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MARCOS SÉRGIO DE SOUZA

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Academic year: 2019

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FINANCIAMENTO INDIRETO DA SEGURIDADE SOCIAL

MESTRADO EM DIREITO

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA

(2)

MARCOS SÉRGIO DE SOUZA

FINANCIAMENTO INDIRETO DA SEGURIDADE SOCIAL

Dissertação apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito Previdenciário, sob orientação do Professor Wagner Balera.

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA

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BANCA EXAMINADORA

_________________________

_________________________

(4)

DEDICATÓRIA,

(5)

AGRADECIMENTOS

(6)

RESUMO

(7)

ABSTRACT

(8)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 1

1 SISTEMA DA SEGURIDADE SOCIAL... 4

1.1 Conceito de seguridade social... 4

1.2 Autonomia da seguridade social ... 14

2 ANÁLISE HISTÓRICA DA SEGURIDADE SOCIAL ... 21

2.1 Evolução histórica da seguridade social ... 21

2.1.1 Idade antiga ... 23

2.1.2 Idade média ... 25

2.1.3 Revolução francesa – assistência pública ... 28

2.1.4 Revolução Industrial – previdência social ... 30

2.1.5 Advento da seguridade social ... 33

2.1.6 Necessidades individuais com complicações sociais ... 38

2.2 Evolução histórica da seguridade social no Brasil... 40

2.2.1 Primeiras legislações brasileiras de seguro social ... 42

2.3 A previdência e o sistema constitucional brasileiro... 45

2.3.1 Constituição da República de 1891 ... 45

2.3.2 Constituição de 1934... 47

2.3.3 Constituição de 1937... 48

2.3.4 Constituição de 1946... 48

2.3.5 Constituição de 1967... 49

2.3.6Emenda Constitucional n. 1/1969 ... 50

2.3.7 Constituição de 1988... 51

3 FUNDAMENTO DE VALIDADE DE UMA ORDEM NORMATIVA.... 57

3.1 A questão do fundamento de validade ... 57

3.2 Validade e eficácia ... 62

3.3 Teoria da norma fundamental e doutrina do direito natural ... 64

(9)

3.5 Lacunas do direito ... 68

4 FINANCIAMENTO INDIRETO DA SEGURIDADE SOCIAL ... 72

4.1 Financiamento indireto da saúde... 90

4.1.1 Retrospecto histórico ... 90

4.1.1.1 Período de 1974 a 1979... 90

4.1.1.2 Período de 1980 a 1986... 93

4.1.1.3 Período de 1987 a 1990... 97

4.1.1.4 Período posterior a 1990 ... 100

4.2 Financiamento indireto da assistência social ... 118

4.2.1 Retrospecto histórico ... 118

4.3 Orçamento público e o financiamento indireto... 130

5 CONCLUSÕES... 147

BIBLIOGRAFIA... 150

ANEXOS... 159

EMENDA CONSTITUCIONAL N. 29, DE 13 DE SETEMBRO DE 2000 ... 159

EMENDA CONSTITUCIONAL N. 31, 14 DE DEZEMBRO DE 2000. 164 RESOLUÇÃO N. 121 DO CONSELHO NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL, DE 1º DE AGOSTO DE 1996... 167

(10)

A proposta deste trabalho é o estudo do financiamento indireto da seguridade social.

A expectativa atual é que os entes políticos, em virtude das exigências previstas na Constituição Federal de 1988, cumpram suas obrigações financeiras para com a seguridade social.

O orçamento da seguridade social compreende todas as entidades e órgãos a ela vinculados, da Administração direta ou indireta, bem como os fundos e fundações mantidos pelo Poder Público.

O artigo 195 da Constituição Federal estabelece que seguridade social deva ser financiada por toda sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

O constituinte não fixou o percentual com o qual cada ente federativo

deve contribuir matéria que depende de definição legal. Não há, assim, a

garantia de um percentual fixo das receitas a ser destinado ao financiamento

da seguridade social.

Inicialmente, a Lei de Diretrizes Orçamentárias fixa as metas e

(11)

estabelece a parcela do orçamento público destinada ao cumprimento dessa

finalidade.

É certo que certa parcela do orçamento deve ser consignada à seguridade, mas não se sabe bem qual é o percentual correspondente a essa parcela, mas somente que deve ser definida pelo orçamento de cada pessoa política, o que efetivamente não está ocorrendo.

O objetivo principal da desvinculação entre o orçamento fiscal e o orçamento da seguridade social é a garantia de que os recursos orçados para os órgãos ou entidades que atuam nesse segmento não sejam destinados para outros fins, sob pena de responsabilidade.

Já se percebe que neste trabalho será adotado o posicionamento de cobrar dos entes federativos a obrigação em relação ao financiamento indireto da seguridade social.

O Capítulo II da Constituição trata da seguridade social em seu artigo 194, que assim disciplina:

“A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinados a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.”

(12)

situação que somente será revertida se for implementado o processo de planejamento.

O trabalho é constituído de introdução ao tema e cinco capítulos. A introdução define o problema, os objetivos do trabalho, bem como as hipóteses que norteiam a questão social e delimitam a estrutura e o campo de estudo.

No primeiro capítulo, estudaremos o conceito do sistema de seguridade social, seus princípios e características voltadas ao aspecto do seu financiamento.

No segundo, abordaremos a evolução histórica da seguridade social, as primeiras legislações, bem como sua presença nas Constituições do Brasil.

No terceiro capítulo, definiremos a Teoria da Norma Jurídica, a questão de sua validade e eficácia a sua proposição prescritiva.

No quarto, conceituaremos o financiamento indireto da seguridade social e seus objetivos. Enfatizando a emenda Constitucional n. 29/00, demonstrando a inovação da vinculação das verbas orçamentárias na área da saúde , estudaremos o aspecto do orçamento público, caracterizá-lo como um sistema de informações, seus princípios e suas contribuições, apresentaremos um modelo conceitual de orçamento público e sua aplicação em os futuros governos, como uma solução para o conflito existente em relação ao financiamento indireto.

(13)

1.1 Conceito de seguridade social

Antes de analisar o problema do financiamento da seguridade social, é necessário entender o sistema como um todo, penetrar no contexto da seguridade social, descrevendo seu regime jurídico, que é peculiar.

A sua definição está na Lei de Organização e Custeio da seguridade social (Lei n. 8.212/91), que assim qualificou o sistema:

“Artigo 1º - A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade destinadas a assegurar o direito relativo à saúde, à previdência social e à assistência social.”

Nesse sentido, Wagner Balera adverte que:

“A integração das áreas que, dentro e fora do aparelho governamental, recebem a incumbência de satisfazer certos direitos sociais implica a racionalização da atividade administrativa, permitindo, destarte, melhor aproveitamento das particulares formas de proteção pelos usuários.”1

A seguridade social consubstancia-se em matéria estritamente complexa, situada na área das ciências humanas, a envolver relação entre o homem, a sociedade e fatores diversos, individuais, coletivos, sociais, econômicos, políticos e ordenamento jurídico vigentes, entre outros.

Celso Barroso Leite associa a seguridade à idéia de tranqüilidade que a sociedade deve garantir aos seus membros e também que:

(14)

“A seguridade social deve ser entendida e conceituada como o conjunto de medidas com as quais o Estado, agente da sociedade, procura atender à necessidade que o ser humano tem de segurança na adversidade, de tranqüilidade quanto ao dia de amanhã.”2

Ilídio das Neves em uma excelente observação exprime a missão fundamental da seguridade social:

“É assegurar de forma organizada a proteção dos cidadãos contra determinados riscos da existência, pois se considera que os seus efeitos danosos não interessam apenas individualmente às pessoas, mas também à sociedade no seu todo.”3

Por sua vez, Wagner Balera, com base na Constituição Federal brasileira, conceitua seguridade social como o “conjunto de medidas constitucionais de proteção dos direitos individuais e coletivos, concernentes à saúde, à previdência e à assistência social”.4

José Manuel Almansa Pastor define seguridade social como sendo:

“El instrumento estatal específico protector de necessidades sociales, individuales y colectivas, a cuya protección preventiva, reparadora y recuperadora tienen derecho los individuos, en la extensión, limites y condiciones que las normas dispongan, segun permite su organización financiera.”5

Portanto, a finalidade específica da seguridade social é a libertação do homem da indigência e da miséria, objetivo concretizado pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas de 10 de dezembro de 1948.

2 Celso Barroso Leite, Conceito de seguridade social, p. 17. 3 Ilídio das Neves, Direito da segurança social..., p. 19.

(15)

As finalidades da seguridade social foram enumeradas pela Organização Internacional do Trabalho no final da década de 1950, e são as seguintes:

“a) cobrir de maneira completa e coordenada todas as eventualidades capazes de levar o trabalhador, sem culpa sua, a perder o salário, temporária ou definitivamente, completando essa proteção pela assistência médica e pelos abonos familiares;

b) estender a proteção a todas as pessoas adultas, na medida de sua necessidade, e aos seus dependentes;

c) prover prestações que, embora de montante moderado, permitam aos beneficiários manter nível de vida aceitável, e que sejam outorgadas em virtude de um direito nitidamente definido em lei;

d) financiar o sistema por métodos tais que tornem o beneficiário suficientemente consciente do custo das prestações que recebe, aplicando amplamente o princípio da solidariedade entre os pobres e ricos, entre pessoas que gozam saúde e aqueles de saúde abalada, entre homens e mulheres, entre pessoas em atividade e os velhos demais ou jovens demais para trabalhar.”6

Essas finalidades formam, segundo José do Reis Feijó Coimbra7, a concepção da função do Estado, assim desenhada de forma a abrir espaço para intervir na economia, no sentido de ser responsável pela proteção dos membros da coletividade atingidos por contingências que eliminam ou diminuem sua capacidade de auto-sustentação. Se essas contingências têm repercussão social e causam necessidades, e se o futuro amedronta a todos que dependem do próprio trabalho para sobreviver, o Estado, como principal artífice do bem-estar e da justiça sociais, tem responsabilidade pela proteção, em face dessas ocorrências.

Como resultado, receptiva se torna a consciência da coletividade à idéia de que o bem comum é o fim do Estado, cabendo a este disciplinar os interesses individuais, conciliando-os com os da sociedade. Nesse sentido, a

6 Celso Barroso Leite e Luiz Paranhos Velloso anotam que a tradução para o vernáculo desses

objetivos foi publicada na Revista dos Industriários, n. 70, ago. 1959 (Previdência social, p. 76).

(16)

ação dos governos já não se limitaria, portanto, à garantia dos direitos civis e políticos, à ordem interna e defesa do país na esfera internacional, devendo voltar-se para a proteção de outros direitos, denominados então de sociais e econômicos.

Para Wagner Balera, tendem ao “objetivo último da justiça social todas as políticas sociais que, com instrumental da seguridade social, o Estado e a sociedade implementarão, em obediência aos comandos do Estatuto Fundamental”.8

Analisando a Carta Magna e os ensinamentos aqui discutidos, somos levados a concluir acerca da existência de um regime jurídico típico e que as normas jurídicas que tratam da seguridade social são unidas pela finalidade de seu objeto, a razão de existir do próprio sistema protetivo, e então tanto a proteção quanto o custeio devem estar sob a égide do princípio da contrapartida.

Esse preceito constitucional previsto no parágrafo 5º do artigo 195 da Constituição Federal de 1988, é a pedra de toque de todo o conjunto de normas constitucionais relacionadas ao financiamento. O dispositivo citado revela a existência de um regime jurídico específico para a seguridade social e, nessa condição, não pode ser desintegrado ou recortado pelos que tratam das prestações, por um lado, e pelos que tratam do custeio, de outro lado, uma vez que não é possível compreender o que será necessário para o custeio de um conjunto de prestações se não soubermos o quanto será gasto.

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Muito menos será possível defender a extensão subjetiva ou objetiva de prestações se não tivermos a noção do caixa e dos recursos que para ali devem ser destinados.

A Organização Internacional do Trabalho definiu nos seguintes termos os objetivos da seguridade social:

“39 - No nosso entender, a seguridade social tem objetivos mais amplos que prevenir ou aliviar a pobreza. Ela constitui resposta a uma aspiração de segurança no sentido mais abrangente. Seu propósito fundamental é dar aos indivíduos e às famílias a tranqüilidade de saber que o nível e a qualidade de sua vida não serão significativamente diminuídos, até onde for possível evitá-lo, por nenhuma circunstância econômica ou social. Para isso é preciso não só atender às necessidades, à medida que surjam, mas também começar por prevenir os riscos e, ao mesmo tempo, ajudar os indivíduos e as famílias a se adaptarem da melhor maneira a qualquer incapacidade ou situação desfavorável não evitada ou que não teria sido possível evitar. Por isso, a seguridade social não depende apenas de dinheiro, mas também de extensa gama de serviços sociais e de saúde(...). O que verdadeiramente importa é permitir a segurança, e não os procedimentos que venham a ser escolhidos para esse efeito: custeio mediante contribuições ou impostos, benefícios ou serviços e entidades públicas ou privadas e de fins lucrativos ou não. Considerações de eficiência econômica e de participação, a tradição nacional, o maior ou menor grau de aceitação pelos usuários e a existência de determinadas instituições podem fazer com que em determinado país algumas modalidades sejam mais indicadas que outras. Mas não devemos confundir os meios com os fins.”9

Importante refletir que o sistema social é constituído por toda a sociedade brasileira, com destaque para a classe trabalhadora e os aposentados e pensionistas, e que se busca uma forma de financiamento eficaz visando garantir os direitos da seguridade social.

Nos dias atuais, são as reformas sociais de base o instrumento maior de que dispõe a sociedade brasileira para se libertar do Estado opressor,

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cujos efeitos incidem sobre os trabalhadores e os aposentados e pensionistas do sistema previdenciário.

É necessária uma maior participação da comunidade nos seus destinos, o que implica, conseqüentemente, em acesso a mais direitos e aumento da cidadania.

O país atualmente suporta um ônus de aproximadamente 5.600 sistemas previdenciários diferentes. Senão, vejamos:

• Regime Geral de Previdência Social (RGPS), mantido pelo INSS para os trabalhadores em geral (um único regime); • Previdência do servidor da União (um único regime);

• Previdência dos servidores de cada Estado, com normas diferenciadas (27 Estados);

• Previdência dos Municípios, que têm autonomia para legislar sobre sua própria previdência (± 5.560 municípios); • Previdência dos militares (um único regime).

Leny Xavier de Brito e Souza, analisando o tema, esclarece que:

“São previdências demais para um só país. Com essa implantação indiscriminada de sistemas sem um estudo atuarial sério de sua viabilidade, no momento de ‘pagar a conta’, ou seja, de manter benefício prometido, a entidade, não conseguindo honrar esse compromisso, corre a solicitar ‘repasse’ da União. Se a União não ajudar, esses diversos sistemas não terão arrecadação suficiente para manter suas aposentadorias e pensões.”10

Não podemos aceitar essa situação, precisamos recuperar a seguridade social como instrumental moderno e condizente com a realidade

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socioeconômica brasileira, dela extirpando essa visão falaciosa da previdência pública, difundida pelas classes dominantes, mediante um processo gradual de aperfeiçoamento das instituições jurídico-políticas do Estado contemporâneo, em prol das maiorias.

Necessitamos não só de uma técnica de controle social, mas também de critérios de justiça e de utilidade das normas jurídicas para sociedade como um todo.

O Estado, por meio de seus poderes constituídos, na qualidade de representantes autênticos de toda sociedade, de auxiliares eficazes e eficientes na execução das normas produzidas e de intérpretes e aplicadores das normas respectivamente, não deve preocupar-se apenas com a execução das normas produzidas, mas também, e com igual atuação, empenhar-se na produção de direitos fora do quadro institucional (democracia participativa).

A Federação não pode continuar a gerir um sistema desproporcional e irracional como o modelo atual, no qual o pagamento dos benefícios é custeado pelos seus orçamentos, pois hoje muitos Municípios deixam de aplicar em saúde e educação para pagar seus pensionistas.

Mesmo com o advento da Lei Complementar n. 101/2001 (Lei de Responsabilidade Fiscal), muitos Municípios continuam gastando valores elevados para pagar seus aposentados, além de não cumprirem sua parte no financiamento indireto estipulado pelo artigo 195 da Constituição Federal.

(20)

instituições jurídico-políticas, colocando o planejamento orçamentário no seu devido lugar.

O primeiro passo já foi dado para alterar o sistema atual. É óbvio que essas alterações deverão ocorrer de forma gradativa, a exemplo da Emenda Constitucional n. 20, de 15.12.1998, que representou enorme avanço, separando os trabalhadores em dois grupos: “1º grupo: contribuintes do regime geral (INSS); 2º grupo: todos os outros servidores, que a partir de agora, terão de seguir as mesmas normas para chegar à aposentadoria.”11

As alterações mais polêmicas foram as seguintes:

• a entidade que não puder manter por sua própria responsabilidade, um regime saudável para seus servidores, deve vinculá-los ao regime geral;

• se quiser manter regime próprio, terá de instituir paralelamente um plano de previdência complementar, para o qual o servidor contribuirá com uma parte, e a instituição com uma parte igual;

• servidor, para conquistar sua aposentadoria, terá de comprovar 10 anos de serviço público, 5 anos no cargo, ter idade mínima e cumprir “pedágio”.

A Portaria n. 4.882 do Ministério da Previdência Social, de 16 de dezembro de 1998, esclarece no seu artigo 2º que:

(21)

“Os regimes próprios de previdência social dos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios deverão ser organizados com base em normas gerais de contabilidade e atuarial, de modo a garantir o seu equilíbrio financeiro e atuarial, nos termos da Lei n. 9717, de 28 de novembro de 1998.”12

Conforme o artigo supra, houve mudança no sistema de previdência do servidor, que não poderá mais deixar a garantia de sua futura aposentadoria em mãos do Estado, sem sua supervisão. E a própria entidade governamental já está se posicionando para que haja total transparência na gestão do valor descontado dos servidores, a título de benefício futuro.

Importante destacar ainda que o sistema de seguridade social visa os direitos sociais, quer positivados pelo legislador pátrio, quer ainda provenientes do direito informal, que criaram uma consciência jurídica resultante das necessidades sociais.

O sistema busca o direito justo, embasado em valores socioculturais, visando o bem-estar da sociedade.

Aldemir de Oliveira, a propósito, lembra que:

“A aplicação da hermenêutica sobre a seguridade social não deve ficar adstrita tão-somente à interpretação positivista das normas jurídicas; deverá aprofundar sua exegética de forma mais exaustiva e ampla, sempre mais favorável aos segurados do sistema de seguridade social, tendo como princípio fundamental o pleno exercício da cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho.”13

12 Em sua justificativa, o Ministro Waldeck Ornélas esclarece que se baseou no direito brasileiro

constitucional e infraconstitucional, tendo em vista as decisões do Supremo Tribunal Federal (REsp n. 1.265/AM, RE n. 114.352/ES, ADIn ns. 152/MG e 122/SC, entre outras) e ainda o disposto na Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998.

(22)

Para operacionalizar a problemática do sistema da seguridade social no Estado contemporâneo brasileiro, devemos estudá-la através de três planos, como instrumento de uma ação prática:

no plano epistemológico, em que cabe a análise axiológica

(valores sociais e psicossociais), “o direito que é” (direito justo);

no plano psicossocial, em que não podemos verificar apenas

a existência de representações jurídicas, mas de outras manifestações da consciência jurídica da sociedade provenientes dos movimentos sociais (novos sujeitos de direito);

no plano operacional, em que se montam as estratégias para

modificar ou afastar “o direito que não deve ser” (injusto) e criar o direito “que deve ser” (justo).

A justiça social, por sua vez, é a materialização dos desejos e aspirações das classes trabalhadoras, dos aposentados e dos pensionistas, ou seja, a concretização do projeto popular.

A justiça política é o instrumento fundamental do Estado para partilhar os bens construídos pela cooperação social, com o intuito de erradicar o profundo dualismo social em que vive a sociedade brasileira.

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Esse Estado tem como princípio basilar erradicar a pobreza e a marginalização, reduzindo as desigualdades sociais e regionais, como instrumentais jurídico-políticos de eficácia plena.

Essa base sócio-constitucional, portanto, deve ser construída por toda sociedade brasileira, possibilitando a criação de novos paradigmas para a seguridade social, com a participação das classes trabalhadoras e dos aposentados e pensionistas como participantes e agentes dessa transformação, no processo da partilha social das riquezas produzidas.14

É certo que devemos buscar um sistema protetor mais eficaz, com medidas mais efetivas de assistência e previdência social, ampliando o alcance e a abrangência do amparo ao homem.

Em síntese, esse sistema protetor só se completará quando o Estado cumprir sua parcela de financiamento de forma eficaz, separando em cada orçamento a parte que cabe à seguridade social, cumprindo a norma constitucional de financiamento indireto.

1.2 Autonomia da seguridade social

Segundo a teoria monista, o sistema de seguridade social pertence ao direito do trabalho, sendo seu mero apêndice. Já para a teoria dualista, o direito da seguridade social possui autonomia, não se confundindo com o direito do trabalho.15

14 Aldemir de Oliveira, A previdência social na carta magna, cit., p. 24.

15 Marcus Orione Gonçalves Correia; Érica Paula Barcha Correia, Curso de direito da seguridade

(24)

A Constituição de 1988 estabeleceu que a seguridade social é gênero, abrangendo a previdência social (arts. 200 e 201), a assistência social (arts. 203 e 204) e a saúde (arts. 196 a 199), o que a torna totalmente desvinculada do direito do trabalho, que teve suas regras incluídas no artigo 7º do Capítulo II (Dos direitos sociais) do Título II (Dos direitos e garantias fundamentais).

A seguridade social possui várias regras próprias, como as Leis ns. 8.212/91 (Plano de Custeio), 8.213/91 (Plano de Beneficio), 8.742/92 (Assistência Social) e 8.080/90 (Saúde).16

Esse sistema tem função de estabelecer os mecanismos jurídicos de vinculação de indivíduos à seguridade social, desenhar as prestações (em dinheiro ou em serviços) oferecidas e as condições para o acesso às mesmas, além de fixar as formas de financiamento do sistema protetivo.

No Diploma Maior, o artigo 193 foi instituído para inaugurar o regime jurídico da seguridade social e funcionar como uma verdadeira chave interpretativa de todo o sistema.17

Vários conceitos utilizados pela seguridade social não são encontrados em outros ramos do direito, como o de segurado, salário de benefício, salário de contribuição, auxílio-doença, renda mensal inicial etc.

Observa-se também que a seguridade social possui princípios próprios18, elencados nos incisos I a VII do parágrafo único do artigo 194 da Constituição.

16 Aristeu de Oliveira, Previdência social – Legislação, p. 33, 63, 278 e 302. 17 Wagner Balera, A seguridade social na Constituição de 1988, p. 32.

18 Wagner Balera esclarece que esses princípios são a base e a estrutura do sistema previdenciário

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Destaca-se primeiramente o princípio da universalidade, que abrange a cobertura e o atendimento de toda a população brasileira, indistintamente. Nesse plano, brasileiros e estrangeiros aqui residentes devem ser amparados pelo sistema de seguridade social.

O segundo princípio constitucional tem como objetivos a uniformidade e a equivalência dos benefícios e dos serviços prestados às populações urbanas e rurícolas.

Essa característica de uniformidade do sistema de seguridade social é fundamental, porque cumpre a disposição constitucional de igualdade de todos perante a lei, estabelecida no artigo 5º da Constituição Federal.

O terceiro princípio constitucional tem como objetivos a seletividade e a distributividade na prestação dos benefícios e serviços, o que requer do plano básico previdenciário benefícios que, além de serem suficientes para atender às reais necessidades dos indivíduos, também sejam compatíveis com a economia nacional e a redistribuição de rendas.

Esses critérios devem obedecer a uma escala salarial, conforme o padrão social em que estão enquadrados os segurados do sistema previdenciário. A finalidade objetiva outra diretriz constitucional, contida no artigo 201, II da Carta de 1988.

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O quinto princípio constitucional é a equidade na forma de participação no custeio da seguridade social. Toda a sociedade deve participar de forma direta ou indireta do financiamento do sistema nacional de seguridade social.

O sexto princípio tem por objetivo a diversidade da base de financiamento da seguridade social. O legislador objetivou que o financiamento tivesse como base de cálculo múltiplos fatos geradores (trata-se do denominado “pluralismo contributivo”) e fontes de recursos provindas de todo a sociedade brasileira.

A Lei Orgânica da Seguridade Social (Lei n. 8.212, de 24.7.1991), que instituiu o plano de custeio, estabelece que, no âmbito da Federação, o orçamento nacional será composto das receitas da União, das contribuições sociais e de outras fontes. As contribuições sociais deverão ser provenientes dos participantes diretos do sistema previdenciário nacional (empregadores, trabalhadores, autônomos e facultativos).

Enfatizamos que a contribuição do Estado é proveniente, de forma indireta, do orçamento fiscal, devendo ser fixado obrigatoriamente na lei orçamentária anual o destino das verbas arrecadadas para tal finalidade, o que de fato não está ocorrendo.

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O Estado deverá ainda arrecadar recursos para o sistema da seguridade social pela denominadas cotas de previdência sobre receitas líquidas dos concursos de prognósticos em todo território nacional. Ademais, poderão integrar esses recursos as multas de serviços de arrecadação e fiscalização, da prestação de outros serviços e do fornecimento ou arrendamento de bens provindos de patrimônio industriais e financeiros, oriundos de doações, legados, subvenções ou receitas provenientes de culturas ilegais (psicotrópicos) e outros, determinados em lei.

O sétimo princípio é considerado uma das maiores conquistas da sociedade brasileira, especialmente das denominadas “classes sociais”, e se trata da presença de representantes diretos da sociedade civil como participantes efetivos na direção e controle do sistema nacional de seguridade social.

Observa-se que ficou assegurada constitucionalmente a participação popular nas direções políticas dos colegiados de todos os sistemas da seguridade social (saúde, previdência e assistência social), em conjunto com os órgãos públicos, em substituição ao tradicional sistema representativo, podendo-se dizer que se iniciou uma nova práxis da democracia participativa, conforme amparo previsto no artigo 10, caput da Constituição de 1988.

(28)

possível proporcionar benefícios e serviços sem a provisão de recursos econômicos para sua efetivação.”19

Esse princípio, imerso no subsistema de seguridade social, entrelaça inafastavelmente as prestações ao custeio, e se encontra positivado no artigo 195, parágrafo 5º da Constituição Federal de 1988, que prescreve: “Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.”

A regra da contrapartida pode ser observada por dois ângulos

distintos. De um lado, materializa-se na noção de dever de equilíbrio do orçamento da seguridade social.

Ninguém pode supor que o ordenamento jurídico autorize o descompasso entre metas a serem atingidas e recursos disponíveis, como

ensina Wagner Balera:

“É que, se o esquema engendrado pelo parágrafo 5º do artigo 195 da Constituição não admite a criação de nenhum benefício sem a correspondente fonte de custeio total, por simples aplicação do modus tollens deve carregar consigo a conseqüência natural de que, posta a fonte de custeio, já está criado o benefício.

(...)

Atentando para a construção lógica do chamado modus tollens percebe-se que, dado um condicional (se p então q), a negação do conseqüente (q) leva a negar também o antecedente. A regra da contrapartida ajusta-se a esse esquema lógico condição sem a qual o sistema não pode funcionar com equilíbrio.”20

O cumprimento desse princípio é essencial para a promoção do equilíbrio do sistema de seguridade social, e assim o legislador só poderá criar

(29)

novas prestações de seguridade, aumentar o valor das já existentes ou ampliar

o espectro da universalidade subjetiva se houver expressa previsão em lei de fontes de custeio para tais prestações.

Esses princípios devem ser levados à exaustão pelo Estado (sociedade brasileira), através de seus agentes políticos da Administração

direta, também denominados “poderes constituídos”.

A seguridade social tem instituto próprio, ou seja, o Instituto Nacional do Seguro Social e o Conselho Nacional de Seguridade Social.

O artigo 22, inciso XXIII da Constituição Federal dispõe que compete privativamente à União legislar sobre seguridade social. Isso indica que a seguridade social não é parte do direito do trabalho, pois do contrário o legislador constituinte diria que a União iria legislar apenas sobre direito do trabalho, e não sobre seguridade social.

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2.1 Evolução histórica da seguridade social

A análise histórica é para o nosso trabalho fundamental, dado que as idéias e as posições doutrinárias base, num determinado momento, são, até certo ponto, ou mesmo em grande parte, o resultado da evolução do pensamento e da ação dos homens, das sociedades e dos Estados.

A origem das primeiras formas de proteção social confunde-se com a própria existência do homem e de sua organização em família e sociedade21. Isso porque, nos momentos de dificuldade, é da natureza humana a necessidade de ajuda de seus pares. Nesse sentido, o homem precisa de amparo na infância e na velhice e de ajuda médica na doença. Ele precisa de ajuda financeira no desemprego, quando os encargos da família excedem os meios para sustentá-la, e assim por diante.

As características atuais dos sistemas de segurança social e dos respectivos ordenamentos jurídicos refletem sempre, em maior ou menor escala, um processo evolutivo, um movimento dinâmico feito de mudanças, de recuos e de progressos, em suma, das interações verificadas no decurso do tempo.22

Segundo Ilídio das Neves:

“(...) análise histórica revela-se, no entanto, particularmente significativa num domínio como o do sistema e do direito da segurança social, não só por serem realidades relativamente recentes na Europa, onde surgiram há pouco

(31)

mais de 110 anos, mas também porque no atual debate acerca da sua crise e da necessidade de uma reforma, algumas propostas de reforço da intervenção de modalidades privadas, baseadas em seguros coletivos e em fundos de pensões geridos em capitalização, vêm, no fundo, a levantar a questão do reordenamento interno dos sistemas através de uma ponderação crítica daquela evolução, dos momentos mais significativos das mudanças verificadas e dos pressupostos técnicos e doutrinários em que se basearam as decisões tomadas.”23

O trabalho é a origem do sustento do homem. Segundo a Bíblia

Sagrada, no início da criação, disse Deus: “Do suor do teu rosto comerás o teu pão, até que tornes à terra, porque dela foste tomado; pois é pó e ao pó tornarás”.24

Portanto, o sustento da família depende necessariamente do

trabalho e o protótipo de qualquer forma de seguridade social representa a solidariedade das gerações, a responsabilidade do chefe em relação ao grupo, a generalização da responsabilidade e a atividade de previsão.

No entanto, a capacidade da família, tanto econômica como

técnica, na luta contra o infortúnio, é limitada. Se não houver um médico na família, a pessoa adoentada ficará sem amparo. Ou então, caso o chefe da família perca o emprego, e nenhum outro membro estiver trabalhando, toda a

família ficará inevitavelmente em dificuldade.

O homem procurou, desde o passado mais remoto, associar-se com seus semelhantes, formando grupos cada vez maiores e organizados, para

superar os efeitos de necessidades e adversidades que o desequilibrassem moral e financeiramente. Com o decorrer do tempo, essa associação, que era

(32)

livre e calcada apenas no hábito e na solidariedade voluntária das pessoas,

passou a ser exigida por força de lei.

A evolução dos sistemas de proteção, até a seguridade social, é a

história da transferência gradual da responsabilidade, das pessoas para grupos mais organizados e economicamente mais fortes, até se chegar ao Estado. É a

história ainda da ampliação dos riscos e necessidades de serem compreendidos.

Celso Barroso Leite e Luiz Paranhos Velloso anotam que o Estado:

“(...) trouxe para sua órbita o esforço coletivo que já se vinha empreendendo mediante o mutualismo, e assim surgiu o seguro social. Paralelamente, assumiu o estado o encargo de prestar, no todo ou em parte, em amplitude variável de país para país, pelo menos algumas formas de assistência a que a solidariedade de grupos ou simples espírito caritativo tinham dado origem desde tempos imemoriais; e dessa maneira surgiu a assistência pública, ou assistência social.”25

2.1.1 Idade antiga

Aguinaldo Simões revela que as notícias mais remotas de comportamento humano preocupado com o bem-estar das pessoas advêm de obras religiosas e literárias. Essa preocupação estaria presente na antiga China, por meio dos ensinamentos de Confúcio; na antiga Índia, onde se ligam a ela preceitos de budismo e fórmulas para se “curar doentes”; e entre os hebreus dos tempos bíblicos.26

25 Celso Barroso Leite; Luiz Assumpção Paranhos Velloso, Previdência social, p. 31.

(33)

José do Reis Feijó Coimbra anota que:

“Como lembra Oscar Saraiva, as primeiras manifestações de proteção social se assinalam em épocas recuadas, pois em Teofrasto (228 a.C.), encontra-se referência à associação existente na Helade, cujos membros contribuíam para um fundo, à conta do qual era prestado socorro aos contribuintes que viessem a ser atingidos por adversidades.”27

Em Roma, existiram associações de finalidades similares, dedicadas à proteção de seus membros, como indica Jefferson Daiber, ao lado das instituições de caridade (Cód. Teodósio – 1.15.17.19 e 22 – De Sacros Eccles).28

Mozart Victor Russomano complementa essas informações considerando “razoável admitir-se que os agrupamentos profissionais da Índia, dos hebreus e dos árias (indicados no Hamurabi) tivessem finalidades assistenciais, ao lado da defesa dos interesses de seus integrantes”29. Essas finalidades também existiam nas organizações profissionais dos pastores, agricultores, barqueiros e soldados do antigo Egito.

Os gregos antigos, assim como os demais povos da época, viviam sob a disciplina e o amparo da família, e esta sob a proteção de sua religião e dos seus deuses domésticos, não se conhecendo naqueles remotos tempos exemplo de assistência, e menos ainda de previdência fora das primeiras organizações de trabalhadores na Grécia30, os “eranol”, quando apareceram algumas normas de caráter assistencial e até mesmo um embrião de socorro mútuo.

27 José dos Reis Feijó Coimbra, Direito previdenciário brasileiro, p. 2.

28 Jefferson Daibert, Direito previdênciário e acidentário do trabalhador urbano, Rio de Janeiro:

Forense, 1978, apud José dos Reis Feijó Coimbra, Direito previdenciário brasileiro, p. 2.

(34)

Para José Manuel Almansa Pastor, as associações na Antigüidade romana já tinham clara finalidade mutualista porque a sua constituição exigia a união de pelo menos três indivíduos que se comprometiam a contribuir periodicamente para a formação de um fundo comum destinado especialmente à cobertura dos gastos com doença e morte.31

A exigência de contribuição periódica dos indivíduos levou Mozart Victor Russomano também a destacar o caráter mutualista das associações da antiga Roma.32

Anníbal Fernandes entende que mutualismo é a “forma de associação baseado no princípio da reciprocidade de direitos e obrigações entre os participantes”33. Ele se destina à proteção contra riscos, hoje melhor designados como contingências sociais. O nascimento do mutualismo propriamente dito será discutido no próximo item.

2.1.2 Idade média

A derrocada do Império Romano do Ocidente deu lugar aos reinos bárbaros e ao feudalismo, mas a evolução sócio-econômica também propiciou, no século X, o ressurgimento das trocas comerciais e o incremento das concentrações urbanas, mesmo nas regiões em que a vida rural era anteriormente dominante.

Nas novas cidades, a vida urbana levou o trabalho a outras formas de cooperação e organização. Os artesãos associaram-se em guildas e

31 José Manuel Almansa Pastor, Derecho de la seguridad social, p. 85. 32 Mozart Victor Russomano, Curso de previdência social, p. 4.

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corporações de ofícios. As guildas eram associações de proteção mútua que ampliaram o círculo de atuação dos artesãos, regulamentando e elevando o seu trabalho ao nível de verdadeiras corporações profissionais. Influenciadas pelos princípios cristãos da caridade e fraternidade, as guildas estimulavam a solidariedade de seus membros, vinculando-se por laços de fraternidade e assistência.

Diversas outras organizações foram criadas nos moldes das guildas. Esclareça-se que o advento do cristianismo seguramente influenciou o espírito da seguridade social, na medida em que suscitava a caridade, a fraternidade e a solidariedade das pessoas, valores que passaram a ser grandes norteadores da conduta humana.34

As corporações da Idade Média estavam estruturadas para proteção de seus membros, pertencentes a uma determinada categoria e localidade, das contingências sociais, tarefas hoje atribuídas ao Estado, tais como a assistência médica e o auxílio-funeral. Elas não recebiam recursos do Estado e nem tinham o caráter de compulsoriedade do seguro social moderno, estando calcadas em um modelo que se denominou mutualismo.35

No século XIV, surgiu o seguro do transporte marítimo, destinado a indenizar o navegador das perdas eventualmente sofridas nas viagens empreendidas.

34 Aguinaldo Simões, Princípios de segurança social; previdência social e assistência, p. 72-73. 35 Segundo a doutrina pátria, o marco inicial da seguridade social é a legislação que consagrou pela

primeira vez o direito subjetivo à proteção social, a Lei dos Pobres da Inglaterra. (Wagner Balera,

A seguridade social na constituição de 1988; Celso Barroso Leite e Luiz Paranhos Velloso,

(36)

Em 1601, foi instituída na Inglaterra a Lei dos Pobres, que conferia a prestação de auxílio às pessoas comprovadamente necessitadas. Essa Lei de 19 de dezembro de 1601, da Rainha Isabel I, criou contribuições compulsórias, denominadas poor taxes, como fonte de custeio, que vigeram por aproximadamente um século e meio.36

José dos Reis Feijó Coimbra esclarece que as formas de proteção do trabalhador na Idade Média jamais lograram moldar um sistema apoiado na solidariedade de toda uma categoria da população ou profissão.37

Os cidadãos ainda não tinham consciência de que um eficiente e funcional sistema de proteção assistencial deveria se calcar em normas jurídicas, a consagrar um direito individual contra o Estado. Até porque o sistema jurídico vigente permitia ao Estado limitar sua condição de obrigado, tanto do valor da obrigação, quanto da eleição do próprio credor38. Esse sistema vigorou até a eclosão do liberalismo e da Revolução Francesa.

Há que se citar, também, como instituição que trouxe subsídios à evolução histórica, mais especificamente da previdência social, a caixa econômica, que substituiu os “pés-de-meia” de pequenas economias em depósitos individuais, com a permissão de retiradas mensais.39

36 Marcos Orione Gonçalves Correia; Érica Paula Barcha Correia, Curso de direito da seguridade

social, p. 2.

37 José dos Reis Feijó Coimbra, Direito previdenciário brasileiro, p. 5. 38 Ibdem, mesma página.

(37)

A primeira caixa econômica foi organizada em Hamburgo, na Alemanha, em 1778, sendo posteriormente instituída na Inglaterra e nos Estados Unidos, em 1816.40

Entretanto, mesmo anteriormente aos fatos já expostos, a maior contribuição à matéria foi dada pelo seguro privado, fonte inspiradora do seguro social. Ressalta-se que o seguro privado a prêmio, como contrato aleatório, ficou bem caracterizado a partir do século XII. Da França, recebeu o seguro embasamento jurídico próprio e, da Inglaterra, a estrutura matemática, que se preocupou com a elaboração de estatísticas, tábuas biométricas, cálculo das probabilidades, compensação e pulverização dos riscos, e outras técnicas peculiares à ciência atuarial. Assim, estavam criadas as condições técnicas indispensáveis ao aparecimento do seguro social.41

2.1.3 Revolução francesa – assistência pública

A eclosão da Revolução Francesa e o advento da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, elaborada pela Assembléia Constituinte da França em 27 de agosto de 1789, imprimiram um novo rumo às formas de proteção social.

As corporações de ofício foram extintas, porém, no que concerne à assistência social, elas já haviam sido substituídas pelas sociedades mútuas, a partir da segunda metade do século XVIII.

40 João Gualberto de Oliveira, Caixas econômicas: economia e história, p. 17.

41 Marcus Orione Gonçalves Correia; Érica Paula Barcha Correia, Curso de direito da seguridade

(38)

Segundo José do Reis Feijó Coimbra, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão “pareceu inscrever entre seus princípios básicos a pedra fundamental da atual seguridade social”.42

Assim, o auxílio prometido aos necessitados passava a ser uma dívida da sociedade, um direito do cidadão. Faltava para a inauguração da seguridade social apenas o reconhecimento pela legislação desse direito, uma vez que se teria, no rol dos direitos juridicamente protegidos do homem, o de ser amparado pelo Estado nas situações de necessidade derivadas de um risco social.

Tal reconhecimento, entretanto, não se deu logo após o advento da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão porque, à primeira vista e pelos mais ortodoxos, poderia ser visto como contrário ao liberalismo de base individualista que estava sendo inaugurado.

Qualquer medida de amparo estatal ao mais fraco seria contrária ao pensamento à época dominante, qual seja, a de que o Estado deveria eximir-se ao máximo da intervenção econômica. Mais tarde, ver-se-ia que o problema do indivíduo acabaria refletindo na própria sociedade. Ou seja, o direito individual era na verdade um problema da sociedade.

Aos poucos, houve o aperfeiçoamento do pensamento dominante, no sentido de que os interesses individuais não poderiam sobrepujar os interesses coletivos, sob pena de colocar em risco a estabilidade social do país. Era imperativo que se legislasse em busca do equilíbrio das relações do capital com o trabalho.

(39)

A intervenção do Estado na economia se fazia necessária à proteção da liberdade do cidadão e à mantença dos três postulados fundamentais da Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade (ou solidariedade).

Ao mesmo tempo, todos se conscientizavam de que o fim do Estado era o bem comum e que os direitos individuais deveriam ser disciplinados em conciliação aos direitos da sociedade.

Ao cabo dessa evolução de pensamentos, admitia-se que o principal fim do Estado era o bem comum da sociedade. Era necessário que ele interviesse na economia, a fim de garantir a segurança do cidadão.

Era dever social a aplicação de parcela da receita tributária no auxílio aos desafortunados e em sua manutenção, quando isso não fosse possível pelo próprio esforço. E, assim, o Estado Liberal se viu, aos poucos, substituído pelo moderno Estado Democrático, verdadeiramente Estado Social.

2.1.4 Revolução Industrial – previdência social

Com a Revolução Industrial do século XIX, houve a introdução do uso em larga escala de máquinas, a transformar o modo e o ritmo de produção econômica, fazendo surgir uma massa de trabalhadores que viviam de baixos salários, sem gozar de nenhum tipo de estabilidade.

(40)

trabalho, não tardaram a surgir. Os trabalhadores tinham a seu favor o poder de voto.

Note-se que o Estado Liberal não encontrou meios de efetivar práticas anteriores, de forma a substituir as obras de assistência e previdência postas em prática pelas abolidas corporações de ofício e grêmios organizados pelo cristianismo através dos séculos. O capitalismo passou a dominar como sistema, dirigindo à sua vontade a lei da oferta e da procura, criando um verdadeiro mercado de trabalho humano, tornando insuportáveis as condições de vida.

Percebendo o vazio moral deixado pelas idéias liberais revolucionárias, Napoleão, procurando dirimir os excessos da Revolução, firmou com a Santa Sé, em 15 de julho de 1801, a concordata, que permitiu à Igreja Católica o retorno à defesa dos trabalhadores desamparados e a prestação de serviços a eles.43

Em 1869, o Parlamento da Confederação Norte, diante dos graves problemas trazidos pelo desenvolvimento industrial na Alemanha, convidou o chanceler Bismark a desenvolver um projeto de “seguro operário”, apto a substituir a limitada assistência pública.44

Estudando as bases do sistema de cooperativa, do mutualismo do seguro privado e do socorro mútuo, Bismarck e seus colaboradores chegaram à conclusão de que, com respaldo em tais idéias,

43 Marcus Orione Gonçalves Correia; Érica Paula Barcha Correia, Curso de direito da seguridade

social, p. 4.

(41)

poderiam combater o socialismo e o capitalismo, em um só tempo, que ameaçavam a estabilidade política do Império Alemão.

Como fruto de tal reflexão, Bismark instituiu na Alemanha o seguro-doença (em 1883), custeado por contribuições dos empregados, empregadores e Estado; o seguro contra acidentes (em 1884), custeado pelos empresários; o seguro de invalidez e velhice (em 1889), também baseado na contribuição tríplice. Todos esses seguros eram de filiação obrigatória pelos trabalhadores que recebessem até 2.000 marcos anuais.45

O sistema de seguro social obrigatório alemão, idealizado por Bismark, e constituído basicamente pelos três ramos vistos – seguro-doença, seguro-acidente e seguro-velhice e invalidez – exerceu forte influência nos seguros sociais obrigatórios, que rapidamente se espalharam pela Europa, de 1885 a 1935. Tal sistema ficou conhecido como sistema clássico de seguro social, caracterizado pela existência de um conjunto heterogêneo e autônomo de seguros sociais.

O sistema de seguro social de Bismark é tido, pela maioria dos autores, como marco histórico-legal da previdência social. E, de fato, pela primeira vez na história, se tem, por imposição legal, uma articulação de esforços entre o Estado, empresário e trabalhador, a formar uma técnica de proteção direta a essa última classe.46

Oportunas as palavras de Wagner Balera:

45 Ilídio das Neves, Direito da segurança social..., p. 149.

(42)

“A previdência social é, antes de tudo, uma técnica de proteção que depende da articulação entre o Poder Público e os demais atores sociais. Estabelece diversas formas de seguro, para qual ordinariamente contribuem os trabalhadores, o patronato e o Estado e mediante o qual se intenta reduzir ao mínimo os riscos sociais, notadamente os mais graves: doença, velhice, invalidez e acidentes no trabalho.”47

2.1.5 Advento da seguridade social

Da instituição do seguro social obrigatório em 1883, na Alemanha, que, repita-se, inaugurou a previdência social no mundo, até o advento da seguridade social propriamente dita, Celso Barroso Leite e Luiz Paranhos Velloso48 didaticamente distinguem três períodos:

O primeiro período estende-se de 1883 até 1918 (término da Primeira Guerra Mundial), e corresponde à expansão da previdência social nos países da Europa. O segundo período inicia-se em 1918, perdurando até 1945, e corresponde à universalização do seguro social obrigatório. E, finalmente, o terceiro período, que se inicia com o final da Segunda Guerra Mundial (1945) e caracteriza-se pela progressiva passagem da previdência social para o que se convencionou chamar de seguridade social.

É claro que essa divisão é meramente didática, sendo até intuitivo que a seguridade social não foi “programada”, mas sim concebida ao longo do tempo pela influência dos fatos e documentos associados, cuja intensidade nem sempre respeita a ordem ali indicada. Dessa didática divisão, tem-se as duas guerras mundiais como marcos históricos representativos da evolução da seguridade social.

47 Wagner Balera, Introdução à seguridade social, p. 31.

(43)

Isso ocorreu porque o momento de guerra em geral é propício ao desenvolvimento dos sistemas de proteção social, em razão do aumento da preocupação das pessoas com a segurança, e pelo desenvolvimento tecnológico e industrial que os países em conflito inevitavelmente acabam apresentando.

A seguir, indicaremos os principais fatos e diplomas históricos referentes à evolução da seguridade social, começando pela encíclica Rerum Novarum, editada pelo Papa Leão XIII em 1891, que defende a intervenção do Estado na economia para a defesa do interesse comum e implantação dos seguros obrigatórios.49

Debatendo a questão do intervencionismo estatal (e decerto aprovando o seguro social bismarkiano), ela prega que:

“Assim como por todos estes meios o Estado pode tornar-se útil às diversas classes, pode igualmente melhorar muitíssimo a sorte da classe operária e isto em todo o rigor do seu direito e sem temer a censura de ingerência indébita, pois que, em virtude mesmo do seu ofício, o Estado deve servir o interesse comum. E é evidente que, quanto mais se multiplicarem as vantagens resultantes desta ação de ordem geral, tanto menos necessidade haverá de recorrer a outros expedientes para remediar as condições dos trabalhadores.”50

Em 1919, o tratado de Versalhes e a conseqüente criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) deram impulso à criação de diversas convenções e recomendações internacionais, uniformizando e difundindo as normas de seguro social. Essas medidas foram decisivas para a construção do arcabouço jurídico da seguridade social.

49 Papa Leão XIII, Rerum Novarum sobre as condições dos operários, p. 5.

50 Marcus Orione Gonçalves Correia; Érica Paula Barcha Correia, Curso de direito da seguridade

(44)

Ainda em 1919, surge a Constituição de Weimar, que confere dignidade constitucional à questão social, inaugurando a época do constitucionalismo social, a substituir as velhas estruturas jurídicas baseadas no individualismo. Sua importância para a seguridade social está traduzida nas palavras de Wagner Balera:

“Velhas estruturas jurídicas baseadas no individualismo cedem passo, ante essa ordem na qual se acha colocado, como elemento subjacente, o solidarismo.

Dali para frente caberá ao Estado atuar como agente no desenvolvimento social e, desse lugar de comando, sobrepor-se ao aleatório das situações concretas.

Contando com o auxílio do planejamento – talvez sua principal arma tática – cumpre ao Estado providência engendrar, num sistema, a segura cobertura das terríveis contingências que deram causa à questão social.”51

O Social Security Act, de 1935, foi instituído nos Estados Unidos durante o governo Roosevelt, como plano de resposta à grave crise econômica do país, utilizou pela primeira vez a expressão seguridade social e ganhou voga com a lei neozelandesa de 1938.

As duas leis são exemplos de um regime de grande alcance, cobrindo os riscos biológicos e econômicos, baseado na fusão dos princípios da assistência e do seguro.

A Carta do Atlântico, de 1941, dentre outras declarações, afirmava o desejo “de lograr no campo da economia a colaboração mais estreita entre todas as nações, com o fim de conseguir para todos melhoria nas normas de trabalho, prosperidade econômica e seguridade social”. Em 1942, é realizada, em Santiago do Chile, a Primeira Conferência Interamericana de

(45)

Seguridade Social, ocasião na qual foi editada a Declaração de Santiago, contendo os objetivos e o conteúdo da seguridade social.

O Reino Unido, como preparação de seu programa de reconstrução para o pós-guerra, criou uma comissão interministerial, sob o comando de Wiliam Beveridge, para preparar um plano unificando todos os sistemas de seguro e de assistência social. Conforme anota José Almansa Pastor, a Comissão Beveridge teceu críticas ao seguro social clássico, oferecendo uma nova visão sobre o instituto, inspirada na libertação das necessidades sociais pela adequada e justa redistribuição de renda. Com efeito, o sistema de proteção social não poderia reduzir-se a um mero conjunto de seguros sociais, devendo abranger a assistência social, um serviço nacional de saúde, ajuda à família e seguros voluntários.52

O chamado Plano Beveridge, de 1942, concebeu um seguro nacional, cujas características principais são: unificação e homogeneidade dos seguros sociais, incluindo os acidentes de trabalho, que devem abandonar a proteção baseada na responsabilidade empresarial; unificação das contribuições, para a simplificação econômica e administrativa, abrangendo todos os riscos; igualdade das prestações e das condições para sua aquisição, atendendo mais às necessidades do que aos riscos; dar caráter de serviço público à prestações da seguridade social; universalização da cobertura e do atendimento; dever de pensar em outras fontes de custeio, além do salário, devendo o Estado garantir a parte faltante.

(46)

O Plano Beveridge foi publicado em dezembro de 1942, pouco antes do Natal, e algumas semanas após a batalha de El Alamein, que se travou no deserto do norte da África.53

A imprensa popular teria, inclusive, cunhado a seguinte frase para definir o plano: from the cradle to the grave (do berço ao túmulo), em uma alusão à cobertura de todas as necessidades humanas, desde o nascimento, até a morte.

Houve imediato reconhecimento popular de que o plano era dirigido a uma Inglaterra mais igualitária, e Beveridge rapidamente viu sua popularidade crescer.

Entretanto, o Partido Conservador logo se manifestou contrariamente, considerando o plano por demais distanciado da realidade.

Além do Plano Beveridge, as recomendações da Organização Internacional do Trabalho sobre garantia dos meios de assistência médica (Declaração de Filadélfia, de 1944) atraíram atenção geral quanto a: estender a seguridade social à totalidade da população; reconhecer a unidade essencial das funções de garantia dos meios de vida, que até então figuravam em regimes diferentes; reconhecer a unidade essencial dos serviços sanitários preventivos e curativos; conceder benefícios iguais, pelo menos ao mínimo vital, compreendendo o salário-família; manter os princípios do seguro e especialmente o da contribuição dos segurados; reconhecer que a seguridade social não é possível sem uma política de pleno emprego e não constitui mais que uma parte da campanha total para a liberação da

53 Marcus Orione Gonçalves Correia; Érica Paula Barcha Correia, Curso de direito da seguridade

(47)

necessidade; prever serviços complementares de assistência social, a fim de cobrir as necessidades não satisfeitas pelo seguro social.54

A idéia de seguridade social idealizada pelo Plano Beveridge foi imediatamente acolhida por todos os governos e povos do mundo livre, exercendo influência sobre a legislação da Commonwealth, dos Estados Unidos antes do fim da guerra, dos países da América Latina, assim como de países como Índia, Turquia e Egito.

Finalmente, em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos aprovada pela Organização das Nações Unidas estatuiu em seu artigo 22 que “toda pessoa, como membro da sociedade, tem direito à seguridade social e a obter, mediante o esforço nacional e a cooperação internacional, levados em conta a organização e os recursos de cada Estado, a satisfação dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento de sua personalidade”.

Em 1952, a Conferência Internacional do Trabalho aprovou a Convenção n. 102, que trata das normas mínimas de seguridade social, revelando o grau mínimo de proteção social que o Estado deve propiciar aos seus cidadãos.

2.1.6 Necessidades individuais com complicações sociais

Questão importante, e para a qual Celso Barroso Leite expressamente sempre chamou atenção em seus trabalhos, reside no fato de que as necessidades essenciais de cada indivíduo que a seguridade social deve

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atender podem se tornar necessidades sociais. Isso porque, se as necessidades aparentemente individuais não forem atendidas, atingem os demais indivíduos e a sociedade inteira. Esse é um dos principais motivos a justificar o caráter social das prestações da seguridade social.55

Nesse sentido, Rio Nogueira também assinala que

“Se não existisse o INPS, grandes massas obreiras ficariam entregues à miséria extremada, quando o infortúnio roubasse o potencial laborativo dos trabalhadores. Sobreviria a crise, e, na imprevidência generalizada, a grande vítima seria o próprio Estado, que lhe deveria enfrentar as conseqüências.”56

As manifestações desses dois autores são deduções lógicas que se extraem da história e das noções conceituais da seguridade social. Mas, ainda que elas pareçam óbvias, são pilares a justificar a seguridade social, apesar de as prestações da seguridade social serem em geral direcionadas à proteção da sociedade em geral. Assim, todos têm interesse na seguridade social, e todos devem custeá-la.

Para James M. Malloy, as manifestações históricas denotam que:

“(...) um fenômeno decisivo do século XX foi o surgimento e o desenvolvimento do bem-estar. A maioria dos países adotou ‘programas sociais’ destinados a proteger, no mínimo, uma parte dos cidadãos, das vicissitudes da vida moderna causadas por perturbações sociais próprias do desenvolvimento econômico e da modernização.”57

55 Celso Barroso Leite, A proteção social no Brasil, p. 16-17 e Conceito de seguridade social, p.

19-25.

(49)

2.2 Evolução histórica da seguridade social no Brasil

José dos Reis Feijó Coimbra explica que a política social brasileira de amparo ao homem evoluiu da assistência prestada por caridade de seus semelhantes, até o estágio em que se mostra como um direito subjetivo, garantido pela sociedade aos seus membros, que é, na verdade, o reflexo de três formas de atuação: a beneficência, a assistência pública e a previdência.58

Desde a colônia, as maiorias viviam oprimidas pelos senhores de engenho e forneciam seu trabalho braçal escravo nas fazendas de cana-de-açúcar.

Historicamente, a burguesia agrária beneficiou-se primeiro da mão-de-obra dos africanos, depois dos trabalhadores rurais nativos e, mais tarde, dos imigrantes pobres oriundos da Europa, sem alternativas na sua terra de origem, principalmente os de origem italiana, em decorrência do capitalismo mercantilista em franco progresso no Continente Europeu.59

No Brasil, esses trabalhadores estavam subordinados à classe dominante da época, ou seja, aos coronéis proprietários das grandes extensões de terra em que era cultivada a cana-de-açúcar e depois o café, que se transformaram em exportadores das matérias-primas transportadas pelas ferrovias brasileiras.

(50)

A Constituição outorgada pelo Imperador D. Pedro I em 25.3.1824, no artigo 179, XXXI do Título VIII, pela primeira vez na história brasileira inseriu no texto constitucional, ainda que de forma meramente assistenciária, um instrumento de ajuda aos cidadãos brasileiros mais necessitados.60

A ideologia liberal francesa repercutiu no Brasil Império e os constituintes de 1824 introduziram no Texto Maior, como garantia, o primeiro instrumento de proteção social aos cidadãos que se encontrassem em estado de necessidade, isto é, em estado de calamidade pública.

Importante destacar que primeiramente prevaleceu a beneficência inspirada pela caridade, e é exemplo dela a fundação da Santa Casa de Misericórdia, pelo Padre José de Anchieta, no século XVI. Já de molde diverso foram as Irmandades das Ordens Terceiras, surgidas no século XVII, que se configuravam como mutualidades. Da assistência pública tem-se notícia inaugural em 1828, com a Lei Orgânica dos Municípios, ao tempo em que outra forma de mutualidade, o Montepio Geral da Economia, surgia em 1835. Do seguro social, tal como muito após se formulou, nos tempos anteriores ao século XX pouco se cogitou.61

As caixas funcionaram muito bem no período imperial como instrumentos de um verdadeiro seguro em bases sociais, por meio dos montepios.

O desenvolvimento dos montepios foi decrescendo no país, face aos conglomerados populacionais nas metrópoles brasileiras, efeito da revolução industrial em franca expansão nos países europeus.

(51)

2.2.1 Primeiras legislações brasileiras de seguro social

No Brasil, no fim do Império, algumas medidas legislativas foram tomadas para proporcionar aos empregados públicos alguma forma de proteção.

Observamos existirem caixas de socorros em cada uma das estradas de ferro do Estado (Lei n. 3.397/1888), o fundo de pensões do pessoal das oficinas da Imprensa Nacional (Dec. n. 10.269/1889), o montepio obrigatório dos empregados do Ministério da Fazenda (Dec. n. 942-A), a aposentadoria para os empregados da Estrada de Ferro Central do Brasil (Dec. n. 221/1890), benefício depois ampliado a todos os ferroviários de empresas do Estado (Dec. n. 565/1890), a aposentadoria por invalidez e a pensão por morte dos operários efetivos do Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (Lei n. 217/1892), a caixa de pensões dos operários da Casa da Moeda (Dec. n. 9284/11), a caixa de pensões e empréstimo para o pessoal das capitazias da Alfândega do Rio de Janeiro (Dec. n. 9.517/1912) e, em 1917, a caixa de aposentadoria e pensões para os operários da Casa da Moeda.62

Em 1923, foi promulgada a Lei n. 4.682, conhecida como Lei Eloy Chaves, instituindo uma caixa de aposentadoria e pensões para cada empresa ferroviária, tornando seus empregados segurados obrigatórios, e desfrutando dos seguintes benefícios: assistência médica, aposentadoria por tempo de serviço e por idade avançada, por invalidez após dez anos de serviço e pensão aos seus dependentes. Posteriormente, a Lei n. 5.109/1926 deferiu igual regime de amparo aos empregados e empresas de navegação marítima e fluvial, bem como aos portuários.63

(52)

Com a criação do Ministério do Trabalho com competência para assuntos de previdência social, apareceram institutos amparando não mais os servidores de uma só empresa, mas de uma categoria profissional, em todo território nacional.

Surgem então o instituto dos marítimos, o IAPM (Dec. n. 22.872/1933), o instituto dos comerciários, o IAPC (Dec. n. 24.273/1934), o instituto dos bancários, o IAPB (Dec. n. 24.615/1934), o instituto dos trabalhadores em transportes de cargas, o IAPTC (Dec. n. 7.720/1945), e assim por diante, até o maior de todos, que foi o dos industriários, o IAPI (Dec. n. 627/1936).64

Além desses institutos, que executavam as mesmas atividades, foram proporcionadas aos trabalhadores outras formas de serviços: em 1940, foi criado o Serviço de Alimentação da Previdência Social (SAPS); em 1941, foi instituído o abono em benefício das famílias de prole numerosa (Dec. n. 4.890/1942), origem da Legião Brasileira de Assistência (LBA); o Decreto n. 4.048/1942 organizou o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI); em 1946, surgiu o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), através do Decreto n. 8.261; posteriormente, surgiu o Serviço Social da Indústria (SESI), pelo Decreto n. 9.403, e, por fim, o Serviço Social do Comércio (SESC), pelo Decreto n. 9.853.

A separação das categorias profissionais resultava em uma proteção diferenciada, quando o ideal seria a unificação da previdência, tentativa frustada feita em 1945, através do Decreto n. 7.526, que criou o Instituto dos Seguros do Brasil.

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A uniformização legislativa da área previdenciária começou em 1947, quando o deputado Aluízio Alves apresentou um projeto de lei que previa o amparo social de toda a população, sob moldes diversos, do qual resultou a Lei n. 3.807, de 23 de agosto de 1960, conhecida mais pela sua sigla LOPS – Lei Orgânica da Previdência Social, proporcionando unidade de tratamento para os chamados segurados e dependentes.65

Essa Lei criou o chamado regime geral de previdência social, que operou importantíssimas mudanças, mas não unificou os organismos gestores, nem assegurou proteção a todos, excluídos os domésticos e os trabalhadores do campo.

Os trabalhadores do campo tiveram sua proteção efetivada pela Lei n. 4214/63, chamada de Estatuto do Trabalhador Rural, cuja concretização se deu em 1971 com a Lei Complementar n. 11, que deu ao trabalhador rural, de modo efetivo, a proteção social tanto esperada, instituindo o sistema de amparo do Prorural.66

A LOPS generalizou e unificou em um modelo único a proteção social dos trabalhadores relacionados às atividades privadas, porém só em 1966 é que o Decreto n. 72 criou um único organismo, unificando as instituições previdenciárias: surge então o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS).

Todas as instituições teriam que ser cuidadas por um único ministério, o que acontece em 1974, quando foi criado o Ministério da Previdência Social, porém a grande reformulação aconteceu somente em

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