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O prompting e suas funções linguístico-interacionais nas afasias

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JULIA DA SILVA MARINHO

O PROMPTING E SUAS FUNÇÕES

LINGUÍSTICO-INTERACIONAIS NAS AFASIAS

CAMPINAS,

2012

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

JULIA DA SILVA MARINHO

O PROMPTING E SUAS FUNÇÕES LINGUÍSTICO-INTERACIONAIS

NAS AFASIAS

Orientadora: Profa.Dra. Edwiges Maria Morato

Tese de doutorado apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Doutora em Linguística.

CAMPINAS,

2012

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iv FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA POR

CRISLLENE QUEIROZ CUSTODIO – CRB8/8624 - BIBLIOTECA DO INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM - UNICAMP

M338p

Marinho, Julia da Silva, 1983-

O prompting e suas funções linguístico-interacionais nas afasias / Julia da Silva Marinho. -- Campinas, SP : [s.n.], 2012.

Orientador : Edwiges Maria Morato.

Tese (doutorado) - Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem.

1. Prompting (Fonoaudiologia). 2. Afasia. 3. Neurolinguística. 4. Interação verbal. I. Morato, Edwiges Maria, 1961-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Estudos da Linguagem. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em inglês: Prompting and its linguistics-interactional functions in aphasia. Palavras-chave em inglês:

Prompting (Speech, language and hearing sciences) Aphasia

Neurolinguistics Verbal interaction

Titulação: Doutora em Linguística. Banca examinadora:

Edwiges Maria Morato [Orientador] Anna Christina Bentes da Silva Larissa Cristina Berti

Margareth de Souza Freitas Thomopoulos Marígia Ana de Moura Aguiar

Data da defesa: 21-09-2012.

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v Folha de Aprovação

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vii AGRADECIMENTOS

À orientadora Edwiges Morato, por quem tenho imensa admiração, pelo empenho e competência nas orientações, pela incentivo, pelo acolhimento, pela compreensão e pelos constantes ensinamentos;

às professoras Anna Christina Bentes e Margareth de Souza Freitas Thomopoulos, por ocasião do exame de qualificação da tese, pelas valiosas contribuições, discussões e indagações;

às professoras Heloísa Macedo e Vanda Elias, pela leitura atenciosa e comentários enriquecedores do texto de qualificação de área;

ao professor Ray Wilkinson, por ter aceitado me receber em seu grupo de pesquisa na Universidade de Manchester, pelo acolhimento e recepção na Inglaterra, pelas frequentes supervisões e ricas discussões em torno dos dados conversacionais de afasia;

à professora Marígia Aguiar, por estar sempre ao meu lado, me incentivando e acreditando no meu trabalho;

à Fapesp, pela bolsa de estudo concedida e incentivo financeiro à pesquisa;

à Capes, pela bolsa-sanduíche concedida por ocasião do estágio doutoral na Universidade de Manchester;

aos participantes do Centro de Convivência de Afásicos (CCA), pelas experiências ali vividas, pelo aprendizado e pela amizade;

aos amigos do grupo de pesquisa COGITES, pelas valiosas discussões e companheirismo; aos queridos amigos que a Unicamp me presentou - Aline Gravina, Heloísa Macedo, Karla dos Santos, Lílian Sousa, Marcela Braganholo, Marcos Pires e Sandra Cazelato - pela convivência diária, companheirismo, amizade e por tornarem os meus dias longe de casa mais alegres;

aos familiares e amigos, pela torcida e carinho;

ao Rafael, meu amado e companheiro marido, por entender as minhas ausências, por estar perto, mesmo quando distante, pela torcida, pelo carinho e amor;

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“De tudo, ficaram três coisas: a certeza de que estamos

sempre começando, a certeza de que é preciso continuar e a certeza de que seremos interrompidos antes de terminar. Fazer da interrupção um novo caminho, fazer da queda um passo de dança, do medo uma escada, do sonho uma ponte, da procura um encontro”.

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xi RESUMO

Nosso propósito de empreender um estudo linguístico-interacional do prompting, bem como seus ganhos explicativos para o contexto das afasias, surgiu da imprecisão conceitual atualmente dispensada ao fenômeno. Grosso modo, o prompting é entendido como uma pista articulatória isto é, a execução, pelo interlocutor, do primeiro gesto ou das primeiras sequências de gestos que compõem as primeiras sílabas da palavra requerida. Não obstante a pouca clareza sobre os aspectos envolvidos em seu funcionamento, tem sido mencionado na literatura clínica quando da referência às estratégias terapêuticas utilizadas na recuperação da linguagem por afásicos. Via de regra, nesses estudos, o terapeuta fornece ou estimula o prompting oral ou escrito ao paciente. Com isso, perdem-se de vista vários aspectos constitutivos do fenômeno.

A presente pesquisa tem como objetivo qualificar e caracterizar a emergência do

prompting na linguagem de afásicos em meio às atividades interativas desenvolvidas no

Programa de Linguagem do Centro de Convivência de Afásicos (CCA), localizado no Instituto de Estudos da Linguagem/Universidade Estadual de Campinas (IEL/UNICAMP).

Ao tomá-lo como fenômeno a ser analisado, pretendemos definir melhor os contornos conceituais e explicativos do prompting, em suas diversas configurações e modalidades, descrevendo as condições e o contexto lingüístico-interacional propício a sua ocorrência, bem como a sua relação com as características de linguagem dos sujeitos afásicos. Além disso, objetivamos a caracterizar o que motiva os afásicos a selecionarem, na resposta ao prompting, por uma produção oral, escrita ou gestual.

O empreendimento analítico das implicações do prompting permite-nos uma melhor compreensão do que ocorre mais especificamente no contexto das afasias, a fim de que possamos estabelecer as relações necessárias acerca do fenômeno e possamos, com isso, agregar novos conhecimentos para a área dos estudos interacionais e conversacionais no campo da Linguística, além de contribuir para as investigações clínicas que objetivam a auxiliar os afásicos em suas dificuldades de comunicação e significação.

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xiii ABSTRACT

Our purpose in undertaking a linguistic-interactional study of verbal prompting, as well as its explanatory gains for the context of aphasia research, has arisen from the conceptual imprecision of the phenomenon. Roughly speaking, prompting is understood as an articulation cue, that is, the execution by the recipient, or the first act of the first sequences of gestures that forms the first syllables of the word required. The lack of clarity on some aspects involved in its functioning, verbal prompting is usually mentioned in the clinics literature when one refers to the therapeutical strategies used in language recovery by aphasics. As a rule in these studies the therapist provides or stimulates spoken or written prompting to the patient. Therefore various aspects of the phenomenon are lost of sight.

This research aims to describe and characterize the emergence of prompting in aphasic language through interactive activities developed in the Language program of Centro de Convivência de afásicos (CCA), located at the Institute of Language Studies/ Universidade Estadual de Campinas (IEL/Unicamp).

By taking it as a phenomenon to be analyzed, we intend to further define and explain the conceptual contours of prompting, in its various settings and types, describing the conditions and interactional-linguistic context to its occurrence and its relationship with the characteristics of the aphasic language. Furthermore, we aimed to characterize what motivates aphasics to choose, in response to prompting by an oral production, written or sign language.

The development of the analytical implications of prompting allows us as better understanding of what occurs specifically in the context of aphasia, in order that we may establish the necessary links about the phenomenon and can, therefore, besides adding new knowledge to the area of interactional and conversational studies in the field of linguistics, contribute to the clinical investigations that aim to assist aphasic subjects in their difficulties to communicate and significate.

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xv LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 Tipos de facilitação lexical mais utilizados como técnicas de reabilitação (PAMIES, PEÑA-CASANOVA & PULIDO, 2005, p.212)

53

QUADRO 2 Sumarização dos dados analisados nesta tese 86

QUADRO 3 Número de ocorrências das diferentes categorias de prompting 108

QUADRO 4 Quadro esquemático das sequências de “Hint and Guess” 109

QUADRO 5 Síntese das características linguísticas e estratégias utilizadas pelos sujeitos

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xvii O PROMPTING E SUAS FUNÇÕES LINGUÍSTICO-INTERACIONAIS NAS

AFASIAS

SUMÁRIO

CAPÍTULO 1

1. INTRODUÇÃO AO PROBLEMA TEÓRICO...19

CAPÍTULO 2 2. DOS ESTUDOS NEUROLINGUÍSTICOS RELATIVOS AO PROMPTING: CONTRIBUIÇÃO DO SOCIOCOGNITIVISMO INTERACIONAL ...23

2.1 Introdução...23

2.2 Abordagens cognitivistas da produção da linguagem...27

2.3 Das abordagens interacionais/conversacionais da linguagem...31

2.4 Concluindo: descrição do estatuto linguístico-interacional do fenômeno....44

CAPÍTULO 3 3. O ESTUDO SOBRE O PROMPTING NO CONTEXTO DAS AFASIAS...49

3.1 Das questões de linguagem nas afasias...49

3.2 O prompting no contexto clínico das afasias: conceituação e utilização terapêutica...58

3.3 Discussão da literatura no campo da clínica de linguagem de afásicos...63

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xviii CAPÍTULO 4

4. SOBRE A METODOLOGIA DA PESQUISA...71

4.1 Problematização e objetivos...71

4.2 Conhecendo o Centro de Convivência de Afásicos (CCA): local de produção e emergência dos dados...73

4.2.1 Descrição dos sujeitos participantes do CCA...75 4.3 A constituição do corpus...83

CAPÍTULO 5

5. ANÁLISE DE DADOS...87

5.1 Apresentação dos dados...87

5.2 Resultados e discussão...107

CAPÍTULO 6

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS...119

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...127

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CAPÍTULO 1

INTRODUÇÃO AO PROBLEMA TEÓRICO

É muito comum que escutemos falar do termo por nós aqui estudado, o prompting, entre os profissionais da Fonoaudiologia, no campo dos estudos clínicos, bem como nas questões relacionadas a pesquisas na área da Neurolinguística, principalmente, para se referir ao trabalho terapêutico com crianças em fase de aquisição de linguagem, pacientes com dificuldades de iniciativa verbal, como autistas e afásicos, entre outros. O termo prompting é evocado para definir a situação na qual o interlocutor vem em auxílio ao falante, em momentos de dificuldades de nomeação, promovendo pistas (gestuais, fonológicas, escritas etc) a fim de que a evocação oral seja realizada e a comunicação desenvolvida com maior fluência.

Apesar de ser uma estratégia que, nos últimos anos, vem sendo explorada enquanto técnica-terapêutica, não tem recebido a atenção teórico-metodológica devida, o que, inclusive, impede que seja analisada de forma consistente no próprio contexto clínico. Há uma grande escassez de estudos dedicados ao tema com atenção e acurácia, que, de maneira mais específica, se proponham a estudar a natureza do fenômeno, suas características e condições de emergência.

O uso que vem sendo feito do fenômeno atualmente é, em sua grande maioria, baseado em trabalhos calcados no método clínico tradicional, em que prevalecem a visão estruturalista e comportamentalista da linguagem que, muitas vezes, não leva em conta o aspecto social e interacional das práticas linguísticas. Nessa abordagem, o prompting é entendido como um fenômeno fornecido pelo terapeuta, sendo a resposta do afásico considerada uma reação comportamental ao estímulo.

Reconhecemos a importância de alguns dos testes e procedimentos avaliativos que se propõem a identificar e discorrer acerca das as dificuldades de ordem linguística apresentadas pelos pacientes com alterações de linguagem, buscando alternativas terapêuticas entre os estímulos que se mostram produtivos para tal finalidade.

Contudo, o intuitivismo do enfoque e mesmo das técnicas terapêuticas deixam de compreender a natureza linguística e cognitiva do fenômeno, bem como a forma como os indivíduos dele lançam mão de forma estratégica e processual. Afinal, o prompting se deixa a ver em situações comunicativas, interacionais. Assim pensando, apostamos na análise mais

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20 aprofundada do fenômeno e, a partir daí, nos trabalhos que seguem linhas teóricas de base mais sócio-interacionista.

As pesquisas e discussões linguístico-interacionais realizadas no terreno das afasias e outras alterações de linguagem permitem, como bem assinala Morato (2008), que possamos entender melhor também questões relacionadas à organização da linguagem não-patológica, bem como estabeler as relações não apenas de excludência entre o normal e o patológico.

Assim, nosso propósito de empreender um estudo linguístico-interacional do prompting verbal (oral e escrito), bem como de verificar seus ganhos explicativos para o contexto das afasias surge da imprecisão conceitual do fenômeno, em geral tomado apenas como “um

auxílio para a inclusão automática de uma palavra, especialmente em tarefas em que devem completar ou concluir uma frase” (Benson & Ardilla, 1998, p.158). Via de regra, nesses

estudos, o terapeuta fornece ou estimula o prompting oral ou escrito com vistas à produção do paciente. Nessa acepção, perdem-se de vista vários aspectos do fenômeno, como, por exemplo, seu caráter linguístico-interacional, sua relação com a fluência oral e seu aspecto estruturador e reorganizador do tópico conversacional e do discurso.

O presente trabalho tem como objetivo qualificar e caracterizar a emergência do prompting na linguagem de afásicos em meio às atividades interativas desenvolvidas no Programa de Linguagem de um dos grupos do Centro de Convivência de Afásicos (CCA), localizado no Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas (IEL/UNICAMP).

Grosso modo o prompting é entendido como uma pista articulatória isto é, execução, pelo

interlocutor, do primeiro gesto ou das primeiras seqüências de gestos que compõem as primeiras sílabas da palavra requerida. Ao tomá-lo como fenômeno a ser analisado, pretendemos definir melhor os contornos conceituais do prompting, em suas diversas configurações e modalidades, descrevendo as condições e o contexto linguístico-interacional propício à sua ocorrência.

Nesse sentido, enfatizamos a importância de nos determos também na reflexão sobre a produção de linguagem em interação, tomando por base no campo da Neurolinguística uma perspectiva sócio-interacional (ou sócio-cognitiva) de inspiração vygotskyana. Neste quadro teórico, a linguagem e a interação são essenciais na constituição e organização da cognição humana.

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21 Como ressalta Morato (1996, 2007), tomando por base as reflexões sobre a sociogênese da cognição humana e o papel espistemológico reservado à linguagem e à interação desenvolvidas por Vygotsky (1934/1987), é nas ações sociocognitivas - isto é, nas múltiplas e diversas experiências simbólicas e práticas sócio-culturais - que emergem as significações verbais e não verbais. Tal abordagem privilegia as relações sociais instauradas pelos interlocutores mediante os recursos linguísticos e cognitivos de que dispõem e salienta a presença de semioses co-ocorrentes (simultâneas e solidárias entre si) em nossa tarefa de compreensão e interpretação do mundo (MORATO, 2007).

A presente tese está subdividida em 7 (sete) capítulos. No primeiro capítulo, realizamos uma introdução sobre o tema pesquisado com a apresentação da nossa proposta de estudo, bem como a sua justificativa. O capítulo segundo é dividido em 4 (quatro) partes. Realizamos, nesta sessão, uma inserção no campo da Linguística, explorando, a partir de diferentes abordagens metodológicas, categorias linguísticas assemelhadas ao fenômeno aqui investigado, que possam convergir na explicação e entendimento do nosso objeto de análise. Na primeira parte, fazemos uma introdução sobre a inserção e importância dos estudos afasiológicos no campo da Linguística. Posteriormente, discutimos, os limites do ponto de vista das abordagens essencialmente cognitivistas do fenômeno. Na terceira parte do capítulo, dedicamo-nos à explicação das categorias linguísticas utilizadas, a partir de uma perspectiva interacional da linguagem e da cognição, na qual se situa a orientação metodológica que norteia este trabalho. Ao final do capítulo, para concluir, refletimos acerca do estatuto linguístico-interacional do

prompting, procurando levantar vantagens de nossa proposta analítica para a compreensão do

fenômeno e suas implicações teóricas e práticas, tanto no campo investigativo, quanto no terapêutico.

No terceiro capítulo, realizamos um aprofundamento sobre o tema principal desta pesquisa, o prompting, mais especificamente, em seu contexto clínico, onde é comumente utilizado face ao tratamento de dificuldades de linguagem. No subitem 3.1, realizamos uma revisão bibliográfica a respeito da concepção e uso do termo no contexto clínico. No subitem seguinte, aprofundamos a discussão do fenômeno no campo da linguagem em seus diversos formatos, porém, mais especificamente, entre os afásicos. No subitem 3.3, discorremos, brevemente, sobre as afasias e sua semiologia, principalmente no que se refere aos sintomas de linguagem que reclamam a utilização da estratégia linguística do prompting.

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22 O quarto capítulo aborda questões metodológicas relativas à execução desta pesquisa. Iniciamos essa seção retomando a problematização e os objetivos do trabalho, bem como as justificativas ou motivações para a sua realização. Em seguida, apresentamos o local em que foi realizada a coleta dos dados, o Centro de Convivência de Afásicos, caracterizando o seu funcionamento e a maneira como realizamos a escolha dos dados, bem como os quadros afásicos dos sujeitos.

O capítulo 5 (cinco) é dividido em duas partes e diz respeito à análise dos dados. Na primeira parte, procedemos à apresentação dos dados que constituem o corpus, isto é, os extratos conversacionais e, além disso, a descrição do contexto em que emergiram os fenômenos linguísticos em suas diferentes configurações. A segunda parte do quinto capítulo diz respeito aos resultados alcançados na pesquisa, bem como a discussão e reflexão em torno da constituição do corpus.

No sexto e último capítulo, abordamos, a partir dos achados da pesquisa, as implicações teóricas e terapêuticas do fenômeno, tomando por base uma abordagem sociocognitiva da linguagem e da observação a respeito da importância de uma análise linguístico-interacional do

prompting para uma melhor compreensão não só das afasias, como da linguagem não

patólogica. Neste capítulo, realizamos ainda algumas discussões sobre os achados da pesquisa e a tipologia de prompting proposta no escopo do estudo. Além disso, refletimos sobre questões-chave surgidas no decorrer da análise do fenômeno, como aquelas relacionadas às dicotomias fluência x disfluência, bem como competência x incompetência. E, por fim, discorremos sobre a importância da análise do prompting para que se compreenda melhor questões relacionadas aos fenômenos conversacionais, bem como as atividades interacionais de uma forma geral.

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23 CAPÍTULO 2

DOS ESTUDOS NEUROLINGUÍSTICOS RELATIVOS AO PROMPTING: CONTRIBUIÇÃO DO SOCIOCOGNITIVISMO INTERACIONAL

2.1 Introdução

Considerar as questões de linguagem apenas sob um único ponto de vista é ter uma visão reducionista do processo e nos leva inevitavelmente às dicotomias que perpassam as discussões em torno das afasias e seus fenômenos linguísticos, como podemos facilmente pontuar como exemplo os debates sobre as questões internas x externas da linguagem. A separação entre o externo e o interno, presente nas ciências cognitivas clássicas, enfatizam Koch e Cunha-Lima (2007, p. 278), é questionada também em outros aspectos, principalmente na separação entre fenômenos mentais e sociais.

De acordo com Koch e Cunha-Lima (2007, p.254):

Os cognitivistas clássicos se preocupam fundamentalmente com aspectos internos, mentais, individuais, inatos e universais do processamento linguístico e que o outro grupo (que não se pode reunir sob um único nome, mas que reúne sociolinguistas, etnolinguistas, analistas do discurso, pragmaticistas, entre outros) está fundamentalmente preocupado com aspectos externos, sociais e históricos da linguagem. No entanto, nos últimos anos têm crescido os debates e pesquisas que compreendem os fenômenos cognitivos em geral, e a linguagem em particular, como fenômenos capazes de oferecer modelos da interação e da construção de sentidos cognitivamente plausíveis ou cognitivamente motivados e, ao mesmo tempo, como fenômenos que acontecem na vida social.

Tendo em vista o exposto, é proposta neste trabalho uma visão que leve em conta tanto os aspectos sociais, como os cognitivos da linguagem, isto é, uma abordagem sociocognitivista de inspiração, principalmente, vygotskiana, baseada no pressuposto básico de que a linguagem e a interação são essenciais na constituição e organização da cognição humana.

Morato (2007, p.18) chama atenção para o fato de que “no campo da Linguística, a

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Cognitiva, Linguística Enunciativa, Análise da Conversação, Linguística Textual, Neurolinguística) agrega aspectos sócio-culturais, linguísticos e multimodais à compreensão da problemática cognitiva, centrada na hipótese segundo a qual os processos cognitivos humanos se constituem em sociedade e no curso das interações e práticas sociais”.

A alternativa aqui seguida, postula Marcuschi (2007, p.61), tem por base a hipótese sociocognitiva do conhecimento; neste caso, vai-se da investigação de processos gerais e abstratos para a análise de atividades situadas. Neste contexto teórico, afirma o autor, os seres humanos são vistos como sujeitos linguísticos e o problema é como dar conta da produção e distribuição do conhecimento nas atividades linguísticas conjuntas desses sujeitos como seres sociais. O problema é explicar como é possível compreender-se e

produzir sentidos públicos através do ‘uso’ da língua como realidade simbólica (grifos do

autor).

A abordagem sociocognitiva, de acordo com Morato (2007),

incorpora aspectos socioculturais e linguístico-interacionais à compreensão da problemática cognitiva, investindo no domínio empírico com base na hipótese de que nossos processos cognitivos se constituem em sociedade e no decurso das interações e práticas sociais (isto é, não são essencialmente individuais e inatas) e na hipótese de inspiração vygostskiana segundo a qual não há possibilidades integrais de linguagem fora de processos interativos humanos. Além de ser um fenômeno social (portanto, não descarnada de seus usuários e de suas condições materiais de vida em sociedade), a cognição – tomada sempre em inter-ação – é também situada local e historicamente, sendo sua constituição e funcionamento estabilizados e reorganizados nessas circunstâncias, compartilhadas de algum modo e por meio de ações conjuntas e coordenadas pelos sujeitos (MORATO, 2007, p.43).

Nesta abordagem, acrescenta Morato (2007), configura-se um conjunto de questões ligadas a todo tipo de produção linguística que é considerada material interativo: práticas, estratégias e operações linguageiras, dinâmicas de trocas conversacionais, comunicação verbal e não-verbal, construção de valores culturais, atividades referenciais e inferenciais realizadas pelos falantes, normas pragmáticas que presidem a utilização da linguagem etc.

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25 constitutivas entre linguagem e cognição, tomando por base Vygotsky (1934/1987), é nas ações sociocognitivas - isto é, nas múltiplas e diversas interações humanas - que emergem as significações verbais e não verbais. Tal abordagem privilegia as relações sociais instauradas pelos interlocutores mediante os recursos linguísticos de que dispõem e salienta a presença de semioses co-ocorrentes (simultâneas e solidárias entre si) em nossa tarefa de compreensão e interpretação do mundo, realizada, como afirma Marcuschi (2005, p.69) dentre outros, em meio a versões públicas da realidade, em meio à negociação pública de pontos de vista, ajustes, acordos, desacordos, etc., enfim, em diferentes práticas com linguagem, em variados contextos sociais.

Para que fique bem estabelecida a linha teórica que optamos por seguir, é importante que explicitemos as diversas abordagens em que identificamos fenômenos assemelhados ao ora investigado e o modo como são analisados esses processos para que possamos articular os debates e formular questionamentos adequados acerca da estratégia de linguagem que está sendo aqui investigada, principalmente, pela opacidade ainda existente em relação a sua conceituação e à descrição de seu funcionamento, como já pôde ser percebido no capítulo introdutório desta tese.

Neste capítulo, enfatizaremos diferentes linhas de pesquisa que se debruçam em pesquisas e estudos na tentativa de explicar de forma mais precisa as questões envolvidas na produção da linguagem e no seu processamento de forma geral. Aliadas a essas questões, focaremos também nos estudos afasiológicos desenvolvidos no campo da linguística, uma vez que, como aponta Morato (2007, p.06), “os dados de instabilidade

relativos à linguagem – como os dados de afasia – têm-se mostrado de fato instigantes para o estudo das relações entre linguagem e cognição, como bem preconizou Jakobson nos 1950”.

Inaugurando a entrada sistemática da Linguística nos estudos das afasias, Jakobson (1954) destaca a importância dessa disciplina para uma adequada descrição e melhor compreensão dos fenômenos que ali ocorrem. Esse autor, lembramos, foi o primeiro a realizar uma análise dos distúrbios afásicos utilizando critérios essencialmente linguísticos. Jakobson rompeu com a tradição de tomar a afasia de forma psicológica ou meramente mental, comum na antiga Afasiologia, assumindo o ponto de vista de que só se pode

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26 entender a linguagem "em funcionamento" e compreendendo as suas distintas funções, e não apenas a partir do sistema linguístico stricto sensu.

Hebling (2007), ao realizar uma investigação sobre os estudos de Jakobson sobre a afasia, chama atenção para uma aproximação teórica indireta entre o estruturalismo peculiar de Jakobson e perspectivas sócio-cognitivas atuais dedicadas aos estudos da linguagem e da afasia, pautando-nos pelas diferentes aplicações da idéia de multi-funcionalidade linguística, que remete aos postulados humboldtianos que grosso modo observam a língua como modo de atividade.

Morato (2006, p.157), ao comentar a respeito da influência de Jakobson no estudo das afasias a partir do ponto de vista da Lingüística, acrescenta que:

Ao se dedicar às afasias, Jakobson estava, na verdade, interessado em construir uma teoria geral da linguagem, uma teoria que a explicasse no seu todo: aquisição, funcionamento, estrutura, alterações etc. Justamente por ferir a norma, a gramaticalidade, os padrões estruturais e funcionais da língua, as afasias dariam solidez empírica à sua teorização sobre o funcionamento da linguagem de um modo geral. A partir dessa primeira incursão linguística, passou-se a acreditar que os linguistas e a Linguística em muito contribuiriam para uma melhor descrição da semiologia e do diagnóstico das afasias.

O estudo da afasia, acrescenta Morato (2010, p.26), tem sido fundamental não apenas para o diagnóstico, mas também para o conhecimento da estrutura e do funcionamento da linguagem, uma vez que as dissociações e seletividades que ela indica permitem elaborar hipóteses que a observação do processamento normal não faz mais do que apenas sugerir.

No plano da pesquisa neurolinguística, estudam-se as afasias não apenas por meio de testes-padrão com fins diagnósticos ou por neuroimagens, mas, especialmente, por meio de protocolos não fechados de investigação, e também por observação e análise do contexto de uso da linguagem (MORATO, 2010, p.27).

Tendo em vista essa breve introdução a respeito da inserção e do interesse dos estudos afasiológicos para a Linguística focalizamos agora a discussão de aspectos

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27 específicos do prompting e os processos de linguagem a ele relacionados a partir de diferentes linhas teóricas no campo, suas peculiaridades e congruências.

2.2 Abordagens cognitivistas da produção de linguagem

Nesta seção, nos dedicaremos de forma mais aprofundada ao tratamento dos fenômenos de linguagem e sua produção propriamente dita, tendo como pano de fundo os estudos e diferentes abordagens cognitivistas. As questões de ordem puramente cognitivas no tratamento dos processos de linguagem, apesar de divergentes em muitos aspectos da linha teórica por nós adotada, permite que façamos algumas relações para uma abordagem mais completa do fenômeno ora investigado.

A produção de linguagem é concebida, na maior parte dos modelos de produção, como uma atividade complexa que envolve processamento de informação em diferentes níveis ou estágios (GARRETT, 1976, 1980, 1988; LEVELT, 1989; BOCK e LEVELT, 1994). Para o desenvolvimento desses modelos, os estudos e pesquisas para explicação dos mecanismos envolvidos na produção da palavra falada, que tomam por base a perspectiva cognitivista, analisam, principalmente, os desvios de fala e outras técnicas experimentais de produção da palavra falada.

Garrett (1976, 1980) defende a existência de cinco níveis de processamento da fala, cuja característica principal do modelo é o fato desses processos serem considerados independentes. O primeiro nível corresponde ao nível da mensagem que representa a intenção do sujeito de falar, correspondendo, portanto, à seleção da informação relevante a ser transmitida; o segundo nível, o nível funcional, consiste na seleção das palavras/conceitos que transmitem a informação pretendida, correspondendo, deste modo, ao processo de lexicalização; o nível três, chamado nível posicional, refere-se ao planejamento sintático, responsável pelo posicionamento correto de cada palavra na frase; no nível seguinte, todas as palavras são transformadas em representações fonológicas, considerando-se, assim, o nível do som; e, por último, tem-se o nível articulatório que consiste na ativação dos músculos periféricos do sistema articulatório para a produção propriamente dita dos sons em sua sequência correta. De acordo com o autor, o processamento é serial e não existe interação entre cada um desses estágios, isto é, durante

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28 o processamento de cada nível, somente um processo está sendo executado.

Com base nos trabalhos de Garett (1976, 1980), Levelt (1989), propôs um modelo serial de produção de fala que consiste fundamentalmente em três estágios subseqüentes: o conceituador, o formulador e o articulador. No conceituador ocorre a geração da mensagem. No formulador, a mensagem é codificada sintática e fonologicamente. No articulador, a fala está preparada para a execução, ou seja, para tornar-se discurso externo. O modelo inclui o chamado auto-monitoramento, realizado pelo sistema de compreensão da fala. Esse sistema analisa tanto o discurso externo quanto o interno e é a análise deste último que permite ao falante detectar erros e corrigi-los antes que ocorra a efetiva articulação. O monitoramento da própria fala ou da fala alheia fornece ao falante as restrições (constraints) ao que será produzido a seguir, seja esta produção um novo enunciado qualquer, como uma resposta a uma pergunta, ou então, a correção de um problema identificado por um dos interlocutores (LEVELT, 1983). De acordo com Hebling (2009), em sua pesquisa sobre a reformulação em afásicos, estudos sobre as hesitações e pausas no fluxo da conversação indicam que esses comportamentos de monitoramento variam em sua duração dependendo da predicabilidade contextual de uma palavra. Esses achados sugerem que essas pausas podem caracterizar dificuldades momentâneas para o acesso lexical. A transferência e a reutilização de elementos estruturais das formulações anteriores a uma correção, segundo Levelt, possibilitam ao falante um ganho na fluência e no estabelecimento de coerência discursiva em benefício do interlocutor.

Um modelo relacionado às questões do acesso lexical, consequentemente, relacionado à questão da produção verbal, foi aquele proposto por Dell (1986) e Dell e O’Seaghdha (1991), conhecido como modelo de ativação interacional da palavra falada. Consiste em uma rede estrutural que possui três níveis de representação: traços semânticos, nodos lexicais e nodos fonológicos. Um feixe de traços semânticos representa um conceito. O modelo postula que o acesso lexical ocorre quando as conexões entre os traços semânticos e os nodos lexicais estão enfraquecidas, diminuindo a ativação dos nodos lexicais pelos traços semânticos. Consequentemente, a ativação dos nodos fonológicos é menos provável que aconteça e o acesso lexical não ocorre. Portanto, a seleção do lemma1

1

Nível intermediário de representação das palavras, em que as mesmas são especificadas nos níveis sintático e semântico, mas não no nível fonológico (PARENTE E COLS, 2006, p.134).

(29)

29 mantém-se incompleta quando o acesso falha.

O modelo descrito é contrário ao sistema modular de acesso ao léxico proposto por Levelt et al (1991) e os outros teóricos que apresentam modelos modularistas da produção de fala. Este modelo sugere que o acesso ao léxico acontece em duas etapas independentes. Quando evocamos uma palavra, primeiramente acessamos o nível semântico, em que as palavras são representadas na forma de lemmas, para somente depois passar a um nível intermediário. Durante o acesso do lemma, as informações semânticas são ativadas e as fonológicas não. E de maneira oposta, no acesso fonológico as informações fonológicas são acionadas, mas as semânticas mantêm-se inativas. Os lemmas são especificados no nível sintático e semântico, mas não no nível fonológico. Após a seleção do lemma (seleção lexical), o sistema deve selecionar as formas fonológicas dessa palavra no estágio de codificação fonológica. Quando ocorre a ativação fonológica da palavra, é o lexema da palavra que é acionado.

Whitworth, Webster e Howard (2005) sugerem um modelo de produção da palavra falada durante a nomeação de figuras e objetos. Os autores apontam que existem quatro estágios principais que estão envolvidos na recuperação das palavras que são: o sistema semântico (o armazenamento de significado de palavras que são ativados em resposta a uma idéia ou conceito), o léxico fonológico de saída (armazenamento da palavra na forma falada: promove o acesso para a forma falada da palavra), estrutura fonológica (que gera uma sequência métrica de fonemas para a produção), programação articulatória (converte o fonema em movimentos articulatórios) e, por fim, tem-se a fala articulada.

De acordo com os autores, a produção da fala de uma forma geral é caracterizada por anomias, com falhas e atrasos na recuperação da palavra. Erros semânticos são produzidos tanto nas atividades de nomeação de fala quanto de escrita. Quando os sujeitos com dificuldades de nomeação decorrente de uma alteração no sistema semântico recebem auxílio de ordem fonêmica para uma associação semântica, esses podem produzir uma palavra semanticamente associada à palavra-alvo (HOWARD E ORCHAND-LISLE, 1984).

Esses modelos de produção de fala e acesso lexical baseados nos erros de fala, experimentos e tarefas de nomeação nos fornecem algumas informações a respeito desse processamento, mas, ao mesmo tempo, deixam de lado questões cruciais pertinentes ao ato

(30)

30 de linguagem propriamente dito, como as interações e os aspectos sociais envolvidos nessas atividades. Apresentam uma abordagem abertamente internalista das questões da linguagem, uma vez que se preocupam essencialmente com a explicação do processo de tradução do pensamento, dos conteúdos internos à fala articulada, na qual estão implicados processos cognitivos, linguísticos e motores apenas.

Partindo para uma visada mais social dos aspectos linguísticos e afastando-se dos modelos essencialmente cognitivistas de produção de fala, convocamos Luria (1986), neuropsicólogo estudioso das questões de linguagem, quando este discorre sobre a organização das palavras faladas em uma rede semântica. O autor postula que a palavra converte-se em elo ou nó central de toda uma rede de imagens por ela evocadas e de palavras “conotativamente” ligadas a ela. Aquele que fala ou que escuta contém, inibe, toda esta rede de palavras e imagens evocadas pela palavra, para poder escolher o significado imediato ou denotativo no caso ou situações dadas.

O autor destaca a importância dos métodos associativos para o estudo da organização das redes semânticas e esclarece que medir a velocidade da reação também pode dar indícios da sua organização, uma vez que palavras mais complexas levam mais tempo para que se acesse uma palavra associada. Uma das variantes do método associativo – as associações livres – indica que as redes semânticas podem estar determinadas por processos cognoscitivos – de caráter situacional ou conceitual – ou por processos afetivos, às vezes por tendências encobertas ou por vivências.

Se cada palavra evoca um campo semântico, isto é, está unida a uma rede de associações que aparece involuntariamente, é fácil verificar que a recuperação de palavras ou a denominação de objetos de nenhuma forma é a simples atualização de uma palavra. Tanto a recuperação de uma palavra como a designação de um objeto são um processo de escolha da palavra necessária dentre todo um complexo de enlaces emergentes e ambos os atos são, por sua estrutura cognitiva, muito mais complexos do que se costumava acreditar (LURIA, 1986, p.88).

Os limites de uma perspectiva cognitivista para uma análise de dados de linguagem reside, como aponta Koch e Cunha-Lima (2007, p.269), na inadequação de alguns pressupostos básicos como a radical separação entre mente e corpo, entre processo interno, individual e processo externo, social, e a cognição como sistema de representação

(31)

31 simbólica.

Concordamos com as autoras acima citadas quando essas afirmam que entender o funcionamento da linguagem exige observar essa língua em funcionamento, observar como os falantes constroem sentido com ela, como se engajam em atividades usando a língua como uma forma de mediação. Além disso, é necessário considerar o contexto mais imeditato de uso da língua e as relações desses usos linguísticos com as condições mais gerais de produção, tais como a visão de mundo e as práticas sociais e culturais dos falantes. Uma visão que incorpore aspectos sociais e culturais à compreensão que se tem do processamento cognitivo pode integrar o fato de que existem muitos processos cognitivos que acontecem na sociedade e não exclusivamente nos indivíduos.

Tendo em vista essas ponderações, apresentamos brevemente nesta sessão algumas abordagens que tratam das questões de linguagem e produção de fala a partir de diferentes postos de observação. Como nesta tese estamos interessadas nos processos linguístico-interacionais propriamente ditos, procuramos explorar uma alternativa explicativa às abordagens tradicionais do fenômeno em questão, alternativa esta baseada na premissa de que “não há possibilidades integrais de processos ou conteúdos cognitivos fora da linguagem e nem linguagem fora de processos interativos humanos” (Cf. MORATO, 2012, p.45).

Sendo assim, a partir de uma perspectiva sociocognitiva ou interacionista, é enfatizada no terreno de nossos interesses analíticos e orientação metodológica a inseparabilidade entre os processos linguísticos e cognitivos imbricados, essencialmente, às situações de interação.

2.3 Das abordagens interacionais/conversacionais da linguagem

Nos estudos do campo da Linguística é possível, a partir das pesquisas sobre o texto falado, sobretudo a partir dos estudos textuais e conversacionais, descrever e analisar a presença de características linguísticas assemelhadas funcionalmente ao fenômeno descrito na literatura clínica como prompting. Tais categorias linguísticas apresentam, como procuraremos assinalar, características muito semelhantes as do fenômeno aqui investigado,

(32)

32 como a colaboração do interlocutor na busca de palavras, a co-construção do texto falado, as estratégias de reformulação, o planejamento e o acabamento de sentenças.

Em grande parte dos estudos que serão mencionados nesta seção, podemos perceber regularidades quanto aos momentos interativos em que ocorrem as estratégias de

prompting. Goodwin & Goodwin (1986), por exemplo, compreendem as buscas de palavras

como atividades. De acordo com os autores (1986, p.52),

As activities, word searches provide organization for a wide range of vocal and non-vocal phenomena, including both stereotypic and nonstereotypic gestures, and second, that participants attend to such phenomena because they are part of currency through which appropriate coparticipation in the activity is displayed and negotiated.2

Abordando as atividades de busca de palavras e das estratégias a elas relacionadas, os autores questionam: como os sujeitos da conversação reconhecem que um momento de procura de palavra está em progresso? Para tentar responder a essa questão, remontam a Sacks, Schegloff & Jefferson (1974, p. 702), que perceberam uma propriedade das estruturas básicas utilizadas para produzir a fala em meio às conversações, estruturas essas denominadas turnos conversacionais, que permitem “uma projeção da unidade conversacional em construção e que, aproximadamente, servirá como opção de unidade a ser completada”.

Caracteristicamente, em uma busca de palavras, a unidade conversacional é interrompida após seu início, mas antes de ter sido finalizada. Este ponto de interrupção é, frequentemente, marcado por uma variedade de perturbações de fala, com características não-lexicais, chamadas hesitações, como, por exemplo, os alongamentos vocais e “uh´s” que podem assinalar um início de um auto-reparo, parte do processo da recuperação de um item lexical.

No caso da ocorrência das hesitações, detecta-se uma interrupção no fluxo informacional, devido a uma dificuldade de seleção de um ou mais termos do enunciado,

2

Como atividades, as buscas de palavras fornecem organização para uma ampla gama de fenômenos verbais e não-verbais, incluindo tanto os gestos estereotipados como os não-estereotipados, e também os participantes fazem uso do fenômeno porque são parte da atividade interativa em que a co-participação apropriada acontece e é negociada.

(33)

33 resultando um enunciado ainda não concluído do ponto de vista da organização sintagmática (Cf. FÁVERO, ANDRADE E AQUINO, 2006, p.261).

Sobre o fenômeno da hesitação, Marcuschi (2006, p.48) postula que este é intrínseco à competência comunicativa em contextos interativos de natureza oral, e não uma disfunção do falante. De acordo com o autor,

a hesitação desempenha papéis importantes na fala: papéis formais, cognitivos e interacionais. É uma atividade textual-discursiva que atua no plano de processamento e não no da formulação textual. Além disso, a hesitação não se acha aleatoriamente distribuída na estrutura organizacional do enunciado, mas obedece a alguns princípios gerais de distribuição e serve também como indicação de organização sintagmática da língua.

Assim, o autor explica que o papel da hesitação é muito mais o de sugerir os sintomas de um processamento em curso do que o de propor alternativas de formulação textual-discursiva, isto é, as interrupções hesitativas funcionam como indícios ao interlocutor de que o falante encontra-se em um momento de processamento linguístico e, dessa maneira, este pode realizar intervenções e/ou aguardar algum tipo de auxílio para o fechamento do segmento discursivo.

De acordo com Marcuschi (2006, p.69), as hesitações exercem dois grandes papéis formais: indicação de orientação/reorientação de seleções sintagmáticas e atividade de busca/confirmação de seleções lexicais. No primeiro caso, trata-se de um indicador da busca de um item lexical com a antecipação de um elemento que lhe convém, ou seja, refere-se ao prenúncio de uma correção; no segundo caso, diferentemente, ocorre que ainda não foi encontrado o item que se buscava, é uma tentativa de preenchimento, que seria o caso das buscas e recuperação de palavras. Assim, podemos dizer que os papéis da hesitação estão nas atividades de construção de estruturas e de identificação de referentes.

Em virtude do que isto ocasiona ao momento da conversação, uma interrupção como esta torna visível não apenas o fato de a palavra não estar disponível, mas uma relevante indisponibilidade que impede o processamento e o fluxo conversacional que não permite que o sujeito dê continuidade ao preenchimento inicialmente projetado. No entanto, a hesitação pode ter motivações discursivas, preservando a fluência, já que a fala, mesmo

(34)

34 com essas interrupções, pode continuar fluente. Sobre isso, Marcuschi (2006) conclui que dadas as funções que a hesitação desempenha no intercâmbio comunicativo, não é consistente a idéia de que a hesitação seja uma simples descontinuadora da fala. O texto falado, em sua materialidade, pode ser visto como uma pista relevante para a observação tanto das estratégias de formulação como das atividades verbais nos aspectos formais, interacionais e cognitivos.

Esta característica da língua falada refere-se, então, “aos procedimentos adotados pelos falantes para resolverem os problemas que surgem devido ao processamento on-line de formas e conteúdos” (MARCUSCHI, 1999, p.163), como é o caso das buscas por palavras.

Apresentamos abaixo um exemplo, extraído dos dados aqui selecionados3, que ilustra a atividade acima explicitada. No exemplo, há uma série de elementos hesitativos que ocorrem em momento de busca de palavras por parte de um falante afásico.

AphasiAcervus (10/09/2009)

01 HM deu pra entender tudo?

02 RL sim mas eh:: ah erm eh: (3s) a escrita...num num sei se:

O reparo, outra categoria lingüística estruturante das atividades de conversação, também se insere no rol dos fenômenos que apresentam aspectos funcionais relacionados e/ou que promovem o prompting.

Ao falarmos de reparo e propormos esta relação com o prompting, é importante que façamos uma pequena digressão para explicá-lo melhor, até mesmo para esclarecer e ampliar as suas relações com a estratégia de correção que se distancia um pouco em termos conceituais e funcionais do fenômeno aqui investigado. Para tanto, trazemos à tona o arrazoado feito por Schegloff, Jefferson & Sacks (1977) sobre o tema:

Some occurences, clearly in the domain with which we are concerned, do not involve the replacement of one item by another. For example, a “word search”, which can occur if an item (e.g. a

3

A transcrição completa do dado e sua contextualização podem ser visualizados nos anexos, ao final deste texto.

(35)

35 word) is not available to a speaker when “due”, is in the domain which we address, but is not a “replacement” or a “correction”.4

Já corrigir, de acordo com Fávero, Andrade e Aquino (2006, p.258), é produzir um enunciado linguístico (enunciado-reformulador – ER) que reformula um anterior (enunciado-fonte – EF), considerado “errado” aos olhos de um dos interlocutores. Segundos os autores, a correção é claramente um processo de reformulação retrospectiva. Diferente da hesitação, processo citado anteriormente, que é produzida prospectivamente.

Por outro lado, o reparo designa uma prática mais abrangente, que tem como objetivo a resolução de qualquer problema que apareça na interação em curso. Nesse caso, é possível considerar a correção como um subtipo de reparo (Cf. SCHEGLOFF, JEFFERSON e SACKS, 1977).

Dessa maneira, no caso do reparo em si não ocorre unicamente uma substituição ou correção de palavras, uma vez que quando há essa indisponibilidade, como no caso da busca/recuperação de palavras, a sequência pode se desenvolver em direção ao acesso lexical propriamente dito. Na correção, uma seleção inadequada já se efetivou, ou seja, o enunciado já foi concluído do ponto de vista sintagmático. No caso do reparo, não há erro ou engano para ser corrigido porque o problema reside em ter acesso ao léxico para evocar. Segue dado ilustrativo da estratégia de reparo em conversação entre afásico e não-afásico:

AphasiaAcervus (10/09/2009)

25 RL =é que é:: ainda é::um é:: 26 HM que ainda é difícil

Nos casos de reparo, esses podem ser caracterizados como auto-reparos ou hetero-reparos, isto é, o início ou complemento dos segmentos reparadores, sejam eles efetivos ou não, podem ter formas distintas. Por exemplo, aquele que realiza um reparo não é, necessariamente, o sujeito que iniciou a operação reparadora, neste caso teríamos um

4Algumas ocorrências, claramente fazendo parte do domínio em que estamos interessados (reparos), não

envolvem a substituição de um item por outro. Por exemplo, em uma “busca de palavras”, a qual pode ocorrer se um item (ex. “uma palavra”) não está disponível para o sujeito quando deveria estar, mas não se trata de uma “substituição” ou “correção”.

(36)

36 hetero-reparo. No auto-reparo, o falante que iniciou o processo de reparo vai, ele mesmo, finalizá-lo.

Fergunson (1992, p.299), ao estudar o reparo em conversações entre afásicos e não-afásicos, reconhece o fato de que, em momentos de lapsos e esquecimentos, o falante é provido de auxílio do seu interlocutor. A autora identifica o fenômeno também em estudos realizados com aprendizes de língua estrangeira, bem como em conversação entre falantes não-afásicos.

As word-finding difficulty is the most prominent characteristic of aphasia (BENSON, 1979), it is not surprising that conversation partners frequently supply words for aphasic people (LUBINSKI, DUCHAN, & WEITZNER-LIN, 1980). Strategies to assist this process have been targeted in therapy (FLOWERS & PEIZE, 1984; GOLPER & RAU, 1983). However, research on conversations between second-language learners and native speakers shows the same phenomenon (CARTER, 1988; DAY, CHENOWETH, CHUN & LUPPESCU, 1984; GIACOBBE & CAMMAROTA, 1986), as does research on conversation between normal speakers (TANNEN, 1989)5.

Lubinski, Duchan & Weitzer-Lin (1980, p.113), ao analisarem conversações entre afásicos e seus parceiros, propõem oito tipos de reparos que concorrem para a resolução de problemas de evocação e retorno ao tópico, dentre eles estão as estratégias de hint e guess (ou hipóteses), as mais utilizadas entre os sujeitos afásicos. Segundo as autoras, o primeiro envolve três subtipos de pistas: as pistas verbais (pistas sonoras e táticas de completamento de sentenças), pistas gestuais (apontar) e mudança na modalidade da pista (quando as pistas eram transformadas do modo verbal para o modo escrito ou vice-versa); a estratégia de

guess envolve a apresentação de um conjunto restrito de respostas a partir das quais o

reparo (a palavra pretendida) pode ser formulado. As autoras mencionam ainda as seguintes estratégias: perguntas iniciadas com QU-, correções e rejeições, repetições, enunciados sociais tangenciados, aproximações fonológicas e os reforços positivos.

5 Como as dificuldades de encontrar palavras são consideradas uma das características mais proeminentes da

afasia (BENSON, 1979), não é surpresa que os parceiros conversacionais forneçam frequentemente palavras para as pessoas afásicas (LUBINSKI, DUCHAN & WEITZNER-LIN, 1980). Algumas tarefas para promover essas estratégias foram focadas em terapias (FLOWERS & PEIZE, 1984; GOLPER & RAU, 1983). No entanto, pesquisas conversacionais realizadas entre aprendizes de segunda língua apresentam o mesmo fenômeno (CARTER, 1988; DAY, CHENOWETH, CHUN & LUPPESCU, 1984; GIACOBBE & CAMMAROTA, 1986), assim como pesquisas conversacionais entre falantes “normais” (TANNEN, 1989).

(37)

37 Em relação às estratégias de guess, Oelschlaeger & Damico (2003) também as consideram uma estratégia facilitadora nos momentos de dificuldade de encontrar palavras. De acordo com os autores, a guess é uma estratégia importante na conversação, pois quando o interlocutor oferece uma palavra como “guess”/hipótese, o afásico é selecionado como próximo falante. Dessa forma, ao fazer um questionamento, o interlocutor socialmente identifica o sujeito afásico como competente para entender a necessidade de promover uma resposta àquela pergunta e ser linguisticamente capaz de o fazer.

Laakso (2003) pondera também sobre o fato de falantes sem dificuldades de linguagem fazerem uso de algumas estratégias linguístico-interacionais em momentos de procura de palavras, como, por exemplo, quando direciona a procura para o seu interlocutor.

Além do reparo, são citadas ainda as estratégias de repetição que também colaboram para a estruturação, resolução de problemas e manutenção da fluência durante os eventos comunicativos.

Tagliaferre (2008, p.27) menciona que, no campo das afasias, a repetição também está associada à dificuldade de encontrar palavras, ao problema de acesso ou processamento lexical, a alterações sintáticas, aos problemas de ordem mnésica ou fono-articulatória. Nesse caso, é também uma categoria lingüística importante para o nosso trabalho, uma vez que o fenômeno de prompting vai ocorrer, usualmente, durante esses momentos do processamento da linguagem.

De acordo com Marcuschi (1992, p.31), a repetição refere-se à produção de segmentos discursivos idênticos ou semelhantes duas ou mais vezes no âmbito de um mesmo evento comunicativo. Na perspectiva do autor, o fenômeno de linguagem presente nas interações em língua falada é parte importante do próprio texto que se está elaborando. Trata-se de processamento e produção realizados no tempo real.

Tannen (1989, p. 48), outra importante estudiosa do fenômeno em questão, afirma que a repetição serve ao falante para que se produza um maior volume de linguagem com mais facilidade e fluência. Com a repetição, a produção vai situando as informações novas em formas já preparadas, permitindo ao falante um tempo para pensar no que dirá em seguida, sem que perca o turno; quanto à produção, portanto, as funções servem, sobretudo, às intenções e propósitos comunicacionais dos interactantes.

(38)

38 Segue extrato conversacional em que é possível observar um caso de repetição em evento interacional:

AphasiAcervus (10/09/2009)

40 RL [é...é não é::eu por é::aqui ((pega 41 papel))nada é a mesma coisa aqui nada é a mesma coisa 42 HM nada o quê?

Ainda em relação ao aspecto da produção, Marcuschi (1992) aponta dois processos relacionados ao fenômeno, considerando a interação entre os falantes. São elas: a auto-repetição (a matriz e a auto-repetição são produzidas pelo mesmo falante), e a hetero-auto-repetição (a matriz e a repetição são produzidas por falantes diferentes). Os falantes em situação de conversa estão submetidos a uma situação de troca de turnos, permitindo que a repetição seja produzida no mesmo turno (intra-turno) ou em turnos diferentes (inter-turno). Para o autor, as marcas de produção funcionam na organização interacional e são essenciais para a formação do texto dialógico.

Como podemos observar, são diversos os fatores que estão envolvidos e vão concorrer para a resolução de um problema instalado durante a conversação. Isso deixa claro que não se trata somente de uma atividade de comunicação da mensagem por si só; os aspectos interativos e cognitivos necessários para isso trabalham de forma integrada e integral nos eventos discursivos. Por isso, ao analisar as características linguísticas envolvidas nesse processo, podemos nos dar conta de forma mais explícita da complexidade e das diferentes questões envolvidas no advento da linguagem. Ao analisar o fato linguístico utilizado como estratégia, mesmo que no âmbito clínico, devemos levar em consideração todas essas questões para uma compreensão abrangente e adequada do fenômeno.

Um outro aspecto que vem junto com as características de linguagem mencionadas acima e, consequentemente, com o prompting, é a colaboração do interlocutor durante esses eventos, como podemos verificar nos casos de hetero-reparo. É possível identificá-los, principalmente, nos momentos onde falta ao falante uma palavra ou nos momentos de dificuldades no acesso lexical.

Sacks (1992, p.261) afirma, à maneira de Goodwin e Goodwin (1986), em relação às atividades linguísticas relacionadas às buscas de palavras:

(39)

39 Word searches are specifically designed for conditional entry by recipients. Though word searches can expand into long sequences, roughly they minimally provide conditional access to the current turn for other participants to aid in the search by suggesting candidate words and a slot for the original speaker to accept or reject proferred candidates.6

De acordo com Schegloff (1979), o início de uma busca de palavra é assinalado por uma interrupção de uma sentença em curso, seguida por uma pausa ao invés da próxima palavra da frase. Além de pausas, os falantes costumam recorrer também a sons que indicam a procura como “uh” e “hmm”, repetição de palavras ou acentuação ao pronunciar sons como já foi explicado anteriormente. Para tornar a busca explícita normalmente também são usadas expressões como “como é mesmo o nome?” ou “como chama aquilo?”

Goodwin e Goodwin (1986, p.53) acrescentam que apesar de o falante também poder encontrar a solução para a sua busca sozinho, a procura de palavras é, normalmente, considerada uma atividade em que os interlocutores também podem colaborar, em uma atividade de co-construção. Em outras palavras, o falante que está buscando a palavra pode convidar o interlocutor a ajudar na procura. Esses pedidos de auxílio podem ser identificados, por exemplo, através de um olhar lançado ao interlocutor ou mesmo de um questionamento.

Koch (2006, p. 42), a propósito, em seus estudos em torno das questões das especificidades do texto falado, postula que “um fato singular das interações faladas é o de

o falante receber ajuda explícita do ouvinte para complementar um enunciado que está processando”. Para exemplificar o seu arrazoado, a autora analisa o extrato conversacional

abaixo, retirado do corpus do Projeto NURC:

(D2 SP 360:726-36)

L1 – tinha-se esperança...em que dona Ana Cândida tendo assumido a procuradoria geral do estado...em ela sendo mulher...que ela defendesse um pouco mais:: a classe não?

L2 - Ahn [

6 As buscas de palavras são especificamente marcadas pela entrada do interlocutor. Embora a busca de

palavras possa se expandir em longas seqüências, pode ocorrer a entrada de outros participantes no turno corrente com o objetivo de auxiliar na busca sugerindo palavras possíveis e pistas, ficando a cargo do falante aceitá-las ou rejeitá-las.

(40)

40

L1 – mas...

L2 – mas eu tenho a impressão que ela acabou se vendo mais [

L1 - ( )

L2 – ou menos numa ( ) mais ou menos ( ) [

L1 - cerceada, não é? L2 – cerceada [...]

Como pode ser observado no exemplo acima, diante da hesitação do locutor (L2) quanto à escolha de uma palavra que dê prosseguimento à sua fala, o interlocutor (L1) vem em seu auxílio, fornecendo-lhe uma opção lexical.

Em contextos como os trazidos acima, referentes à linguagem não-patológica, também podemos observar as ocorrências do fenômeno tanto em momentos de lapsos como no processo de construção de referente e do desenvolvimento do tópico discursivo. Nesses momentos, são comuns fenômenos como a hesitação, a pausa, a repetição, reformulação, a correção, etc.

Preti (1991), em trabalho que descreve a hesitação em sujeitos idosos, aponta para o fato de que “o fenômeno da hesitação na linguagem faz parte, em maior ou menor

intensidade, de qualquer tipo de falante, de qualquer faixa etária, em qualquer situação de comunicação” (p.48). De acordo com o autor, a hesitação acontece quase sempre diante de

um problema de memória, mas pode refletir também o precário domínio pelo falante do assunto desenvolvido na conversação. Enfatiza que, durante esses momentos, podem acontecer os pedidos de colaboração do falante, por meio da intercalação de uma parentética: “como é que se diz?”; “como é que chama esse negócio aqui?”. Com isso o falante pretende obter o auxílio do ouvinte para a lembrança da palavra esquecida. Segundo Preti (1991, p.48), trata-se de um caso curioso que bem demonstra como, às vezes, o falante, depois de tentar conservar o domínio da palavra, procura realizar uma entrega de turno controlada, apenas para que o interlocutor colabore momentaneamente.

Um recurso muito importante para manter a fluência ao nível do enunciado, de acordo com Preti (2004, p.48), é o processo cooperativo do engate das falas, que ocorre quando o interlocutor, reconhecendo a estrutura que está sendo desenvolvida pelo falante que está com a palavra, resolve completá-la, antes que ele o faça. Em momentos de hesitação, pois, o interlocutor facilmente interfere, toma a palavra ou, se for seu desejo

(41)

41 apenas colaborar, vale-se do recurso do engate para completar o pensamento do falante que estava com a palavra.

Um aspecto interessante que surge nessas atividades colaborativas e que deve ser reconhecido para a análise de fenômenos desse tipo é o papel fundamental desempenhado pelos participantes em uma interação ao interpretar o contexto e, consequentemente, os processos inferenciais que são acionados para prover o auxílio ao interlocutor.

Ao atuar num diálogo, muito se deixa por dizer. Por isso, são constituintes das atividades interacionais os cálculos inferenciais realizados pelo interlocutor, os enquadramentos interacionais etc, recursos esses construídos com base em pelo menos dois fatores: o conhecimento de mundo do ouvinte e os conhecimentos que são partilhados entre eles. Dessa forma, parece claro o trabalho linguístico-cognitivo efetuado tanto pelo interlocutor, quanto pelo falante:

“(...) a produção de inferências desempenha um papel particularmente relevante. Nenhum texto apresenta de forma explícita toda a informação necessária à sua compreensão: há sempre elementos implícitos que necessitam ser recuperados pelo ouvinte/leitor por ocasião da atividade da produção de sentido (KOCH, 2001, p. 26)”.

Gumperz (1982) chama a atenção para as pistas de contextualização que são utilizadas para sinalizar intenções comunicativas ou para inferir as intenções conversacionais do interlocutor. Essas pistas, de acordo com o autor, podem ser de natureza linguística, extralinguística, prosódica e não vocal. Para Gumperz (2002, p.100), o processo inferencial é baseado em construções hipotéticas, pois o conhecimento pressuposto ou “conhecimento de mundo” é reinterpretado na conversa, construído social e interacionalmente, sendo considerado culturalmente situado.

O conceito de pistas de contextualização proposto pelo autor diz respeito aos traços presentes na estrutura de supefície das mensagens, sinalizados pelos falantes que permitem que os interlocutores interpretem qual é a atividade que está ocorrendo, como o conteúdo semântico deve ser entendido e como cada elocução se relaciona com a que precede ou segue. O autor acrescenta:

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