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Sumário. Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 11453/10.9TDLSB.L1.S1

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Supremo Tribunal de Justiça

Processo nº 11453/10.9TDLSB.L1.S1 Relator: HENRIQUES GASPAR

Sessão: 05 Dezembro 2012 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: REJEITADO

ACORDÃO DA RELAÇÃO

REVOGAÇÃO DA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA

ADMISSIBILIDADE DE RECURSO

COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

INTERPRETAÇÃO

Sumário

I - No caso, o arguido foi condenado em 1.ª instância, na vigência da Lei 48/2007, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa por idêntico período; a Relação, por acórdão de 23-06-2010, julgou procedente o recurso do MP, revogando o acórdão recorrido no que respeita à suspensão da

execução da pena.

II - A recorribilidade para o STJ de decisões penais está prevista, específica e autonomamente, no art. 432.º do CPP. De uma forma directa, nas als. a), c) e d) do n.º 1; e de um modo indirecto na al. b), decorrente da não

irrecorribilidade de decisões proferidas, em recurso, pelas Relações, nos termos do art. 400.°, n.º 1, e respectivas als., do CPP. Há, neste regime definido pelo conjunto das referidas normas, elementos que, aparentemente descoordenados, não podem deixar de ser harmonizados, salvo risco e efeito de uma séria contradição intra-sistemática.

III - A referência essencial para a leitura integrada do regime – porque

constitui a norma que define directamente as condições de admissibilidade do recurso para o STJ – não pode deixar de ser a al. c) do n.° 1 do art. 432.° do CPP, que fixa, em termos materiais, uma condição e um limiar material mínimo

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de recorribilidade – acórdãos finais, proferidos pelo tribunal do júri ou pelo tribunal colectivo, que apliquem pena de prisão superior a 5 anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito. Não sendo interposto de decisão do tribunal colectivo, ou sendo recurso de decisão do tribunal colectivo ou do tribunal do júri que não aplique pena de prisão superior a 5 anos, o recurso, mesmo versando exclusivamente o reexame da matéria de direito, segue a regra geral do art. 427.° do CPP e deve ser obrigatoriamente dirigido ao Tribunal da Relação.

IV - A repartição das competências em razão da hierarquia pelas instâncias de recurso está, assim, delimitada por uma regra-base que parte da confluência de uma dupla de pressupostos – a natureza e a categoria do tribunal a quo e a gravidade da pena efectivamente aplicada.

V - A coerência interna do regime de recursos para o STJ em matéria penal supõe, deste modo, que uma decisão em que se não verifique a referida dupla de pressupostos não deva ser (não possa ser) recorrível para o STJ. Com efeito, se não é admissível recurso directo de decisão proferida por tribunal singular, ou que aplique pena de prisão não superior a 5 anos, também por integridade da coerência que deriva do princípio da paridade ou até da

maioria de razão, não poderá ser admissível recurso de 2.º grau de decisão da Relação que conheça de recurso interposto nos casos de decisão do tribunal singular ou do tribunal colectivo ou do júri que aplique pena de prisão não superior a 5 anos.

VI - A conclusão que poderá ser extraída de todo o processo legislativo que antecedeu a Lei 48/2007 será a de que se não manifesta nem revela uma intenção, segura, de alteração do paradigma que vem já da revisão do

processo penal de 1998: o STJ reservado para os casos mais graves e de maior relevância, determinados pela natureza do tribunal de que se recorre e pela gravidade dos crimes aferida pelo critério da pena aplicável. É que, no essencial, esta modelação mantém-se no art. 432.° do CPP, e se modificação existe, vai ainda no sentido da restrição: o critério da pena aplicada conduz, por comparação com o regime antecedente, a uma restrição no acesso ao STJ.

VII - Não sendo razoavelmente possível, pelos elementos objectivos que o processo legislativo revela, identificar a vontade do legislador no sentido de permitir a conclusão de que na al. e) do n.º 1 do art. 400.° do CPP disse mais do que quereria, não parece metodologicamente possível operar uma

interpretação restritiva da norma.

VIII - Porém, a norma, levada isoladamente ao pé da letra, sem

enquadramento sistémico, acolheria solução que é directamente afastada pelo art. 432.°, n.º 1, al. c), produzindo uma contradição intrínseca que o equilíbrio

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pensar que, na leitura isolada, estreitamente literal, um acórdão proferido em recurso pela Relação, que aplicasse uma pena de 30 dias de prisão, não

confirmando a decisão de um tribunal de Pequena Instância, seria recorrível para o STJ, contrariando de modo insuportável os princípios, a filosofia e a teleologia que estão pressupostos na repartição da competência em razão da hierarquia definida na regra-base sobre a recorribilidade para o STJ do art.

432.°, n.° 1, al. c), do CPP.

IX - Pode suceder, com efeito, que uma norma, lida «demasiado amplamente segundo o seu sentido literal», tenha de ser reconduzida e deva ser «reduzida ao âmbito de aplicação que lhe corresponde segundo o fim da regulação ou a conexão do sentido da lei», procedendo às «diferenciações requeridas pela valoração» e «exigidas pelo sentido e finalidade da própria norma» e pela finalidade ou sentido «sempre que seja prevalecente» de outra norma, que de outro modo seria seriamente afectada, seja pela “natureza das coisas” ou «por um princípio imanente à lei prevalecente num certo grupo de casos» (cf., Karl Larenz, Metodologia da Ciência do Direito, p. 473-474). Nestes casos, deverá o intérprete operar a “redução teleológica” da norma. A redução ou correcção respeitará também o princípio da proporcionalidade e serve o interesse

preponderante da segurança jurídica.

X - A perspectiva, o sentido essencial e os equilíbrios internos que o legislador revelou na construção do regime dos recursos para o STJ, com a prevalência sistémica, patente e mesmo imanente, da norma do art. 432.°, e especialmente do seu n.º 1, al. c), impõe, por isso, em conformidade, a redução te1eológica da norma do art. 400.°, n.° 1, al. e), do CPP, de acordo com o princípio base do art. 432.°, n.º 1, al. c), do CPP, necessária à reposição do equilíbrio e da

harmonia no interior da regime dos recursos para o STJ.

XI - A solução a que se chegou pela redução teleológica da al. e) do n.° 1 do art. 400.° do CPP, no sentido da convergência necessária com os limites

verdadeiramente definidores da recorribilidade para o STJ, permite desenhar a solução, que será construída, ou ad minus, ou por identidade de razão.

Consequentemente, o presente recurso não é admissível.

Texto Integral

1. No processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.°

11453/10.9TDLSB, da 4.ª Vara Criminal de Lisboa, o arguido AA foi julgado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21.°, n.° l, do DL 15/93 de 22/1, com referência às tabelas anexa I-A e I-C.

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Realizado o julgamento, foi proferido acórdão que decidiu julgar a acusação parcialmente procedente e provada, e, em consequência:

1 — Absolveu o arguido AA da prática, em autoria material, na forma

consumada, do crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo disposto no art

°.21°., n°. l, do DL 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às tabelas I-A e I-C anexas ao mesmo diploma, por que vinha acusado;

2 — Efectuando, porém, a convolação da qualificação jurídica, condenou o arguido pela prática, em autoria material, na forma consumada, do crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo disposto no art°.25°., n°. l, alínea a), do DL 15/93, de 22 de Janeiro, com referência ao art°.21°., n°. l, e à tabela I-B anexa ao mesmo diploma, na pena de dois anos e seis meses de prisão,

suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova.

2. O Magistrado do Ministério Público recorreu para o tribunal da Relação, que concedendo provimento ao recurso revogou parcialmente o acórdão recorrido, na parte em que decretou a suspensão da execução da pena de prisão, decidindo que a pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, em que o arguido foi condenado, será de prisão efectiva.

3. Não se conformando, o arguido recorre para o Supremo Tribunal, com os fundamentos constantes da motivação que apresentou e que termina com a formulação das seguintes conclusões:

1. Salvo o devido respeito por opinião contrária, entende o Recorrente que mal andou o Tribunal a quo ao revogar a suspensão da execução da pena de prisão que lhe foi aplicada.

2. Com efeito, da matéria de facto provada e de acordo com as regras de experiência comum, in casu, deverão ser considerados preenchidos os

pressupostos da suspensão da execução da pena, nos termos do disposto no art.° 50.° do Código Penal, tal qual o considerou o tribunal de 1.ª Instância.

3. E, consequentemente, deverá ser mantida a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao Recorrente.

4. Ao decidir como decidiu, violou o Tribunal a quo o disposto no art.° 50.° do referido diploma legal.

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Pede, em consequência, o provimento do recurso com a revogação do acórdão recorrido e a substituição por outro «que permita o cumprimento da pena de prisão em que foi condenado, sujeito ao regime de suspensão de execução».

O magistrado do Ministério Público responder à motivação, concluindo:

1. O presente recurso tem como objecto o douto Acórdão deste tribunal de 10/7/2012 que concedeu provimento ao recurso do Ministério Público tendo revogado a decisão recorrida que condenou o arguido em pena de 2 anos e 6 meses de prisão suspensa na sua execução.

2. Concorda-se com os fundamentos que estão na base da revogação da decisão recorrida pelo Ministério Público afigurando-se pertinentes as conclusões lógicas extraídas pelo douto Acórdão recorrido.

3. A ponderação da aplicação de uma pena de substituição é efectivamente feita no momento da prolação da sentença condenatória.

4. A pena suspensa tem como pressuposto material o prognóstico favorável quanto ao comportamento do delinquente que em determinadas

circunstâncias torna crível a possibilidade de se afastar do crime.

5. Este juízo reporta-se sempre ao momento da decisão e não ao momento da prática do crime, nem a qualquer outro momento.

6. A pena suspensa tem como pressuposto material o prognóstico favorável quanto ao comportamento do delinquente que em determinadas

circunstâncias torna crível a possibilidade de se afastar do crime.

7. No caso concreto tais circunstâncias não se verificaram.

Considera, a terminar, que o acórdão recorrido deve ser mantido, negando-se provimento ao recurso.

4. No Supremo Tribunal, o Exmº Procurador-Geral Adjunto teve intervenção nos termos do artigo 416º do CPP, emitindo desenvolvido parecer suscitando a questão prévia da rejeição do recurso por rejeitado por inadmissibilidade.

Considera que, estando em causa decisão proferida pela Relação que, embora tenha alterado/revogado a decisão da 1ª instância (pois não substituiu a pena de 8 meses de prisão pela prestação de trabalho a favor da comunidade) aplicou pena de prisão inferior a 5 anos, o recurso não é admissível (artigo

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432º, nº 1, alínea c), do CPP), devendo ser rejeitado (artigos 420º, nº 1, alínea b) e 414º, nº 2 do CPP).

Notificado, o recorrente respondeu, sustentado a admissibilidade do recurso, na interpretação que faz a contrario sensu do alínea c) do nº 1 do artigo 400º e da alínea b) do artigo 432º do CPP.

5. Colhidos os vistos, cumpre decidir.

O arguido foi condenado em 1.ª instância, na vigência da Lei n.º 48/2007, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa por idêntico período, pela prática de um crime de tráfico do art. 25.º, n.º 1, al. a), do DL 15/93; a

Relação, por acórdão de 23 de Junho de 2010, julgou procedente o recurso do Ministério Público, revogando o acórdão recorrido no que respeita à

suspensão da execução.

A recorribilidade para o STJ de decisões penais está prevista, específica e autonomamente, no artigo 432º do CPP. De uma forma directa, nas alíneas a), c) e d) do nº 1; e de um modo indirecto na alínea b), decorrente da não

irrecorribilidade de decisões proferidas, em recurso, pelas relações, nos termos do artigo 400º, nº 1 e respectivas alíneas, do CPP.

Há, neste regime definido pelo conjunto das referidas normas, elementos que, aparentemente descoordenados, não podem deixar de ser harmonizados, salvo risco e efeito de uma séria contradição intra-sistemática.

A referência essencial para a leitura integrada do regime – porque constitui a norma que define directamente as condições de admissibilidade do recurso para o STJ – não pode deixar de ser a alínea c) do nº 1 o artigo 432º do CPP, que fixa, em termos materiais, uma condição e um limiar material mínimo de recorribilidade – acórdãos finais, proferidos pelo tribunal do júri ou pelo

tribunal colectivo, que apliquem pena de prisão superior a cinco anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito.

Não sendo interposto de decisão do tribunal colectivo, ou sendo recurso de decisão do tribunal colectivo ou do tribunal do júri que não aplique pena de prisão superior a cinco anos, o recurso, mesmo versando exclusivamente o reexame da matéria de direito, segue a regra geral do artigo 427º do CPP e deve ser obrigatoriamente dirigido ao tribunal da relação.

A repartição das competências em razão da hierarquia pelas instâncias de recurso está, assim, delimitada por uma regra-base que parte da confluência

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de uma dupla de pressupostos – a natureza e a categoria do tribunal a quo e a gravidade da pena efectivamente aplicada.

A coerência interna do regime de recursos para o STJ em matéria penal supõe, deste modo, que uma decisão em que se não verifique a referida dupla de pressupostos não deva ser (não possa ser) recorrível para o STJ. Com efeito, se não é admissível recurso directo de decisão proferida por tribunal singular, ou que aplique pena de prisão não superior a cinco anos, também por integridade da coerência que deriva do princípio da paridade ou até da maioria de razão, não poderá ser admissível recurso de segundo grau de decisão da relação que conheça de recurso interposto nos casos de decisão do tribunal singular ou do tribunal colectivo ou do júri que aplique pena de prisão não superior a cinco anos.

Como a propósito se refere em acórdão do STJ (de 25 de Junho de 2008, proc.

1879/2008), «desde que não haja condenação em pena não superior a cinco anos de prisão, não incumbe ao STJ, por não se circunscrever no âmbito dos seus poderes de cognição, apreciar e julgar recurso interposto de decisão final do tribunal colectivo o do júri, que condene em pena não superior a cinco anos de prisão»; «o legislador, ao arredar da competência do Supremo o julgamento do recurso de acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que apliquem pena não privativa de liberdade, quis implicitamente significar, de harmonia com o artigo 9º do Código Civil, na teleologia e unidade do sistema quanto a penas privativas de liberdade, que […] apenas é admissível recurso de acórdão da relação para o Supremo quando a relação julgar recurso de decisão do tribunal colectivo ou do júri, em que estes tivessem aplicado pena superior a cinco anos de prisão».

É, pois, neste círculo hermenêutico que têm de ser interpretadas as normas do artigo 400º, nº 1 do CPP, quando determinam a irrecorribilidade (e, por

antonímia, a recorribilidade) das decisões proferidas, em recurso, pelo tribunal da relação.

Desde logo a norma da alínea e) do nº 1 do artigo 400º, que prevê a irrecorribilidade das decisões proferidas em recurso pela relação, que apliquem pena não privativa de liberdade.

A formulação da norma constava da Proposta de Lei nº 109/X (DAR, II série, nº 31, de 23/Dez/06) em termos diversos («são irrecorríveis» os acórdãos

proferidos, em recurso, pela relação, «que apliquem pena de multa ou pena de prisão não superior a cinco anos»), adaptando, por comparação com a anterior formulação e para os casos aí previstos, o critério da “pena aplicada” em lugar

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da “pena aplicável ao crime” (Os Projectos de Lei nº 237/X, DAR, II série, nº 100, de 6/Abril/06; 368/X, 369/X e 370/X, DAR, II série, nº 52, de 9/Março/07 não previam qualquer alteração para a alínea e) do nº 1 do artigo 400º).

A redacção final foi votada, após proposta oral do PS (com a abstenção dos restantes Partidos), em última leitura no Grupo de Trabalho da Comissão Parlamentar, ficando a expressão constante da redacção fixada pela Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto - «que apliquem pena não privativa de liberdade».

O Relatório dos trabalhos preparatórios, de 18 de Julho de 2007, fixando a alteração na sequência da «proposta oral», não deixa qualquer traço de

fundamentação que justifique o desvio em relação ao primeiro texto proposto e a consequente «descontinuidade metodológica».

E, assim, também não deixa massa crítica nos procedimentos que permita obter deduções, com o peso de probabilidade necessário, sobre a vontade ou a intenção de legislador.

Isto é, não parece possível determinar se a formulação final e votada da norma constitui um «acidente» na metodologia da formação normativa, ou uma

expressão concreta, firme e pensada da vontade do legislador.

A conclusão que poderá ser extraída de todo o processo legislativo, tal como deixou traço, será a de que se não manifesta nem revela uma intenção,

segura, de alteração do paradigma que vem já da revisão do processo penal de 1998: o STJ reservado para os casos mais graves e de maior relevância,

determinados pela natureza do tribunal de que se recorre e pela gravidade dos crimes aferida pelo critério da pena aplicável. É que, no essencial, esta modelação mantém-se no artigo 432º do CPP, e se modificação existe, vai ainda no sentido da restrição: o critério da pena aplicada conduz, por comparação com o regime antecedente, a uma restrição no acesso ao STJ.

Não sendo razoavelmente possível, pelos elementos objectivos que o processo legislativo revela, identificar a vontade do legislador no sentido de permitir a conclusão de que na alínea e) do nº 1 do artigo 400º do CPP disse mais do que quereria, não parece metodologicamente possível operar uma interpretação restritiva da norma.

Porém, a norma, levada isoladamente ao pé da letra, sem enquadramento sistémico, acolheria solução que é directamente afastada pelo artigo 432º, nº 1, alínea c), produzindo uma contradição intrínseca que o equilíbrio normativo

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Basta pensar que, na leitura isolada, estreitamente literal, um acórdão proferido em recurso pela relação, que aplicasse uma pena de trinta dias de prisão, não confirmando a decisão de um tribunal de Pequena Instância, seria recorrível para o STJ, contrariando de modo insuportável os princípios, a filosofia e a teleologia que estão pressupostos na repartição da competência em razão da hierarquia definida na regra-base sobre a recorribilidade para o STJ do artigo 432º, nº 1, alínea c) do CPP.

A contradição e a assimetria normativa e a consequente aporia intra- sistemática seriam, assim, tão patentes e tão intensas, que tornariam insuportável tal sentido.

Impõe-se, por isso, um acrescido esforço de interpretação.

Uma norma legal, contra o seu sentido literal mas de acordo com a teleologia imanente à lei, pode exigir uma limitação que não está contida no texto, acrescentando-se uma restrição que é requerida em conformidade com o sentido da norma.

Pode suceder, com efeito, que uma norma, lida «demasiado amplamente

segundo o seu sentido literal», tenha de ser reconduzida e deva ser «reduzida ao âmbito de aplicação que lhe corresponde segundo o fim da regulação ou a conexão do sentido da lei», procedendo às «diferenciações requeridas pela valoração» e «exigidas pelo sentido e finalidade da própria norma» e pela finalidade ou sentido «sempre que seja prevalecente» de outra norma, que de outro modo seria seriamente afectada, seja pela “natureza das coisas” ou «por um princípio imanente à lei prevalecente num certo grupo de casos» (cfr., KARL LARENZ, “Metodologia da Ciência do Direito”, 2ª ed., p. 473-474).

Nestes casos, deverá o intérprete operar a “redução teleológica” da norma.

A redução ou correcção respeitará também o princípio da proporcionalidade e serve o interesse preponderante da segurança jurídica.

A perspectiva, o sentido essencial e os equilíbrios internos que o legislador revelou na construção do regime dos recursos para o STJ, com a prevalência sistémica, patente e mesmo imanente, da norma do artigo 432º, e

especialmente do seu nº 1, alínea c), impõe, por isso, em conformidade, a redução teleológica da norma do artigo 400º, nº 1, alínea e) do CPP, de acordo com o princípio base do artigo 432º, nº 1, alínea c) do CPP, necessária à

reposição do equilíbrio e da harmonia no interior da regime dos recursos para o STJ.

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A solução a que se chegou pela redução teleológica da alínea e) do nº 1 do artigo 400º do CPP, no sentido da convergência necessária com os limites

verdadeiramente definidores da recorribilidade para o STJ, permite desenhar a solução, que será construída, ou ad minus, ou por identidade de razão (cf., entre vários, os acórdão do STJ de 25 de Junho de 2008, Proc. 1879/2008, proc, 102/09, de no acórdão de 23 de Junho de 2010).

6. O recurso não é, assim, admissível (artigo 432º, nº 1, alínea c) do CPP), e consequentemente deve ser rejeitado (artigos 420º, nº 1, alínea b) e 414º, nº 2 do CPP).

Nestes termos, rejeita-se o recurso.

Lisboa, 05 de Dezembro de 2012 Henriques Gaspar (Relator) Armindo Monteiro

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