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CONSIDERAÇÕES SOBRE O INSTITUTO DA TUTELA DE URGÊNCIA EM FACE DA FAZENDA

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Academic year: 2021

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CONSIDERAÇÕES SOBRE O INSTITUTO DA

TUTELA DE URGÊNCIA EM FACE DA FAZENDA

Alexandre Moura de Souza

Muito já foi dito sobre a possibilidade de concessão de tutela de urgência (liminares, cautelares e tutela antecipada) em face da Fazenda, havendo grande divergência na doutrina e jurisprudência sobre esse ponto. Não cabe nesta oportunidade, contudo, cotejar todas as posições doutrinárias a favor ou contra os interesses da Fazenda em juízo, mas sim registrar singelas considerações acerca do tema. Na verdade, o nosso propósito é analisar a questão como um todo, e não de maneira isolada.

Com efeito, quando buscamos analisar as prerrogativas da Fazenda em juízo, não podemos esquecer dos princípios constitucionais e administrativos que norteiam a atividade estatal, sob pena de incidirmos em erro na fixação de uma conclusão lógica e jurídica. Vale dizer: a aplicação da tutela de urgência contra a Fazenda jamais poderá ser analisada exclusivamente sob o aspecto do direito processual civil.

No plano do Direito Constitucional e do Direito Administrativo, devemos nos lembrar que:

“A Fazenda se submete ao princípio da inafastabilidade da jurisdição. O interesse público prevalece sobre o interesse particular.

A liberação de verba pública para o pagamento de ordem judicial está condicionada à expedição de precatório ou requisição de pequeno valor, conforme o valor devido pela Fazenda.”

Em primeiro lugar, podemos dizer que os entes federativos (União, Estados e Municípios) podem ser demandados em juízo, sendo esta uma conquista da democracia. Em segundo, que a supremacia do interesse público sobre o privado é decorrência do espírito democrático republicano,

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uma das bases da Nação. E, em terceiro lugar, que a atual Constituição Federal determina a aplicação do sistema de precatórios ou de requisição de pequeno valor para as hipóteses de liberação de verba pública em decorrência de ordem judicial, não havendo outra previsão constitucional para tal finalidade.

Colocadas essas premissas, passaremos a abordar questão relativa à concessão de tutela de urgência contra a Fazenda.

No âmbito do direito processual civil, o ponto de partida é a Lei Federal nº 4.348/64, que cuida especificamente do mandado de segurança, detalhando a concessão de liminar na espécie, uma vez que a Lei Federal nº 1.533/51 apenas indicava a possibilidade de sua concessão, não havendo qualquer restrição expressa à aplicação do instituto. Vale transcrever os arts. 5º e 7º da Lei referida:

LEI Nº 4.348, DE 26 DE JUNHO DE 1964. “(...)

Art. 5º Não será concedida a medida liminar de mandados de segurança impetrados visando a reclassificação ou equiparação de servidores públicos, ou a concessão de aumento ou extensão de vantagens.

Parágrafo único. Os mandados de segurança a que se refere este artigo serão executados depois de transitada em julgado a respectiva sentença. (...)

Art. 7º O recurso voluntário ou ex officio, interposto de decisão concessiva de mandado de segurança que importe outorga ou adição de vencimento ou ainda reclassificação funcional, terá efeito suspensivo.”

Aqui deparamos com uma das primeiras limitações à concessão de liminares em sede de mandado de segurança. Da leitura dos citados dispositivos, observa-se claramente a preocupação do legislador em conter a concessão de liminares e a execução provisória de sentenças que impliquem aumento de despesas para o erário, isso no que diz respeito à folha de pagamento de servidores.

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Na seqüência, foi editada a Lei Federal nº 5.021/66, que trata com detalhes da questão relativa ao pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias asseguradas, em sentença concessiva de mandado de segurança, a servidor público civil, cabendo transcrever as disposições contidas no art. 1º e seu § 4º, e no art. 2º, verbis:

LEI Nº 5.021, DE 9 DE JUNHO DE 1966.

“Art. 1º O pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias asseguradas, em sentença concessiva de mandado de segurança, a servidor público federal, da administração direta ou autárquica, e a servidor público estadual e municipal, somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial. (...)

§ 4º Não se concederá medida liminar para efeito de pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias.

Art. 2º A autoridade administrativa ou judiciária que ordenar a execução de pagamento com violação das normas constantes do artigo anterior incorrerá nas sanções do art. 315 do Código Penal e pena acessória correspondente”.

Podemos observar agora que o legislador endureceu ainda mais, fazendo constar expressamente da lei a proibição de liminar para efeito de pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias. Lembre-se que a Lei Federal nº 4.348/64 falava apenas em "reclassificação ou equiparação de servidores públicos, ou a concessão de aumento ou extensão de vantagens".

O legislador também fez constar da norma a responsabilidade criminal da autoridade judiciária e administrativa que descumprir os preceitos contidos na Lei. Vale dizer, a concessão de liminar em mandado de segurança nas hipóteses vedadas em lei constitui crime!

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Muito tempo depois foi editada a Lei Federal nº 8.437/92, dispondo sobre a concessão de medidas cautelares contra atos do Poder Público, conforme se verá.

LEI Nº 8.437, DE 30 DE JUNHO DE 1992.

“Art. 1° Não será cabível medida liminar contra ato s do Poder Público, no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar ou preventiva, toda vez que providência semelhante não puder ser concedida em ações de mandado de segurança, em virtude de vedação legal.

(...)

§ 3° Não será cabível medida liminar que esgote, n o todo ou em qualquer parte, o objeto da ação.

§ 4° Nos casos em que cabível medida liminar, sem prejuízo da comunicação ao dirigente do órgão ou entidade, o respectivo representante judicial dela será imediatamente intimado. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.180-35, de 2001.)

§ 5º Não será cabível medida liminar que defira compensação de créditos tributários ou previdenciários. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.180-35, de 2001.)

Art. 2º No mandado de segurança coletivo e na ação civil pública, a liminar será concedida, quando cabível, após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no prazo de setenta e duas horas.

Art. 3° O recurso voluntário ou ex officio, interpo sto contra sentença em processo cautelar, proferida contra pessoa jurídica de direito público ou seus agentes, que importe em outorga ou adição de vencimentos ou de reclassificação funcional, terá efeito suspensivo”.

Nesse caso, o legislador buscou aplicar às outras hipóteses de tutela de urgência, notadamente às ações cautelares, as mesmas vedações à concessão de liminares em mandados de segurança. A Lei Federal nº 8.437/92 também inovou em proibir a concessão de liminar de cunho

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satisfativo. A jurisprudência, porém, afasta tal regra em situações excepcionais, tais como: providências médicas urgentes (RSTJ 127/227) e questões previdenciárias (Súmula nº 729 do STF).

A Lei nº 8.437/92 diz também que a sentença proferida em ação cautelar que importe em outorga ou adição de vencimentos, ou em reclassificação funcional, terá efeito suspensivo, praticamente repetindo as normas aplicáveis ao mandado de segurança sobre essa questão. Além disso, inovou ao determinar que, em sede de ação civil pública e de mandado de segurança coletivo, deverá haver obrigatória e prévia audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público antes da concessão de liminar, o qual deverá se pronunciar no prazo de 72 horas. A liminar eventualmente concedida sem respeito a esta disposição será nula, conforme jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça (REsp nº 303.206-RS).

Já a Lei Federal nº 9.494/97 trata da aplicação do instituto da antecipação da tutela relativamente à Fazenda. Segue-se a transcrição dos arts. 1º e 2º (redação dada pela MP nº 2.180-35) da citada Lei, verbis:

LEI Nº 9.494, DE 10 DE SETEMBRO DE 1997.

“Art. 1º Aplica-se à tutela antecipada prevista nos arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil o disposto nos arts. 5º e seu parágrafo único e 7º da Lei nº 4.348, de 26 de junho de 1964, no art. 1º e seu § 4º da Lei nº 5.021, de 9 de junho de 1966, e nos arts. 1º, 3º e 4º da Lei nº 8.437, de 30 de junho de 1992.

(...)

Art. 2º-B A sentença que tenha por objeto a liberação de recurso, inclusão em folha de pagamento, reclassificação, equiparação, concessão de aumento ou extensão de vantagens a servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, inclusive de suas autarquias e

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fundações, somente poderá ser executada após seu trânsito em julgado. (NR) (Incluído pela Medida Provisória nº 2.180-35, de 2001.)”

Observamos aqui que o legislador trouxe para o instituto da tutela antecipada todas as vedações anteriormente previstas à concessão de liminares em mandado de segurança e cautelares, ou seja, a impossibilidade de execução provisória para os casos de sentença que tenha por objeto a liberação de recurso, inclusão em folha de pagamento, reclassificação, equiparação, concessão de aumento ou extensão de vantagens a servidores, bem como a impossibilidade de concessão de tutela antecipada em tais casos.

Vale anotar que a constitucionalidade da Lei Federal nº 9.494/97 já foi objeto de apreciação cautelar pelo egrégio Supremo Tribunal Federal nos autos da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 4, promovida pela Presidência da República, Mesa do Senado e Mesa da Câmara dos Deputados, tendo a mais alta Corte declarado a constitucionalidade do art. 1º da referida Lei.

Tal julgado declarou a possibilidade de o legislador ordinário disciplinar a concessão de tutela antecipada contra a Fazenda, não importando as prerrogativas fazendárias em violação ao princípio da inafastabilidade da jurisdição. Com este julgado, restou pacificado o debate que havia sobre a validade das prerrogativas da Fazenda relativamente à concessão de tutela de urgência contra os seus atos.

Vale registrar, por fim, que a Emenda Constitucional nº 30 alterou a redação do art. 100 da Constituição Federal para proibir a expedição de precatório sem a existência de trânsito em julgado do processo, reafirmando, pois, aquilo que o legislador ordinário já dizia quanto à vedação de concessão de tutela de urgência (liminar, cautelar e tutela antecipada) que implique em liberação de verba pública para o pagamento de condenação judicial da Fazenda. Já tivemos a oportunidade de sustentar tal tese no Tribunal de Justiça de São Paulo, onde nos sagramos

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vencedores nos autos do Agravo de Instrumento nº 239.499-5/2 da colenda Quinta Câmara de Direito Público, constando do v. Acórdão a seguinte passagem:

“Ora, inconcebível, ao depois da Emenda Constitucional nº 30/00, que modificou a redação do § 1º do art. 100 da Carta Magna, execução provisória contra a Fazenda Pública, na medida em que ficou estampado, com todas as letras, que qualquer pagamento de débito deve ser feito através de precatório, sendo certo, inclusive, a inclusão da correspondente verba no orçamento da entidade de direito público.Assim sendo, forçoso convir que, in casu, a pretensão do agravado – maquiada a liquidação provisória, tendo no fundo coloração de execução – se encontra despida de suporte legal, tendo em vista que existem agravos pendentes de julgamento, o que vale dizer que a decisão pode ainda ser reformada.”

Na verdade, a Emenda Constitucional nº 30 foi além do legislador ordinário, uma vez que referida emenda vedou o pagamento provisório (tutela de urgência e execução provisória de sentença) de qualquer verba pública, não se restringindo às hipóteses de liberação de verba para pagamento de servidor público, como fez o legislador ordinário nas Leis Federais nºs 4.348/64, 5.021/66, 8.437/92 e 9.494/97.

Como podemos observar, a grande preocupação do legislador sempre foi impedir a liberação de verba pública em caráter provisório, sendo certo que há outras hipóteses de vedação de tutela de urgência relativamente a outras obrigações da Fazenda.

Por exemplo, a Lei Federal nº 2.770/56 há mais de 50 anos, em seu art. 1º, já vedava a concessão de tutela de urgência para a liberação de mercadorias, bens ou coisas de qualquer espécie procedentes do estrangeiro. Também vale acrescentar que o art. 170-A do Código Tributário Nacional, já com a redação dada pela Lei Complementar nº 104/01, veda expressamente a concessão de tutela de urgência e execução provisória relativamente à compensação de créditos tributários.

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Na mesma esteira é a redação da Súmula nº 212 do Superior Tribunal de Justiça, verbis:

“A compensação de créditos tributários não pode ser deferida em ação cautelar, ou por medida liminar cautelar ou antecipatória”.

Como podemos observar, mostra-se possível a concessão de tutela de urgência contra a Fazenda, porém há determinadas situações expressas em lei que vedam a sua concessão, não significando tais prerrogativas fazendárias violação ao princípio da inafastabilidade da jurisdição. Muito pelo contrário, tais prerrogativas constituem desdobramento do princípio da supremacia do interesse público.

Referências

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