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A Aritmética no Ensino Primário da Educação Básica nas Escolas Públicas do Distrito Federal ( )

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A Aritmética no Ensino Primário da Educação Básica nas Escolas

Públicas do Distrito Federal (1960-1980)

Rosália Policarpo Fagundes de Carvalho1

Grupo de Discussão: GD5 – História da Matemática e Cultura

Resumo

O trabalho apresenta a síntese do projeto de pesquisa de doutorado, em fase inicial. A pesquisa tem como objetivo analisar vestígios de como se processava o ensino de Aritmética no ensino primário nos decênios de 1960/1980 nas escolas públicas do Distrito Federal. O aporte teórico-metodológico é construído na perspectiva da História Cultural, mais especificamente, com base nos conceitos de apropriação de Roger Chartier (2002), tática e estratégia, utilizados por Certeau (2012) e cultura escolar de Julia (2001). As informações serão coletadas a partir de um diálogo entre fontes escritas e entrevistas semiestruturadas com professores que atuaram no primário daquela época.

Palavras-chave: Ensino Primário. Aritmética. História Cultural.

Introdução, justificativa e objetivos

A Aritmética na escola primária tem sido objeto de estudo de algumas pesquisas na Educação Matemática, dentre elas: Costa (2010), que tratou da Aritmética Escolar no ensino primário brasileiro no período compreendido entre 1890 e1946; Claras e Pinto (2013), que pesquisaram a aritmética da escola primária do estado do Paraná, entre 1901 a 1915; Salvador (2012), que focou a Matemática no ensino primário de Vassouras/ RJ; Souza (2013), que abordou a Aritmética Escolar em Vassouras/RJ entre 1987 e 1904; Pais (2012), que discutiu os aspectos históricos da aritmética em programas do ensino fundamental do XIX; Arruda (2011), que escreveu sobre as histórias e práticas da escola primária durante o Movimento da Matemática Moderna em Santa Catarina; França, (2012) que discutiu as orientações da Secretaria de Educação de São Paulo e apontou as principais transformações ocorridas do primário ao primeiro grau e Almeida (2010), que discorreu acerca do ensino de matemática nas séries iniciais no estado de Mato Grosso de 1920 a 1980.

1 Universidade Anhanguera de São Paulo UNIAN. E-mail: rosaliapolicarpo@yahoo.com.br. Orientadora:

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Além de pesquisas individuais, grupos como o Grupo de Pesquisa de História da Educação Matemática no Brasil (GHEMAT)2 e o Grupo de Pesquisa da História das Disciplinas Escolares (GPHDE)3 têm contemplado estudos sobre a aritmética dos grupos escolares. Embora o crescente interesse dos pesquisadores por esse tema, ao fazer uma busca exploratória em bancos de teses e dissertações brasileiros não foi encontrada nenhuma pesquisa relacionada ao tema proposto. Assim sendo, surgiu o interesse de analisar o Ensino de Aritmética nas séries iniciais da educação básica nos decênios de 1960 a 1980 nas escolas públicas do Distrito Federal (DF).

Ao falar sobre a presença da Matemática Moderna no ensino de primeiras letras brasileiro, Arruda (2011) cita Medina (2007); e Villela (2009), mostrando que “É difícil definir um tempo exato para a presença da Matemática Moderna nas quatro séries iniciais do Ensino Fundamental brasileiro. Todavia, tem-se identificado essa presença a partir da década de 1960 até meados de 1980” (ARRUDA, 2011, p.53). Assim, essa foi a razão da escolha desse período para realizar esta investigação, acrescentando-se o fato de que em 1960 ocorreu a fundação de Brasília.

Cumpre observar que nos decênios que se pretende pesquisar, a educação brasileira passou por mudanças, conforme nos mostra o Decreto-Lei n. 8.529 – de 2 de janeiro de 1946 – Lei Orgânica do Ensino Primário em seu artigo 1º, alínea b, o ensino primário tinha entre outras finalidades “oferecer de modo especial, às crianças de sete a doze anos, as condições de equilibrada formação e desenvolvimento da personalidade”. No entanto, na a Lei de Diretrizes de Bases – Lei nº 4.024/1961 de 20/12/1961, o ensino primário passa a ter um mínimo de quatro séries anuais podendo a duração ser ampliada até seis anos pelo sistema de ensino. Já no decênio de 1960 até 1971, as primeiras séries escolares eram chamadas de ensino primário. Mas, com a aprovação da Lei nº 5.692, Lei de Diretrizes de Bases, de 11 de agosto de 1971, o ensino primário passa a ser chamado 1ª a 4ª séries do 1º grau. De acordo com essa Lei, o ensino de 1º grau tinha a duração de oito anos letivos, sendo dividido em 1ª a 4ª séries e 5ª a 8ª séries.

Dessa forma, considera-se relevante tratar da aritmética na Capital Federal nos decênios 1960-1980 o que impõe dizer que, primeiramente, as décadas de 60 e 70 foram o período

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auge da disseminação do Movimento da Matemática Moderna, em que, segundo Búrigo (1990, p. 258), o discurso dos modernistas pregava a valorização da Matemática e sua nova adequação às novas necessidades sociais.

De acordo com Salvador (2012, p.41),

Foi só em 1964 que o primeiro curso para professores primários foi oferecido e em 1965, através do texto Introdução da matemática moderna na escola

primária, de Manhucia e Ana Franchi, os professores da escola primária tiveram

contato com o Movimento. Em 1967, as duas, juntamente com Lucília Bechara, escreveram um livro didático para o ensino de matemática para o nível primário.

É preciso, portanto, investigar quando e como professores do Distrito Federal (DF) tomaram conhecimento e se apropriaram dessas discussões, ou seja, como se deu o contexto de sustentação que, segundo Valente (2011), “A expressão contextos de sustentação sintetiza as formas diferenciadas como uma dada teoria é lida por seus múltiplos usuários” (p. 01).

Além disso, não se pode esquecer que ocorreu no Brasil o Programa de Assistência Brasileiro-Americana ao Ensino Elementar – PABAEE. Esse curso foi um acordo entre o Brasil e os Estados Unidos, visando à constituição de programa de assistência ao ensino primário em 1956.

Esse acordo ocorreu por considerar que a situação do ensino primário brasileiro nos anos 1950 apresentava altos índices de evasão e repetência. Havia muitos professores leigos, que contribuíam para a baixa qualificação do corpo docente. E para melhorar os índices de escolarização primária a proposta mais adequada era investir maciçamente na formação do professor primário. (BORBA, 2003).

De acordo com Porto o PABAEE tinha os seguintes objetivos.

Aperfeiçoar grupos de professores para escolas normais do Brasil, e orientadoras do ensino primário; produzir ou adaptar materiais didáticos para serem usados no treinamento de professores, e distribuí-los; selecionar professôres competentes a fim de enviá-los aos Estados Unidos para um curso em educação elementar. (PORTO, 2003, p.165)

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teve influência do Movimento da Matemática Moderna? O que se ensinava de aritmética e como os professores se apropriaram desse conteúdo? Como a aritmética aparece nos documentos oficiais do sistema público de ensino do Distrito Federal? Para tratar do tema em questão, tem-se como objetivo geral analisar, na perspectiva da história cultural, vestígios de como se processava o ensino de aritmética nas séries iniciais da educação básica nos decênios de 1960/1980 nas escolas públicas do Distrito Federal.

Como objetivos específicos, pretende-se analisar o significado de aritmética expresso em documentos do DF; identificar vestígios da proposta do PABAEE na aritmética; identificar vestígios da Matemática Moderna na aritmética no ensino de primeiras letras do DF; identificar o que se ensinava de aritmética e como os professores do DF se apropriaram desse conteúdo e analisar a aritmética expressa nos discursos de professores que lecionavam nas escolas das séries iniciais nos decênios de 1960 a 1980 no DF.

Breve histórico do ensino primário no Brasil

A primeira Lei a tratar do ensino primário foi o Decreto Imperial de 15 de outubro de 1827 que trazia o seu art. 1º afirmando que: “Em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos, existirão as escolas de primeiras letras que forem necessárias”. (BRASIL, 1827, p.71). O Art. 6º detalhava o que deveria ser ensinado.

Os professores ensinarão a ler, escrever, as quatro operações de arithmética, prática de quebrados, decimaes e proporções, as noções mais geraes de geometria prática, a grammática de língua nacional, e os princípios de moral christã e da doutrina da religião cathólica e apostólica romana, proporcionados à comprehensão dos meninos; preferindo para as leituras a Constituição do Império e a História do Brazil. (BRASIL, 1827, p.72).

Naquela época, havia uma distinção no ensino dos meninos e das meninas. Por isso, essa Lei previa no seu artigo 12º que a educação das meninas deveria limitar-se na instrução da aritmética, ao ensino das quatro operações, excluía-se a geometria e no lugar desta deveriam ensinar “prendas domésticas”. Essa distinção representava a submissão que as mulheres enfrentavam naquela época. A maioria da população era analfabeta. Era uma pequena parte que recebia educação. Desse modo, o ensino primário não representava os anseios do Estado conforme afirma Costa

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A falta de professores qualificados, de remuneração adequada e de fiscalização dificultou a incorporação deste segmento escolar. (COSTA, 2010, p. 63).

Em 1834, o ensino primário passou a ser responsabilidade das províncias, mas as políticas educacionais continuaram voltadas aos interesses da elite. Em 1854, a Reforma Couto Ferraz (Decreto n. 1.331 – A/ 17/02/1854) trouxe a obrigatoriedade do ensino elementar e do princípio da gratuidade, a previsão de criação de classes para adultos, mas continuava sendo ofertado para poucos e era proibido o acesso dos escravos ao ensino público.

Por meio do Decreto nº 7.247, de 19 de abril de 1879, houve uma grande reforma no ensino primário, secundário e superior. Essa reforma teve influência dos princípios da Revolução Francesa. Ficou estabelecida a total liberdade no ensino primário, secundário e superior. Ficou estabelecido, ainda, a obrigatoriedade do ensino para os meninos e meninas dos 7 aos 14 anos de idade, ficando desobrigados aqueles que seus pais ou tutores ou protetores provassem que recebiam instrução adequada em escolas particulares ou em suas próprias casas. Foi nessa reforma que houve a implantação dos jardins da infância para a primeira educação dos meninos e meninas de 3 a 7 anos de idade e do ensino primário para adultos. Essa reforma foi implementada por Carlos Leôncio de Carvalho que foi ministro e secretário de estado dos negócios do Império e realizada mediante a expedição de um decreto executivo.

Esse decreto, quando enviado para a aprovação na Câmara, teve como relator Rui Barbosa e recebeu o título de Reforma do ensino primário e várias instruções complementares da instrução pública.

Nessa reforma, o ensino primário passou a ser obrigatório e laico, com oito anos de duração e abrangendo três cursos: o elementar e o médio, cada um com dois anos de duração e o superior, com quatro anos. Um elemento importante foi a indicação do método intuitivo.

Mas foi somente com a Lei Orgânica do Ensino Primário – Decreto-lei n. 8.529 de 02/01/1946 – que o governo federal concretizou suas ações dando diretrizes nacionais para esse nível de ensino e instituiu o ensino gratuito e obrigatório, definindo como finalidades do ensino primário, conforme o artigo 1º:

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formação e desenvolvimento da personalidade. (c) Elevar o nível dos conhecimentos úteis à vida na família, à defesa da saúde e à iniciação ao trabalho (BRASIL, 1946, p.1).

A aritmética no ensino primário

Desde os tempos antigos, a aritmética faz parte da cultura. As pesquisas da Educação Matemática, sobretudo as pesquisas na perspectiva da História Cultural, no Brasil, têm contribuído para a compreensão da aritmética em diferentes tempos históricos.

Nesse sentido, Pais (2012) descreveu aspectos históricos do ensino de aritmética em programas do ensino primário do século XIX. Para tanto, discutiu o regulamento que foi aprovado em 1890 para a instrução primária e secundária do Distrito Federal, pelo Decreto nº 981, de 8 de novembro de 1890, intitulada como Reforma Benjamim Constant e que trazia as seguintes orientações:

As escolas primárias do primeiro grau foram estruturadas em três cursos de dois anos cada: o elementar, para os alunos de 7 a 9 anos, o médio, para alunos de 9 a 11 anos e o superior, para alunos de 11 a 3 anos. Após completar esses anos da escola primária, o aluno recebia um certificado que lhes dava o direito de ingressar no ensino secundário ou normal, sem necessariamente cursar os três anos das escolas do 2º grau, pois o objetivo desta era a preparação para o trabalho. (PAIS, 2012, p. 45).

Pais (2012) reproduz a íntegra dos programas de ensino de aritmética para as escolas primárias do século XIX

1ª classe do curso elementar: Contar primeiramente pelos processos espontâneos, empregando os dedos, riscas, pedrinhas (cálculos), grãos, contas, etc., e depois os rosários, o contador mecânico, o crivo numeral e os ábacos, usando, entretanto, a terminologia própria da nomenclatura sistemática. Conhecimento prático das unidades fracionárias: metade, terça parte, quarta parte etc., é comparação dessas unidades entre si. Escrever os algarismos. Exercícios práticos de somar, diminuir e multiplicar os números simples. Exercício mental de problemas fáceis. Conhecimento prático do metro e sua divisão em décimos e centésimos. Ler e escrever qualquer número de três algarismos. Conhecimento prático da moeda- papel até notas de 100$000.

2ª classe do curso elementar: Ler e escrever números compostos até seis algarismos, empregando os processos primitivos e os sistemáticos. Ideia clara da unidade, dezena e centena de milhar. Valor das letras maiúsculas usadas como algarismos romanos. Exercícios das quatro operações sempre s o ponto de vista concreto. Cálculo mental. Termos da fração e sua significação. Ler e escrever frações decimais até cinco algarismos. Da semana; do mês; do ano; do dia em horas e minutos. Conhecimento prático das moedas nacionais. Medidas métricas. 1ª classe do curso médio: Revisão do programa anterior. Ler e escrever números compostos de mais de seis algarismos. Sistema de numeração romanos. Conhecimentos do quadrado, cubo, raiz quadrada e raiz cúbica. Sistema métrico completo. Conhecimento prático das principais moedas estrangeiras. Problemas concretos. Cálculo mental.

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1ª classe do curso primário superior: Revisão da matéria estudada; operações sobre frações ordinárias e decimais. Números primos; crivo de Erastótenes. Principais caracteres [critérios] da divisibilidade dos números escritos no sistema decimal. Princípios da decomposição dos números em seus fatores primos. Máximo comum divisor, empregando em primeiro lugar as linhas retas. Problemas. Cálculo mental.

2ª classe do curso primário superior: Noções sobre os números complexos e suas operações. Regra de três e suas aplicações, pelo método de redução à unidade. Revisão geral. Problemas. Cálculo mental. Noções de escrituração mercantil. [Grifos do autor] (PAIS, 2012, p. 51).

Assim como a reforma implementada por Carlos Leôncio de Carvalho, a Reforma Benjamim Constant também defendeu a ideia de o professor empregar constantemente o método intuitivo nos seis anos da escola do 1º grau e de que o livro escolar seria apenas um recurso auxiliar. Essa recomendação era para acompanhar, por meio de determinação legal, o movimento internacional de modernização pedagógica da época, visando superar a excessiva ênfase na memorização, na repetição e na retórica, (PAIS, 2012).

O método intuitivo foi criado com o objetivo de resolver o problema da ineficiência do ensino na sua inadequação às exigências sociais decorrentes da revolução industrial que se processara entre o final do século XVIII e meados do século XIX. Para explicar esse método foram elaborados manuais. O mais famoso desses manuais foi o do americano Norman Allison Calkins, denominado Primeiras lições de coisas. Sua primeira edição foi publicada em 1861, sendo reformulado e ampliado em 1870. Foi traduzido por Rui Barbosa, em 1881, e publicado no Brasil em 1886. (SAVIANI, 2007).

Segundo Lourenço Filho (1954) apud Duarte (2012), Rui Barbosa entendia o método intuitivo como uma forma de

Educar a vista, o ouvido, o olfato; habituar os sentidos a se exercerem naturalmente sem esforço e com eficácia; ensiná-los a apreenderem os fenômenos que se passam ao redor de nós, a fixarem na mente a imagem exata das coisas, a noção precisa dos fatos. (LOURENÇO FILHO, 1954, p.121 apud DUARTE (2012, p.5).

De acordo com Duarte “Tratava-se, portanto, de um método que permitia aos alunos ver, sentir e observar objetos, utilizando-se de variados materiais didáticos os quais incluíam maior quantidade de figuras, desenhos e cores”. (DUARTE, 2012, p.5).

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documento, no que se refere às matérias que compunham o Programa de Ensino, o referido documento trazia no seu artigo 21 a relação delas, especificando quais integrariam o programa e constava brevemente o que deveria ser ensinado.

No que se refere à aritmética, objeto do presente estudo, o Regulamento prescreve que ao final do Primeiro Grau, que correspondia aos dois primeiros anos do que posteriormente passou a ser denominado Ensino Primário, os alunos deveriam saber operacionalizar com as quatro operações (adição, subtração, multiplicação e divisão) com quaisquer números. (CLARAS E PINTO, 2013, p.2).

Assim como o Distrito Federal e o Paraná, os demais estados brasileiros elaboraram seus Regulamentos que orientaram como seria a Instrução Pública. É preciso, portanto, analisar esses documentos e detectar quais eram as recomendações acerca do ensino da Aritmética no ensino primário daquela época.

Base teórico-metodológica

A pesquisa buscará aporte teórico-metodológico na História Cultural que, segundo Chartier,

Esta história deve ser entendida como o estudo dos processos com os quais se constrói um sentido. Rompendo com a antiga ideia que dotava os textos e as obras de um sentido intrínseco, absoluto, único – o qual a crítica tinha a obrigação de identificar –, dirige-se às práticas que, pluralmente, contraditoriamente, dão significado ao mundo. (CHARTIER, 2002 p. 27).

Como se pretende analisar, na perspectiva da História Cultural, vestígios de como se processava o ensino de aritmética no ensino elementar nos decênios de 1960-1980 nas escolas públicas do Distrito Federal, entende-se que a história cultural traz subsídios para essa pesquisa, pois mostra a importância de identificar o modo como em diferentes lugares e momentos uma realidade social é construída, pensada e dada a ler, (CHARTIER, 2002). Com o intuito de responder aos questionamentos desta pesquisa, busca-se fundamentos nos conceitos de apropriação de Roger Chartier que afirma “Apropriação [...] tem por objetivo uma história social das interpretações, remetidas para as suas determinações fundamentais (que são sociais, institucionais, culturais) e inscritas nas práticas específicas que produzem”. (CHARTIER, p. 26).

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(orientações curriculares, portarias, decretos, pareceres do Conselho Nacional de Educação, pareceres do Conselho de Educação do Distrito Federal), recorrer-se-á aos conceitos de tática e estratégia de Michel de Certeau

Essas táticas manifestam igualmente a que ponto a inteligência é indissociável dos combates e dos prazeres cotidianos que articula, ao passo que as estratégias escondem sob cálculos a sua relação com o poder que os sustenta, guardado pelo lugar próprio da instituição. (CERTEAU, 2012, p. 46-47)

Esta pesquisa também busca fundamentação em Julia (2001) no que denomina de Cultura Escolar

Para ser breve, poder-se-ia descrever a cultura escolar como um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses conhecimentos e a incorporação desses comportamentos. (JULIA, 2001, p.10).

Para esse autor, ao se falar em Cultura Escolar, três eixos devem ser levados em conta i) interessar-se pelas normas e pelas finalidades que regem a escola; ii) avaliar o papel desempenhado pela profissionalização do trabalho de educador e iii) interessar-se pela análise dos conteúdos ensinados e das práticas escolares.

Para detectar a permanência da Matemática Moderna até os anos 80, uma das categorias de análise considerada é o conceito de contextos de sustentação entendido como aqueles que agregam as diversas maneiras em que uma teoria é lida por seus usuários, os quais possibilitam leituras do passado de forma a construir uma nova perspectiva de trabalho prático e/ou teórico, que procura superar uma situação já estabelecida (VALENTE, 2011). Faz-se necessário, portanto, conhecer o contexto local no qual o objeto de pesquisa está situado e a realidade política, social e econômica da época. Então, emerge o seguinte desafio: Brasília, apesar de ser uma cidade nova, não tem os documentos referentes à educação disponíveis em espaços públicos, sendo preciso procurá-los em arquivos pessoais ou em outros lugares como, sebos, bibliotecas, instituições privadas de educação.

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De fato, não é tarefa fácil encontrar o que foi produzido nas décadas anteriores. França (2012) problematiza as dificuldades por ela vivenciada no processo de produção de fontes,

Pude vivenciar a dificuldade dessa etapa que exigiu, por um lado, grande dose de paciência, em razão da dispersão dos poucos acervos com material catalogado para consulta e, por outro lado, desprendimento para descartar as que não estavam ligadas ao ensino da Matemática. (FRANÇA, 2012, p. 24).

Valente (2005) coloca as fontes de pesquisa como fundamento para a escrita da história de um saber ou de uma disciplina escolar. A intenção é, portanto, partir para um diálogo entre fontes escritas e entrevistas semiestruturadas com professores que atuaram no ensino elementar nas escolas públicas do DF, nos decênios de 1960 a 1980. Segundo Triviños (1987, p. 146):

Podemos entender por entrevista semiestruturada, em geral, aquela que parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses, que interessam à pesquisa e que, em seguida, oferecem amplo campo de interrogativas, frutos de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as respostas do informante. Dessa maneira, o informante, seguindo espontaneamente a linha de seu pensamento e de suas experiências dentro do foco principal colocado pelo investigador, começa a participar na elaboração do conteúdo da pesquisa.

Para as fontes escritas, buscar-se-á informações sobre aritmética em documentos como: orientações curriculares, leis, portarias, decretos, pareceres do Conselho Nacional de Educação, pareceres do Conselho de Educação do Distrito Federal, diários de classe, provas de alunos, cadernos de planejamentos de professores, entre outros. Como orienta Valente:

Ao lado de toda normatização oficial que regula o funcionamento das escolas, como leis, decretos, portarias, etc. há toda uma série de produções da Cultura Escolar: livros didáticos, cadernos de alunos, de professores, diários de classe, provas etc. São essas as fontes de pesquisa que devem ser encontradas, organizadas e inventariadas a fim de estudarmos a trajetória da Matemática Escolar. (2005, p. 31).

Para proceder a análise dessas informações, será utilizada a análise de documentos. Segundo a Associação de Arquivistas Brasileiros (AAB, 1990, apud SÁ-SILVA et al, 2009, p. 8), "documento define-se como qualquer informação fixada em um suporte".

Considerações finais

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Capital Federal nos decênios 1960-1980, pois as décadas de 60 e 70 são o período auge de disseminação do Movimento da Matemática Moderna, em que o discurso dos modernistas pregava a valorização da Matemática e sua nova adequação às novas necessidades sociais. É preciso, portanto, investigar quando e como os professores do Distrito Federal (DF) tomaram conhecimento e se apropriaram dessas discussões.

Referências

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ARRUDA, Joseane Pinto de. Histórias e Práticas de um ensino na escola primária: marcas e movimentos da Matemática Moderna. 2011. 312 f. Tese (Doutorado do Programa de Pós-graduação em Educação Científica e Tecnológica). Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2011.

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Referências

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