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NarrativaAutobiografica

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Academic year: 2021

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RVCC - GRUPO L2 Cidália Ribeiro

NARRATIVA AUTOBIOGRÁFICA

O meu nome é Cidália Cristina Mendes Ribeiro, nasci dia 18 de Agosto de 1976, em Pombal, Portugal. Sou cabeleireira, actualmente desempregada.

Sou filha de Joaquim de Oliveira Ribeiro (português) e de Maria De Jesus Mendes (portuguesa). Tenho três irmãs: Anabela, Brigitte, e Sylvie.

Em jovem, o meu pai emigrou com os irmãos mais velhos para França. Naquela altura era de assalto, sem “papéis”. Passavam as fronteiras às escondidas. Quando voltou a Portugal conheceu a minha mãe, o problema é que os pais da minha mãe não queriam, que ela namorasse com ele, por ele ser de família pobre. Então fugiram os dois para Lisboa.

A minha mãe engravidou com dezanove anos e eu nasci. Mas os tempos eram difíceis e regressaram à aldeia para a casa dos meus avós paternos. Aquela casa era pequena demais para mais três, e a solução foi o meu pai voltar a emigrar para França. Foi juntando um dinheirito e construiu uma casita modesta com uma cozinha e um quarto. Passados dois anos, nasceu a minha irmã Anabela. Com mais um bebé para sustentar, decidiram emigrar com as filhas para França e começar uma nova vida.

Quando emigraram, eu tinha três anos e meio e a minha irmã Anabela um ano e meio. O meu pai já lá tinha alguns conhecimentos, os irmãos dele e casa onde ficarmos. Fomos viver para uma pequena vila chamada Neuville Aux Bois que se situa no departamento de Loiret, na região centro de França. Fica a 20 km de Orleães e a 100 km de Paris. No início, fomos para uma casa de renda da Madame Portault, mas como era pequena demais, os meus pais mudaram-se para uma velha casa de quinta alugada em Roulin, uma aldeia, que ficava um pouco mais longe da vila de Neuville Aux Bois. Tinha eu cinco anos, quando nasceu a minha terceira irmã, Brigitte.

Naquele tempo a minha mãe ainda não tinha carta de condução. Mas tínhamos o peixeiro e o padeiro que passavam à porta. Para o leite havia pertinho uma ordenha onde

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nós íamos. Para irmos para a escola, era a nossa vizinha, que também tinha dois filhos, que nos levava de boleia no carro. O meu pai não o podia fazer, porque saía muito cedo de manhã para o trabalho.

Naquela casa, os meus pais sempre tiveram quintal, animais (galinhas, coelhos, um porco) e também um cão chamado Mabrouk, um pastor alemão. Lembro-me de um lago em frente da casa, do outro lado da estrada, gostava de ir para lá ver as galinhas de água, as rãs e atirar pedras para a água.

Naquela aldeia havia muitas quintas, algumas delas, propriedade de pessoas que viviam em Paris, e que só as habitavam nas férias ou nos fins-de-semana. O meu pai e a minha mãe, para ganharem mais algum dinheiro, cuidavam de quatro dessas casas, ele fazia jardinagem e bricolage e a minha mãe limpezas.

Naquelas quintas havia muitas árvores de fruto. Não nos faltava fruta, como pêssegos, maçãs, peras, ameixas, morangos, framboesas. Tenho a certeza absoluta que tínhamos melhor alimentação e mais equilibrada, do que nos dias de hoje. Recordo as cerejas que trazíamos para casa, cestos e cestos delas, era cada barrigada! De legumes também havia muita coisa, desde feijão a couves, endívias e alcachofras, ervilhas e favas, tudo cultivado pelos meus pais nos quintais daqueles parisienses, para nós e para os proprietários. Os franceses fazem muitas conservas de frutas, legumes, e patés, até nos dias de hoje, os portugueses já não têm tanto esse hábito. Os meus pais sempre nos habituaram a comer de tudo e quando chegava a hora de comer, o tacho ia para cima da mesa e todos comíamos do que era servido. Nunca a minha mãe cozinhou comida à parte, porque esta ou aquela não gostava disto ou daquilo. Quando alguma de nós não gostava, ela simplesmente dizia: Deixas o que não gostas na borda do prato e comes o resto! É o exemplo que eu dou hoje à minha filha e funciona. Ela come de tudo. Acho que todos os pais deveriam fazer o mesmo, de certeza que as crianças teriam melhor alimentação. Há certos pais que, se os filhos não gostam de legumes ou peixe, preparam-lhes uma febra com batatas fritas. Assim, é que eles se vão habituando a comer unicamente o que eles gostam, em vez de fazerem uma alimentação variada e saudável. É verdade, que hoje em dia, o marido e a mulher que trabalham, têm uma vida mais agitada, stressada, não há tempo para preparar grandes refeições. O mercado dos alimentos está caro para a maioria dos salários e reformas dos portugueses. E também ajuda a que as pessoas, quando fazem as compras, se orientem para um tipo de produtos mais baratos, como os enlatados, os pratos já confeccionados, e os pratos congelados. Cinco ou dez minutos no microondas e já está!

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Ao pequeno-almoço, a refeição mais importante do dia, os pais deveriam substituir alguns tipos de cereais (que têm imenso açúcar, absorvido rapidamente pelo organismo), por um pão de mistura de cereais, que dá energia ao organismo por mais tempo, por causa dos açúcares mais complexos e de absorção mais lenta, uma fruta natural, iogurtes ou compota de fruta. Nos lanches das crianças, também não se opta pelos nutrientes indispensáveis ao seu crescimento. Em vez de levarem um pão com manteiga ou doce, queijo ou fiambre, um pacote de leite ou iogurte e uma peça de fruta, não, os pais dão-lhes dinheiro e vão na hora do intervalo para as cafetarias comprar pastéis de nata, tostas, barras de chocolate, bolachas, doçarias, batatas fritas, bolos, refrigerantes com gás, sumos empacotados, enfim, tudo aquilo menos saudável.

Acho que havia de existir nas escolas mais oferta de alimentos mais saudáveis, como por exemplo, a fruta, sumos de frutas e batidos. Para comer, poderiam oferecer mais pão torrado com manteiga, com doce ou queijo fresco. E nos refeitórios das escolas propor nas ementas mais cozidos e grelhados, e menos fritos, guisados e comidas gordas cozinhadas à base de molhos, refogados e natas.

Voltando àquela aldeia, havia muitas florestas em redor. Dávamos muitos passeios a pé e de bicicleta, apanhávamos cogumelos, morangos silvestres, que eram tão bons! Também colhíamos flores do campo, muitas castanhas, pois em França, nas florestas há muitos castanheiros. Às vezes, com sorte, víamos porcos-bravos, ou veados com os seus pequenitos, era tão giro!

Foi também quando morávamos nesta casa, que o meu pai me comprou a minha primeira bicicleta, era de cor branca e foi ele que me ensinou a andar nela, devia ter os meus 6/7 anos. Quando chovia e os caminhos de terra estavam molhados, eu não queria deixar a bicicleta, os sapatos cheios de terra, os guarda-lamas cheios de terra, que já nem as rodas rodavam, então tinha que puxá-la. Chegava toda enervada e chorosa a casa. Que melancólica estas lembranças me deixam…

Em 1983, tinha eu sete anos, quando nasceu a minha quarta irmã Sylvie. Fui com as minhas outras três irmãs e o meu pai à maternidade de Orleães ver a minha mãe e a bebé. Nunca me esqueci de ter perguntado à minha mãe por onde é que o bebé tinha nascido, e de ela me responder: vês aqui o braço da mamã com este dói-dói (que era onde tinha levado o soro), foi por aqui! Claro que eu acreditei, mas por causa da mentalidade e educação dos meus pais, muitos temas eram tabu para eles, fui inocente em muitos aspectos até muito tarde! À minha filha, com cinco anos, já lhe tinha

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explicado como nascem os bebés. Qual é o mal de as crianças serem respondidas às suas questões? Sabedoras da verdade, podem vir a gerir melhor os seus afectos.

A minha mãe sempre se escondeu de nós, nunca soube explicar as coisas claramente e mesmo o meu pai, quando eram abordadas questões sobre sexualidade, era muito ambíguo, explicando as coisas com palavras que até me deixavam assustada. Por isso, nos balneários da escola, eu também me escondia das minhas amigas.. Eu não quero ser assim com a minha filha, quero ser a confidente dela e que não haja segredos sobre coisas da nossa natureza e desenvolvimento.

Depois do nascimento da minha quarta irmã, já não vivemos muito mais tempo naquela aldeia, porque, com quatro filhos em idade escolar, e longe da vila, a Segurança Social achou por bem que nós nos mudassemos para a vila para estarmos mais perto da escola, dos correios, da praça para irmos às compras, do médico ,etc … Então fomos para um apartamento T3.

Naquela altura, em França, a Segurança Social trabalhava e apoiava as famílias de uma forma bem diferente da nossa cá de Portugal. Os pais recebiam um abono de família mensal por cada criança que tivessem. Essa prestação era atribuída até os filhos andarem na escola, se bem que aos dezoito anos a prestação por esse jovem era reduzida, mas continuava, desde que os pais fizessem prova que esse filho continuava os estudos. Em Agosto, os meus pais recebiam um dinheiro extra acumulado com o abono de família, destinado à compra do material escolar. No Natal também recebiam essa mesma quantia extra e davam uma ajuda no pagamento da habitação.

Cheguei a andar na pré-escola, um ano ou dois. Dessa escolinha lembro-me daquele “murito”, onde gostava de subir e andar, do recreio, de gostar de trocar de sapatos com as minhas amiguitas sobretudo sandálias e tamancos, eu adorava aquele tipo de calçado. Lembro-me também de algumas actividades que fazíamos na sala, com tintas e moldes de batatas cortadas em forma de estrela, coração, formas geométricas, eram assim os nossos carimbos.

Depois fui para a primária, aos cinco anos. Em França existe o CP (Cours

Préparatoire, equivalente ao 1º ano do primeiro ciclo), o CE1 (Cours Élémentaire 1,

equivalente ao 2º ano do primeiro ciclo), CE2 (equivalente ao 3º ano do primeiro ciclo), CM1 (Cours Moyen 1, equivalente ao 4º ano do primeiro ciclo), e CM2 (Cours Moyen 2, equivalente ao 5º ano do 2º ciclo).

A minha primeira professora chamava-se Madame Jeanot, gostava dela e aí aprendi as primeiras letras, os primeiros números, canções, disciplina, regras.

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Lembro-me daquelas secretárias duplas em madeira, da minha priLembro-meira mochila em verniz de cor azul, e laranja, das actividades de pintura, do pinheiro de Natal que decorávamos, das ardósias e dos cadernos onde escrevíamos. Quando a professora batia uma vez as palmas, escrevíamos na ardósia, quando batia duas vezes as palmas, tínhamos que levantar a ardósia bem alto para ela ver o que tínhamos escrito. Naquele tempo é que se poupava papel. Em França, na primária, os professores distribuíam cadernos, lápis e papel, as tintas, os pincéis para todos os alunos e quando se acabavam era só dizer ao professor que os substituía.

Os livros escolares da primária até ao 9º ano, era a escola que nos emprestava. No início do ano, os professores entregavam-nos os livros, no fim do ano lectivo tínhamos que os entregar impecáveis como os tínhamos recebido no início, senão os pais tinham que os pagar, e assim passavam de uns alunos para outros. Hoje, não sei se ainda continua a funcionar assim. As editoras não ganhavam tanto dinheiro, mas não se abatiam tantas árvores, nem se destruía tanta floresta, era mais ecológico, e os pais poupavam mais dinheiro. Aqui em Portugal é completamento diferente, os pais gastam imenso dinheiro com material escolar, a minha filha ainda só está no primeiro ano do 1ºCiclo…o pior está para vir! Os livros escolares em Portugal são caríssimos, não entendo como os governos não têm tomado medidas para modificar esta situação. Não dá para decidirmos ter muitos filhos.

Falando da minha querida professora de CP, tenho dela a recordação inesquecível de quando íamos às aulas de natação. Em França tínhamos aulas de natação nos cinco anos de primária, com um professor de natação e o nosso professor/a de escola. Tenho pena que o sistema educativo português não proporcione às crianças em idade escolar este desporto que é considerado uma das actividades físicas mais completas que existem, e ainda é a mais indicada por médicos para pessoas de todas as idades, principalmente crianças e idosos. Ela é recomendada pelos vários benefícios, principalmente físicos, que traz aos praticantes regulares, e preferida por aqueles que encontram no meio aquático o melhor ambiente para relaxar e cuidar da saúde integral. A natação é um exercício bastante eficaz, pois coloca em jogo todos os principais músculos do corpo e, consequentemente, proporciona um efeito total de condicionamento, maior do que muitos outros desportos. Entre os diversos efeitos positivos que a actividade regular da natação traz para um praticante, podemos destacar o aumento da capacidade respiratória, com consequente aumento da sua resistência (fôlego), prevenindo e actuando em problemas de asma e bronquite; uma maior

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eficiência na correcção e manutenção da postura, visto que na posição horizontal a nossa coluna está praticamente isenta da acção da gravidade. A natação ainda contribui na dilatação das paredes do miocárdio e um aumento do volume do coração; torna as artérias mais flexíveis, possibilitando uma melhor circulação sanguínea; diminui a frequência cardíaca basal (de repouso); actua no sistema nervoso, como um elemento auto-relaxante e auxilia na coordenação fina e coordenação global.

Sempre gostei de piscina, mas tinha a fobia de me pôr de costas na água para nadar. Tinha um medo horrível de ir ao fundo e de me afogar. Até que um dia, a minha professora fartou-se do meu medo, foi para a água, agarrou-me, colocou-me de costas, olhou para mim e disse: Não tenhas medo, eu seguro-te, vês que não é complicado! E foi naquele dia que eu comecei a perder o medo de me virar de costas na água. Hoje o meu desporto preferido é a natação que pratico semanalmente.

No recreio da primária, adorava jogar com berlindes, cheguei a ter uma saca de pano cheia e não tinha receio de jogar com os rapazes. Hoje reconheço que era um pouco batoteira. Quando jogava lá em casa com as minhas irmãs já a minha mãe dizia que eu o era. Também lembro algumas outras brincadeiras de criança lá no recreio, como “a macaca”, e outras das quais não sei traduzir o nome “je boi”, “4 coins”, “enfilons l´aiguille” “chat perché”…

Durante os meus anos escolares, sempre convivi com colegas de várias nacionalidades (turcos, marroquinos, argelinos, paquistaneses, chineses, franceses.). Acho que a diversidade étnica na escola promove harmonia, tolerância nas atitudes das crianças para com etnias diferentes e no conhecimento dos outros para se darem todos bem. Na minha opinião, tínhamos menos problemas de relacionamento uns com os outros, e menos preconceitos do que as crianças que frequentam escolas de composição mais homogénea. Aliás, ainda hoje, guardo o contacto com uma das minhas melhores amigas que é marroquina e ainda vive em França.

Quando íamos para o recreio, os professores também iam. Estavam ali todos a conversar, mas atentos às nossas brincadeiras. Os professores que tive, durante os anos de primária, eram sempre os mesmos, a Madame Jeanot, Monsieur Dufour, Madame Pointreau, Madame Lechroenec, Monsieur Archenault, Monsieur Dafy, também havia uma outra, da qual não recordo o nome, que tinha uma turma especial com alunos com dificuldades de aprendizagem.

Uma outra professora que me deixou boas recordações foi a Madame Pointreau, que eu tive no ano de CM1, com ela fizemos uma viagem de estudo de três semanas à

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neve em Combloux, que se situa geograficamente na Haute Savoie em França a 30 km de Chamonix, 70 km de Annecy, e 50 km de Genebra. Aquelas três semanas foram espectaculares, fizemos esqui, andámos a cavalo e aprendemos a cuidar deles, visitámos alguns lugares, estudámos a flora e a fauna das montanhas, foi magnífico.

Também me lembro dessa professora ter dado à minha mãe, sacos de roupas que eram dos filhos dela, e nós ficávamos super felizes! Acho que naquele tempo as pessoas ajudavam-se mais umas às outras e eram gratas. Hoje, penso que é estranho para as pessoas oferecerem coisas, talvez porque sentem um possível constrangimento ou vergonha por parte de quem precisa. Talvez por isso remetemos aquilo que podemos dispensar para instituições de solidariedade como centros sociais e casas de acolhimento, ou instituições humanitárias como a legião da boa vontade, a caritas, a cruz vermelha ou a santa casa da misericórdia.

Há seis anos, quando a minha filha nasceu, fui ao sótão da casa dos meus pais buscar quase toda a roupa que tinha sido da minha sobrinha. A minha avó, sempre disse que no poupar é que está o ganho e que o dinheiro não é de quem o ganha, é de quem o poupa!

Outro professor que não esqueci, é o Monsieur Archenault do ano de CE2. Uma vez, tinha um recado dele para os meus pais assinarem, só que era uma informação de mau comportamento, e eu tive a má ideia de falsificar a assinatura deles. O meu pai descobriu, deu-me uma valente coça que ainda hoje não esqueci!

Com a professora Madame Lechroenec, nunca me esqueci da viagem de fim de ano com a turma toda, uma semana a Clermont Ferrand em França, fica na Auvergne. Fomos estudar os vulcões, um deles, o famoso e mais alto, Puy de Sancy com 1886 metros. Eram totalmente diferentes do que eu imaginava, nunca tinha estado dentro de nenhum.

Durante os anos de primária, também tive uns dois ou três anos de Português. Era destinado a filhos de emigrantes portugueses, não era obrigatório, acontecia depois das aulas, uma vez por semana. A professora chamava-se Ana Peixoto e o que sei hoje de português, foi com ela que aprendi, porque cá em Portugal nunca andei na escola. Gostei muito dela, porque estava sempre a elogiar-me e isso entusiasmava-me ainda mais para ser a melhor da turma!

Com onze anos, entrei na catequese, e andei lá três anos. Em 21 de Junho de 1987, fiz a primeira comunhão, a 29 de Maio de1988, a profissão de fé, e o crisma em 20 de Maio de 1989. Gostei muito de andar na catequese, gostei das catequistas, do

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padre que era muito divertido, apesar da idade que tinha, das freiras que às vezes também nos davam catequese. Aquilo era quase uma pequena família. Quando o padre ia de férias ou ao santuário de Lurdes no sul da França, mandava sempre um postal a todos os que andavam na catequese. Ainda hoje, os tenho guardado, numa gaveta em casa dos meus pais. O que eu aprendi na catequese…As orações do Pai Nosso, Ave-maria, a história do nascimento, da vida e morte de Jesus. Gostava muito quando fazíamos representações da vida de Jesus na missa. Ao domingo gostava de ir à missa, logo na entrada da igreja estavam livros para seguirmos neles a missa. Voltávamos a colocá-los no sítio à saída. E foi assim a minha catequese, não é como aqui em Portugal onde os miúdos andam na catequese dez anos, começam aos seis anos e acabam com idade de começarem a namorar. Acho que é muito tempo. Os miúdos não querem ser padres nem freiras, para quê tanto tempo! Acho que se torna chato, eles aborrecem-se, digo isto pelos miúdos que conheço que o afirmam.

Passaram-se os anos de primária e entrei para o colégio, também em Neuville Aux Bois. No colégio fiz 4 anos, a 6ème (equivalente ao 6º ano), 5ème (equivalente ao 7º ano), 4ème (equivalente ao 8º ano), 3ème (equivalente ao 9º ano). O que nunca mais esqueci, foi a responsabilidade em ter que cumprir horários, foi terrível para me adaptar. Depois de alguns anos, a entrar para a escola às 9 horas e ser da responsabilidade da minha mãe, porque era ela que nos levava, agora entrava às 8 horas e já ia sozinha para a escola, a minha mãe já não me acordava. Chegava quase sempre em cima da hora. Um dia fui chamada a atenção pelo subdirector do colégio que me disse: Tu tens que aprender a chegar sempre, cinco ou dez minutos, antes do toque da campainha, porque um dia quando tu entrares no mundo do trabalho, o teu patrão não te vai poupar! Agora já reconheço que é bem verdade…

Na 4ème (equivalente ao 8º ano), tinha eu 15 anos, começaram a orientarem-nos para uma futura profissão, a mim, como não era assim muito boa aluna, propuseram aos meus pais que eu tirasse um curso profissional de cabeleireira, por ser a profissão pela qual eu já sentia gosto e interesse.

A aprendizagem de cabeleireira, passava por arranjar um estágio num cabeleireiro que me quisesse como aprendiz, fazia um tanto tempo no salão, e outro tanto tempo numa escola de Cabeleireiros

Com essa idade, era fácil para mim ter arranjado um local de estágio, porque só eram obrigados a pagarem-me o salário mínimo. Depois dos 16 anos, já eram obrigados

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a pagar uma percentagem a mais. Mas eu não quis entrar num curso profissional, preferi prosseguir os estudos regulares, e bem arrependida fiquei dois anos mais tarde!

Para além do Inglês, que já tínhamos desde a 6ème (6º ano), no 4ème tínhamos que escolher uma segunda língua estrangeira entre o Espanhol, Latim, ou Alemão. Eu escolhi o Espanhol, por achar um pouco parecido com o Português. Há dois anos atrás, até me deu jeito esta aprendizagem do Espanhol, quando fui passar uns dias a Espanha, ainda me lembrava de algumas coisas. Continuo a achar que falam rápido de mais!

Também no ano de 4ème (8º ano), a turma toda foi desafiada a fazer um estágio de uma semana numa empresa à escolha, para relatarmos em aula, as nossas impressões relativamente ao mundo do trabalho. Eu escolhi um salão de cabeleireiro, porque era a profissão pela qual, eu ainda tinha o “bichinho”.

Encontrei um salão de cabeleireiros em Phitiviers, que ficava a uns 30 quilómetros de Neuville Aux Bois onde morávamos. O salão tinha o nome de “Ile de beauté coiffure”. Precisei que os meus pais me comprassem algumas roupas, porque naquele salão todos os dias os empregados conjugavam as cores das roupas, com o branco no Verão, e com o preto no Inverno (um dia era rosa e branco, outro dia laranja e branco, etc.) Na semana que lá estive, aprendi a pôr toalhas a lavar e a secar nas máquinas, dobrá-las, arrumá-las, varria cabelos, aprendi que se tem que falar educadamente para os clientes, a limpar bigoudis, ajudar o cliente a despir o casaco e a pô-lo no cabide, a lavar cabeças, quando o cliente não se importasse que fosse executado por um estagiário, enfim, a ter uma postura e atitude correcta no local de trabalho. Ainda recebi algumas gorjetas, e fui penteada de graça. Nunca esqueci os patrões daquele salão, Dani & Luc Travert.

No último ano de colégio 3ème (9º ano), tínhamos que fazer um exame, o Brevet, que era mais ao menos, uma compilação das matérias dos dois últimos anos. Para os que falhavam, havia uma outra oportunidade, fazer um outro exame, o CFG (certificado de formação geral). Os professores diziam, que era bom concluir com sucesso, um destes exames, para o nosso futuro profissional. Depois não quis mais continuar a estudar, preferi orientar-me para a profissão de cabeleireiro, e com a ajuda dos meus professores e o acordo dos meus pais, preenchi os papéis para entrar num liceu profissional de cabeleireiro em Blois, mas depois das férias grandes de Agosto, os meus pais “estragaram” tudo…

Em Setembro desse ano, decidiram que a minha mãe ficaria em Portugal com as minhas três irmãs. Eu tinha dezoito anos e não queria ficar em Portugal, que para mim

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era sinónimo de pobreza. Quando vínhamos de férias com os meus pais, ficávamos na aldeia deles, e ao meu redor via os meus avós e outras pessoas a trabalharem muito nas terras. Essas pessoas não tinham tractores, faziam tudo segundo a força humana e com a ajuda da força dos animais, mas nem todos os tinham. As minhas tias e tios andavam nos pinhais com as latas às costas a colherem resina. Os meus primos e primas andavam mal vestidos. As estradas pelas aldeias, estavam todas esburacadas ou eram em terra batidas. Acho que a maioria nem sequer podia contar com a ajuda da segurança social e muito menos subsídios, como os meus pais usufruíam em França. Três tios meus pediram dinheiro emprestado aos meus pais…Para mim era um cenário de muita pobreza. Fazia-me confusão a falta de transportes públicos, esgotos e água canalizada.

Preferi voltar para França com o meu pai. Quando lá chegámos, o meu destino foi ir fazer limpeza para a casa das patroas, para quem a minha mãe já tinha trabalhado. Para o meu pai era impensável, eu ir para longe da asa dele e não fui como eu queria, para o liceu profissional em Blois. E foi assim, com dezoito anos comecei a trabalhar nas limpezas. Algumas patroas ficavam a uns 6 km, a minha mãe tinha carta de condução mas eu não. Desloquei-me durante dois meses de bicicleta.

A viver com o meu pai, durante esses dois meses, todos os dias à noite, fazia o jantar para nós os dois. Uma coisa boa que herdei da minha mãe, foi saber cozinhar, adoro cozinhar e fazer pratos diferentes. Às vezes lembro certos pratos franceses e vou pesquisar as receitas na internet para os confeccionar. Preparava a marmita para ele levar para o trabalho no dia seguinte. Ao fim-de-semana, ia às compras, mas ele é que as pagava, não queria que eu gastasse o meu dinheiro.

O meu pai lá foi resolvendo as coisas dele, para ir definitivamente viver para Portugal. Mas eu não queria voltar. Então uma minha tia, que vive em Paris, arranjou-me trabalho lá. O arranjou-meu pai dizia: Vem para Portugal, tu vais arrepender-te de cá ficar! Mas eu preferi ir para Paris. E foi assim, que comecei a trabalhar na casa de um casal que não tinha nada de pobre, muito pelo contrário, era uma casa enorme com piscina, sala de musculação, jardim enorme à frente e atrás da casa. Eles tinham três filhos pequenos, e o meu trabalho era fazer um pouco de tudo: passar a ferro, levar e buscar os miúdos à escola, fazer a comida, limpar a casa, etc. Em troca ganhava 6000 francos, com comida e dormida, tinha o meu quarto e a minha casa de banho.

O problema é que comecei a sentir-me sozinha, ansiosa, não via o tempo passar, perdi o apetite, faltava-me a minha família e só aguentei duas semanas. Telefonei para as informações, pedi o número da rodoviária, e marquei uma viagem para Portugal.

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Avisei os patrões, que me fizeram as contas, e me disseram que se quisesse voltar era bem-vinda. Regressei a Portugal. Quando cá cheguei, a minha mãe estava sempre a desmoralizar-me por me ter vindo embora. O que ia ser de mim agora? Não tinha futuro aqui em Portugal. Já o meu pai gostava de ver a família reunida.

Como o meu sonho era ser cabeleireira, andei com a minha mãe a procurar um salão onde me aceitassem como aprendiz, encontrámos em Pombal o Salão da Sr.ª Deolinda que aceitou ensinar-me a profissão em troca de 180 contos. O meu pai concordou, pagou-lhe os 180 contos sem recibo nem nada, porque o que nós queríamos e o que ela aceitou fazer era ilegal. Trabalhei lá de Novembro de 1994 a Fevereiro de 1997. Ia de Carnide de Cima até às Meirinhas, às vezes de carro, às vezes de bicicleta, outras vezes a pé, ia apanhar o autocarro que vinha de Leiria para Coimbra e que passava por Pombal. No princípio, foi um grande choque, quando via pessoas a levarem coelhos em caixas, patos e galinhas em sacos de ráfia, caldeiros de tremoços para dentro da mala do autocarro, a falarem em voz alta umas para as outras sem discrição nenhuma, parecia que todas se conheciam. Isto para mim foi bizarro, em França não acontecia. Parecia-me estar a ver uma daquelas reportagens sobre África.

No salão, era arranjar unhas, arranjar sobrancelhas, lavar cabeças, ficava muito tempo de pé a olhar como as outras funcionárias trabalhavam, cheia de dores nas minhas pernas, sem me poder sentar, passava horas a fio numa salita a pôr bigoudis na cabeça de um manequim, a fazer ondas vincadas com os dedos, ajudava a minha colega a limpar o salão, fazia os recados à patroa. Passado algum tempo, a dona do salão ia pedindo aos clientes se podia ser eu a cortar-lhes o cabelo, dizia que era das moças, que ela lá tinha tido, que tinha aprendido mais depressa. Entrava sempre às 9 horas e saía às 18h30. Com o tempo, já sabia fazer alguns trabalhos, então iam-me compensando no fim do dia com algum dinheiro, que já dava para eu comprar algumas coisitas para mim, e pagar o passe para o autocarro.

Entretanto, um primo meu que se inscreveu numa escola de condução, desafiou-me para eu desafiou-me inscrever também e, assim foi, paguei a minha carta com o dinheiro que tinha ganho a trabalhar na limpeza nos dois meses, em França. Não comprei livros portugueses de código, estudei nos livros que a minha mãe tinha comprado quando ela tirou a carta em França. Foi sem perceber bem todas as palavras, tirando umas pelas outras, que consegui à primeira vez o código, e a condução. Foi um orgulho para mim e festejei em cheio!

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Na minha aldeia as pessoas iam sabendo, umas pelas outras, que eu já sabia cortar e pintar cabelo, e pediam para as atender. Só prestava serviços ao domicílio, e lá ia eu, depois de pedir autorização ao meu pai, no carro dele a casa das minhas clientes. E assim, sem ordenado fixo em Pombal, ia juntando mais uns trocos na aldeia. Comprei tesoura, pentes, secador etc.

Em Junho de 1995, fui pedir trabalho num bar que existia em Carnide. O meu trabalho era à noite, terças e quintas-feiras, a servir os clientes no bar com outro rapaz. Com ele aprendi o nome das bebidas, e a lidar com pessoas desagradáveis que se encontram às vezes nestes sítios. Trabalhei lá três meses, e depois fechou. Foi neste bar que eu conheci um rapaz, que é hoje o meu marido.

Passado algum tempo no salão da Sr.ª Deolinda, a praticar a profissão, já me sentia capaz de atender os clientes tendo em conta a necessidade de assegurar um bom clima relacional. Facilitar o relacionamento interpessoal com clientes, com vista à criação de um clima de empatia e entender e pôr em prática as soluções mais adequadas na resolução de problemas decorrentes das solicitações e reclamações de clientes.Aprendi a organizar o meu posto de trabalho de forma a permitir responder às solicitações do serviço, interagindo com os outros elementos da equipa.

Soube de uma senhora que ia abrir um salão na Rua Direita em Pombal, falei com ela, comecei aí a trabalhar e a ter um salário mensal. Era o Salão Celeste Cabeleireiros, iniciei no dia 4 de Fevereiro de 1997 e fiquei até 18 de Junho de 2004, foram sete anos. No início, estive a trabalhar e a ganhar o salário mínimo, já com descontos, passados quatro meses, descobri que ainda não estava declarada, nem tinha contrato de trabalho. Um dia o meu namorado perguntou-me se me tinham pedido para assinar algum documento, ou se me tinham pedido o número de contribuinte ou o Bilhete de Identidade. Respondi-lhe que não, e foi assim que me apercebi que não estava a descontar para a Segurança Social. Eu pensava que era só arranjar um emprego, receber o nosso vencimento, e já estaria a descontar para a Segurança Social, não fazia ideia dos documentos necessários, era o primeiro emprego…

Exigi que me devolvesse todo o dinheiro que me tinha descontado e não declarado. Não imaginam a audácia dela, respondeu-me, que os meses tinham sido fracos, dividíamos a meias, e eu, ingénua, aceitei, com medo que ela já não me quisesse mais lá a trabalhar.

Existem pessoas muito oportunistas. Revolta-me ouvir colegas dizerem que recebem os seus salários em prestações. Trabalham meses e anos para um patrão que

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não os declara, não cumprem as leis que o código do trabalho impõe. Na década de setenta, quando os meus pais emigraram para França, havia lá muita oferta de trabalho, também por causa dos estragos que a segunda guerra mundial causou, mas ninguém tentou usurpar os seus direitos enquanto trabalhadores. Não me lembro do meu pai falar de algum tipo de situação similar, acho que as mentalidades dos povos são diferentes. Acho que em França as pessoas têm mais civismo. Quando nos anos 2000/2003 os imigrantes de leste (Ucranianos, Russos e Moldavos) vieram para o nosso país, ouvia alguns portugueses dizerem que eles nos vinham tirar os nossos postos de trabalho! Por outro lado, lembro de algumas notícias televisivas e de jornais identificarem patrões portugueses que exploravam muitos estrangeiros, que, pouco ou nada falavam português, ilegais, que necessitavam ganhar algum dinheiro para sobreviver. Resultado, muitos deles foram embora procurar trabalho em outros países, e outros regressaram ao país de origem, onde não conseguem o sustento para as suas famílias, quando cá, bastava serem justamente pagos pelo seu trabalho.

Estou desempregada e quando vou procurar trabalho, acho inadmissível que certos empregadores me peçam para trabalhar sem contrato, com salários tão precários, e ainda me dizem: Quem não arrisca não petisca!

Voltando à Sr.ª Celeste, não era uma pessoa má, mas ao mesmo tempo, quando me relembro de tantas moças que lá trabalharam comigo, com as quais ela só fez contrato passado meses e meses, e outras simplesmente nunca lhes fez contrato nenhum, estavam ali em situação ilegal, e dizia-lhes que se passasse a inspecção, para dizerem que era o primeiro dia que ali estavam. Ela tinha a oportunidade de pagar esses salários com contratos de trabalho… É triste ver pessoas que enriquecem às custas dos outros, não posso com injustiças. É triste este tipo de injustiças no século vinte e um, num pais da união europeia, onde é que anda a fiscalização?!

Para além de ajudante de cabeleireira, eu também atendia o telefone e fazia marcações, recebia as encomendas, verificava e etiquetava os produtos com preços, fazia a caixa, limpava o salão, ficava responsável pelo salão quando ela ia de férias e comunicava-lhe as contas quando regressava.

Mais tarde, como não tinha carteira profissional, resolvi ir a Leiria à Associação dos Cabeleireiros, inscrever-me para tirar o Curso de Reciclagem de Ajudante de Cabeleireira. Em horário pós-laboral, tive aulas de fisiologia, estudei a célula que é a

unidade de vida (manifesta todas as funções de um ser vivo). Algumas células têm uma

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que o organismo tenha atingido a sua maturidade, mas nem todas se multiplicam ao mesmo ritmo, nem têm a mesma duração. Algumas são formadas na gestação até ao nascimento e não são substituíveis como as células nervosas. Outras, como as células sanguíneas e as da pele têm uma vida curta. Podem a cada segundo cinquenta milhões de células morrer e serem substituídas. Estudei coisas sobre a morfologia da pele e do pêlo. O pêlo nasce numa pequena cavidade da epiderme chamada folículo piloso, no qual se vem alojar um bolbo ou papila que contém uma terminação nervosa e um sistema vascular. Os folículos pilosos do couro cabeludo dão origem a pêlos denominados cabelos e que são muito desenvolvidos. Estudei as anomalias do cabelo e do couro cabeludo, alergias e pigmentos do cabelo. O folículo piloso engloba três partes designadas por: medula, córtex e cutícula. No córtex encontram-se os pigmentos

melânicos que dão a cor natural ao cabelo. Existem dois tipos de pigmentos: os

pigmentos difusos que produzem as cores loiras, e os pigmentos granulosos que produzem as cores escuras e avermelhadas.

Também tive aulas de química sobre o pH ácidos-base, pH, símbolo que designa na química o grau de acidez ou de alcalinidade de uma substância em função da neutralidade. Os valores de pH variam entre 0 e 14, sendo 7, o valor sinónimo de uma substância neutra. Estudamos a composição e estrutura química do amoníaco, água oxigenada e ácido tioglicólico. O ácido tioglicólico é preparado a partir do cloro acetato de sódio e do sulfidrato de sódio, apresentando-se como um líquido com um cheiro activo desagradável. E ficamos a conhecer a famosa tabela periódica dos elementos. Tive aulas práticas sobre brushing tradicional de canudos, descoloração total, permanente clássica.

No dia 10 de Março de 1999, fui a exame e consegui a minha carteira profissional.

Nos dias 22 e 23 de Maio de 1999, fui ao Figueira Moda´99, assistir à realização de vários trabalhos artísticos. É muito importante manter-se a par das novas actualizações (a nível de cor, corte, penteados), para podermos responder com profissionalismo às exigências dos clientes nos salões de cabeleireiro.

No início do ano de 1999, eu e o meu namorado decidimos marcar a data do nosso casamento e começar a construir a nossa casa. Com o casamento marcado para Setembro, tivemos que fazer o CPM (curso de preparação ao matrimónio), nesse curso de quatro dias, abordámos os temas: comunidade de amor, o sacramento do amor, a unidade no amor, a fecundidade do amor, as exigências e a evolução do amor.

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Mas é algo que só se aprende nas trocas e tomadas de decisão no dia-a-dia, em que é fundamental o diálogo, a compreensão, a tolerância e a empatia na comunicação do casal.

Para a construção da nossa casa, idealizámos a casa e andámos a ver outras. Mandámos fazer o projecto a um arquitecto. A casa foi construída pensando no isolamento térmico. Tendo sido colocado isolamento de poliúretano em placas na caixa-de-ar, de modo a conservar o calor e consequentemente poupar energia. Depois tivemos que andar a ver os azulejos, as loiças sanitárias, o mobiliário, a escolher as cores das tintas para pintar a casa interior e exterior. Tudo isto foi uma “guerra”, porque eu queria de uma maneira e o meu marido queria de outra.

Naquela altura, eu gostava mais da arquitectura rústica, enquanto o meu namorado preferia a arquitectura moderna. Por exemplo, eu queria por tudo que a casa tivesse portadas, ele dizia que era melhor os estores. Levei a minha ideia avante, meses mais tarde arrependi-me (ao fim de lá estar a viver), porque os estores acabam por isolar mais, não é necessário abrir as janelas a cada vez que queremos abrir ou fechá-los, e quando o sol bate nas janelas podemos fechá-los só por metade.

A arte nova e a arte deco tiveram pouco expressão em Portugal. Mais tarde, durante o Estado Novo, foi aplicada uma arquitectura mais contida, mas sobretudo funcional.

Com o fim da ditadura, e abertura ao meio internacional, a arquitectura enriqueceu o seu espólio tanto em quantidade como em qualidade. Na actualidade destacam-se os arquitectos portugueses Álvaro Siza Vieira, Eduardo Souto de Moura, Fernando Távora, Gonçalo Byrne, entre outros. Antigamente os arquitectos viravam-se mais para a estética das moradias, não se pensava, nem sequer se falava, em certificado energético que hoje é obrigatório, em eco-arquitectura, em arquitectura bio-climática, ou isolamento térmico. A casa que os meus pais construíram, e outras pessoas naquele tempo cá em Portugal, no Verão é super fresca, tem ventilação por todo o lado. Mas no Inverno é um gelo, às vezes está-se melhor na rua do que dentro daquelas casas. Actualmente, a arquitectura tem procurado reduzir o consumo energético dos edifícios, exemplo disso, é a arquitectura bioclimática que tem como objectivo promover um bom desempenho ambiental do edifício através da sua arquitectura. Podem dividir-se em termos de climatização em estratégias de arrefecimento – com o objectivo de proteger e dissipar o calor no Verão e estratégia de aquecimento – com o objectivo de maximizar a captação da radiação solar e armazenar essa energia no edifício no Inverno.

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Na utilização destas estratégias deverá ser considerado o seu desempenho ao longo do ano. É necessária a integração adequada destas estratégias e o relacionamento com outros aspectos do desempenho ambiental, como a iluminação e a ventilação natural, a orientação solar, o isolamento térmico a utilização de materiais mais ecológicos e de menor impacto ambiental.

Depois da construção da nossa vivenda, os passos seguintes foram as mobílias, a decoração, e a escolha dos electrodomésticos. Para além, das funcionalidades e do aspecto estético destes aparelhos (frigorífico, máquinas da loiça e roupa, fogão eléctrico, micro-ondas), fizemos a nossa opção segundo a sua eficiência energética. Estes electrodomésticos são obrigados a ter visível uma etiqueta que indica a sua eficiência energética, bem como outras características, onde o electrodoméstico é classificado numa escala que vai de A (mais eficiente) a G (menos eficiente). Para os equipamentos de frio, a classe de maior eficiência energética é a A++. Nas máquinas de lavar loiça e roupa, é preciso ter em atenção se essa eficiência é acompanhada também de uma boa eficiência na lavagem, na secagem e centrifugação, de forma a garantir que compra um electrodoméstico que, não só poupa energia, mas também executa de forma eficiente o seu trabalho.

Para cozinhar, optei por uma placa, e preferi um forno que eu pudesse encastrar em altura, primeiro a pensar na minha postura, não preciso de me baixar, e segundo pensei no perigo e segurança no futuro, quando tivesse crianças.

Quando fiz a aquisição do meu micro-ondas, foi só depois de a minha filha nascer para poder aquecer os biberões ou as sopitas, porque às vezes, é desnecessário estar a ascender o gás e sujar uma panela por uma quantidade de comida tão pequena. Afinal, comprar por comprar, preferi comprar um bom micro-ondas, que tem outras funcionalidades, como descongelar, grelhar, e cozinhar. De todos os electrodomésticos que tenho, conservo sempre o manual de instruções depois de o ler, porque há sempre momentos que pode surgir alguma dúvida sobre a sua utilização, sobre características ou mesmo. Como é o caso do meu forno, que traz informações muito úteis sobre a que temperaturas devo cozinhar estes ou aqueles alimentos, o tempo que demora a cozer e a que altura a grelha deve estar.

O meu frigorifico que tem a parte de congelador, normalmente faço-o descongelar, uma ou duas vezes por ano, para retirar o excesso de gelo, para que consuma menos energia.

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Com a máquina de lavar roupa tenho sempre o cuidado de utilizar um anti-calcário para que em primeiro, as tubagens não fiquem cheias de anti-calcário, e segundo para que a máquina consuma menos electricidade quando as resistências aquecem a água. Depois nunca utilizo a dose de detergente que recomendam na embalagem (utilizo sempre menos), porque nas instruções da máquina diz que não é por utilizar mais detergente que a roupa fica melhor lavada, é importante sim a carga de roupa e o programa de lavagem certo. Quanto aos detergentes é necessário pensar nos lençóis de água do planeta, e utilizar menos quantidade e se possível detergentes ecológicos. Para poupar energia com os electrodomésticos, também optei por um tarifário EDP bi-horario, e substituí lâmpadas incandescentes por lâmpadas fluorescentes. Todas as formas de utilização de energia têm impacto ambiental. As renováveis, tais como os colectores solares (sistema fotovoltaico) para aquecimento de água, e a eólica tem um impacto menor que as energias convencionais como o fuel e o carvão. Mas são as emissões gasosas que têm maior impacto, nomeadamente produzindo o efeito de estufa, que está associado ao aquecimento global. Os impactos no aquecimento global são evidentes em muitas partes do mundo, em particular, nos climas com condições extremas (muito quentes ou muito frios). Estes impactos são visíveis e fazem parte dos noticiários diários, são exemplo disso, as notícias de cheias, de ondas de calor ou frio. Outras das consequências destas alterações no clima são as doenças, a fome, etc.

É por isso necessário e importante, que se explique que a redução destes

impactos é possível e que cada um de nós pode contribuir alterando pequenos hábitos. A esperança é que explicando os problemas às famílias, se comece a poupar energia em casa e assim cada um de nós terá a possibilidade de contribuir para um mundo melhor e um estilo de vida sustentável. Na minha opinião é muito importante apostar-se mais na educação ambiental para o desenvolvimento da nossa cidadania.

Dia 4 de Setembro de 1999 casámos. O dinheiro que recebemos de oferta dos nossos convidados, serviu para pagar algumas dívidas da casa. Não fomos em lua-de-mel, mas estreamos o nosso cantinho de amor, a nossa casa nova!

Um ano e meio mais tarde, engravidei. Foi uma luta contra a balança, porque eu não queria engordar muito, só mesmo 12Kg, como o meu ginecologista recomendou, para prevenir o risco de diabetes. Na gravidez tudo correu bem, cheguei às 42 semanas de gestação, e só queria que o bebé nascesse, mas como estava “teimoso”, o meu ginecologista obstetra foi obrigado a provocar o parto, administrando prostoglandina via genital. Ele dizia que eu ia ter um bebé grande, e foi mesmo.

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No dia 13 de Março de 2002, nasceu a minha filha Leonor, com 4.240kg. Na maternidade as enfermeiras diziam que ela já parecia ter dois meses. Depois, até fazer um ano e meio, foi mesmo muito chata para conseguirmos descansar de noite. Com o meu marido sempre a trabalhar por turnos, não foi fácil. Depois dos quatro meses de Licença de Maternidade, voltei ao meu trabalho, mas com a minha filha numa ama, era uma correria diária.

Quando estive grávida, tinha uma colega no meu local de trabalho, também grávida. Tenho que aqui contar as reflexões que a minha patroa Celeste fazia. Para ela, gravidez não é doença, só que cada mulher é única, e muitas delas passam mal e têm que ficar de repouso. Não foi o meu caso, graças a Deus, trabalhei até uma semana antes de ela nascer. Ela dizia, para nós planearmos as coisas, para que não viéssemos a ficar de Licença de Maternidade, nos meses em que houvesse mais trabalho, na Páscoa, no mês de Dezembro, e nos meses de Julho e Agosto! Ora, eu acho que estas situações, nem sempre se conseguem planear, e as outras pessoas, não têm nada que interferir com esta tomada de decisão. Além disso, a licença de maternidade é um direito do cidadão português identificado na Constituição da República Portuguesa, Artigo 68º (Paternidade e Maternidade).

Eu trabalhei sete anos naquele salão, três anos no salão Art e Style, e mais seis meses no salão Hanna´s, nunca tive direito a ter férias na altura da Páscoa, nem no Natal, e muito menos nos meses de Julho e Agosto. Mesmo com toda a minha família emigrante, de férias neste período. Só podia estar com eles ao fim do dia. Ao domingo, enquanto trabalhei para a Sr.ª Celeste, nem sequer direito a folga tinha, nas alturas de mais trabalho, e se elas calhassem em véspera de feriado, tinha que as tirar, num período de menos trabalho. Estas coisas começaram a tornar-se fatigantes, ainda mais depois de ter tido a minha filha.

Não me sentindo ainda realizada profissionalmente, resolvi inscrever-me novamente no Curso de Reciclagem de Praticante de Cabeleireiros em Leiria. Em horário pós-laboral, de Outubro de 2002 a Maio de 2003, duas vezes por semana. Não foi nada fácil com uma bebé de sete meses e o meu marido a trabalhar por turnos.

Tive aulas de fisiologia, estudei os mecanismos homeostáticos, sistema nervoso e endócrino, a célula, a pele e as suas funções, o cabelo e as suas características. Estudei em química, o átomo. Um átomo é a mais pequena partícula de um elemento que permite a formação de uma molécula. E a molécula é a mais pequena quantidade que pode existir no estado livre. Estudamos as suas estruturas, a tabela periódica dos

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elementos, os ácidos, as bases ou alcalinos e o PH, a composição elementar do corpo humano, substâncias, matérias-primas e produtos cosméticos utilizados na profissão de cabeleireiro. Tive aulas práticas de ondas directas e caracóis de pinças, corte de cabelo, ondas Marcel e coloração.

No dia do exame, estes trabalhos técnicos eram realizados em modelo vivo. Mais uma vez consegui passar no exame. Na véspera tinha tido um acidente de carro, ainda fui parar ao hospital, mas sem gravidade, deram-me alta passado algumas horas. Nesse dia, só pensava no meu exame, com medo de não poder realizá-lo.

Em 4 de Novembro de 2003, fiz uma actualização de penteados de noite e festa, através do Instituto Miratge. Para ser cabeleireiro é também importante estar sempre a par das novas tendências da moda do cabelo. Um profissional de Cabeleireiro continua a progredir na sua carreira, inovando, indo a eventos sobre a profissão para poder responder às exigências dos clientes, que cada vez é mais. Eu gosto da minha profissão, gosto de aprender sempre mais coisas sobre ela, e procuro estar actualizada.

A minha patroa Celeste, um dia, quando regressei de férias disse-me que ia abrir um salão novo, os Jerónimos Cabeleireiros em Pombal e eu tinha que ir para lá trabalhar. Antes de começar a trabalhar no novo salão, fui a sua casa, para a filha me dar umas dicas sobre o computador, porque no novo salão a registadora era um computador. Ensinou-me o básico para eu saber registar e fazer a caixa ao fim do dia. Quando eu queria, ou precisava de alguma coisa, era à minha patroa Celeste que eu me dirigia, a filha não aceitava isso muito bem, porque também lá estava. Estava sempre a alterar as regras de trabalho, era muito presunçosa, não comunicava bem connosco, criava um mau ambiente. Um dia tivemos uma discussão, e para não me enervar mais, e por não conseguir trabalhar em tão mau ambiente, escrevi e mandei a minha carta de demissão.

Passados alguns dias, arranjei trabalho no centro comercial do Cardal em Pombal, no salão de cabeleireiros Art & Style da Sr.ª Fátima. Aqui pediram-me logo os documentos para fazer o contrato, antes de eu começar a trabalhar. Neste salão aconteceram-me algumas situações caricatas, como por exemplo, um dia fui trabalhar e ao abrir a porta vi que havia um papel da EDP no chão, li que a luz tinha sido cortada por falta de pagamento. Comuniquei de imediato à minha patroa, ela disse-me para eu ir para casa. Era mesmo incrivelmente despistada! No fim do mês, queria descontar-me aquele dia. Disse-lhe que não concordava, porque tinha ido trabalhar, tinha levado a minha filha à ama e quando cheguei ao meu local de trabalho, não havia condições para trabalhar, mas não por culpa minha…. Retorquiu, mas pagou-me o dia.

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Uma vez, apareceu uma cliente que não era conhecida no salão. Fez uma coloração, quando foi para efectuar o pagamento, disse-me que não tinha dinheiro que chegasse, tinha que ir levantar ao multibanco, Nunca me tinha acontecido, confiei e respondi-lhe que tudo bem! Bom, passaram 10 minutos, 15, e eu comecei a pensar que ela não iria voltar. E foi mesmo o que aconteceu, nunca mais voltou. A cliente tinha-me dito que trabalhava na Geral de Limpezas, ainda lá fui no dia seguinte, mas o dono disse que não tinha ninguém a trabalhar na empresa com aquele nome! Disse à minha patroa para descontar os quarenta euros do meu vencimento, mas ela foi simpática e não descontou.

A partir daquele dia, ficou bem claro para mim, que se mais alguém precisasse de ir levantar dinheiro, tinha que deixar um documento de identificação. Passado algum tempo, apareceu outra cliente, à qual cortei o cabelo e só no fim é que disse que não trazia dinheiro, pediu-me para pagar no dia a seguir. Tinha que aceitar, já lhe tinha cortado o cabelo, só que desta vez tive de perder a vergonha e pedi-lhe um documento de identificação. Passados uns três meses voltou lá, para pagar e levar a carta de condução! Há pessoas incríveis!

Outra cena que se passou comigo, foi com uma moça toda elegante e cheia de não me toques que eu até conhecia, pintou o cabelo, não tinha dinheiro e pediu-me se podia pagar na quinta-feira seguinte. A patroa não estava, eu conhecendo-a, facilitei-lhe o pagamento. Passou uma, passaram duas semanas e ela sem pagar o que devia. Fui ao local de trabalho dela, e pedi-lhe o dinheiro. Não percebo as pessoas, não têm dinheiro, mas querem comprar as coisas. Quem não tem dinheiro, não tem vícios!

Naquele salão, eu era responsável pela higiene das escovas e pentes, rolo e

bigoudis. Tudo isto era eu que limpava e desinfectava. Para além de termos um

esterilizador, de vez em quando, aquele material era lavado com água e lixívia, que é um composto químico para limpeza e desinfecção, cujo produto activo, o hipocloroso de sódio tem a fórmula química NaClO. É muito utilizada como agente branqueador. Possui excelente acção bactericida, daí matar microrganismos existentes neste material de cabeleireiro. Existe um antifungicida, que deve ser dissolvido em água, também para desinfecção deste material, ou mesmo o álcool a 90º. Pois a desinfecção (de pentes, tesouras, bancadas, calhas, toalhas etc.), é muito importante para a saúde tanto dos profissionais como dos clientes deste tipo de estabelecimento.

Implementei naquele salão, depois de o ter começado a fazer em minha casa, a separação do lixo. Detestava encontrar no caixote do lixo, outras coisas, que não lixo

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orgânico. Proteger o nosso planeta e ambiente, é uma das prioridades que as pessoas todas deviam ter. Mas infelizmente, ainda não entrou na cabeça de todas… Custa-me ver, quando vou ao ecoponto da minha terra, colchões encostados aos ecopontos, fraldas e lixo no chão, todo o lixo e mais algum, e no contentor do lixo orgânico, garrafas, caixotes de papelão que não deveriam ali estar.

Sei por uma amiga que vive na Suíça, que lá as pessoas pagam multa se não separarem o lixo. Em França, cada morador tem o seu contentor do lixo, se os funcionários do camião do lixo orgânico passarem, e virem que o lixo não foi separado, selam o contentor com fita adesiva própria e não o despejam. Acho que o governo português deveria optar por ter medidas semelhantes, já que certas pessoas só têm os devidos cuidados se forem aplicadas coimas.

Voltando ao meu percurso profissional, de 20 de Setembro a 6 de Dezembro de 2005, fiz uma actualização de cabeleireiro em corte, cor e penteado.

Em Dezembro de 2005, inscrevi-me para tirar o curso de reciclagem de oficial de cabeleireiro, novamente em horário pós-laboral, que durou até 16 de Maio de 2006. Com aulas sobre a protecção do ambiente, igualdades e oportunidades de trabalho, fisiologia aplicada, noções de física e química, utilização e acção de produtos capilares, qualidade, higiene, saúde e segurança, legislação laboral, técnicas de permanente e descoloração, brushing e ondas directas, técnica de coloração, técnicas de corte, mise de rolos, transformação penteado de dia para noite com postiço. Um total de 149 horas.

Nestes cursos, aprendi e troquei imensas impressões com os professores e os outros formandos.

Tive o apoio e incentivo da minha patroa, Sr.ª Fátima, que também me emprestou algum material, para eu evitar de o comprar.

No salão dela, também vivi as inundações em Pombal em Outubro de 2006. Nessa noite, ligou-me para casa às três e meia da manhã. Quando ouvi o telefone, levantei-me logo a correr, pensando que era uma má notícia, sobre os meus pais ou as minhas irmãs… Era a minha patroa toda chorosa e aflita com o dilúvio em Pombal. De qualquer maneira eu não podia fazer nada àquela hora morando a 7 km de Pombal. Dizia que havia água até ao terceiro degrau, mas como às vezes quando chovia um bocado mais em Pombal, as sanitas das casas de banho, da cave do centro comercial deitavam fora, pensei que o terceiro degrau era a partir de baixo, mas não, era contar a partir de cima! No dia seguinte, quando fui trabalhar levei as minhas botas de borracha no saco. Trazia a minha filha para a creche, qual não foi a nossa surpresa quando vimos

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o caos que havia em Pombal. Estive quase três semanas, sem exercer a minha profissão, mas continuei a trabalhar no salão, ajudando a tirar entulho, lama, água, a lavar paredes, lavar o mobiliário que dava para aproveitar, lavar e voltar a lavar, porque a lama estava tão entranhada que eu lavava as coisas, punha a escorrer, e quando me apercebia estavam sujas na mesma.

Uma prima da minha patroa, que tinha um salão de cabeleireiros para arrendar, emprestou-lho durante quatro meses, o tempo que o outro salão demorou a estar pronto com as obras. Ainda bem que ela tinha um seguro!

Em Fevereiro de 2006, com o custo de vida a aumentar, pedi à minha patroa para me aumentar o salário, mas ela recusou. Resolvi despedir-me, porque com o custo da ama da minha filha, o custo das deslocações, precisava de ganhar mais. Também já estava um pouco cansada daquele sítio na cave do centro comercial, já me sentia “soterrada”. Não é fácil trabalhar o dia todo numa cave, sem poder chegar à porta respirar um pouco de ar fresco, sem saber que tempo está lá fora, ou ver a luz do dia através de uma janela pequena que se situa a dois metros de altura.

O meu objectivo era deixar de trabalhar por conta de outrem, e tive a ideia de distribuir panfletos para exercer a minha profissão ao domicílio. Três semanas passaram, sem nunca receber um telefonema. Resolvi logo procurar novamente um emprego dentro da minha área. Encontrei logo, no salão de cabeleireiros Hanna´s em Pombal, onde nunca devia ter entrado…

Combinei o meu salário com a patroa e o marido dela. Logo no início, quis dar-me uma parte do salário declarada e a outra não! Não aceitei, pedi para o declarar todo. Só que do valor que tínhamos combinado, arranjou maneira de me declarar menos, o resto era em subsídio de almoço para atingir o preço que tínhamos combinado. Precisava do emprego e decidir ficar. Depois, pediu-me para trabalhar uma semana à experiência, depois se ela gostasse do meu trabalho faria o contrato. Quando a lei do trabalho diz que o contrato deve ser celebrado e incluir o primeiro dia em que o empregado começa a prestar o serviço, estando sempre salvaguardado para ambas as partes, o período de experiência nos contratos de trabalho (período de trinta dias).

Só passado, quinze dias, trouxe o contrato de um ano para eu assinar. Passados três meses, em Agosto, veio ter comigo e perguntou-me se eu não me importava de tirar as minhas férias em Setembro, as quais eu ia ter direito em Dezembro. Em Dezembro iria haver mais trabalho por causa das festas do fim de ano, e eu era precisa para trabalhar nessa altura. Até ali tudo bem, o pior foi quando ela me disse que não me iria

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pagar nem férias, nem subsídio de férias, nem subsídio de Natal, referentes aos quinze dias que lá tinha estado a trabalhar, sem contrato. Já me tinha acontecido uma história deste género com a minha primeira patroa, mas desta vez não estava disposta a deixar passar o assunto, afinal levantei-me muito cedo, todos aqueles dias para ir trabalhar, a correr para ir levar a minha filha à escola. E mesmo que fosse muito, ou pouco dinheiro, ele era-me devido por direito.

A partir daquele dia, fizeram-me a vida negra para eu me despedir. Até me propôs, assinar um acordo mútuo para me despedir, dizendo que eu iria para o fundo de desemprego. Só que eu fui ao IDICT (inspecção e desenvolvimento das condições de trabalho), expor o problema, e disseram-me para não assinar nada, porque não iria ter direito nenhum ao fundo de desemprego. E foi o que fiz, não assinei acordo nenhum. Afinal não tinha feito nada de mal, apenas pretendia ter os meus direitos.

O marido dela chegou-me a dizer, que se não fosse a bem, ia a mal! Assim foi, tive um processo disciplinar, acusando-me de coisas que nunca aconteceram! O mais incrível é que arranjou testemunhas, para confirmar essas coisas que nunca tinham acontecido. Pela primeira vez na minha vida, precisei de ir a um advogado, que respondeu no prazo estipulado pela lei à nota de culpa. A advogada deles não considerou e recebi uma carta registada de despedimento.

Decidi não baixar os braços e lutar contra esta injustiça. Pus um processo no Tribunal de Trabalho. Foi marcado o julgamento para 15 de Julho de 2008. Uma semana antes do julgamento, o meu advogado avisou-me que a advogada deles tinha pedido um adiamento.

Andei meses e dias, ansiosa para que chegasse aquela data, e afinal, ainda não estava para acontecer. Mas não vou desistir de modo algum.

Com esta história, andei dias e dias, a pesquisar leis na internet, sobre leis de trabalho, artigos. Escrevi para relatar tudo ao pormenor, para que o meu advogado compreendesse bem toda a história. Lembrava-me de coisas que eles me tinham dito ou feito…Escrevia.

Actualmente estou no fundo de desemprego, porque fui para tribunal, senão não tinha esse direito. Coitadas das pessoas que não têm hipóteses financeiras para contratar um advogado, não vão para tribunal e desistem.

Com esta história, pelo menos tenho o privilégio de poder dar mais atenção e estar mais tempo com a minha filha.

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O pior foi a doença que foi descoberta ao meu marido em Setembro de 2008. Foi um grande choque para nós, chorei muito, mas agora quero pensar positivamente e acreditar que ele vai ficar bom.

Ter saúde é a coisa mais importante nesta vida! Quando ela falta, mais nada importa à nossa volta. Estou consciente disso, e é por isso que estou inscrita no registo Português de dadores de medula óssea e que sou dadora de sangue desde 1995. Sinto-me bem ao pensar que posso ajudar pessoas. O sangue não se fabrica artificialSinto-mente e só o ser humano o pode doar. Por esta razão, o sangue existente nos Serviços de Sangue depende inteiramente do gesto valiosíssimo de todos aqueles que generosamente, de forma benévola e regular, efectuam a sua dádiva de sangue. O sangue é preciso todos os dias. Todos os dias, existem doentes com anemia, doentes que vão ser submetidos a cirurgia, doentes acidentados com hemorragias, doentes oncológicos que fazem tratamento com quimioterapia, doentes transplantados e muitos outros que necessitam de fazer tratamento com componentes sanguíneos. Enquanto um doente com anemia pode necessitar de 1 ou 2 unidades de sangue, um doente com transplante de fígado pode necessitar de maior número de unidades de sangue e um doente com leucemia pode necessitar de um número muito elevado de componentes sanguíneos.

Uma unidade de sangue total representa aproximadamente 450ml. Cada pessoa tem em circulação 5 a 6 litros de sangue, dependendo da superfície corporal. O sangue doado é rapidamente reposto pelo nosso organismo. A unidade de sangue depois de colhida vai ser separada nos seus constituintes: Glóbulos Vermelhos, Plasma e Plaquetas ou Crioprecipitado, de acordo com a produção escolhida. Mais tarde ou mais cedo podemos vir a precisar dele. Não é algo que devemos recear, os dadores são submetidos a um exame médico antes da dádiva e são feitos vários testes que permiten detectar doenças infecciosas como a Hepatite B e C, Sida, Sífilis e outras. As colheitas são feitas com técnicas de assepsia e o material usado não é reutilizado.

Eu penso que o sistema de saúde em Portugal devia funcionar melhor, um exemplo disto, são as grandes listas de espera. Que vão de meses a anos e anos, para uma simples operação. Os médicos do sistema nacional de saúde indicam-nos para as clínicas e hospitais privados onde eles exercem também. Acho que eles não trabalham horas suficientes nos hospitais públicos, e que o estado os deveria obrigar a escolher entre o privado e o público. É que o privado dá-lhes mais lucros… Resultado, ainda podem resolver os seus problemas, os pacientes que tiverem mais meios económicos. Porque os médicos especialistas no privado cobram tantos euros por uma consulta,

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tantos mil por operação, e mais tantos mil para a clínica. Acho ridículo e triste o facto de as pessoas terem de ir às tantas da madrugada, em certos lugares do país, ganhar vez para a porta do centro de saúde, para poder ter uma consulta. Não percebo também o facto do estado não ter incluído no programa de saúde, a comparticipação das consultas de medicina dentária.

Estou a par destas situações através da comunicação social. Os Mass Media, sistemas organizados de produção, difusão e recepção de informação, são geridos, por empresas especializadas na comunicação de massas e exploradas nos regimes concorrenciais, monopolísticas ou mistos. As empresas podem ser privadas, públicas ou estatais. Estas diferenças fazem com que a informação seja trabalhada de forma diferente, produzindo um produto específico de mensagens políticas, ideológicas, comerciais, recreativas e culturais. Tenho consciência que podem moldar a opinião pública.

Pelo facto de estar desempregada, tenho a oportunidade, de poder acompanhar o meu marido nos tratamentos, nas consultas, e mimá-lo mais, estando presente.

Com os meus pais e uma irmã a viverem bem em França, outra irmã na Suíça, às vezes desmoralizo e bem me apetecia ir para lá também. Acho que as situações e problemas profissionais vividos por mim, fizeram-me ficar um pouco pessimista relativamente a situações de oportunidade futuras. Tenho mais conhecimento dos direitos e deveres enquanto trabalhadora e quero ser optimista em relação à postura dos empregadores. Numa conjuntura que já é de crise económica, não quero que se vislumbre uma grave crise de valores. Se tivesse uma boa oportunidade de ir trabalhar para o estrangeiro, ia-me embora novamente.

Eu só quero uma oportunidade para com seriedade e honestidade, poder trabalhar.

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