETIVA ... 26

3.1 O afeto e sua interferência na formação das Famílias Poliafetivas ... 26

3.2 Poliamor versus Concubinato versus União estável versus Poligamia... 27

3.3 A Dignidade da Pessoa Humana como garantia dos direitos fundamentais da Família Poliafetiva... 29

3.4 O amor como garantia da formação das Famílias Poliafetivas e a restrição do mesmo pelo direito ... 32

4 ANÁLISE DE JURISPRUDÊNCIA SOBRE AS FAMÍLIAS POLIAFETIVAS... 34

4.1 Entendimento dos tribunais acerca das uniões poliafetivas... 34

4.2 Repercussão dos entendimentos dos tribunais... 37

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS... 39

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1 INTRODUÇÃO

São perceptíveis as transformações que a entidade familiar tida como tradicional, isto é, pai, mãe e filhos, vem sofrendo no decorrer dos anos, passando-se a existir diversas formas de arranjos familiares, dos quais nem todos são amparados e aceitos facilmente por toda a sociedade, apesar da sua efetiva existência.

Tais transformações nos arranjos familiares exigem que o Direito evolua a fim de proporcionar segurança e garantir um mínimo de direitos para tais famílias, conferindo um mínimo de dignidade aos integrantes de cada arranjo familiar

Portanto, ainda que parte da sociedade não aceite todos os formatos familiares, não é possível mais negar a existência, o crescimento e a repercussão dos mesmos no dia a dia. Deve, então, o Direito cumprir seu papel e se amoldar às mudanças que vem ocorrendo na sociedade, deixando de menosprezar certo grupo de pessoas porque parte da sociedade não concorda com a escolha da forma que aqueles construirão suas famílias.

Dentre os diversos tipos de arranjos familiares que estão surgindo tem-se a família poliafetiva, que tem suscitado alguns questionamentos, como, o que seria família? Poderiam as uniões Poliafetivas serem consideradas família? Devem elas receber um mínimo de segurança jurídica, a fim de que seus integrantes tenham um mínimo de dignidade humana respeitado?

Com base nessas questões que perpassam os debates acerca das famílias poliamorosas, o presente trabalho analisa se as uniões poliafetivas são de fato consideradas entidades familiares, e se de fato o forem, se merecem algum tipo de segurança e como são tratadas nos tribunais brasileiros. Pois é evidente que as mesmas, de fato existem, e por isso não podem ser esquecidas pelo ordenamento jurídico.

Inicialmente, o trabalho se encarregará de analisar o conceito de família, a evolução da entidade familiar, os direitos constitucionais a ela garantidos, detendo-se, ainda, na análise da família segundo o direito brasileiro, atualmente.

Em seguida, estuda a interferência do afeto na conjuntura dos tipos familiares, ocupando-se, posteriormente, de uma explanação acerca dos tipos de arranjos familiares existente.

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Observando, ainda, se realmente há a garantia de que os integrantes dessas famílias tenham o direito à dignidade humana garantido, mesmo que seja o mínimo possível, isto é, não sejam tratados de forma degradante ou desumana e tenham um mínimo de direitos que permitam uma existência harmônica na sociedade e no âmbito familiar.

Prosseguindo para um estudo acerca da segurança jurídica estabelecida para tal entidade, isto é, se tal arranjo familiar possui garantias que lhes proporcionem uma coexistência em sociedade de forma digna.

Encerra-se com a análise jurisprudencial sobre casos em que se reconhecem, ou não, juridicamente as uniões paralelas, percebendo a existência de divergência nos tribunais acerca do tema.

Diante do que foi explano, o presente trabalho acadêmico tem por objetivo analisar as famílias poliamorosas, reconhecendo que as mesmas merecem ter assegurado um mínimo de direito a fim de proteger seus integrantes e garantir-lhes uma existência harmônica, pacífica e saudável em sociedade e entre seus integrantes.

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2. CONCEITO DE FAMÍLIA, SUA EVOLUÇÃO NO TEMPO E GARANTIAS COSNTITUCIONAIS

É de suma importância analisar a segurança que o Estado vem garantindo às entidades familiares, visto que são elas o primeiro contato que o ser humano tem com a sociedade ao longo dos anos. É importante salientar que o Estado veio concedendo uma maior segurança constitucional as famílias, estabelecendo alguns princípios e direitos basilares para as mesmas.

2.1 Evolução histórica

A família vem passando por diversas transformações ao longo dos anos em decorrência das mudanças ocorridas na sociedade, e o direito vem tentando acompanhar essas mudanças, ao procurar proteger ou, pelo menos, conceder um mínimo de garantias para os arranjos familiares que se vislumbra na sociedade.

A família tinha sua atribuição, ao longo dos anos, determinada pela função que exercia, seja religiosa, política, econômica, afetiva. Tendo o matrimônio como um dos principais impulsionadores na formação das famílias, foi por meio deste que as mesmas começaram a ser formadas, independentemente do que levou duas pessoas a se casarem, seja economia, religião, filhos ou o afeto, a união objetivando construir uma família tinha início com o casamento. E foi por meio da colonização que se enraizou na sociedade brasileira o hábito de que a família se formaria por meio do casamento.1

No entanto, com a evolução e transformações da sociedade e a mentalidade das pessoas, a importância do indivíduo para a família, as necessidades do homem como integrantes de um núcleo familiar, a evolução das relações humanos, dentre outros motivos levaram a mudança das famílias e dos laços que as unem.

As famílias começavam a se formar por meio do que pregava a religião dominante da época, na qual a religião em si coordenava a união das pessoas a fim de formar uma família, sem haver qualquer outra relação entre os seus participantes.

Era possível observar, também, as famílias que tinham como base a economia, na qual se tinha inúmeros filhos a fim de garantir seu sustento na velhice, visto que seriam eles que garantiriam a subsistência dos pais na velhice, pois não se tinha a previdência. Ou se casava apenas objetivando ganhos patrimoniais, em que se procurava sempre casamentos

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mais vantajosos, isto é, quanto mais patrimônio a pessoa tivesse melhor. Novamente, sem haver qualquer afeição entre os cônjuges.

Em ambos os precursores familiares tinha-se como característica principal o homem como dominante do pátrio poder, determinando os moldes e rumos que a família seguira, e a mulher sendo sempre submissa ao homem. O patriarca detinha o poder sobre os demais integrantes da família, determinando o que deveria ou não ser feito, regulando a vida dos integrantes do núcleo familiar. Tais famílias eram marcadas pelo autoritarismo e conservadorismo, não havendo qualquer afeto que ensejasse a união.

Tais relações tinham como início o matrimônio, era apenas por meio deste que se iniciavam as famílias, e qualquer outro relacionamento fora do mesmo não tinha validade, ficando a margem da sociedade, tal como ocorria com o filho fruto de concubinato.

Foi com base nessa visão da sociedade que o Código Civil de 1916 estruturou-se, tendo como marca o pensamento autoritário, conservador, patriarcal e machista da época, em que a mulher era tratada de forma inferior ao homem e não se aceitando os filhos tidos fora do matrimônio ou as demais relações que não tinham o casamento como base. Confirmando tal entendimento Silvana Maria Carbonera, como se observa:

Outro aspecto relevante que caracteriza o tratamento jurídico da família no período compreendido entre o primeiro Código Civil e a Constituição Feral de 1988 consiste na unicidade do modelo familiar tutelada pelo sistema jurídico, concretizada pela desconsideração da existência de estruturas familiares diversas. Uma simples leitura da legislação vigente em tal período produz, em um leitor desatento, a impressão de que o formato de família existente em território nacional era unicamente o patriarcal, circunscritos aos moldes codificados.2

No decorrer dos anos, o pensamento machista e conservador da época foi perdendo força, a mulher começou a buscar seus direitos e tratamento igual ao homem, além de começar a conquistar espaço no mercado de trabalho, deixando de ter função apenas no âmbito doméstico, para buscar de fato uma função na sociedade e poder influenciar esta de alguma forma. Deste modo, as famílias já não tinham como princípio o viés econômico, social, religioso, as pessoas agora estavam se unindo por vontade de estarem juntas, já não se tinha mais a figura do patriarca tão forte na sociedade, podendo observar agora a busca da igualdade entre os integrantes do núcleo familiar. Este novo modelo de família e as transformações por ela sofridos foi protegido pela Constituição Federal de 1988.

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Com o advento da Constituição de 1988, passou-se a ter uma preocupação com o indivíduo, com proteção da dignidade do mesmo, havendo uma ruptura com a mentalidade até então dominante, em que não havia o cuidado com o ser humano, destinava-se maior atenção ao viés econômico e não a pessoa em si.

A família passou, então, a ser fundada no afeto, na emoção, na ligação pessoal entre os indivíduos, isto é, uma ligação única que os faz querer continuar unidos, ligação esta que vai promover e propiciar o crescimento pessoal de cada um dos integrantes da entidade familiar.

Essa transição no que se tinha como fundamento de família à época do Código Civil de 1916 e o que se tem por família nos dias atuais é evidenciada pelos autores Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald3, conforme se vê a seguir:

A transição da família como unidade econômica para uma compreensão igualitária, tendente a promover o desenvolvimento da personalidade de seus membros, reafirma uma nova feição, agora fundada no afeto. Seu novo balizamento evidencia um espaço privilegiado para que os seres humanos se complementem e se completem.

A família passou a ter uma maior importância no crescimento pessoal dos indivíduos, sendo agora, como afirmam os supracitados autores, meio para o desenvolvimento do ser humano e não mais uma finalidade. Pode-se agora observar uma ligação emocional entre os integrantes da família, a existência da preocupação mútua entre cada familiar e o desejo de pertencimento ao núcleo familiar.

Essa ligação substitui o poder patriarcal pelos sentimentos de amizade, respeito, afeto, solidariedade na relação entre os entes de uma família, além do conhecimento verdadeiro dos sentimentos, das aspirações e objetivos do outro, incentivando e ajudando o mesmo a alcançar o que almeja. A finalidade da família agora é construir um ambiente harmonioso, sólido e duradouro entre os familiares. Tais características propiciaram o surgimento de outros tipos de arranjos familiares, não tendo os mesmo como precursor apenas o casamento.

Ainda como afirma Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald4, atualmente, por meio

das famílias busca-se alcançar a felicidade5, estando tal objetivo estampado não apenas na

família baseada no casamento, a tradicional, mas também nos diversos tipos de famílias

3 FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direito das Famílias. 3ªed. Rio de Janeiro. Editora Lumen Juris. 2010.p.6

4 FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direito das Famílias. Rio de Janeiro. Editora Lumen Juris. 3ªed. 2010.p.7

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existentes. Cabe falar, ainda, que para Amartya Sen um dos conceitos fundamentais para que se possa alcançar o desenvolvimento da sociedade através da liberdade é o conceito da felicidade, ao afirmar que “a capacidade de ser feliz é também um aspecto fundamental da liberdade que temos boas razões para valorizar. A perspectiva da felicidade ilumina uma parte extremamente importante da vida humana”, o que demonstra a importância da busca dela para o indivíduo.

Portanto, o conceito de família, perpassa pelo de afetividade, visto que este é, hoje, característica basilar na formação e estruturação das entidades familiares. Conforme assevera Paulo Lobo6, proporcionando a existência das famílias socioafetivas e vida em comum entre

os familiares.

2.2 Princípios constitucionais regentes do Direito das Famílias

A Constituição Federal de 1988 foi um marco na história brasileira, pois por meio dela se passou a conceder um tratamento mais justo e inclusivo ao ser humano, isto é, o homem passou a ser um fim em si mesmo, a ser valorizado e protegido.

Não foi diferente ao que fez com as entidades familiares, pois rompeu com o entendimento anterior, de que a família seria apenas aquela constituída por meio do matrimônio, mas também ampliou-se o conceito de família ao incluirão conceito as uniões estáveis e as entidades monoparentais.

Com a finalidade de garantir uma convivência pacífica e harmoniosa de todos os tipos familiares, a Constituição estabeleceu princípios fundamentais expressos ou implícitos que passaram a nortear a aplicabilidade e eficácia das leis. Diante disso, todas as leis e condutas deverão se pautar e respeitar tais princípios, garantindo assim a proteção, assistência e um tratamento digno e uniforme tanto para as entidades familiares quanto para aqueles que compõe tal entidade.

Para Alexy7, tanto os princípios quanto as regras são consideradas normas, logo, é

possível perceber que os princípios fundamentam todo o ordenamento brasileiro, além de influenciar a formação do juízo sobre o que é certo e errado. Por este motivo se mostra imprescindível o respeito a eles.

É com base nesses princípios, expressos ou implícitos, que também se

6 LOBO, Paulo. Direito Civil: famílias. São Paulo. Saraiva. 4ª ed. 2011. p.71

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concretizaram as normas referentes ao Direito de Família. Por esse motivo se faz interessante e importante abordar os mais relevantes para o tema ora discutido.

a) Princípio da dignidade da pessoa humana:

É um dos princípios basilar que se tem hoje no ordenamento jurídico brasileiro, visto que por muito tempo o homem foi tratado como objeto que não merecia qualquer proteção ou cuidado. Somente a partir da jurisdicionalização do princípio da dignidade da pessoa humana que passou a existir uma preocupação com a integridade e a existência do ser humano, assegurando-se, então, um mínimo de direitos e garantias para todas as pessoas.

Dessa forma, Paulo Lobo aduz que “viola o princípio da dignidade da pessoa humana todo ato, conduta ou atitude que coisifique a pessoa, ou seja, que a equipare a uma coisa disponível, ou a um objeto”8, o que demonstra que foi a partir desse princípio que se

rompeu com a coisificação do homem e com o tratamento impiedoso conferido àqueles que não eram considerados iguais perante os que detinham o poder.

O entendimento de que o homem deve ser tratado com um mínimo de dignidade deve ser estendido para o âmbito familiar, visto que a existência da família, hoje, é pautada no respeito e coexistência mútua, isto é, deve a família ter como base o respeito à dignidade de seus integrantes, a fim de possibilitar uma existência pacífica e harmônica entre seus membros.

Pode-se concluir que a dignidade da pessoa humana também está relacionada com a não-discriminação, com a aceitação do próximo e as escolhas dele, conforme expõe Vladimir Polízio Júnior9 ao afirmar que a “dignidade pressupõe, pois, não ser recriminado

nem discriminado por escolhas pessoais, que dizem respeito apenas e tão somente à vida íntima e privada, que não podem ser tolhidas ou reprimidas por preconceito moral”.

Desse modo, deve-se garantir a dignidade dos integrantes da família, por mais que seja diferente do modo como a maioria da sociedade está acostumada, devendo-se proteger a sua integridade, assim como bem determina a Constituição Federal em seu art. 22610, que a

mesma merece proteção especial do estado.

Além da importância demonstrada a relevância do princípio da dignidade da

8 LOBO, Paulo. Direito Civil: famílias. 4ª ed. São Paulo. Saraiva. 2011. p.60.

9 POLÍZIO JÚNIOR, Vladimir. A possibilidade jurídica de união estável ou casamento entre mais de duas pessoas: interpretação conforme a Constituição. Revista Quaestio Juris, v. 08, nº 01, Rio de Janeiro, 2015. pp. 51-80. Disponível em< http://dx.doi.org/10.12957/rqi.2015.15351>. Acesso em 09 de Nov. de 2017.

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pessoa humana é enfatizada por Sarlet11 ao afirmar que os direitos fundamentais têm como

fundamento o princípio da dignidade da pessoa humana.

b) Princípio da solidariedade:

Esse princípio expressa a ideia de proporcionar uma convivência na qual um está preocupado com o outro, está disposto a ajudar o outro, tendo como base a ideia de coexistência humana. Em consonância com este posicionamento Paulo Lobo12 declara que o

princípio da solidariedade surgiu a partir da superação do indivíduo, isto é, passa-se a viver agora em sociedade pensando não apenas nos interesses individuais, mas de toda a sociedade, os interesses do outro.

No âmbito familiar a solidariedade está ligada não só ao viés econômico, mas, principalmente, ao respeito que cada um de seus membros deve ter com os demais. Dessa forma leciona Caio Mario13 ao afirmar que significa o respeito e consideração nas relações

familiares.

Consiste, portanto, na obrigação entre os compõem a família quanto à coexistência, à convivência, à formação moral e educacional dos que ali convivem. A fim de que se possa ter uma existência pacífica, harmônica, mas que também promova o crescimento e desenvolvimento de todos os que ali estão.

Acerca do princípio da solidariedade e de sua abrangência na sociedade de forma geral, Caio Mário14 afirma:

[...]a solidariedade familiar é fato e direito, realidade e norma. No plano fático as pessoas convivem no âmbito familiar, não por submissão a um poder incontrolável, mas porque compartilham afetos e responsabilidades. No jurídico, os deveres de cada um para com os outros impuseram a definição de novos direitos e deveres jurídicos, inclusive na legislação infraconstitucional, a exemplo o Código Civil de 2002, o que significa que se alcançou a dimensão ideal da solidariedade, impondo por avanços legislativos.

Ainda, com base em tal princípio e em tais questões acima levantadas, Caio Mário15 assevera que o princípio da solidariedade é o princípio norteador do Direito das

Famílias contemporâneo, pois implica respeito e consideração mútua aos integrantes da

11 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: Uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora. 2012. p.74

12 12 LOBO, Paulo. Direito Civil: famílias. São Paulo. Saraiva. 4ª ed. 2011. p.63

13 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Direito de Família. Vol. V. 20ª ed. Rio de Janeiro: Forense. 2012. p.58.

14 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Direito de Família. Vol. V. 20ª ed. Rio de Janeiro: Forense. 2012. p.58.

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entidade familiar.

Desse modo, com base no que foi afirmado acima, é tal princípio impulsionador das relações familiares, fomentando com os demais a existência das famílias como hoje se pode observar. Este princípio interfere, principalmente, no princípio da afetividade, um dos princípios básicos nas relações familiares atualmente, e que será abordado logo abaixo.

c) Princípio da afetividade:

Na contemporaneidade, tem-se a afetividade como a base da formação dos núcleos familiares. Visto que foi por meio dela que se deixou de lado o interesse de se crescer economicamente por meio do casamento, o de manter um status social, ou qualquer outro motivo semelhante na formação das famílias. É um dos principais impulsionadores na evolução e atual aspecto que as famílias vêm assumindo hoje.

Corroborando esse entendimento assevera Paulo Lobo16:

A família, tendo desaparecido suas funções tradicionais, no mundo do ter liberal burguês, reencontrou-se no fundamento da afetividade, na comunhão de afeto, pouco importando o modelo que adote, inclusive o que se constitui entre um pai ou mãe e seus filhos.

Portanto é possível perceber que atualmente o afeto vem sendo o maior impulsionador na formação das relações familiares e na manutenção de tais laços, não importando mais o formato que o núcleo familiar venha a ter ou quem integre tal núcleo, pois o que realmente determinará sua real existência é se há afeto ou não. A família agora movida pelo afeto não busca o interesse de um, mas sim o do grupo familiar.

Vale salientar que a afetividade não deve ser confundida com o afeto, pois aquela pode ser presumida, é um dever imposto na relação entre pais e filhos, na relação entre conjunges e companheiros deve incidir apenas se houver a afetividade real, isto é, o objetivo comum de constituir família, portanto, a afetividade é um dever de assistência. Representa, então, a afetividade a intervenção do Direito nas relações familiares, a fim de regula-las. O afeto, por sua vez, esta mais para algo psicológico, anímico, ligado as emoções e aos sentimentos, é um fato social.

Cristiano Farias e Nelson Rosenvald17 lecionam que é o princípio da afetividade

que orienta o Direito das famílias, juntamente com o princípio da dignidade da pessoa humana. Ademais, afirma que é a partir do afeto que advém os efeitos jurídicos da unidade familiar.

É a afetividade que permite a aceitação das peculiaridades de cada integrante da

16 LOBO, Paulo. Direito Civil: famílias. São Paulo. Saraiva. 4ª ed. 2011. p.72.

17FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direito das Famílias. Rio de Janeiro. Editora Lumen

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família, além de garantir a dignidade de cada um, a união e a continuidade. Assevera, ainda, Farias e Rosenvald que “a família é o refúgio das garantias fundamentais reconhecidas a cada um dos cidadãos.”18, por esse motivo é tão importante garantir a proteção de todos os núcleos

familiares, pois é nele que o ser humano pode realmente ser quem é, sem julgamentos, tendo seus direitos mais básicos assegurados.

Maria Berenice Dias19 reconhece, também, que as famílias têm como base o afeto

e o amor, ao afirmar que “os vínculos conjugais que passaram a se sustentar no amor e no afeto. Na esteira dessa evolução, o direito de família instalou uma nova ordem jurídica para a família, atribuindo valor jurídico ao afeto”, o que corrobora o entendimento de que hoje são eles que nutrem as relações entre as pessoas e, principalmente, entre os membros de uma família.

d) Princípio da igualdade:

O princípio da igualdade evoca o entendimento de igualdade não só entre homem e mulher, mas entre os filhos havidos na constância ou não do casamento, entre os diversos tipos de famílias existentes.

Conforme declara Paulo Lobo20 acerca desse princípio, é possível entender

melhor qual o objetivo do mesmo:

[...]para que programe políticas públicas para superação das desigualdades reais existentes entre os gêneros, à administração da justiça, para o impedimento das desigualdades, cujos conflitos provocaram sua intervenção, e, enfim, às pessoas para que o observem em seu cotidiano.

Dessa forma, pode-se perceber que o princípio da igualde tem o objetivo de garantir a verdadeira igualdade entre as pessoas, procurando superar o tratamento desigual antes concedido, no qual não se levava em consideração o ser humano em si e suas peculiaridades.

Sendo o mesmo trazido expressamente na Constituição Federal, igualdade esta referente ao gênero, aos filhos e as entidades familiar, conforme pode-se observar, respectivamente, nos artigos 226, parágrafo 521; 227, parágrafo 622; e 226, caput23, ao não

18FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direito das Famílias. Rio de Janeiro. Editora Lumen Juris. 6ªed. 2015. P.31

19 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 8ª Edição. Revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 68.

20 LOBO, Paulo. Direito Civil: famílias. São Paulo. Saraiva. 4ª ed. 2011, p.66

21 Constituição Federal de 1988, artigo 226 [...] § 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

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determinar o que viria a ser família, deixando o entendimento amplo, para que seja possível adequar as demais famílias.

Portanto, deve ser responsabilidade do Estado a proteção dos mais diversos tipos de famílias e dos seus integrantes, a fim de garantir o tratamento igualitário entre eles e proporcionar o cumprimento dos demais direitos e deveres referentes aos mesmos.

e) Princípio do Pluralismo das Entidades Familiares:

O aludido princípio é o que garante a existência dos mais diversos tipos de famílias, pois por meio dele rompe-se com o entendimento de que existe apenas um tipo de família e passa-se a aceitar a existência e a possibilidade da existência de entidades familiares diferentes, afastando-se de uma vez a ideia de que a família seria apenas a constituída por meio do casamento e propiciando a existência de famílias com base na união estável, famílias homoafetivas e, quiçá, famílias poliamorosas.

O que se percebe em comum entre todos os tipos de entidades familiares é que todas têm como características a afetividade, estabilidade e a convivência pública. Portanto, independentemente de quem são as pessoas que as formam, elas têm essas três características que as diferenciam dos demais tipos de relações, dando-lhes a caracterização de família.

Conforme estabelece Paulo Lobo24 a seguir, é possível perceber que tal princípio

tem fundamento nos princípios da igualdade e da liberdade, além de ser fruto das transformações que a entidade familiar vem sofrendo ao longo dos anos:

Em virtude das transformações ocorridas e que estão a ocorrer no direito de família, alguns princípios emergem do sistema jurídico brasileiro e que poderiam desfrutar de autonomia, como o princípio do pluralismo de entidades familiares, adotado pela Constituição de 1988, pois elas são titulares de mesma proteção legal. Tal princípio, por sua especificidade, encontra fundamento em dois princípios mais gerais, aplicáveis ao direito de família, a saber, o da igualdade e o da liberdade, pois as entidades são juridicamente iguais, ainda que diferentes, e as pessoas são livres para constituí-las

Portanto, é com base nessas transformações das entidades familiares que o Direito traz tal princípio, a fim de que possa alcançar as mudanças da sociedade, passando a proteger os diversos tipos familiares que estão começando a existir, reconhecendo, de algum modo, que, por mais que o ordenamento ainda não estabeleça quais são essas novas formas de entidade familiar, elas precisam de proteção.

filiação.

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2.3 Conceito de família e os diversos tipos de arranjos familiares

Conceituar família é uma tarefa árdua, pois além da diversidade de tipos familiares, pode-se analisar por diferentes aspectos, como a família de sangue, a família fruto do casamento, a família fruto da união estável, dentre outras, mas seu conceito vem mudando de acordo com as transformações que as entidades familiares vêm passando no decorrer dos anos.

Caio Mário reconhece em seu livro Instituições de Direito civil – Direito de Família25, que o núcleo familiar não recebe tratamento uniforme e pacífico na seara jurídica, o

ordenamento concentra sua análise nos membros que fazem parte do núcleo ou na relação ali existente, não há abrangência de todos os tipos familiares e relações existentes, daí a dificuldade em conceituar família e de conferir proteção a todos os tipos de arranjos familiares, ou seja, as normas ainda são omissas em reconhecer algumas relações familiares e as repercussões destas.

Nessa mudança de conceito de família e na evolução das entidades familiares. viu-se o Judiciário obrigado a reconhecer as entidades familiares que vinham cada vez mais ocupando espaço na sociedade, como no caso das uniões estáveis homoafetivas ao determinar a Resolução nº 175, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, “inexistir óbices legais à celebração de casamento entre pessoas de mesmo sexo”26, conferindo assim segurança às

uniões homoafetivas, reconhecendo-as como família e protegendo-as.

Nessa evolução, encontra-se o conceito de poliamor e formação de famílias a partir do mesmo, questionando-se a necessidade do Judiciário também reconhecer a existência das famílias polissubjetivas e conferir proteção aos seus componentes.

Diante disso, cabe analisar os diversos tipos de entidades familiares, a fim de que seja possível perceber a singularidade das famílias Poliafetivas. Paulo Lobo27 estabelece onze

tipos de entidades familiares existentes hoje, quais sejam:

São unidades de convivência encontradas na experiência brasileira atual, entre outras: a) homem e mulher, com vínculo de casamento, com filhos biológicos;

b) homem e mulher, com vínculo de casamento, com filhos biológicos e filhos não biológicos, ou somente com filhos não biológicos; c) homem e mulher, sem casamento, com filhos biológicos (união estável); d) homem e mulher, sem

25 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Direito de Família. Vol. V. 20ª ed. Rio de Janeiro: Forense. 2012. p.27

26 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Resolução nº 175. De 14 de maio de 2013. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/resolu%C3%A7%C3%A3o_n_175.pdf> Acesso em: 22 de novembro de 2017.

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casamento, com filhos biológicos e não biológicos ou apenas não biológicos (união estável); e) pai ou mãe e filhos biológicos (entidade monoparental); f) pai ou mãe e filhos biológicos e adotivos ou apenas adotivos (entidade monoparental); g) união de parentes e pessoas que convivem em interdependência afetiva, sem pai ou mãe que a chefie, como no caso de grupo de irmãos, após falecimento ou abandono dos pais, ou de avós e netos, ou de tios e sobrinhos87; h) pessoas sem laços de parentesco que passam a conviver em caráter permanente, com laços de afetividade e de ajuda mútua, sem finalidade sexual ou econômica; i) uniões homossexuais, de caráter afetivo e sexual; j) uniões concubinárias, quando houver impedimento para casar de um ou de ambos companheiros, com ou sem filhos; k) comunidade afetiva formada com “filhos de criação”, segundo generosa e solidária tradição brasileira, sem laços de filiação natural ou adotiva regular, incluindo, nas famílias recompostas, as relações constituídas entre padrastos e madrastas e respectivos enteados, quando se realizem os requisitos da posse de estado de filiação.

Desses tipos de arranjos familiares a Constituição Brasileira de 1988 ou o Código Civil de 2002 faz menção a algumas acima, como as uniões estáveis, entidades monoparentais e o casamento. No entanto, tais modelos são apenas exemplificativos, conforme assevera, ainda, Paulo Lobo28 acerca dos tipos de entidades familiares:

Os tipos de entidades familiares explicitados nos parágrafos do art. 226 da Constituição são meramente exemplificativos, sem embargo de serem os mais comuns, por isso mesmo merecendo referência expressa. As demais entidades familiares são tipos implícitos incluídos no âmbito de abrangência do conceito amplo e indeterminado de família, indicado no caput. Como todo conceito indeterminado, depende de concretização dos tipos, na experiência da vida, conduzindo à tipicidade aberta, dotada de ductilidade e adaptabilidade.

Entende-se, portanto, que o ordenamento pátrio não se preocupou em determinar quais são todos os tipos familiares existentes, estabelecendo apenas um rol exemplificativo, pois o conceito de família não se pode definir como sendo apenas um, assim como não se pode definir família como sendo apenas de um tipo, visto que a sociedade está sempre em constante mudança, e, consequentemente, a família também vai mudando, adaptando-se a tais mudanças, passando a ter novos moldes.

Cabe lembrar, que a Declaração Universal dos Direitos do Homem, assegura que “a família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado”29, o que garante o direito a todas as pessoas de formar família, seja a constituída

por casamento ou socialmente constituída, além de permitir concluir que é dever do Estado protegê-la, mas sem restringí-la ou tratá-la como parte da sua constituição.

28 LOBO, Paulo. Direito Civil: famílias. 4ª ed. São Paulo. Saraiva. 2011, p.83.

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3 A FAMÍLIA POLIAFETIVA

A família poliafetiva seria aquela em que três ou mais pessoas convivem pacificamente com caráter duradouro, contínua e com o intuito de juntos formarem uma família, tendo como característica, ainda, ser formada por relacionamentos não monogâmicos.

Conforme afirma Sandra Elisa30:

No poliamor todas as pessoas envolvidas no relacionamento parecem se amar simultaneamente. Trata-se de uma nova modalidade de relacionamento, que desafia os elementos do amor romântico que pauta a sociedade ocidental, cujo paradigma central das relações amorosas se apoia na ideia de considerar que o casal se relacione apenas entre si, vivenciando uma relação a dois.

Portanto, com base no que foi exposto, pode-se afirmar que a instituição familiar vem sofrendo transformações, as quais levaram ao surgimento de diversos tipos de núcleos familiares, dentre eles as famílias poliafetivas, isto é, famílias formadas por três ou mais pessoas que estão juntas pela afetividade, pelo amor, que tem o objetivo de construir família juntos, de forma a se ter uma coexistência seus participantes, não havendo a restrição a apenas um parceiro, uma relação.

3.1 O afeto e sua interferência na formação das famílias poliafetivas

O afeto vem interferindo bastante nos diversos tipos de arranjos familiares, não sendo diferente com as famílias poliamorosas. Pode-se, inclusive, afirmar que é o afeto o maior impulsionador na constituição e formação de tal formação familiar, como assevera Paulo Lobo ao citar Claude Lévi-Strauss: “A evolução da família “expressa a passagem do fato natural da consanguinidade para o fato cultural da afinidade” (este no sentido de afetividade)”31.

Desse modo, as famílias poliamorosas quebram o paradigma do amor como sendo aquele existente apenas entre um casal, entre duas pessoas, trazendo consigo a ideia do amor como algo que pode ser partilhado entre várias pessoas, de forma que todos estejam satisfeitos e realizados com as relações multisubjetivas que estão vivendo.

Nas uniões poliamorosas prega-se a ideia de que a felicidade está em partilhar o amor, não precisando, necessariamente, que seja apenas com uma pessoa, podendo-se,

30 FREIRE, Sandra Elisa de Assis. Poliamor, uma forma não exclusiva de amar: correlatos valorativos e afetivos.2013, 258f. Tese de Pós-Graduação em Psicologia Social (Doutorado) - Universidade Federal da Paraíba. Disponível em: <http://tede.biblioteca.ufpb.br/handle/tede/6928?locale=pt_BR#preview-link0> Acessado em: 03 nov 2017

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portanto, haver relacionamentos formados por mais de três pessoas, nas quais todos vivenciam igualmente a experiência, todos fazem parte, verdadeiramente da união polissubjetiva.

Corroborando o entendimento ora esposado, Regina Navarro Lins32 declara que o

poliamor:

[...]não se trata de procurar obsessivamente novas relações pelo fato de ter essa possibilidade sempre em aberto, mas, sim, de viver naturalmente tendo essa liberdade em mente. O poliamor pressupõe uma total honestidade no seio da relação. Não se trata de enganar nem de magoar ninguém. Tem como princípio que todas as pessoas envolvidas estão a par da situação e se sentem à vontade com ela. A ideia principal é admitir essa variedade de sentimentos que se desenvolvem em relação a várias pessoas, e que vão além da mera relação sexual.

Entende-se que o poliamor é uma forma diferente de amar, um amor mais livre, no qual seus integrantes podem ter quantos parceiros quiserem, sendo aceitos sem sofrer qualquer tipo de preconceito uns dos outros. Além disso, seus membros estão juntos por uma vontade mais profunda, sem restrições por conta de posicionamentos da sociedade, estão juntos porque quere realmente conviver e buscar a felicidade em conjunto.

Ao se debater sobre poliamor pode surgir o questionamento acerca da questão do ciúme, por conta da forma como se da o relacionamento amoroso, mas quanto a esse assunto a psicanalista Regina Navarro Lins33 afirma, também, que amar mais de uma pessoa não

configura traição, além de afirma que a humanidade está progredindo para um tipo de amor, o qual não está restrito a apenas uma pessoa, isto é, passível de haver múltiplas relações. Dessa forma, pode-se considerar que seria o poliamor uma expressão desse tipo de amor.

3.2 Poliamor versus Concubinato versus União estável versus Poligamia

É muito comum haver a confusão entre concubinato, poliamor e união estável que são, na verdade, realidades diferentes, conforme se verá a seguir.

O concubinato é a relação, não eventual entre duas pessoas, um homem e uma mulher, que não podem se casar por algum motivo, por exemplo, quando um dos dois já é casado, conforme estabelece o artigo 1727 do Código Civil Brasileiro34, não sendo

considerado uma entidade familiar, visto que a lei proíbe o concubinato, além disso, a própria sociedade não aceita o concubinato, o cônjuge infiel e a concubina. A própria lei não concorda

32 LINS, Regina Navarro. A cama na varanda: arejando nossas ideias a respeito de amor e sexo: novas tendências. 2 ed. Rio de Janeiro: Bestseller, 2007.

33 LINS, Regina Navarro. O Livro do Amor. Vol. 1. Rio de Janeiro: Best Seller, 2012.

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com tal prática, ao estabelecer que não há obrigação patrimonial com a concubina. No caso do poliamor, conforme se observará no decorrer do presente trabalho, não se tem a infidelidade, a traição ou semelhante, como ocorre no caso anterior, que são justamente as situações tão rechaçadas pelas pessoas, que provocam a não aceitação do concubinato pela sociedade. No poliamor há a liberdade dos relacionamentos, não há a privação de apenas duas pessoas em uma relação.

Ademais, vale salientar que os juristas defendem a ideia de que o Código Civil, em seus artigos, permite afirmar que o concubinato e a união estável não se confundem, visto que esta é considerado família, pois estão presentes os requisitos da afetividade, ostensibilidade e estabilidade, ademais o artigo 1723 do Código Civil de 200235 estabelece

que a união estável é formada por um homem e mulher que estabelecem uma união pública, duradoura e contínua. Tendo por objetivo a formação de uma família. Diferindo, portanto, do concubinato, no qual não é possível observar tais características, principalmente pelo fato de que neste uma terceira pessoa, alheia ao relacionamento e a família, se envolve na relação do casal sem que o outro cônjuge sequer saiba e aceite.

O Supremo Tribunal Federal também distingue união estável de concubinato, conforme se ver a seguir:

Companheira e concubina – distinção. Sendo o Direito uma verdadeira ciência, impossível é confundir institutos, expressões e vocábulos, sob pena de prevalecer a babel. União estável – proteção do Estado. A proteção do Estado à união estável alcança apenas as situações legítimas e nestas não está incluído o concubinato (...) Percebe-se que houve um envolvimento forte, projetado no tempo – 37 anos –, dele surgindo prole numerosa – nove filhos -, mas que não surte efeitos jurídicos ante a ilegitimidade, ante o fato de haver sido mantido o casamento com quem Valdemar contraíra núpcias e tivera onze filhos (...) No caso, vislumbrou-se união estável, quando, na verdade, verificado simples concubinato, conforme pedagogicamente previsto no artigo 1.727 do Código Civil. (...) O concubinato não se iguala à união estável referida no texto constitucional, no que esta acaba fazendo as vezes, em termos de consequências, do casamento. Tenho como infringido pela Corte de origem o parágrafo 3º do artigo 226 da Constituição Federal, razão pela qual conheço e provejo o recurso para restabelecer o entendimento sufragado pelo Juízo na sentença prolatada”36 (STF, RE 397.762/BA, 1ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 3.6.2008).

Sendo perceptível, portanto, que os dois conceitos não se confundem, sendo essa diferença reconhecida, inclusive, pelo próprio ordenamento jurídico, conferindo, ainda,

35 BRASIL. Lei n° 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, 2002, Planalto. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm> Acessado em: 05 nov 2017.

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proteção a união estável, visto que a mesma é lícita, aceita socialmente e juridicamente. Por sua vez, a união poliafetiva difere dos dois anteriores pelo fato de que não é uma união monogâmica, como a união estável, e difere do concubinato porque neste não há a coexistência pacífica dos participantes. No poliamor é possível que todos os que compõe essa relação saibam da existência dos demais integrantes e aceitem tal relação, todos vivem a experiência de forma igual, o que não acontece no concubinato.

No relacionamento poliamoroso, há a convivência de três ou mais pessoas com o intuito de formar família, sem que exista a exclusividade entre os parceiros, baseando-se em um relacionamento não monogâmico.

Não se devem confundir, ainda, poliamor com poligamia, visto que na poligamia somente um dos integrantes é polígamo. Por sua vez, nas uniões polissubjetivas todos estão em um mesmo nível de igualdade, isto é, todos vivenciam o relacionamento da mesma forma.

Apesar de Regina Beatriz Tavares da Silva37 afirmar que “a expressão poliafeto é

um engodo, um estelionato jurídico, na medida em que, por meio de sua utilização, procura-se validar relacionamentos com formação poligâmica”, a presente monografia discorda, pois, como explicado acima, a união poliafetiva não se confunde com a poligamia, no sentido em que nesta apenas um está na situação de polígamo, isto é, seus integrantes não têm igualdade de posição no relacionamento. Diferentemente daquela, na qual todos estão em mesmo grau, ou seja, todos compartilham da mesma experiência, vivendo a relação da mesma forma e usufruindo-a em igual intensidade.

3.3 A Dignidade da Pessoa Humana como garantia dos Direitos Fundamentais da Família Poliafetiva

A dignidade da pessoa humana hoje é um dos balizadores da legislação brasileira, sendo a mesma garantido pela Constituição Federal, no artigo 1º, III,38 sendo considerado um

princípio fundamental, ou seja, o Estado Brasileiro tem como foco a pessoa humana. Segundo Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino39, tal princípio se fundamenta em duas posições

37SILVA, Regina Beatriz Tavares da. “União Poliafetiva' é um estelionato jurídico. 03 de outubro de 2012. Publicado nos sites www.migalhas.com.br e www.arpensp.com.br. Disponível em: <http://reginabeatriz.com.br/uniao-poliafetiva-e-um-estelionato-juridico-migalhas-e-arpensp/> Acessado em: 16 de novembro de 2017.

38 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:[...] III - a dignidade da pessoa humana;

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jurídicas:

De um lado, apresenta-se como um direito de proteção individual, não só em relação ao Estado, mas, também, frente aos demais indivíduos. De outro, constitui dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes.

Diante disso, é possível perceber que a dignidade humana está ligada não apenas à proteção do indivíduo, mas é, também, um dever do Estado garantir essa proteção e promover a igualdade entre todos, assegurando, assim, que todas as pessoas tenham sua dignidade garantida, independentemente da situação em que se encontrem ou de suas escolhas.

Ainda com base nesse entendimento, José dos Santos Carvalho Filho40 leciona

que a dignidade da pessoa humana é que proporciona a concretização dos direitos fundamentais, além de determinar e humanizar o homem. Dito isto, percebe-se que tal princípio é o responsável por fazer do homem o centro do ordenamento jurídico e o foco da sociedade.

É, ainda, o princípio da dignidade da pessoa humana que fundamenta o Direito de Família, sendo tal explicito no artigo 226, parágrafo 7º da CF41, ao estabelecer que a família é

fundada na dignidade da pessoa humana. Ademais, o parágrafo 8º, do mesmo artigo da CF42,

estabelece que o estado irá assegurar a assistência a cada uma das pessoas que integram a família, inclusive protegendo-as.

Vale ressaltar que a família é onde o ser humano começa a moldar sua personalidade, sua vida, suas aspirações. A família, portanto, tem importância social, jurídica e psicológica, logo, deve receber especial atenção, além de precisar ser protegida, visto seu grau de importância na vida do ser humano e na sociedade.

Deve, portanto, o Estado cuidar e proteger as famílias, a fim de proporcionar a todos um mínimo de dignidade, direitos e deveres garantidos. Em consonância com tal entendimento, Paulo Nader43 afirma:

40 CARVALHO FILHO, José dos Santos. A Dignidade da Pessoa Humana como valor supremo da democracia. Revista de Direito Administrativo. Junho de 1998. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/47169/45637> Acesso em: 22 nov 2017.

41 Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...]§ 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

42 Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...]§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.

43 NADER. Paulo. Curso de Direito Civil – Direito de Família. Vol.5. Rio de Janeiro: Forense. 7ª ed. 2016.

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31

O Estado não apenas possui legitimidade para dispor sobre a instituição familiar, como o dever de zelar por sua organização, a fim de garantir a prática da solidariedade entre os seus membros e a observância de valores básicos ligados à vida, saúde, cultura e educação.

O Estado, como detentor do poder, deve, então, assegurar que todos tenham seus direitos garantidos e respeitados, a fim de que seja possível conferir um mínimo de igualdade entre todos os tipos familiares e a seus integrantes.

Ainda, em relação às entidades familiares, a Constituição Federal de 1988, no artigo 226, delimita três tipos, o casamento, a união estável e entidades monoparentais, entre os quais não deve haver hierarquia ou diferença no tratamento conferidas as mesmas. Por sua vez, com base no princípio do pluralismo das entidades familiares permite que as demais entidades familiares recebam igual tratamento conferido a todos os tipos familiares existentes, não deve.

Com base neste entendimento Fabio Ulhoa44 leciona acerca das entidades

familiares não tratadas na Constituição Federal:

[...] As não constitucionais (fundadas em união livre, de pessoas do mesmo sexo e demais), porém, são igualmente famílias e merecem ser reconhecidas e protegidas como tais pela ordem jurídica. A lei ordinária não está obrigada a tratá-las de forma isonômica, relativamente às constitucionais: essa a única consequência da omissão dos constituintes. Mas em função dos princípios maiores da igualdade e dignidade, a lei também não pode ignorar, desprestigiar ou criminalizar qualquer outra forma de entidade familiar não mencionada pelos constituintes.

Portanto, por mais que a entidade familiar não esteja discriminada no ordenamento jurídico não deve ser deixada ao esquecimento, isto é, não se pode admitir que ela não tenha um mínimo de proteção, mesmo que receba direitos diferentes aos atribuídos às demais, deve-se garantir este mínimo tanto para a família em si quanto para os seus integrantes.

É possível afirmar que a família poliamorosa pode ser considerada, de fato, como família, visto que seus integrantes coexistem e agem objetivando constituir uma família, tendo como base do relacionamento o amor, além de se enquadrarem nos princípios do Direito de Família e, por esse motivo, merece ter seu mínimo de direitos garantidos45, a fim de que seja

concedida alguma proteção aos seus integrantes.

44 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil – Família/Sucessões. vol 5. 5º ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012. PDF. p.276.

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3.4 O amor como garantia da formação das famílias Poliafetivas e a restrição do mesmo pelo direito

A família poliafetiva tem como principal fundamento o afeto, este sendo baseado no amor, um amor que não é egoísta, isto é, que pode ser compartilhado não só com uma pessoa, mas com um conjunto, o que termina por defini-la como uma união formada por mais de três pessoas, que tem o intuito de fazer com que tal união perdure no tempo, tendo como consequência a formação de uma família.

É como base nesse sentimento, o amor, que as famílias vêm sendo formadas hoje, seja a formada por um homem e uma mulher, seja por dois homens ou duas mulheres, seja a formada por dois homens e uma mulher, ou duas mulheres e um homem, e por aí seguem os exemplos, mas sempre tendo como base o amor, que fundamenta e proporciona o desenvolvimento e crescimento de todos dentro do seio familiar,

Sendo, então, o amor a base de tais entidades familiares seria o direito capaz de cercear tais relações, seja por não as enumerar juridicamente, ou por não conferir qualquer proteção, como no caso das famílias poliafetivas? Cabe realmente ao direito se eximir do dever de garantir um mínimo legal às uniões Poliafetivas, ainda que as mesmas existam de fato e venham ganhando espaço, cada vez mais, na sociedade brasileira?

Segundo afirma Paulo Nader46:

A interferência do Estado na organização da família visa, em um primeiro plano, à justiça nas relações interindividuais e, em segundo, à firmeza e à força de suas próprias instituições.

Essa lição confirma o entendimento de que o Estado deve pacificar as relações familiares, a fim de proteger e viabilizar a existência de seus integrantes e da própria entidade na sociedade com um mínimo de igualdade com os demais tipos familiares e com as demais pessoas.

O Código brasileiro em nenhum momento aborda a temática do amor, mantendo-se mantendo-sempre distante da mesma, como mantendo-se houvesmantendo-se uma incompatibilidade entre os dois. O direito tendo como características a previsibilidade e a regularidade, o amor, por sua vez, imprevisível e irregular, tumultuando as relações entre as pessoas. No entanto, este é o que tem movido as relações dos ser humano, não devendo mais ser tratado à parte ou esquecido

46 NADER. Paulo. Curso de Direito Civil – Direito de Família. Vol.5. Rio de Janeiro: Forense. 7ª ed. 2016.

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pelo direito, visto que o direito deve acompanhar as mudanças que ocorrem na sociedade, devendo se moldar e tentar se harmonizar ao lidar com o afeto, com o amor, para que não ocorra o cerceamento das relações por não se compatibilizar o direito e a expressão do amor, do afeto.

Stefanno Rodotá47, ao falar acerca do matrimônio afirma que as cortes e

tribunais o tratam como um fato natural, o qual não seria passível de sofrer mudanças sociais e antropológicas, mas pelo contrário, é uma estrutura que vem passando por mudanças ao longo dos séculos, espelhando a transformação vista, o que tem resultado no surgimento das famílias tratadas no presente trabalho.

Rodotà48 ainda afirma que o Direito por muitas vezes tratou o amor como

irrelevante, o que acarretou tratamento desigual com as mulheres durante muito tempo. Pode-se estender tal entendimento as famílias Poliafetivas, no Pode-sentido em que, ao cercear o amor e não se reconhecer que tal entidade familiar merece ter um mínimo de garantido aos seus integrantes, pois tais famílias não podem viver com a insegurança de não ter nenhum direito que as viabilize em momentos de adversidades, como na divisão da herança quando da morte de um dos integrantes da família, a fim de que os mesmo não fiquem a mercê apenas dos entendimentos dos juristas brasileiros.

Diante do que foi apresentado, percebe-se que o distanciamento existente entre o direito e o amor tem provocado um tratamento desigual para com as famílias poliamorosas, deixando-as a mercê do entendimento do juiz que julgar a causa e da aplicação de leis que as prejudicam.

47FIORI, Simonetta. Entrevista com Stefano Rodotà. “Como é pobre o direito quando não fala de amor.” Revista Instituto Humanitas Unisinos. 23 de novembro de 2015. Disponível em: <http://www.ihu.unisinos.br/549329-qcomo-e-pobre-o-direito-quando-nao-fala-de-amorq-entrevista-com-stefano-rodota> Acesso em: 22 nov 2017.

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4. ANÁLISE DE JURISPRUDÊNCIA SOBRE AS FAMÍLIAS POLIAFETIVAS

Como apresentado ao longo do presente trabalho, as famílias Poliafetivas não possuem qualquer regulamentação no ordenamento jurídico brasileiro, visto que muitos a apontam como uma afronta ao princípio da monogamia. No entanto, Maria Berenice Dias49

esclarece que a monogamia não constitui princípio fundamental da Constituição:

[...] a monogamia não é um princípio, é um norte organizador da sociedade. Até a própria Constituição admite o reconhecimento de filhos fora do casamento. O único problema é que esbarra no reconhecimento de direitos, que a maioria dos estados não reconhece, tem poucas decisões nesse sentido.

Portanto, a monogamia é apenas uma forma de organizar a sociedade, um preceito a ser seguido, mas que pode passar por transformações, visto que a sociedade está em constante evolução e deve o Direito acompanhar tais mudanças a fim de proteger as pessoas e as relações em que as mesmas estão.

4.1. Entendimento dos tribunais acerca das uniões poliafetivas

Em conformidade com o entendimento de que as famílias Poliafetivas merecem ser protegidas e reconhecidas como família o Tribunal de Justiça de Pernambuco assentiu a coexistência de duas uniões estáveis paralelas, conforme se vê no julgado abaixo:

DIREITO DE FAMÍLIA. PRELIMINARES REJEITADAS. UNIÕES ESTÁVEIS PARALELAS. RECONHECIMENTO.

1.Estando demonstrada, no plano dos fatos, a coexistência de duas relações afetivas públicas, duradouras e contínuas, mantidas com a finalidade de constituir família, é devido o seu reconhecimento jurídico à conta de uniões estáveis, sob pena de negar a ambas a proteção do Direito. 2. Ausente os impedimentos elencados no art. 1.521 do Código Civil, a Caracterização da união estável paralela como concubinato somente decorreria da aplicação analógica do art. 1.727 da mesma lei, o que implicaria ofensa ao postulado hermenêutico que veda o emprego da analogia para a restrição de direitos. 3. Os princípios do moderno Direito de Família, alicerçados na Constituição de 1988, consagram uma noção ampliativa e inclusiva da entidade familiar, que se caracteriza, diante do arcabouço normativo constitucional, como o lócus institucional para a concretização de direitos fundamentais. Entendimento do STF na análise das uniões homoafetivas (ADI 4277/DF e ADF 132/RJ).4. Em uma democracia pluralista, o sistema jurídico-positivo deve acolher as multifárias manifestações familiares cultivadas no meio social, abstendo-se de, pela defesa de um conceito restritivo de família, pretender controlar a conduta dos indicíduos no campo afetivo. 5. Precedentes do TJDF e do TJRS. 6.Apelação a que se nega provimento.

Referências

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